Aprendizagem de procedimentos e efeitos ansiolíticos: medidas eletrencefalográficas, motora e atencional

Procedural learning and anxiolytic effects: electroencephalographic, motor and attentional measures

Aprendizagem de procedimentos e efeitos ansiolíticos: medidas eletrencefalográficas, motora e atencional

Procedural learning and anxiolytic effects: electroencephalographic, motor and attentional measures

Claudio Elidio Portella^I; Julio Guilherme Silva^II; Victor Hugo Bastos^III; Dionis Machado^IV; Marlo Cunha^V; Maurício Cagy^VI; Luis Basile^VII; Roberto Piedade^VIII; Pedro Ribeiro^IX

^IMestrando, Laboratório de Mapeamento Cerebral e Integração Sensório-Motora, Rio de Janeiro, Brasil (IPUB/UFRJ), Colaborador UNIABEU/Fisioterapia

^IIDoutorando, Laboratório de Mapeamento Cerebral e Integração Sensório-Motora - IPUB/UFRJ, Professor Pesquisador / FESO

^IIIDoutorando, Laboratório de Mapeamento Cerebral e Integração Sensório-Motora - IPUB/UFRJ, Professor Pesquisador UNIABEU / FESO

^IVMestranda, Laboratório de Mapeamento Cerebral e Integração Sensório-Motora - IPUB/UFRJ, Professora Pesquisadora FESO

^VMestrando, Laboratório de Mapeamento Cerebral e Integração Sensório-Motora - IPUB/UFRJ

^VID.Sc. em Engenharia Biomédica, COPPE - IPUB/UFRJ

^VIIProfessor do Departamento de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo - Faculdade de Psicologia e Fonoaudiologia da Universidade Metodista de São Paulo

^VIIIProfessor Adjunto III Doutor, IPUB/UFRJ - Coordenador do Laboratório de Mapeamento Cerebral e Integração Sensório-Motora - IPUB/UFRJ

^IXProfessor Adjunto III PhD Escola de Educação Física (EEFD) - IPUB (UFRJ); Professor Pesquisador, Universidade Castelo Branco (PROCIHM)

RESUMO

O objetivo do presente estudo foi avaliar parâmetros atencionais, motores e eletrencefalográficos durante uma tarefa de procedimentos em sujeitos que ingeriram 6mg de bromazepam. A amostra consistiu de 26 sujeitos saudáveis, ambos os sexos, entre 19 e 36 anos. Os grupos controle e experimental foram submetidos à tarefa datilográfica em desenho duplo-cego randomizado. Os achados não revelaram diferenças nas medidas atencionais e motoras entre os grupos. Foram avaliadas medidas de coerência (EEGq) entre regiões do escalpo nas bandas teta, alfa e beta. Análise inicial revelou um efeito principal para condição (Anova 2- critérios de variação - condição versus blocos). Uma segunda Anova, também com 2 critérios de variação (condição versus região do escalpo), demonstrou um efeito principal para ambos os fatores. Em conclusão, a medida de coerência parece não ser uma ferramenta sensível para demonstrar diferenças entre áreas corticais em função de uma tarefa de procedimentos.

Palavras-chave: mapeamento cerebral, EEGq, coerência, treino motor, ansiolíticos.

ABSTRACT

The objective of the present study was to evaluate attentional, motor and electroencephalographic (EEG) parameters during a procedural task when subjects have ingested 6mg of bromazepam. The sample consisted of 26 healthy subjects, male or female, between 19 and 36 years of age. The control (placebo) and experimental (bromazepam 6mg) groups were submitted to a typewriting task in a randomized, double-blind design. The findings did not show significant differences in attentional and motor measures between groups. Coherence measures (qEEG) were evaluated between scalp regions, in theta, alpha and beta bands. A first analysis revealed a main effect for condition (Anova-2way - condition versus blocks). A second Anova 2-way (condition versus scalp regions) showed a main effect for both factors. The coherence measure was not a sensitive tool at demonstrating differences between cortical areas as a function of procedural learning.

