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Processo analítico hierárquico (AHP) aplicado ao estudo de diferentes argamassas frente ao ataque por sulfatos

Analytic Hierarchy Process (AHP) applied to the study of different mortars against sulfate attack

Resumo

O concreto é um material suscetível a diferentes mecanismos de degradação que podem causar a formação de produtos expansivos, como o ataque externo por sulfatos. As adições minerais, como a cinza volante, o metacaulim, a sílica ativa e a sílica de casca de arroz são opções que possuem sua eficácia comprovada em argamassas e concretos expostos a ambientes com sulfatos. O presente estudo busca, por meio de um método de análise multicritérios de decisão, realizar a escolha do teor de aglomerante em argamassas (1: 3,2 a/agl=0,60) que apresentar melhor desempenho frente ao ataque externo por sulfato de sódio (Na2SO4) e magnésio (MgSO4). Tendo uma base de dados pré-definida, foram escolhidos critérios e subcritérios para composição da matriz hierárquica, levando em consideração a sustentabilidade, desempenho econômico das diferentes composições e o efeito do ataque químico nas propriedades mecânicas e na durabilidade das argamassas. Ao final da análise, a composição mais indicada para ambientes agressivos contendo Na2SO4 foi a argamassa contendo 10% de sílica da casca de arroz em substituição parcial ao cimento Portland e, para a exposição ao MgSO4, a utilização de cinza volante na mesma proporção.

Palavras-chave:
Ataque externo por sulfatos (AES); Materiais cimentícios suplementares; Análise hierárquica (AHP); Durabilidade

Abstract

Concrete is a material susceptible to different degradation mechanisms that can lead to the formation of expansive products resulting from external sulfate attack (ESA). In this context, supplementary cementing materials (SCMs), like fly ash, metakaolin, silica fume, and rice husk ash, have effectively suppressed the effects caused by ESA. However, each SCM may present different behavior depending on the exposure conditions, sulfate type, SO 4 2- concentration, etc. Thus, this study presents a multicriteria decision-making analysis of fixed binder content for mortars (1: 3.2 a/agl=0.60) aiming to achieve the best performance against ESA (exposure to Na 2 SO 4 or MgSO 4 ). The criteria selected for the decision-making analysis are the sustainability impact of the mixture, economic performance, and the effect of ESA on the mechanical properties and durability of the mortars. The results indicate that the most suitable composition for aggressive environments containing Na 2 SO 4 was the mortar containing 10% rice husk ash and, for exposure to MgSO 4 , the use of fly ash in the same proportion.

Keywords:
External attack by sulfates (EAS); Additional cementitious materials; Analytics Hierarchy Process (AHP); Durability

Introdução

O ataque externo por sulfato (AES) é um complexo processo de degradação dos compósitos cimentícios, proveniente do ingresso dos íons sulfato (SO4 2-) pela estrutura porosa através de diferentes mecanismos de transporte. Sob o ponto de vista químico, os íons sulfato reagem com as fases hidratadas do cimento (hidróxido de cálcio - Ca(OH)2 e fases aluminato) resultando na formação de produtos expansivos, como a etringita e a gipsita, que são responsáveis pelo surgimento de tensões internas e podem levar à do compósito cimentício (Ranjani; Ramamurthy, 2012RANJANI, G. I. S.; RAMAMURTHY, K. Behaviour of foam concrete under sulphate environments. Cement and Concrete Research, v. 34, p. 825-834, 2012.; Whittaker; Black, 2015WHITTAKER, M.; BLACK, L. Current knowledge of external sulfate attack. Advances in Cement Research, 1400089, 2015.).

O mecanismo de deterioração dos compósitos cimentícios pelo ataque por sulfato depende de fatores como a disponibilidade de íons SO4 2-, as condições de exposição (temperatura, umidade relativa) a composição da matriz cimentícia e a sua estrutura porosa (Irassar, 2009IRASSAR, E. F. Sulfate attack on cementitious materials containing limestone filler: a review. Cement and Concrete Research, v. 39, p. 241-254, 2009.; Hoppe Filho et al. 2015HOPPE FILHO, J. et al. Ataque de matrizes cimentícias por sulfato de sódio: adições minerais como agentes mitigadores. Cerâmica, v. 61, p. 168-177, 2015.; Souza; Medeiros; Hoppe Filho, 2018SOUZA, D. J.; MEDEIROS, M. H. F.; HOPPE FILHO, J. Evaluation of the SR Portland cement against sodium and magnesium sulfate attack: a physical and comparative analysis of mortars. Revista Ibracon de Estruturas e Materiais, v. 11, n. 5, p. 1053-1075, 2018.; Menéndez et al, 2020MENÉNDEZ, E. et al. Review of the incidence of the sulphate attack in Spain: evaluation of field concrete cases. In: MENÉNDEZ, E.; BAROGHEL-BOUNY, V. (ed.). External sulphate attack: field aspects and lab tests. Cham: Springer, 2020.). Adicionalmente, Ikumi, Cavalaro e Segura (2019IKUMI, T.; CAVALARO, S. H. P.; SEGURA, I. The role of porosity in external sulphate attack. Cement and Concrete Composites, v. 97, p. 1-12, 2019.) afirmam que a permeabilidade e a capacidade de tamponamento são os dois mecanismos definidos pela rede de poros que influenciam a formação dos produtos expansivos e a consequente expansão, fissuração, perda de massa e perda de resistência, contribuindo com o desempenho frente ao ataque por sulfato. Logo, um material com baixa porosidade, apresenta elevada resistência à penetração de íons sulfato e baixo potencial de precipitação de etringita em virtude do ataque.

Diversas pesquisas abordam a incorporação de diferentes materiais suplementares cimentícios na matriz cimentícia, com o intuito de diminuir a quantidade final do hidróxido de cálcio e dos compostos hidratados que contém alumina, além de promover alterações microestruturais que resultam em um refinamento dos poros e, consequentemente, no aumento da resistência da matriz cimentícia ao ingresso de íons sulfato (Irassar; Maio; Batic, 1996IRASSAR, E. F.; MAIO, A.; BATIC, O. R. Sulfate attack on concrete with mineral admixtures. Cement and Concrete Research, v. 26, n. 1, p. 113-123, 1996.; Atahan; Dikme 2011ATAHAN, H. N.; DIKME, D. Use of mineral admixtures for enhanced resistance against sulfate attack. Construction and Building Materials, v. 25, p. 3450-3457, 2011.; Siad et al., 2013SIAD, H. et al. Characterization of the degradation of self-compacting concretes in sodium sulfate environment: Influence of different mineral admixtures. Construction and Building Materials, v. 47, p. 1188-2000, 2013.; Souza; Medeiros; Hoppe Filho, 2020aSOUZA, D. J.; MEDEIROS, M. H. F.; HOPPE FILHO, J. Evaluation of external sulfate attack (Na2SO4 and Mg2SO4): Portland cement mortars containing siliceous supplementary cementitious materials. Revista Ibracon de Estruturas e Materiais, v. 13, n. 4, 2020a.; 2020bSOUZA, D. J.; MEDEIROS, M. H. F.; HOPPE FILHO, J. Evaluation of external sulfate attack (Na2SO4 and Mg2SO4): Portland cement mortars containing fillers. Revista Ibracon de Estruturas e Materiais, v. 13, n. 3, p. 644-655, 2020b.; SOUZA et al., 2020SOUZA, D. J. et al. The uses of finely ground materials to mitigate the external sulphate attack (ESA) on cementitious materials. In: MENÉNDEZ, E.; BAROGHEL-BOUNY, V. (ed.). External sulphate attack: field aspects and lab tests. Cham: Springer, 2020.).

