Resumo
Introdução
A extensão da lesão epitelial na rinite alérgica e não alérgica e sua associação com alterações inflamatórias no lavado nasal ainda não estão esclarecidas.
Objetivo
Verificar a relação entre o processo inflamatório no lavado nasal, extensão da lesão epitelial e espessamento da membrana basal na mucosa nasal de pacientes com rinite; determinar o ponto de corte do percentual de eosinófilos no lavado nasal associado à presença de atopia.
Método
Foram selecionados pacientes com rinite e indicação de septoplastia e (ou) turbinectomia por hipertrofia de conchas nasais, os quais foram submetidos aos testes cutâneos alérgicos, lavado nasal com determinação das concentrações de albumina, interleucina-8 (IL-8), contagem total e diferencial de células, análise da extensão da lesão epitelial, e grau de espessamento da membrana basal por meio de histopatologia da mucosa.
Resultado
Foram estudados 56 pacientes, mediana de 24,5 anos com diagnóstico de rinite alérgica (n = 36) e rinite não alérgica (n = 20). Nos atópicos os testes cutâneos alérgicos foram positivos para D. pteronyssinus em 35 (97,0%) e L. perenne em 18 (50,0%). Atópicos apresentaram maior índice de escore clínico para rinite em comparação a não atópicos. A contagem total de células, neutrófilos e níveis de albumina e IL-8 não foi diferente entre o lavado nasal de atópicos e não atópicos. O ponto de corte da contagem de eosinófilos no fluido nasal para a distinção de rinite alérgica e rinite não alérgica foi de 4%. Algum grau de lesão epitelial foi mais frequente em pacientes com rinite alérgica (94%) do que em pacientes com rinite não alérgica (65%). Na presença de espessamento da membrana basal, como marcador de remodelamento, não houve diferença no lavado nasal entre pacientes com rinite alérgica e não alérgica.
Conclusão
Nesta casuística, 4% foi o ponto de corte do número de eosinófilos no lavado nasal, para diferenciação de atopia. Remodelamento da via aérea superior pelo espessamento da membrana basal revelou infiltrado semelhante de células inflamatórias no lavado nasal, independentemente da presença de atopia.
Palavras-chave
Rinite alérgica; Eosinófilo; Membrana basal; Remodelamento da via aérea
Abstract
Introduction
The extent of epithelial lesion in allergic and non-allergic rhinitis and its association with inflammatory changes in nasal lavage has not been clarified.
Objective
To verify the association between the inflammatory cells in the nasal lavage, epithelial lesion extent and basement membrane thickness, in the nasal mucosa of patients with rhinitis; to determine the cutoff point of the percentage of eosinophils in the nasal lavage associated with the atopic patients.
Methods
Patients with rhinitis and indication for septoplasty and (or) turbinectomy for turbinate hypertrophy were selected, and were submitted to allergy skin tests, nasal lavage with measurement of albumin and interleukin-8 levels, total and differential counting of cells, and mucosal histopathological analysis to determine the extent of epithelial lesion, and degree of basement membrane thickening.
Results
Fifty-six patients with a median age of 24.5 years and a diagnosis of allergic rhinitis (n = 36) and non-allergic rhinitis (n = 20) were studied. In atopic subjects, allergy skin tests were positive for Dermatophagoides pteronyssinus in 35 (97.0%) and Lolium perenne in 18 (50.0%). Atopic subjects showed a higher clinical score index of rhinitis compared to non-atopic ones. The total count of cells, neutrophils, and levels of albumin and IL-8 were not different in the nasal lavage of atopic and non-atopic subjects. The cutoff point for eosinophil count in nasal fluid for the distinction between allergic rhinitis and non-allergic rhinitis was 4%. Some degree of epithelial lesion was more frequent in allergic rhinitis (94%) than in non-allergic rhinitis (65%) patients. In the presence of basement membrane thickness, as a marker of remodeling, there was no difference in the nasal lavage of patients with allergic rhinitis and non-allergic rhinitis.