Key words: brain mapping, qEEG, coherence, motor tranning, motor sensory integration, anxiolitics.

A memória de procedimentos tem sido foco de investigações diversas. Ao longo dos anos tornou-se vital o entendimento deste tipo de memória em função da associação direta com tarefas do cotidiano e algumas patologias. Neste contexto, variáveis eletrencefalográficas vêm sendo analisadas em função da sua estreita relação com processos de aprendizagem motora. Em especial, a medida de coerência parece ser útil para verificar a ocorrência de co-ativação entre duas áreas corticais¹. Tal medida é a covariância da potência espectral entre diferentes áreas do encéfalo. A diminuição da coerência é um indicativo de especialização em determinadas regiões corticais que se traduz em aprendizagem². Esta, por sua vez, promove aumento da performance e mostra-se presente durante toda a vida³. Para que isso ocorra, informações são processadas por circuitos neurais complexos, que se comunicam através de neurotransmissores. Com o objetivo de aumentar a eficiência com que as informações são transportadas, a ação dos neurotransmissores é facilitada ou inibida por uma classe de substâncias denominada neuromoduladores⁴.

Há décadas, diversos autores promovem discussões sobre os fatores que interferem neste processo. Sob esse prisma, diversos modelos experimentais discutem a repercussão do uso de medicamentos no gesto motor, em especial o uso de ansiolíticos. A propriedade ansiolítica do bromazepam está bem estabelecida⁵, porém sua influência na execução de tarefas motoras tem sido pouco investigada. Alguns experimentos, relacionando o efeito ansiolítico da droga à integração sensório-motora, sugeriram que o bromazepam possa causar certo grau de incoordenação motora e perturbação da marcha; há relatos de que ocorre aumento do tempo de reação (TR) e déficit de memória^6-9.

Desta forma, o presente estudo tem por objetivo avaliar alterações nos níveis atencionais, na performance motora e nos parâmetros eletrencefalográficos em função da administração de 6mg de bromazepam. Em especial, para as variáveis eletrencefalográficas, tem-se como objetivos específicos, analisar diferenças de coerência nas bandas de freqüência alfa, beta e teta nas áreas frontais, centrais e parietais durante a execução de quatro blocos de tarefa motora.

MÉTODO

Amostra – Foi constituída por 26 sujeitos, de qualquer dos sexos, entre 19 e 36 anos, todos os estudantes de graduação e pós-graduação dos cursos da área de saúde. Foram considerados como critério de inclusão os seguintes aspectos: ausência de comprometimento da saúde física e mental,tendo sido realizad anamnese prévia; não usuários de substâncias psicotrópicas ou psicoativas; ter dormido no mínimo 6h na noite que antecedeu o experimento; inexperiência até o momento em datilografia; dominância manual destra de acordo com o inventário de Edinburgh¹⁰. Todos os sujeitos estavam cientes do objetivo do estudo e assinaram declaração de consentimento na qual a condição experimental foi detalhadamente descrita. O estudo foi aprovado pela Comissão de Ética do Instituto de Psiquiatria da Universidade Federal do Rio de Janeiro.

Desenho experimental – No dia e hora previamente agendados, o sujeito chegava ao laboratório e era informado sobre todo o procedimento experimental. Após concordar, assinava a declaração de livre consentimento e se realizava a primeira captação de sinal por meio do eletrencefalograma (EEG). Esta primeira captação consistia em seis minutos nos quais o sujeito mantinha-se de olhos fechados e seis minutos de olhos abertos, sendo solicitado evitar piscadas a fim de minimizar a quantidade de artefatos no EEG. Após esta primeira etapa de captação, o sujeito ingeria uma cápsula que poderia conter placebo (amido 400mg) ou 6mg de bromazepam. A distribuição das cápsulas seguiu modelo duplo-cego para evitar que houvesse influência nos resultados por parte dos examinadores. Trinta minutos após a ingestão da cápsula era feita uma avaliação do nível de atenção através do teste de Stroop. Neste contexto, tal teste serviu apenas para avaliar níveis de atenção e não para promover ansiedade como em outros modelos experimentais^11-13. Após o teste, era iniciada nova captação, desta vez simultaneamente à tarefa da datilografia. Ao término da tarefa era realizada mais uma etapa de captação (seis minutos de olhos fechados e seis de olhos abertos).