Bonakdar e Mobasher (2010BONAKDAR, A.; MOBASHER, B. Multi-parameter study of external sulfate attack in blended cement materials. Construction and Building Materials, v. 24, p. 61-70, 2010.) verificaram a diminuição da expansão de argamassas contendo cinza volante nos teores de 20 e 30% em substituição parcial do cimento Portland e do aparecimento de cristais expansivos de etringita após 1 ano de exposição das barras prismáticas à solução de sulfato de sódio (Na2SO4). Segundo a investigação conduzida por Hoppe Filho et al. (2015HOPPE FILHO, J. et al. Ataque de matrizes cimentícias por sulfato de sódio: adições minerais como agentes mitigadores. Cerâmica, v. 61, p. 168-177, 2015.), a substituição parcial do cimento Portland por cinza volante, metacaulim, sílica ativa e sílica de casca de arroz, em teores de 10% em massa, propiciaram a redução da expansão resultante em argamassas expostas a solução de sulfato de sódio (Na2SO4) segundo a NBR 13583 (ABNT, 2014ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 13583: cimento Portland: determinação da variação dimensional de barras de argamassa de cimento Portland expostas à solução de sulfato de sódio. Rio de Janeiro, 2014.). De maneira semelhante, Souza, Medeiros e Hoppe Filho (2020aSOUZA, D. J.; MEDEIROS, M. H. F.; HOPPE FILHO, J. Evaluation of external sulfate attack (Na2SO4 and Mg2SO4): Portland cement mortars containing siliceous supplementary cementitious materials. Revista Ibracon de Estruturas e Materiais, v. 13, n. 4, 2020a.) verificaram que a substituição parcial de 10% do cimento em argamassas, por adições minerais silicosas (sílica ativa e sílica de casca de arroz) promoveram uma diminuição estatisticamente significativa na expansão após a exposição a uma solução de Na2SO4 por 140 dias. Porém, as mesmas adições minerais silicosas, não promoveram a mitigação da expansão quando expostas ao sulfato de magnésio (MgSO4), sendo a expansão obtida semelhante à da série sem adições após o período de exposição do estudo (Souza; Medeiros; Hoppe Filho, 2020aSOUZA, D. J.; MEDEIROS, M. H. F.; HOPPE FILHO, J. Evaluation of external sulfate attack (Na2SO4 and Mg2SO4): Portland cement mortars containing siliceous supplementary cementitious materials. Revista Ibracon de Estruturas e Materiais, v. 13, n. 4, 2020a.).

O ataque por sulfatos não deve ser tratado de forma genérica, visto que é notável a influência do MgSO4 nesse mecanismo de deterioração de argamassas e concretos devido às reações secundárias. A exposição ao MgSO4 promove uma diminuição no pH da solução dos poros levando à formação cristalina da brucita (Mg(OH)2) e uma maior redução na resistência à compressão, devido à transformação do C-S-H em M-S-H, quando comparada à exposição do mesmo material ao Na2SO4, mesmo apresentando uma menor expansão (Xiong et al., 2014XIONG, C. et al. Influence of cation type on deterioration process of cement paste in sulfate environment. Construction and Building Materials, v. 71, p. 158-166, 2014.; Wu et al., 2020WU, J. et al. Effect of multiple ions on the degradation in concrete subjected to sulfate attack. Construction and Building Materials, v. 259, p. 119846, 2020.).

Comparando as duas fontes de contaminação, Sirisawat et al. (2014SIRISAWAT, I. et al. Durability and testing of mortar with interground fly ash and limestone cements in sulfate solutions. Construction and Building Materials, v. 64, p. 39-46, 2014.), Ortega et al. (2018ORTEGA, J. M. et al. Short-term performance of sustainable silica fume mortars exposed to sulfate attack. Sustainability, v. 10, n. 7, p. 2517, 2018.), Souza, Medeiros e Hoppe Filho (2020aSOUZA, D. J.; MEDEIROS, M. H. F.; HOPPE FILHO, J. Evaluation of external sulfate attack (Na2SO4 and Mg2SO4): Portland cement mortars containing siliceous supplementary cementitious materials. Revista Ibracon de Estruturas e Materiais, v. 13, n. 4, 2020a., 2020bSOUZA, D. J.; MEDEIROS, M. H. F.; HOPPE FILHO, J. Evaluation of external sulfate attack (Na2SO4 and Mg2SO4): Portland cement mortars containing fillers. Revista Ibracon de Estruturas e Materiais, v. 13, n. 3, p. 644-655, 2020b.) e Pinto et al. (2020PINTO, S. R. et al. Durability of phosphogypsum-based supersulfated cement mortar against external attack by sodium and magnesium sulfate. Cement and Concrete Research, v. 136, p. 106172, 2020) demonstraram que o material mais indicado para resistir ao ataque externo por Na2SO4 é diferente do mais apropriado para o ataque externo por MgSO4. Essa condição enfatiza a complexidade da especificação de um compósito de cimento Portland durável em uma condição de ataque por sulfatos para as obras de engenharia. Neste contexto, sistematizar a escolha do material a ser especificado em condições de ataque por sulfatos, considerando não somente aspectos químicos, é necessário e imprescindível. Isto, pois, tal escolha é mais complexa do que a simples aplicação do procedimento da NBR 13583 (ABNT, 2014ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 13583: cimento Portland: determinação da variação dimensional de barras de argamassa de cimento Portland expostas à solução de sulfato de sódio. Rio de Janeiro, 2014.), que apenas indica o potencial de durabilidade de argamassas a partir da sua expansão após a exposição ao Na2SO4.

Com este preâmbulo, o presente estudo tem o foco de utilizar o processo de análise hierárquica (AHP) como ferramenta de decisão para sistematizar escolhas para os casos práticos de obras de concreto submetidas à exposição e ao ataque externo de sulfatos. Desse modo, tem-se como objetivo a escolha da composição do material cimentício que apresente maior durabilidade ao ataque por sulfatos de sódio e magnésio. Como base de dados para alimentar o processo de escolha, utilizou-se os dados do experimento desenvolvido por Souza (2016SOUZA, D. Capacidade de adições minerais em mitigar o ataque por sulfatos de sódio e magnésio em argamassas de cimento Portland. Curitiba, 2016. 229 f. Dissertação (Mestrado em Engenharia de Construção Civil) - Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Construção Civil, Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2016.), em que o autor investigou a durabilidade de argamassas contendo diversas adições minerais, pozolânicas ou não, expostas à solução de sulfato de sódio (Na2SO4) e sulfato de magnésio (MgSO4).

Análise hierárquica

A análise hierárquica (Analytic Hierarchy Process - AHP) é um método desenvolvido por Saaty (1991SAATY, T. L. Some mathematical concepts of the analytic hierarchy Process. Behaviormetrika, v. 29, p. 1-9, 1991.) na década de 70 e consiste na utilização do múltiplo critério como auxílio à tomada de decisão. Dolan (2008DOLAN, J. G. Shared decision-making: transferring research into practice: the analytic hierarchy process. Patient Educational and Counseling, v. 73, p. 418-425, 2008.) afirma que o AHP é o método multicritério mais conhecido e utilizado, devido ao seu fundamento teórico e sua simplicidade, propiciando a tomada de decisão em circunstâncias complexas através de uma escala de comparação por pares. Além disso, o método permite a decomposição do problema em uma árvore de decisão, propiciando uma maior extração de informação da unidade especialista ou decisora, que pode ser composta por um único indivíduo ou um grupo de pessoas (Costa, 2002COSTA, H. G. Introdução ao método de análise hierárquica: análise multicritério no auxílio à decisão. In: SIMPÓSIO BRASILEIRO DE PESQUISA OPERACIONAL, 36., Niteroi, 2002. Proceedings [...] Niteroi, 2002.).