Conclusion
In this series, 4% was the cutoff point for the number of eosinophils in the nasal lavage, for atopy differentiation. Upper airway remodeling accessed by basement membrane thickness showed similar inflammatory cell infiltrate in the nasal lavage, regardless of the presence of atopy.
Keywords
Allergic rhinitis; Eosinophil; Basement membrane; Airway remodeling
Introdução
Rinite é uma doença crônica, prevalente, com integração complexa entre múltiplos fatores genéticos e ambientais, interligados por mecanismos associados ou não à IgE. A associação com outras doenças alérgicas e fenótipos relacionados à sensibilização alergênica múltipla influencia intensidade, frequência e persistência dos sintomas.11 Anto JM, Bousquet J, Akdis M, Auffray C, Keil T, Momas I, et al. Mechanisms of the development of allergy (MeDALL): introducing novel concepts in allergy phenotypes. J Allergy Clin Immunol. 2017;139:388-399. O processo inflamatório crônico na mucosa respiratória pode levar a alterações estruturais com remodelamento na via aérea, bem caracterizado em asma,22 Bourdin A, Neveu D, Vachier I, Paganin F, Godard P, Chanez P. Specificity of basement membrane thickening in severe asthma. J Allergy Clin Immunol. 2007;119:1367-1374.–44 Bousquet J, Jeffery PK, Busse WW, Johnson M, Vignola AM. Asthma. From bronchoconstriction to airways inflammation and remodeling. Am J Respir Crit Care Med. 2000;161:1720-1745. porém em menor extensão na rinite.55 Cruz AA, Popov T, Pawankar R, Annesi-Maesano I, Fokkens W, Kemp J, et al. Common characteristics of upper and lower airways in rhinitis and asthma: ARIA update, in collaboration with GA(2)LEN. Allergy. 2007;62(Suppl. 84):1-41.–1111 Mori S, Pawankar R, Ozu C, Nonaka M, Yagi T, Okubo K. Expression and roles of MMP-2, MMP-9, MMP-13, TIMP-1 and TIMP-2 in allergic nasal mucosa. Allergy Asthma Immunol Res. 2012;4:231-239. Todas as doenças inflamatórias resultam em remodelamento, que pode evoluir para um processo de remodelamento normal ou patológico.44 Bousquet J, Jeffery PK, Busse WW, Johnson M, Vignola AM. Asthma. From bronchoconstriction to airways inflammation and remodeling. Am J Respir Crit Care Med. 2000;161:1720-1745. Na rinite, caracteriza-se por aumento da espessura e do desprendimento epitelial e pseudofibrose da membrana basal.1010 Watelet JB, Van Zele T, Gjomarkaj M, Canonica GW, Dahlen SE, Fokkens W, et al. Tissue remodelling in upper airways: where is the link with lower airway remodeling?. Allergy. 2006;61:1249-1258.
A reação inflamatória e o remodelamento da mucosa das conchas nasais resultam em edema e (ou) hipertrofia de conchas, cuja consequência clínica é a obstrução nasal.99 Bousquet J, Jacquot W, Vignola AM, Bachert C, Cauwenberge PV. Allergic rhinitis: a disease remodeling the upper airways?. J Allergy Clin Immunol. 2004;113:43-49.,1212 Ciprandi G, Vizzaccaro A, Cirillo I, Tosca M, Massolo A, Passalacqua G. Nasal eosinophils display the best correlation with symptoms, pulmonary function and inflammation in allergic rhinitis. Int Arch Allergy Immunol. 2005;136:266-272. Além disso, variação no engurgitamento da complexa vasculatura arterial e de sinusoides venosos cavernosos também contribui para obstrução nasal grave.33 Bousquet J, Van Cauwenberge P, Khaltaev N, Aït-Khaled N, Annesi-Maesano I, Bachert C, et al. Allergic rhinitis and its impact on asthma (ARIA). J Allergy Clin Immunol. 2001;108:S147-S336.,1313 Holmberg K, Bake B, Pipkorn U. Nasal mucosal blood flow after intranasal allergen challenge. J Allergy Clin Immunol. 1988;81:541-547. Aumento do número de eosinófilos na mucosa nasal é o parâmetro que apresenta melhor correlação com o sintoma obstrução nasal.1212 Ciprandi G, Vizzaccaro A, Cirillo I, Tosca M, Massolo A, Passalacqua G. Nasal eosinophils display the best correlation with symptoms, pulmonary function and inflammation in allergic rhinitis. Int Arch Allergy Immunol. 2005;136:266-272.