Aquisição de dados – Para a captação do sinal eletrencefalográfico foi utilizado o aparelho Braintech 3000 (EMSA - Instrumentos Médicos, Brazil), sistema que utiliza uma placa conversora analógica-digital (A/D) de 32 canais com resolução de 12 bits, colocada em um slote ISA de um Pentium III – com um processador de 750 MHz. Foi utilizada uma touca que continha os eletrodos dispostos de acordo com o sistema internacional 10-20¹⁴, incluindo-se os eletrodos de referência posicionados nos lóbulos das orelhas (bi-auricular)¹⁵. O tamanho da touca utilizada estava de acordo com o perímetro craniano de cada sujeito (toucas de tamanhos variados). A sala utilizada para captação do sinal eletrencefalográfico foi preparada com isolamento acústico e elétrico, durante a aquisição do sinal as luzes foram reduzidas, exceção feita ao momento da tarefa.O sinal adquirido em um determinado eletrodo foi resultante da diferença entre o potencial elétrico do mesmo no escalpo e a referência pré-estabelecida. Foram verificados, "a priori", os níveis de impedância de cada eletrodo, cujos valores foram fixados entre 5-10K ohms (W) e mantidos nesses padrões. Os sinais adquiridos tinham um total de amplitude (pico a pico) menor que 100 mV. Por este motivo, o sinal foi amplificado com ganhos de 20000 vezes. Os sinais eletrencefalográficos adquiridos flutuaram entre 0.01 e 50Hz. A atividade elétrica ocular foi estimada com a colocação de dois eletrodos de 9 mm de diâmetro montados de forma bipolar. Visto que os indivíduos podiam movimentar livremente seus olhos, os eletrodos foram posicionados respectivamente acima, abaixo e no canto externo da órbita (direita e esquerda) para registrar movimentos oculares verticais e horizontais. Os movimentos oculares ocorridos antes, durante e depois da tarefa motora foram eliminados através da inspeção visual. Desta forma evitou-se contaminação do sinal eletrencefalográfico, ficando o restante do traçado livre para análise específica.

Procedimento experimental – O procedimento e a montagem da tarefa motora foram similares àqueles descritos em trabalhos anteriores^16-18. Para a realização da tarefa, optou-se por máquina de datilografia de modelo antigo (Olivetti modelo Línea 98); tal opção se deve ao fato da representação cortical ser tanto maior quanto maior o grau de força empregada na tarefa^19-20. O teclado da máquina foi coberto com caixa de madeira que evitava a visualização do posicionamento das mãos sobre o teclado e que exigia do sujeito a criação de uma "referência espacial" para o teclado. A tarefa consistiu num método de datilografia²¹ com aprendizagem progressiva e realizada num único dia. O exercício proposto era composto por quatro blocos sendo cada bloco constituído por doze linhas. Cada linha continha cinco seqüências de letras para cada mão.