De acordo com Cheng, Li e Ho (2002CHENG, E. W. L.; LI, H.; HO, D. C. K. Analytical hierarchy process (AHP): a defective tool when used improperly. Measuring Business Excellence, v. 6, n. 4, p. 33-37, 2002.), o método AHP pode ser dividido em seis etapas principais, como mostrado a seguir:

  1. definição do problema e alternativas;

  2. decomposição do problema em um sistema de estrutura hierárquica;

  3. atribuição de pesos para os critérios escolhidos, através do método de comparação em pares;

  4. verificação das medidas de consistência;

  5. definição dos valores das alternativas em estudo; e

  6. comparação das alternativas com o auxílio de uma matriz de decisão.

A primeira etapa consiste na definição de um objetivo conciso e claro, através do qual serão definidas possíveis soluções que podem ser adotadas para o problema, sendo avaliadas por um conjunto de critérios. Tais critérios são escolhidos na etapa seguinte, de acordo com os fatores relevantes ao desempenho das alternativas anteriormente definidas. Durante a segunda etapa, a decomposição do problema é realizada de maneira estruturada, ou seja, através de uma árvore de decisão, na qual é possível indicar a integração dos critérios e a criação de inúmeros níveis de subcritérios. Posteriormente, o decisor irá avaliar a interferência dos critérios e subcritérios no desempenho das alternativas, através da distribuição de pesos. Tal procedimento é realizado através da comparação das variáveis em pares, com o auxílio de uma escala de comparação pré-definida. A quarta etapa consiste em uma verificação matemática com o intuito de apontar possíveis inconsistências na etapa anterior, devendo ser realizada para cada nível da matriz hierárquica (Saaty, 1991SAATY, T. L. Some mathematical concepts of the analytic hierarchy Process. Behaviormetrika, v. 29, p. 1-9, 1991.; Cheng; Li; Ho, 2002CHENG, E. W. L.; LI, H.; HO, D. C. K. Analytical hierarchy process (AHP): a defective tool when used improperly. Measuring Business Excellence, v. 6, n. 4, p. 33-37, 2002.; Costa, 2002COSTA, H. G. Introdução ao método de análise hierárquica: análise multicritério no auxílio à decisão. In: SIMPÓSIO BRASILEIRO DE PESQUISA OPERACIONAL, 36., Niteroi, 2002. Proceedings [...] Niteroi, 2002.; Dolan, 2008DOLAN, J. G. Shared decision-making: transferring research into practice: the analytic hierarchy process. Patient Educational and Counseling, v. 73, p. 418-425, 2008.).

Por fim, em posse de todos os dados, o decisor irá definir uma escala de pontuação para as variáveis em relação a cada critério analisado e a comparação das alternativas será realizada através de uma matriz de decisão. Esta última etapa, por sua vez, irá considerar a importância de cada critério através dos pesos relativos definidos na terceira etapa, resultando na sua participação no desempenho final das alternativas (Costa, 2006COSTA, H. G. Auxílio multicritério à decisão: método AHP. São Carlos: ABEPRO, 2006.).

Método

Definição do problema

A Figura 1 apresenta a definição do problema e das alternativas para a aplicação da AHP no presente estudo.

Figura 1 -
Definição do problema e alternativas

O problema consiste na escolha da composição do aglomerante para argamassas em ambientes com sulfatos, sendo considerados os sulfatos de sódio e magnésio. As alternativas a serem avaliadas são argamassas produzidas com CPV - ARI e com a substituição parcial do cimento por adições minerais reativas, como a cinza volante, o metacaulim, a sílica ativa e a sílica de casca de arroz.

O trabalho utilizado como banco de dados no presente estudo consiste em uma dissertação de mestrado, desenvolvida por Souza (2016SOUZA, D. Capacidade de adições minerais em mitigar o ataque por sulfatos de sódio e magnésio em argamassas de cimento Portland. Curitiba, 2016. 229 f. Dissertação (Mestrado em Engenharia de Construção Civil) - Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Construção Civil, Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2016.), cujo objetivo foi “[...] analisar o comportamento e a influência da substituição parcial do cimento Portland por adições minerais inertes e pozolânicas em mitigar a deterioração causada pelo ataque por sulfato de sódio e sulfato de magnésio em argamassas e pastas de cimento Portland, por um período de exposição de 140 dias.” (Souza, 2016SOUZA, D. Capacidade de adições minerais em mitigar o ataque por sulfatos de sódio e magnésio em argamassas de cimento Portland. Curitiba, 2016. 229 f. Dissertação (Mestrado em Engenharia de Construção Civil) - Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Construção Civil, Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2016., p. 26). Além da série referência, CPV-ARI, as composições contendo materiais reativos, sílica ativa, metacaulim, cinza volante e sílica de casca de arroz, também foram selecionadas para a avaliação proposta pelo presente estudo.

O programa experimental do trabalho utilizado como base de dados, consistiu no acompanhamento das reações expansivas promovidas pela exposição a soluções contendo sulfatos, através de barras prismáticas com dimensões (25x25x285) mm e na avaliação das propriedades mecânicas e físicas ao longo do tempo, com o auxílio de corpos de prova prismáticos com dimensões (40x40x160) mm. As argamassas foram produzidas seguindo o procedimento preconizado pela NBR 7215 (ABNT, 2019ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 7215: cimento Portland: determinação da resistência à compressão de corpos de prova cilíndricos. Rio de Janeiro, 2019.), com traço de 1,0:3,2 e relação água/aglomerante igual a 0,60. As adições minerais foram utilizadas como substituição parcial do cimento, em massa, no teor de 10%. A Tabela 1 mostra a proporção de mistura dos materiais utilizados para as diferentes composições.

Ao final deste procedimento as misturas foram moldadas, levadas à cura inicial em câmara úmida por 48 horas e, posteriormente, imersas em água saturada com cal durante 12 dias, totalizando 14 dias de cura. Após os dois procedimentos iniciais de cura, as amostras foram divididas em três séries e imersas em soluções distintas. Uma manteve-se em solução saturada com hidróxido de cálcio, a qual serviu como referência. Uma foi submetidas à solução de sulfato de sódio (Na2SO4) e a outra de sulfato de magnésio (MgSO4), onde permaneceram durante 140 dias. A segunda solução seguiu o recomendado pela norma brasileira para avaliação da variação dimensional de argamassas expostas à solução de sulfato de sódio (ABNT, 2014ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 13583: cimento Portland: determinação da variação dimensional de barras de argamassa de cimento Portland expostas à solução de sulfato de sódio. Rio de Janeiro, 2014.), resultando em uma concentração de 100 g de Na2SO4/L de solução. Considerando uma concentração constante de íons sulfato (SO4 2-) para ambas as soluções, tem-se uma solução de sulfato de magnésio com concentração igual a 84,74g de Mg2SO4/L de solução contaminante.

Consequente à preparação das soluções, os corpos de prova e os contaminantes foram dispostos em recipientes, respeitando uma relação entre o volume de solução e o volume de amostras igual a 4,0/1,0 e levadas à estufa, à temperatura de 40 °C durante todo o período de análise.

Ao longo do tempo foram realizados ensaios periódicos com o intuito de avaliar a deterioração promovida pela exposição às soluções contaminantes, dentre eles, a variação dimensional linear e a variação de massa, aplicadas com o intuito de avaliar a formação dos produtos expansivos pela reação com os íons sulfatos. Adicionalmente, os efeitos nas propriedades mecânicas, como a resistência à tração na flexão e a resistência à compressão, foram quantificados, bem como a variação da velocidade de pulso ultrassônico. Essas alterações físicas devido ao ataque por sulfatos foram comprovadas com o uso de técnicas microestruturais por Souza (2016SOUZA, D. Capacidade de adições minerais em mitigar o ataque por sulfatos de sódio e magnésio em argamassas de cimento Portland. Curitiba, 2016. 229 f. Dissertação (Mestrado em Engenharia de Construção Civil) - Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Construção Civil, Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2016.).

Estrutura hierárquica

A Figura 2 apresenta a estrutura hierárquica dos critérios e subcritérios definidos para a escolha da composição do aglomerante para argamassas em ambientes com sulfatos.