A extensão da lesão epitelial nas diferentes formas de rinite e a correlação com células e mediadores inflamatórios ainda não estão de todo esclarecidas. Presença de eosinófilos está associada à perda da integridade epitelial em pacientes com rinite alérgica ou não alérgica.1414 Amin K, Rinne J, Haahtela T. Inflammatory cell and epithelial characteristics of perennial allergic and nonallergic rhinitis with a symptom history of 1 to 3 years’ duration. J Allergy Clin Immunol. 2001;107:249-257. Entretanto, há divergências quanto ao ponto de corte do número de eosinófilos considerado elevado nas amostras de secreção nasal, pois a forma de coleta da secreção nasal pode interferir na celularidade recuperada.1515 Howarth PH, Persson CG, Meltzer EO, Jacobson MR, Durham SR, Silkoff PE. Objective monitoring of nasal airway inflammation in rhinitis. J Allergy Clin Immunol. 2005;115(Suppl. 1):S414-S441.–1717 Nair P, Goodwin S, Hargreave FE. Reproducibility, validity, and responsiveness of cell counts in blown nasal secretions. Allergy Rhinol (Providence). 2011;2:3-5. A mucosa nasal, pela facilidade de obtenção de amostra, permite o estudo das alterações celulares durante a reação alérgica.1515 Howarth PH, Persson CG, Meltzer EO, Jacobson MR, Durham SR, Silkoff PE. Objective monitoring of nasal airway inflammation in rhinitis. J Allergy Clin Immunol. 2005;115(Suppl. 1):S414-S441. O lavado nasal é uma técnica relativamente não invasiva, de fácil execução para determinação quantitativa da distribuição celular e de mediadores inflamatórios.33 Bousquet J, Van Cauwenberge P, Khaltaev N, Aït-Khaled N, Annesi-Maesano I, Bachert C, et al. Allergic rhinitis and its impact on asthma (ARIA). J Allergy Clin Immunol. 2001;108:S147-S336.,1818 Bascom R, Pipkorn U, Lichtenstein LM, Naclerio RM. The influx of inflammatory cells into nasal washings during the late response to antigen challenge. Effect of systemic steroid pretreatment. Am Rev Respir Dis. 1988;138:406-412.–2020 Kovalhuk LCS, Rosário NA, Carvalho A. Mediadores inflamatórios, citograma em lavado nasal e tomografia computadorizada de seios paranasais em crianças atópicas. J Pediatr (Rio J). 2001;77:271-278. A análise simultânea do infiltrado celular e do grau de ativação celular em amostras de secreção nasal e de biópsia de mucosa nasal mostra diferenças entre os dois compartimentos.2121 Lim MC, Taylor RM, Naclerio RM. The histology of allergic rhinitis and its comparison to cellular changes in nasal lavage. Am J Respir Crit Care Med. 1995;151:136-144. Portanto, o estudo do processo inflamatório em amostras simultaneamente obtidas pelo lavado nasal (LN) e da mucosa nasal pode auxiliar na compreensão dos mecanismos envolvidos na reação inflamatória nasal alérgica ou não alérgica.