Localização espacial e bandas de freqüências – Foram selecionados os eletrodos localizados em áreas frontal, central e parietal. Na área frontal em virtude de sua relação com aos mecanismos de motivação, planejamento, cognição e execução de movimentos voluntários. Na área central, por representar o córtex sensório-motor primário, que tanto recebe informações somáticas como controla movimentos dos membros. A inserção dos eletrodos parietais justifica-se pelo controle dos mecanismos sensoriais e espaciais ocorrerem em tais áreas^22-23. Os seguintes eletrodos foram selecionados: região frontal (FP1, FP2, Fz, F3 e F4), central (Cz, C3 e C4) e parietal (P3 e P4). As bandas de freqüências foram escolhidas em função de suas características peculiares: 1) beta possui um ritmo mais rápido e de menor amplitude (maiores de 14 hz) e mostra um córtex ativado, o que é um indicativo de atividade mental e de atenção; a escolha desta freqüência se deve ao nível de atenção exigido pela tarefa: 2) teta, com um ritmo situado entre 4 e 7 hz, tem sido documentada ocorrendo em várias tarefas mentais, particularmente aqueles que requerem atenção sustentada. Parece, portanto estar relacionada a atividades de habilidade motora e cognitiva. O ritmo alfa situa-se entre 8 e 13 hz. O aumento da atividade alfa parece estar relacionado com a consolidação mental da tarefa²⁴. Por ser mais proeminente na região occipital e por modular a abertura e fechamento dos olhos, pode-se dizer que ele está ligado de alguma maneira com o processamento visual e estado de vigília²⁵. A escolha desta banda se explica devido os fatores aprendizagem e necessidade permanente de vigília exigida pela tarefa.

Análise estatística – Em relação ao teste de Stroop foi realizado um teste-t (grupos independentes) para tempo e escore bruto. Em especial, o Stroop foi realizado 30 minutos após a ingestão do placebo ou bromazepam 6mg, dependendo da randomização. Para análise da performance motora, tempo de execução e erros cometidos na tarefa, foi feito o teste de análise de variância (ANOVA) com dois criterio de variação com relação a cada uma das duas variáveis. Em especial, ANOVA foi implementada para comparar dois fatores: condição (placebo e bromazepam 6mg) e blocos (blocos I, II, III e IV). Para a pesquisa dos dados eletrencefalográficos, foram realizadas duas análises com o objetivo de: verificar diferenças e possíveis interações entre condição (controle e experimental) e blocos (b1, b2, b3 e b4) e, ainda, observar mudanças em áreas frontais, centrais e parietais, na execução do gesto motor. Neste intuito foram considerados os pares de eletrodos: F3-Fz, F4-Fz, C3-Cz, C4-Cz Fp1-Fp2, F3-F4, C3-C4 e P3-P4 na análise de coerência e as bandas de freqüência alfa, beta e teta. Inicialmente, foi feito teste de ANOVA comparando os fatores condição (bromazepam versus placebo) e blocos (b1, b2, b3 e b4), em relação aos pares de eletrodos (F3-Fz, F4-Fz, C3-Cz, C4-Cz). Em seguida, novo teste ANOVA (3 critérios de variação) comparou os fatores condição, blocos (b1, b2, b3 e b4) e regiões do escalpo (Fp1-Fp2, F3-F4, C3-C4 e P3-P4) (p<0,05).

RESULTADOS

Os resultados obtidos foram divididos em três categorias de acordo com os objetivos traçados: análise dos níveis atencionais, da performance motora e dos parâmetros eletrencefalográficos.

Níveis atencionais – O teste utilizado para verificar nível de atenção (teste de Stroop) não mostrou diferença significativa entre as condições placebo e bromazepam, tanto para variável tempo de execução do teste (p = 0,976) quanto para escore bruto atingido pelos participantes (p = 0,332).

Performance motora – Os resultados do teste ANOVA (2 critérios de variação), condições (placebo e experimental) versus blocos (b1 e b3), na variável tempo de execução da tarefa (Fig 1) apresentaram efeito principal para blocos (p = 0,000). Em especial, não houve interação entre condição versus blocos, e não foi demonstrado efeito principal entre as condições. O teste ANOVA (2 critérios de variação), condições e blocos, no número de erros (Fig 2), apresentou um efeito principal entre blocos (p = 0,001). Não foram observadas interações entre condição versus blocos, e não houve diferença significativa entre as condições. Na comparação realizada entre os erros do terceiro bloco e o fator lateralidade (mão direita x mão esquerda) foi observado efeito principal para lateralidade (p = 0,001) sem evidência de interações entre erros no terceiro bloco e lateralidade.