Tabela 1 -
Composição das argamassas para moldagem dos corpos de prova

Figura 2 -
Estrutura hierárquica dos critérios e subcritérios

O critério “Propriedades mecânicas” tem como objetivo avaliar as propriedades mecânicas das argamassas submetidas à solução de hidróxido de cálcio, ou seja da referência. Dessa maneira, são apresentados três subcritérios distintos: a resistência à compressão, a resistência à tração na flexão e o módulo de elasticidade dinâmico. A resistência à compressão e a resistência à tração são expressos de forma comparativa através dos dados obtidos nos ensaios realizados sem a contaminação por sulfato, ou seja, após 140 dias de cura em solução de água saturada com cal.

Os critérios “Econômico” e “Sustentabilidade” também foram avaliados de forma quantitativa. O primeiro apresenta o valor monetário necessário para a produção de 1 m³ das diferentes composições de argamassa, considerando a compra de todos os insumos, exceto a água. Em contrapartida, o segundo contém dois subcritérios distintos que visam quantificar o critério, o fator de eficiência (bics) no uso de aglomerantes e a emissão de CO2 (cics), ambos calculados com base no indicado por Damineli et al. (2010DAMINELI, B. L. et al. Measuring the eco-efficiency of cement use. Cement and Concrete Composites, v. 32, p. 555-562, 2010.) em relação a resistência à compressão das argamassas após 140 dias de cura em solução de água saturada com cal. Segundo os autores, tais parâmetros, quando utilizados em conjunto, permitem uma análise da eficiência de todo o processo de produção e utilização dos materiais cimentícios, através da incorporação de parâmetros relativos a sustentabilidade ambiental, como a eficiência do processo de produção dos cimentos, a dosagem do material cimentício e, por fim, a natureza e qualidade dos materiais utilizados.

Por fim, o critério “Durabilidade” refere-se à durabilidade das argamassas frente à exposição das soluções contaminantes, dividindo-se em subcritérios que tem como intuito avaliar a durabilidade das diferentes argamassas frente ao ataque por sulfato provenientes da contaminação por sulfato de sódio e de magnésio, sendo eles:

  1. variação de massa;

  2. variação volumétrica;

  3. variação de velocidade de pulso ultrassônico (VUP); e

  4. variação de resistência à compressão das argamassas submetidadas aos sulfatos.

Todos os subcritérios foram expressos de forma quantitativa e apresentam a variação dos valores obtidos para cada ensaio ao final de 140 dias de exposição, em relação aos valores obtidos para a mesma série em cura submersa em água com cal. A variação de massa, a variação volumétrica e a variação de velocidade de pulso ultrassônico (VUP) são parâmetros que avaliam, de forma indireta, a formação dos compostos expansivos e deterioração dos compósitos cimentícios provenientes do ataque por sulfato. Por outro lado, a variação de resistência à compressão avalia o efeito de tais produtos nas propriedades mecânicas das argamassas.

Determinação do peso de cada critério

Os pesos dos critérios e subcritérios foram determinados a partir do conhecimento técnico dos autores do trabalho que possuem um quadro formado por doutores e mestres em durabilidade das estruturas de concreto e experiência no uso de EH, com o auxílio de uma escala de 5 classificações, conforme indicado por Saaty (1991SAATY, T. L. Some mathematical concepts of the analytic hierarchy Process. Behaviormetrika, v. 29, p. 1-9, 1991.) e apresentado pela E1765 (ASTM, 2016AMERICAN SOCIETY FOR TESTING AND MATERIALS. E1765: standard practice for applying analytical hierarchy process (AHP) to multiattribute decision analysis of investments related to projects, products and processes. West Conshohocken, 2016.), sendo descrita nas tabelas apresentadas a seguir1 1 Tendo em vista que o processo de determinação de pesos de cada critério confere certo grau de racionalidade com base em avaliações subjetivas e técnico-pessoais, os autores colocam-se a disposição para discutir e disponibilizar dados explicando quais argumentos foram levados em consideração para determinar que um fator é igualmente, moderadamente, ou mais importante que outro, e assim garantir a reprodutibilidade e replicabilidade desse estudo a eventuais interessados. .

A Tabela 2 mostra a matriz de cálculo dos pesos relativos dos critérios que se encontram no nível 1 da estrutura hierárquica criada.

O critério “Durabilidade” apresentou o maior peso relativo, seguido dos critérios “Propriedades mecânicas”, “Econômico” e “Sustentabilidade”. Tal comportamento já era esperado, visto que a definição do problema possui caráter de análise em relação à durabilidade das argamassas frente a um determinado tipo de deterioração.

A partir da definição dos pesos relativos de cada critério constituinte da matriz hierárquica, a matriz do nível 1 foi submetida ao teste de razão de consistência (RC) indicado por Saaty (1991SAATY, T. L. Some mathematical concepts of the analytic hierarchy Process. Behaviormetrika, v. 29, p. 1-9, 1991.) e pela E1765 (ASTM, 2016AMERICAN SOCIETY FOR TESTING AND MATERIALS. E1765: standard practice for applying analytical hierarchy process (AHP) to multiattribute decision analysis of investments related to projects, products and processes. West Conshohocken, 2016.) para avaliação de possíveis inconsistências no julgamento realizado pelos autores. De acordo com Saaty (1991SAATY, T. L. Some mathematical concepts of the analytic hierarchy Process. Behaviormetrika, v. 29, p. 1-9, 1991.) e a E1765 (ASTM, 2016AMERICAN SOCIETY FOR TESTING AND MATERIALS. E1765: standard practice for applying analytical hierarchy process (AHP) to multiattribute decision analysis of investments related to projects, products and processes. West Conshohocken, 2016.), uma razão de menor do que 0,1 indica a consistência da matriz e dos pesos atribuídos.

Para a realização dessa análise, a matriz de comparação aos pares foi multiplicada pelo vetor dos pesos de cada critério, o valor obtido foi dividido pelo peso correspondente, a média dos resultados obtidos corresponde ao máximo autovalor da matriz de comparação (λmáx). Após esse processo é possível calcular o Índice de Consistência pela equação IC = (λmáx - n) / (n - 1), onde n é o número de elementos na matriz. Por fim calcula-se a RC que é dada através da razão entre o índice de consistência (IR) e o índice randômico (IR), onde o IR é calculado a partir de uma matriz randômica recíproca com elementos não negativos, e Saaty (1991SAATY, T. L. Some mathematical concepts of the analytic hierarchy Process. Behaviormetrika, v. 29, p. 1-9, 1991.) aproximou esse índice para diferentes tamanhos de matriz N.

Considerando o índice de consistência e a ordem da matriz, os critérios do nível 1 apresentaram razão de consistência igual a 0,057, logo, os pesos adotados para julgamento constituem uma matriz consistente.

O mesmo procedimento foi aplicado aos subcritérios presentes no nível 2 e no nível 3. As Tabelas 3 a 6 apresentam, respectivamente, os pesos relativos dos subcritérios referentes as propriedades mecânicas, sustentabilidade e a durabilidade.

Em relação ao critério “Propriedades mecânicas”, o item referente à resistência à compressão apresentou maior influência relativa, sendo esta uma característica intrínseca do material. De maneira semelhante, em relação aos subcritérios de durabilidade, a variação de resistência à compressão apresentou maior peso relativo, seguido dos parâmetros referentes à formação de produtos expansivos (variação de massa e variação dimensional linear), da variação de resistência à tração na flexão e, por fim, a variação de velocidade de pulso ultrassônico (VPU). Os subcritérios de sustentabilidade apresentaram pesos relativos semelhantes, evidenciando a importância de ambos os parâmetros.