O objetivo deste estudo foi avaliar a relação entre o processo inflamatório na luz da cavidade nasal e extensão de lesão da mucosa nasal em pacientes atópicos e não atópicos com rinite.
Método
Foram selecionados pacientes com rinite obstrutiva, alérgica ou não, com indicação de cirurgia para correção de desvio de septo e (ou) turbinectomia para alívio da obstrução nasal, em acompanhamento no Serviço de Otorrinolaringologia do Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Paraná. Foram excluídos os casos com história de infecção de vias aéreas superiores e inferiores, respectivamente nas 2 e 4 semanas prévias à avaliação clínica; além do uso recente de medicações, como corticosteroides sistêmico e/ou tópico nasal, cromoglicato dissódico e anti-histamínico oral e/ou tópico nasal.
O diagnóstico clínico e a classificação da gravidade da rinite foram feitos por um escore adaptado de sintomas (prurido/espirros, obstrução nasal, secreção nasal/fungação, secreção pós-nasal/snorting) e sinais (coloração da mucosa e aumento de volume das conchas, aspecto e volume de secreção nasal, presença de alteração à oroscopia), graduados numa escala de 0 a 3 (ausente, leve, moderado e grave), com pontuação máxima de 24.33 Bousquet J, Van Cauwenberge P, Khaltaev N, Aït-Khaled N, Annesi-Maesano I, Bachert C, et al. Allergic rhinitis and its impact on asthma (ARIA). J Allergy Clin Immunol. 2001;108:S147-S336.,2222 Meltzer EO. Evaluating rhinitis: clinical, rhinomanometric, and cytologic assessments. J Allergy Clin Immunol. 1988;82:900-908.,2323 Meltzer EO, Jalowayski AA, Vogt K, Iezzoni D, Harris AG. Effect of desloratadine therapy on symptom scores and measures of nasal patency in seasonal allergic rhinitis: results of a single-center, placebo-controlled trial. Ann Allergy Asthma Immunol. 2006;96:363-368.
Os pacientes foram submetidos a testes cutâneos alérgicos por punctura,33 Bousquet J, Van Cauwenberge P, Khaltaev N, Aït-Khaled N, Annesi-Maesano I, Bachert C, et al. Allergic rhinitis and its impact on asthma (ARIA). J Allergy Clin Immunol. 2001;108:S147-S336.,2424 Bernstein IL, Storms WW. Practice parameters for allergy diagnostic testing. Joint Task Force on Practice Parameters for the Diagnosis and Treatment of Asthma. The American Academy of Allergy, Asthma and Immunology and the American College of Allergy, Asthma and Immunology. Ann Allergy Asthma Immunol. 1995;75:543-625. com extratos dos alérgenos mais relevantes na cidade de Curitiba,2525 Rosário Filho NA, Baggio D, Suzuki MM. Ácaros na poeira domiciliar em Curitiba. Rev Bras Alerg Imunopatol. 1992;25:15-25.–2727 Dutra BMRS, Rosário Filho NA, Zavadniak AF. Alérgenos inaláveis em Curitiba: uma revisão de sua relevância clínica. Rev Bras Alerg Imunopatol. 2001;24:189-195. como Dermatophagoides pteronyssinus 5.000 BAU/mL (unidades alergênicas bioequivalentes) e Lolium perenne (10.000 BAU/mL), provenientes da Hollister-Stier®, Spokane, USA.
O teste foi considerado positivo se o diâmetro médio de pápula fosse maior ou igual a 3 mm com halo de eritema, em relação ao controle negativo.33 Bousquet J, Van Cauwenberge P, Khaltaev N, Aït-Khaled N, Annesi-Maesano I, Bachert C, et al. Allergic rhinitis and its impact on asthma (ARIA). J Allergy Clin Immunol. 2001;108:S147-S336.,2424 Bernstein IL, Storms WW. Practice parameters for allergy diagnostic testing. Joint Task Force on Practice Parameters for the Diagnosis and Treatment of Asthma. The American Academy of Allergy, Asthma and Immunology and the American College of Allergy, Asthma and Immunology. Ann Allergy Asthma Immunol. 1995;75:543-625.