Variável eletrencefalográfica – Na primeira análise os resultados demonstraram efeito principal para o fator condição (placebo x bromazepam) nos pares de eletrodos: F3-Fz (p=0,000; p=0,004) (Tabela 1 e 2) e C3-Cz (p=0,017) (Tabela 3). Não houve efeito principal para o fator blocos e não houve interação entre os fatores condições e blocos. Na análise seguinte, os resultados evidenciaram efeito principal para os fatores condição (p=0,000) e regiões do escalpo: Fp1-Fp2, F3-F4, C3-C4 e P3-P4 (p=0,000). Não havendo interação entre os fatores condições, blocos e regiões (Figs 3, 4 e 5).

DISCUSSÃO

O objetivo do presente estudo foi observar as alterações atencionais, da performance motora e eletrencefalográficas em sujeitos sob o efeito do bromazepam na dosagem de 6mg e expostos a uma tarefa motora.

Níveis atencionais – De acordo com os resultados do teste de Stroop, empregado minutos antes de iniciar a tarefa, o bromazepam 6mg parece não ter provocado alterações nos níveis de atenção capazes de serem detectadas. Medidas psicométricas como testes de atenção e memória⁹, tarefas de vigilância visual⁷ e tempo de reação também têm sido empregadas^25-26.

Performance motora – A análise da performance motora, a partir das variáveis erro e tempo, evidenciou que tanto os sujeitos que receberam placebo quanto os tratados com bromazepam obtiveram graus significativos de melhora quando se comparou os blocos da tarefa (Figs 1 e 2). A transição do primeiro bloco para o segundo pareceu coincidir com algum estágio crítico da aprendizagem observada, talvez marcando a evolução de um estágio com processamento controlado (com ênfase em demandas cognitivas) em direção a estágios mais avançados, aproximando-se do automatismo (com predomínio de demandas com natureza mais motora propriamente dita). A ausência de significância estatística entre os blocos subseqüentes ao primeiro pode sugerir que se fosse aumentado o volume de trabalho dentro de cada bloco, poderia haver um intervalo de tempo suficiente para que a evolução atinjisse significância estatística. As diferenças entre as condições placebo e bromazepam observadas para número de erros, mas não para tempo de execução sugerem melhor desempenho da condição bromazepam. Os sujeitos se tornaram mais precisos com relação ao pressionamento das teclas datilográficas, porém não mais velozes, quando comparados à condição placebo. Tais achados podem estar associados ao efeito do medicamento que ao controlar os níveis de ativação e ansiedade ocasionados pela situação de tarefa, acabou por favorecer a incorporação e aprimoramento dos mecanismos próprios do controle motor.

Variável eletrencefalográfica – A análise das variáveis eletrencefalográficas considerou a medida de coerência que é a covariância da potência espectral, nas bandas de freqüências específicas entre pares de canais do EEG.

Variação na medida de coerência sugere uma evidência funcional da ocorrência de co-ativação entre duas áreas corticais¹. Em especial, a diminuição da coerência seria um indicativo de especialização de determinadas regiões corticais, o que se traduz em aprendizagem². Foram selecionadas as bandas alfa, beta e teta, e realizadas duas análises: condição x blocos – para os eletrodos – F3-Fz, F4-Fz, C3-Cz e C4-Cz; condição x blocos x região do escalpo: frontal, central e parietal.