Tabela 2 -
Peso relativo dos critérios do nível 1
Tabela 3 -
Peso relativo dos subcritérios de propriedades mecânicas no nível 2
Tabela 4 -
Peso relativo dos subcritérios de sustentabilidade no nível 2
Tabela 5 -
Peso relativo dos subcritérios de durabilidade no nível 2
Tabela 6 -
Peso relativo dos subcritérios de durabilidade no nível 3

O procedimento utilizado anteriormente para análise da consistência dos pesos relativos atribuídos aos critérios de avaliação da matriz hierárquica foi repetido para os subcritérios do nível 2. Sendo os subcritérios relativos às propriedades mecânicas, a sustentabilidade e a durabilidade apresentando razão de consistência igual a 0, indicando a perfeita consistência da matriz de julgamento. Por fim, a matriz para julgamento dos pesos relativos dos subcritérios de durabilidade - nível 3 também apresentou consistência, sendo sua razão de consistência igual a 0,098.

Resultados e discussões

A partir da atribuição dos pesos para cada um dos critérios e subcritérios escolhidos para compor a matriz hierárquica do presente estudo foi realizada a definição dos valores para a avaliação das alternativas da composição do aglomerante de argamassas sujeitas ao ataque por sulfatos. Seguindo a recomendação de Saaty (1991SAATY, T. L. Some mathematical concepts of the analytic hierarchy Process. Behaviormetrika, v. 29, p. 1-9, 1991.), iniciou-se a análise pelos subcritérios. Como citado anteriormente, o critério “Propriedades mecânicas” divide-se em três subcritérios e tem como objetivo avaliar as propriedades mecânicas das argamassas após 140 dias de cura em solução de água saturada com cal.

A Tabela 7 apresenta os valores atribuídos a cada um dos subcritérios relacionados às características mecânicas das argamassas, coletados do trabalho desenvolvido por Souza (2016SOUZA, D. Capacidade de adições minerais em mitigar o ataque por sulfatos de sódio e magnésio em argamassas de cimento Portland. Curitiba, 2016. 229 f. Dissertação (Mestrado em Engenharia de Construção Civil) - Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Construção Civil, Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2016.). Os valores inseridos consistem em dados quantitativos, dessa forma, foi realizada a normalização dos dados para a obtenção de resultados na escala de 0 a 1. Tal procedimento consiste na divisão dos valores atribuídos a cada alternativa pelo maior valor da respectiva coluna da Tabela 7, considerando um determinado subcritério.

No caso da “Resistência à compressão”, a série contendo sílica de casca de arroz (SCA) apresentou maior valor, igual a 62,50 MPa, dessa forma, os demais valores foram divididos por ele, resultando em coeficientes de normalização igual a 0,69 0,90, 0,76 e 0,96, para as alternativas CPV, CV, MT e SA, respectivamente. Por fim, os pesos relativos de cada subcritério (Tabela 3) foram aplicados aos valores normalizados de cada alternativa, por exemplo, o peso do critério de resistência à compressão, 0,714 (Tabela 3) foi multiplicado com o valor normalizado de resistência à compressão, 0,69 (Tabela 7) e por 100, resultando na nota do critério. Sendo a somatória dos valores obtidos para cada alternativa o desempenho referente ao critério “Propriedades mecânicas”.

A argamassa SCA apresentou maior desempenho em relação às propriedades mecânicas, seguida das argamassas SA, CV, MT e CPV. Diversos estudos apontam que a incorporação de adições minerais promove uma melhoria nas propriedades mecânicas dos compósitos cimentícios devido a melhoria no empacotamento dos sólidos, aliado à interação com o hidróxido de cálcio proveniente da hidratação do cimento para a formação de silicatos de cálcio hidratado secundários (C-S-H), no caso das adições com potencial reativo (pozolânicas), resultando na densificação da matriz cimentícia (Juenger; Siddique, 2015JUENGER, C. G. M.; SIDDIQUE, R. Recent advances in understanding the role of supplementary cementitious materials in concrete. Cement and Concrete Research, v. 78, Part A, p. 71-80, 2015.; Singh, 2018SINGH, B. Waste and supplementary cementitious materials in concrete: characterisation, properties and applications. In: SIDDIQUE, R.; CACHIM, P. Waste and supplementary cementitious materials in concrete: characterization, properties and applications. Amsterdam: Elsevier, 2018.). Cabe ressaltar ainda que a sílica ativa e a sílica de casca de arroz além de possuírem mais de 88% de SiO2 em suas composições químicas, são classificadas como adições pozolânicas de elevada reatividade (Medeiros et al., 2015MEDEIROS, M. H. F. et al. Pozolanas de elevada reatividade: uma avaliação crítica do ensaio de Índice de Atividade Pozolânica (IAP) com cal usando Difração de Raios X. Ambiente Construído, Porto Alegre, v. 15, n. 3, p. 19-29, jul./set. 2015.). Logo, podendo apresentar uma maior produção de C-S-H secundário em idades avançadas. Deste modo, o resultado de desempenho das alternativas obtido através da matriz de decisão condiz com o esperado pelos autores.

Tabela 7 -
Matriz de decisão das argamassas para os subcritérios de “Propriedades mecânicas”

O mesmo procedimento foi aplicado aos subcritérios referentes à sustentabilidade, como é apresentado na Tabela 8. O fator de eficiência (bics) foi determinado através do consumo de aglomerantes para 1m³ de argamassa, sendo igual a 470,15 kg/m³ para as composições presentes no presente estudo, e pela resistência à compressão de cada alternativa após 140 dias de cura em água saturada com cal (Tabela 7). Adicionalmente, foi realizada uma inversão de valores, visto que, o menor consumo de aglomerantes para a atribuição de 1 MPa é melhor para o compósito cimentício em relação à sua eficiência energética e ambiental. De maneira semelhante, a emissão de CO2 (cics) se mostra melhor em relação à sustentabilidade quanto menor é o valor obtido, tendo os seus valores invertidos na matriz de decisão. A emissão de CO2 nas diferentes alternativas foi determinada considerando a substituição parcial de 10% do cimento pelas adições minerais, em massa, resultando em um consumo de 423,14 kg de cimento por m³ de argamassa, e a emissão de 679 kg de CO2 por tonelada de cimento (GCCA, 2020GLOBAL CEMENT AND CONCRETE ASSOCIATION. GNR project reporting CO2: gross CO2 emissions, distribution excluding CO2 from on-site power generation - Grey and white cementitious products, year of 2018. Disponível em: Disponível em: https://gccassociation.org/gnr/ . Acesso em: 24 set. 2020.
https://gccassociation.org/gnr/...
). Não foram consideradas as emissões de CO2 geradas pelas adições.

Após a normalização dos dados e a aplicação dos pesos relativos a cada subcritério (Tabela 4), a argamassa com sílica de casca de arroz (SCA) apresentou maior desempenho frente à sustentabilidade, seguida das composições, SA, CV, MT e CPV. É possível observar uma similaridade de comportamento do desempenho à sustentabilidade das alternativas em relação às propriedades mecânicas, visto que as argamassas apresentam mesmo teor de substituição e, tanto o fator de eficiência quanto a emissão de CO2, se baseiam na resistência à compressão das argamassas após 140 dias de cura em solução de água saturada com cal.

A análise dos subcritérios de durabilidade tem início no nível 3. A Tabela 9 apresenta os dados das argamassas, referente aos subcritérios adotados, após a exposição à solução de sulfato de sódio e sulfato de magnésio pelo período de 140 dias.

Tabela 8 -
Matriz de decisão das argamassas para os subcritérios de “Sustentabilidade”

Tabela 9 -
Dados relacionados aos subcritérios de “Durabilidade”

As argamassas expostas ao sulfato de sódio (Na2SO4) apresentaram valores percentuais positivos de variação de massa e variação volumétrica, indicando a precipitação de produtos expansivos provenientes das reações sulfáticas e, consequentemente, a variação dimensional linear dos corpos de prova. Tais parâmetros são utilizados invertidos na matriz de decisão, visto que, quanto maior é a formação de produtos expansivos e a expansão da matriz cimentícia, menos durável é a composição. Entretanto, é importante evidenciar o fato de que a exposição de compósitos cimentícios às diferentes soluções de Na2SO4 e MgSO4 resultam em similares, porém distintos mecanismos de deterioração das amostras. Na exposição à solução de Na2SO4 há uma tendência na qual o desenvolvimento de fissuras sejam originados na zona de transição do agregado com a pasta cimentícia, bem como, em poros e fissuras pré-existentes da pasta. Com o progresso do ataque por sulfato de sódio, tais fissuras tendem a crescer em comprimento e largura ao longo da matriz cimentícia da argamassa e/ou concreto. Por outro lado, a exposição ao sulfato de magnésio (MgSO4) além de promover semelhante progresso no desenvolvimento de fissuras, há também um importante fator característico do ataque por MgSO4, a descalcificação das estruturas de C-S-H e decorrente formação de silicato de magnésio hidratado (M-S-H), que possui baixa capacidade de ligação e nenhuma propriedade cimentante. Resultando, consequentemente, em valores negativos de variação de massa e variação volumétrica devido ao desgaste superficial das argamassas. Enquanto compósitos expostos à solução de Na2SO4 tendem a depositar, principalmente na zona de transição do agregado com a pasta cimentícia, a exposição ao sulfato de magnésio (MgSO4) promove a formação de fissuras na própria pasta cimentícia (Wu et al., 2020WU, J. et al. Effect of multiple ions on the degradation in concrete subjected to sulfate attack. Construction and Building Materials, v. 259, p. 119846, 2020.), resultando em valores negativos de variação de massa e variação volumétrica, devido ao desgaste superficial das argamassas. Logo, os menores valores percentuais apresentam a maior deterioração do compósito. Há uma tendência de que quanto maior a reatividade da adição mineral e consequente maior consumo de portlandita, mais intenso será o desgaste superficial dos compósitos expostos ao ataque por sulfato de magnésio.

Com o intuito de realizar uma padronização dos efeitos dos dois reagentes, os valores referentes à exposição ao MgSO4 foram utilizados em módulo na matriz de decisão, de modo que o maior valor representasse a menor durabilidade da argamassa. Cabe ressaltar que a alternativa CPV apresentou valor positivo de variação de massa, não indicando o desgaste superficial característico da longa exposição ao sulfato de magnésio, dessa maneira, o valor 0 foi atribuído ao subcritério.

O mesmo raciocínio foi aplicado aos valores de variação de VUP e variação de resistência à compressão. Dessa maneira, foram atribuídos valores em módulo a estes parâmetros, sendo posteriormente invertidos para a utilização na matriz de decisão. Apenas as alternativas SA e SCA tiveram seus valores anulados na variação de VUP e na variação de resistência à compressão, respectivamente, visto que, diferente das demais alternativas, não foi possível observar o efeito de deterioração proveniente do ataque por sulfatos nestes casos.

A Tabelas 10 e 11 apresentam, respectivamente, a normalização dos dados e a matriz de decisão para determinação do desempenho quanto à durabilidade das alternativas expostas ao Na2SO4 e ao MgSO4, considerando os pesos relativos definidos na Tabela 6.

Tabela 10 -
Matriz de decisão das argamassas expostas ao sulfato de sódio (Na2SO4) para os subcritérios - nível 3 de “Durabilidade”

Tabela 11 -
Matriz de decisão das argamassas expostas ao sulfato de magnésio (MgSO4) para os subcritérios - nível 3 de “Durabilidade”

Assim como indicado por Souza (2016SOUZA, D. Capacidade de adições minerais em mitigar o ataque por sulfatos de sódio e magnésio em argamassas de cimento Portland. Curitiba, 2016. 229 f. Dissertação (Mestrado em Engenharia de Construção Civil) - Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Construção Civil, Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2016.), a alternativa SCA apresentou melhor desempenho quanto à durabilidade ao Na2SO4, seguida das alternativas CV, CPV, SA e MT. Adicionalmente, observa-se ainda que a argamassa com a incorporação de CV, quando submetida ao ataque por Na2SO4 obteve um desempenho melhor quando comparadas com a argamassa sem adições (CPV). Corroborando assim os resultados observados por Souza (2016SOUZA, D. Capacidade de adições minerais em mitigar o ataque por sulfatos de sódio e magnésio em argamassas de cimento Portland. Curitiba, 2016. 229 f. Dissertação (Mestrado em Engenharia de Construção Civil) - Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Construção Civil, Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2016.). O mesmo comportamento não é observado para o desempenho das alternativas expostas ao MgSO4, tendo a CV apresentado maior desempenho, seguida das alternativas CPV, MT, SA e SCA.

Em sequência, foi realizada a análise da matriz de decisão para o nível 2 do critério “Durabilidade”, sendo o procedimento realizado com o auxílio dos pesos relativos indicados na Tabela 5 e apresentado na Tabela 12.

Considerando os dados apresentados, a série SCA apresentou o maior índice de desempenho quanto à durabilidade ao ataque por sulfato, independente do tipo de sulfato utilizado, seguida das alternativas CV, CPV, MT e SA.

Por fim, tendo conhecimento dos desempenhos das alternativas nos subcritérios da matriz hierárquica, é possível obter o desempenho final das diferentes argamassas frente aos critérios do nível 1. A Tabela 13 apresenta a matriz de decisão utilizada, tendo como base os pesos relativos apresentados na Tabela 2. Cabe ressaltar que, assim como realizado nas demais análises, o critério “Econômico” teve seu valor invertido, visto que um menor valor de m³ para a produção do compósito representa o melhor cenário para a confecção das argamassas.

Considerando a análise conjunta de todos os critérios, a alternativa SCA apresentou o maior índice de desempenho em relação às demais, seguida das alternativas CV, SA, CPV e MT. É possível observar a importância dos pesos relativos na composição do desempenho final das alternativas. Avaliando-se o desempenho final das alternativas em cada critério do nível 1 observa-se que a alternativa SCA apresentou os maiores valores de desempenho em todos os critérios analisados, resultando no seu maior índice de desempenho. Em sequência, tem-se a um maior desempenho da cinza volante, da sílica ativa, da série sem adição (CPV) e do metacaulim.

Por fim, a Figura 3 mostra a composição percentual do índice de desempenho final das diferentes alternativas ao considerar os critérios do nível 1 da matriz hierárquica, sendo possível observar o maior impacto do critério “Durabilidade”, seguido dos critérios “Propriedades mecânicas”, “Sustentabilidade” e “Econômico”, no índice de desempenho de todas as alternativas. Dessa maneira, apesar da evidente influência do critério “Durabilidade” no resultado final, em casos de estruturas de concreto reais evidencia-se a necessidade da análise conjunta de diversos fatores para escolha de um material.

Diversos estudos apontam que as adições minerais, quando utilizadas como parte da composição do aglomerante de argamassas e concretos, diminuem a disponibilidade de hidróxido de cálcio e de C3A e, consequentemente, promovem a diminuição ou mitigação do ataque externo por sulfatos (Siad et al., 2013SIAD, H. et al. Characterization of the degradation of self-compacting concretes in sodium sulfate environment: Influence of different mineral admixtures. Construction and Building Materials, v. 47, p. 1188-2000, 2013.; Hoppe Filho et al,. 2015HOPPE FILHO, J. et al. Ataque de matrizes cimentícias por sulfato de sódio: adições minerais como agentes mitigadores. Cerâmica, v. 61, p. 168-177, 2015.; Tanyildizi, 2016TANYILDIZI, H. The investigation of microstructure and strength properties of lightweight mortar containing mineral admixtures exposed to sulfate attack. Measurement, v. 77, p. 143-154, 2016.; Souza; Medeiros; Hoppe Filho 2020aSOUZA, D. J.; MEDEIROS, M. H. F.; HOPPE FILHO, J. Evaluation of external sulfate attack (Na2SO4 and Mg2SO4): Portland cement mortars containing siliceous supplementary cementitious materials. Revista Ibracon de Estruturas e Materiais, v. 13, n. 4, 2020a., 2020bSOUZA, D. J.; MEDEIROS, M. H. F.; HOPPE FILHO, J. Evaluation of external sulfate attack (Na2SO4 and Mg2SO4): Portland cement mortars containing fillers. Revista Ibracon de Estruturas e Materiais, v. 13, n. 3, p. 644-655, 2020b.). Porém, é necessário cautela com tal afirmação, visto que é possível observar uma diferença no desempenho dos materiais quanto à durabilidade conforme o tipo de sulfato presente na solução agressiva (Figura 4).