Os achados apontam para um efeito principal para o fator condição, ou seja, houve influência do bromazepam durante a realização da tarefa motora. Particularmente, a primeira análise apontou para diminuição de coerência nos pares de eletrodos F3-Fz (teta e beta) e C3-Cz (alfa). Em análise posterior, os resultados apontaram efeito principal para os fatores condição e regiões do escalpo. Neste contexto, o bromazepam representaria um fator de interferência no acoplamento funcional entre áreas do córtex cerebral. Este achado é relevante, uma vez que regiões do hemisfério esquerdo (F3-Fz, C3-Cz) sofreram maior interferência na medida de coerência. Neste hemisfério está presente a representação somatotópica da mão direita. Este desacoplamento cortical evidenciado no grupo bromazepam parece estar relacionado ao efeito sistêmico da droga, ou seja, na diminuição de padrões de tônus e força muscular despendida na tarefa. Desta forma, como não foi detectada interação entre condição e setores do escalpo, as diferenças de coerência entre áreas do córtex não foram consideradas relevantes na presente discussão. Tal resultado estaria associado a diferentes atividades das áreas corticais.

No que diz respeito ao efeito do bromazepam na tarefa motora, observou-se em algumas bandas de freqüência diminuição na medida de coerência em determinados pares de eletrodos. Decréscimos nos valores de coerência parecem significar efetivação de processos de aquisição de memória de procedimentos¹⁶. Processos de atenção estão relacionados à área frontal do córtex cerebral²⁷ e são indicados por aumento do ritmo beta²⁴. Nesta banda houve decréscimo entre os eletrodos F3-Fz no grupo experimental, o que sugere especialização neuronal para tais mecanismos. Esta constatação é percebida em modelos que envolvem tarefa motora seqüencial, na qual as medidas de correlação entre áreas corticais (coerência) iniciam-se altas e tendem a diminuir à medida que se repete a tarefa. Neste contexto, só parecem trabalhar as áreas específicas (seletividade neural) para tais funções motoras¹⁶. Em relação à banda teta, foi observada diminuição de coerência entre F3-Fz, o que sugere automatismo na tarefa, visto que na região frontal o incremento de tal banda relaciona-se com níveis de atenção sustentada e habilidade cognitiva²⁸. Tanto a banda alfa como as regiões centrais corticais supostamente estão envolvidas com mecanismos de consolidação mental da tarefa motora. Os resultados demonstraram diminuição da coerência entre C3-Cz nesta banda. Tal achado se relaciona com possível acoplamento destas regiões corticais em função da representatividade sensório-motora da mão direita²⁴.

Os blocos de execução da tarefa não interferiram significativamente no acoplamento funcional das áreas responsáveis pelo planejamento e execução. Considerando que a tarefa caracterizou-se por simples repetição de movimentos dos dedos, sempre na mesma seqüência. Esta tarefa não dependeria de funções cognitivas complexas, realizadas pelas áreas estudadas (regiões frontais, centrais e parietais do córtex cerebral), mas sim de um automatismo motor, possivelmente vinculado ao cerebelo²⁹. Os resultados também não demonstraram interação entre condições, blocos e bandas. Este achado sugere que o uso de bromazepam (6mg) não produz alterações significativas na medida de coerência em função dos blocos de atividade ou das bandas analisadas.

Em conclusão, a utilização do bromazepam (6mg) parece diminuir a coerência entre as regiões do córtex analisadas, mediante execução da atividade motora (datilografia). O fator blocos parece não influenciar na coerência, ou seja, a análise de coerência não foi, neste desenho experimental, sensível para detectar aprendizagem motora. Apesar deste achado, na dose administrada, o medicamento não prejudicou a performance; ao contrário, favoreceu o rendimento. Provavelmente o medicamento deve evitar níveis indesejáveis de ansiedade que frequentemente ocorrem durante a aprendizagem.

Recebido 21 Setembro 2005, recebido na forma final 16 Janeiro 2006. Aceito 21 Fevereiro 2006

Dr. Victor Hugo do Vale Bastos - Rua Silva Teles 30A / 208 - 20541-110 Rio de Janeiro RJ - Brasil. E-mail: [e-mail]

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Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  02 Ago 2006
• Data do Fascículo
  Jun 2006

Histórico

• Revisado
  16 Jan 2006
• Recebido
  21 Set 2005
• Aceito
  21 Fev 2006