Tabela 12 -
Matriz de decisão das argamassas expostas ao ataque por sulfatos para os subcritérios - nível 2 de “Durabilidade”

Tabela 13 -
Matriz de decisão das argamassas expostas ao ataque por sulfatos

Figura 3 -
Composição percentual do índice de desempenho das alternativas nos critérios do nível 1 da matriz hierárquica

Figura 4 -
Desempenho das argamassas referente ao critério “Durabilidade” para as fontes de íons sulfato separadamente

A incorporação de cinza volante no aglomerante das argamassas promoveu um melhor desempenho quanto à durabilidade quando comparado ao CPV ao ataque de ambas as soluções de sulfato. Sendo a melhor alternativa dentre as analisadas quando há exposição do compósito cimentício ao MgSO4. O metacaulim, apesar de apresentar um desempenho intermediário frente ao ataque por MgSO4, apresentou maior variação de massa, maior variação volumétrica e maior perda de resistência à compressão quando exposto ao Na2SO4, mostrando-se a pior alternativa dentre as analisadas. Tal fato é explicado pelo elevado teor de alumina em sua composição, que propicia a formação de fases aluminatos disponíveis para a formação de produtos expansivos resultantes da interação com os íons sulfatos (Souza; Medeiros; Hoppe Filho, 2018SOUZA, D. J.; MEDEIROS, M. H. F.; HOPPE FILHO, J. Evaluation of the SR Portland cement against sodium and magnesium sulfate attack: a physical and comparative analysis of mortars. Revista Ibracon de Estruturas e Materiais, v. 11, n. 5, p. 1053-1075, 2018.).

A sílica ativa e a sílica de casca de arroz apresentaram comportamentos antagônicos frente as duas fontes de contaminação, sendo eficazes quanto expostas ao Na2SO4 e altamente susceptíveis à degradação promovida pelo MgSO4. Segundo Siad et al. (2013SIAD, H. et al. Characterization of the degradation of self-compacting concretes in sodium sulfate environment: Influence of different mineral admixtures. Construction and Building Materials, v. 47, p. 1188-2000, 2013.), o elevado consumo de portlandita devido às reações pozolânicas destas adições reduz o potencial de formação de gipsita e etringita, promovendo a melhoria na eficácia quanto ao ataque por Na2SO4. Em contrapartida, as reações pozolânicas são responsáveis também pela diminuição do pH da matriz cimentícia, o que pode facilitar a desestabilização e descalcificação do C-S-H no ataque por MgSO4 (Souza; Medeiros; Hoppe Filho, 2020aSOUZA, D. J.; MEDEIROS, M. H. F.; HOPPE FILHO, J. Evaluation of external sulfate attack (Na2SO4 and Mg2SO4): Portland cement mortars containing siliceous supplementary cementitious materials. Revista Ibracon de Estruturas e Materiais, v. 13, n. 4, 2020a.). Ortega et al. (2018ORTEGA, J. M. et al. Short-term performance of sustainable silica fume mortars exposed to sulfate attack. Sustainability, v. 10, n. 7, p. 2517, 2018.) observaram ainda que a pouca disponibilidade de portlandita impede a formação da barreira dupla de brucita e gipsita, propiciando a difusão de íons e a promoção das reações de deterioração no interior da rede de poros.

A composição percentual do índice de desempenho nos critérios do nível 1 da matriz hierárquica (Figura 3) mostra a maior influência do critério “Durabilidade” para todas as alternativas. Porém, os dados apresentados na Figura 4 deixam claro a necessidade do conhecimento do ambiente em que a estrutura de concreto estará exposta, visto que a melhor opção de compósito de cimento Portland para um ambiente agressivo com Na2SO4 não é necessariamente a mesma para o caso do MgSO4.

Dessa maneira, não pode-se classificar os cimentos como resistentes ao ataque por sulfato, baseando se exclusivamente em ensaios de laboratório que utilizam o Na2SO4 como agente agressivo. Mesmo sendo consolidada a influência do cátion associado ao íon sulfato no mecanismo de degradação dos compósitos cimentícios, a NBR 16697 (ABNT, 2018ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 16697: cimento Portland: requisitos. Rio de Janeiro, 2018.) define que para um cimento ser considerado resistente a sulfatos, as barras de argamassa confeccionadas com ele devem apresentar uma expansão linear máxima de 0,03% aos 56 dias de idade quando submetidos ao ensaio prescrito pela NBR 13583 (ABNT, 2014ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 13583: cimento Portland: determinação da variação dimensional de barras de argamassa de cimento Portland expostas à solução de sulfato de sódio. Rio de Janeiro, 2014.), ou seja, tendo como parâmetro exclusivamente a exposição ao Na2SO4. Porém, após este trabalho, fica evidente que esta é uma prática falha, pois, esta denominação funciona apenas se a exposição em campo for igual à estabelecida pela norma em relação ao tipo de contaminante (Na2SO4) e ao teor de contaminação.

Estruturara hierárquica modificada

Assim como realizado em campo, a AHP apresentada no item anterior considerou a durabilidade dos dados de exposição aos dois sulfatos (Na2SO4 e MgSO4) simultaneamente, com o intuito de se obter a melhor alternativa em relação ao ataque por sulfato. Porém, os dados indicam que o caminho mais aconselhável é colocar como parâmetro de entrada inicial a resposta à pergunta: “Qual o tipo de sulfato está envolvido na sua especificação?”. Logo, tendo esta resposta definida é possível desenvolver a escolha da melhor alternativa para cada caso de exposição ao sulfato seguindo o mesmo caminho apresentado no item anterior. A estrutura hierárquica foi modificada e, ao contrário da anterior, apresenta 2 níveis, sendo o desempenho quanto ao critério “Durabilidade” desenvolvido com dados de ensaios realizados para o tipo de sulfato que se pretende proceder a escolha, como mostra a Figura 5 (Figura 2 modificada).

Apesar da importância do comportamento em relação à durabilidade frente ao ataque por sulfato, a aplicação dos materiais em campo torna necessária a análise de outros critérios aliados à durabilidade, como por exemplo, propriedades mecânicas, economia e sustentabilidade, além da especificação do tipo de sulfato presente no ambiente. A Figura 6 apresenta o índice de desempenho dos critérios no nível 1 para as diferentes alternativas, considerando a exposição à ambientes com Na2SO4 (Figura 6a) e MgSO4 (Figura 6b) separadamente. O cálculo do índice de desempenho foi realizado seguindo os mesmos passos das matrizes de decisão apresentadadas anteriormente, atribuindo também os mesmos pesos para cada critério, considerando a presença de um sulfato apenas no ambiente.

Através da AHP, é possível observar que as composições do aglomerante contendo 10% de cinza volante, metacaulim, sílica ativa e sílica de casca de arroz apresentaram um índice de desempenho superior ao da alternativa sem adição (CPV) ao considerar a exposição ao Na2SO4. Porém, apenas a alternativa CV apresentou índice de desempenho maior que a CPV para a contaminação por MgSO4, sendo este comportamento semelhante ao obtido na análise do critério “Durabilidade”. De acordo com a base de dados do presente estudo, a série CPV apresentou expansão positiva nessa condição de exposição, evidenciando o período de expansão do ataque. As demais alternativas apresentaram uma desintegração parcial dos corpos de prova, resultante da interação com a solução agressiva.

Figura 5 -
Estrutura hierárquica modificada dos critérios e subcritérios para o caso de especificação do tipo de sulfato como dado de entrada

Figura 6 -
Índice de desempenho das diferentes composições de argamassa para o ataque por sulfatos ao considerar a estrutura hierárquica modificada. (a) Na2SO4; (b) MgSO4

O metacaulim, por sua vez, mesmo apresentando menor durabilidade frente aos íons sulfato proveniente da exposição ao Na2SO4, apresentou um bom desempenho quando comparado a série CPV ao considerar o conjunto de critérios escolhidos. Tal fato pode ser atribuído à maior representatividade do critério “Propriedades Mecânicas” na análise do índice de desempenho das alternativas através da matriz hierárquica modificada para o Na2SO4 como mostra a Figura 7.

Apesar da aplicação dos mesmos pesos relativos, a SCA teve o seu índice de desempenho composto em maioria pelo critério “Durabilidade”, devido, provavelmente, ao seu comportamento contraditório ao das demais alternativas quanto à variação na resistência à compressão. De acordo com Müllauer, Beddo e Heinz (2013MÜLLAUER, W.; BEDDO, R. E.; HEINZ, D. Sulfate attack expansion mechanisms. Cement and Concrete Research, v. 52, p. 208-215, 2013.), a formação dos produtos expansivos divide-se em três fases distintas:

  1. ocorre a formação da etringita proveniente das fases aluminato em pequenos poros, resultando em uma pressão acompanhada de pouca expansão e danificação;

  2. a pressão exercida pelos cristais de etringita aliado à formação da gipsita, supera a resistência da matriz cimentícia, promovendo a rápida expansão e, consequentemente, o aparecimento de fissuras macroscópicas; e

  3. a taxa de formação dos produtos expansivos diminui devido à baixa disponibilidade de fases aluminato, resultando em uma mínima expansão.

Dessa maneira, assume-se que ao final de 140 dias de exposição ao Na2SO4, a alternativa SCA encontra-se ainda no primeiro estágio descrito, enquanto as demais no segundo ou terceiro estágio, resultando em uma diminuição na resistência à compressão das argamassas.

Por fim, a Figura 8 mostra a composição percentual do índice de desempenho das alternativas para a exposição ao MgSO4.

Ao contrário do observado anteriormente, o índice de desempenho das argamassas expostas ao MgSO4 apresentaram, em sua composição, a presença majoritária do critério “Durabilidade”, evidenciando o maior nível de deterioração dessas amostras e, consequentemente, a maior necessidade em se considerar tal critério em uma escolha prática. Em segundo lugar tem-se os critérios “Propriedades mecânicas”, “Sustentabilidade” e “Econômico”.

Figura 7 -
Composição percentual do índice de desempenho das alternativas nos critérios do nível 1 da matriz hierárquica modificada para o Na2SO4

Figura 8 -
Composição percentual do índice de desempenho das alternativas nos critérios do nível 1 da matriz hierárquica modificada para o MgSO4

Cabe ressaltar que, em ambas as análises, o critério “Sustentabilidade” possui maior representatividade que o “Econômico” na formação do índice de desempenho das alternativas, indicando o benefício da incorporação de resíduos de outras indústrias na construção civil.

Por fim, considerando o explanado, tem-se que a especificação de materiais para resistir a ambientes contendo exposição das estruturas ao ataque por sulfato é muito complexo, não sendo apropriado tratar o tema de forma genérica. Logo, torna-se necessária a especificação do tipo de sulfato presente no ambiente para a correta escolha dos materiais que irão compor a porção aglomerante do compósito cimentício. Cabe ressaltar que este trabalho realizou a análise considerando apenas dois tipos de sulfatos, porém, na natureza, existem outros tipos que podem agredir os compósitos de cimento Portland (K2SO4, (NH4)2SO4), agregando ainda mais complexidade ao tema dos estudos que tem como foco a obtenção de estruturas de concreto mais duráveis em ambientes de elevada agressividade ambiental.

Conclusões

O processo de análise hierárquica (AHP) se mostrou uma ferramenta eficaz para a escolha em campo da composição do aglomerante de argamassas submetidas ao ataque de sulfatos, visto que, através dessa metodologia é possível considerar diferentes critérios importantes para o desempenho dos compósitos cimentícios em geral. Além disso, é possível evidenciar a sua utilização na tomada de decisões e sua aplicabilidade na construção civil, sendo importante ressaltar a singularidade de cada análise e sua adaptação para diferentes cenários, de acordo com a necessidade do usuário.

Em relação à escolha da composição do aglomerante para argamassas expostas ao ataque por sulfatos de sódio e magnésio, a substituição parcial do cimento por sílica de casca de arroz, em um teor de 10% resultou no maior desempenho quando considerados critérios relacionados às propriedades mecânicas, sustentabilidade, durabilidade e economia. Porém, viu-se a necessidade do uso de uma EH específica para cada tipo de sulfato presente no ambiente para a correta escolha dos materiais, visto que a durabilidade das alternativas se encontra relacionada ao cátion associado ao íon sulfato.

A sílica de casca de arroz foi a adição de argamassa que apresentou melhor índice de desempenho para a exposição ao sulfato de sódio (Na2SO4), porém, a pior opção quando utilizado o sulfato de magnésio (MgSO4). Neste caso, a cinza volante foi a adição que apresentou maior índice de desempenho. Cabe ressaltar ainda que o critério “Propriedades mecânicas” representou a maior parcela do índice de desempenho das alternativas expostas ao Na2SO4. Em contrapartida, para a exposição ao MgSO4 o critério “Durabilidade” apresentou maior representatividade, indicando a maior agressividade do contaminante e a necessidade de considerar este parâmetro na escolha da composição do aglomerante de estruturas de concreto expostas a ambientes semelhantes.

Dessa maneira, é um erro conceber a classificação dos cimentos como resistentes a sulfatos, baseando se exclusivamente em ensaios de laboratório que utilizam o Na2SO4 como agente agressivo. No que diz respeito ao ataque por sulfatos é importante ressaltar que na natureza existem diversos tipos, tornando o assunto complexo. Assim, identificar o tipo de sulfato ao qual as estruturas de concreto estão submetidas é primordial, pois adições que podem ser benéficas a um tipo de meio agressivo pode não ser o indicado para outro meio.

Agradecimentos

Os autores expressam a sua gratidão às agências brasileiras CNPq, Capes e Fundação Araucária pelo apoio financeiro, bem como a Universidade Federal do Paraná (UFPR), ao Departamento de Construção Civil (DCC), ao Programa de Pós-Graduação em Engenharia Civil (PPGEC), ao Centro de Estudos de Engenharia Civil (CESEC), ao Laboratório de Materiais e Estruturas (LAME), ao Grupo de Patologia e Recuperação das Construções (PRC) e a Agência Nacional de Águas (ANA).

Referências

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  • ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 16697: cimento Portland: requisitos. Rio de Janeiro, 2018.
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    Tendo em vista que o processo de determinação de pesos de cada critério confere certo grau de racionalidade com base em avaliações subjetivas e técnico-pessoais, os autores colocam-se a disposição para discutir e disponibilizar dados explicando quais argumentos foram levados em consideração para determinar que um fator é igualmente, moderadamente, ou mais importante que outro, e assim garantir a reprodutibilidade e replicabilidade desse estudo a eventuais interessados.

Editado por

Editores:

Ercília Hitomi Hirota e Eduardo Pereira

Editora convidada:

Juliana Parise Baldauf

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    19 Abr 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    16 Jan 2023
  • Aceito
    14 Nov 2023
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