Os pacientes foram submetidos à instilação nasal de 5 mL de solução salina isotônica (0,9%) em ambas as cavidades nasais para obtenção do fluido do LN,1919 Cruz AA, Naclerio RM, Proud D, Togias A. Epithelial shedding is associated with nasal reactions to cold, dry air. J Allergy Clin Immunol. 2006;117:1351-1358.–2121 Lim MC, Taylor RM, Naclerio RM. The histology of allergic rhinitis and its comparison to cellular changes in nasal lavage. Am J Respir Crit Care Med. 1995;151:136-144.,2828 Naclerio RM, Meier HL, Kagey-Sobotka A, Adkinson N, Meyers DA, Normam PS, et al. Mediator release after nasal airway challenge with allergen. Am Rev Respir Dis. 1983;128:597-602. o qual foi homogeneizado por agitação e centrifugado para obtenção do pellet de células (1.000 rotações por minuto/5 minutos), em centrífuga refrigerada. Dessa maneira, apenas 0,01% das células permaneceu no sobrenadante.1818 Bascom R, Pipkorn U, Lichtenstein LM, Naclerio RM. The influx of inflammatory cells into nasal washings during the late response to antigen challenge. Effect of systemic steroid pretreatment. Am Rev Respir Dis. 1988;138:406-412.
O sobrenadante foi estocado à temperatura de -80 °C para determinação de mediadores. A concentração de albumina na amostra do lavado nasal foi determinada por imunoensaio turbidimétrico (Microalbumina Multigent – Abbott Laboratórios dos Brasil Ltda®, limites de detecção de 1 a 500 µg/mL); a concentração de interleucina-8 (IL-8) foi feita pela técnica quantitativa de sandwich enzyme-linked immunosorbent assay (ELISA MAXTM Set Deluxe – Biolegend®; San Diego, California, limites de detecção de 31,2 a 2.000 pg/mL).
À análise da citologia nasal a partir do sedimento inicialmente obtido (pellet de células) permitiu a determinação do número total de células/mL, contagem de células inflamatórias e epiteliais; uma alíquota foi citocentrifugada (Citocentrífuga LABHO® CT-12) para confecção de lâminas que foram coradas pelo método de May-Grünwald-Giemsa, para contagem diferencial de eosinófilos, neutrófilos e células epiteliais.1818 Bascom R, Pipkorn U, Lichtenstein LM, Naclerio RM. The influx of inflammatory cells into nasal washings during the late response to antigen challenge. Effect of systemic steroid pretreatment. Am Rev Respir Dis. 1988;138:406-412.–2020 Kovalhuk LCS, Rosário NA, Carvalho A. Mediadores inflamatórios, citograma em lavado nasal e tomografia computadorizada de seios paranasais em crianças atópicas. J Pediatr (Rio J). 2001;77:271-278.,2929 Ciprandi G, Buscaglia S, Pesce G, Pronzato C, Ricca V, Parmiani S, et al. Minimal persistent inflammation is present at mucosal level in patients with asymptomatic rhinitis and mite allergy. J Allergy Clin Immunol. 1995;96:971-979.
Histopatologia das amostras da mucosa das conchas nasais inferiores, obtidas por procedimento de turbinectomia inferior parcial3030 Lima WTA. Tratamento cirúrgico dos cornetos nasais. Rev Bras Otorrinolaringol Cadern Debat (Suplem). 1998;64:5-10. ou por biópsia de mucosa da extremidade anteroinferior das conchas inferiores, foi avaliada por microscopia ótica.2121 Lim MC, Taylor RM, Naclerio RM. The histology of allergic rhinitis and its comparison to cellular changes in nasal lavage. Am J Respir Crit Care Med. 1995;151:136-144.
A porção anterior da concha inferior, mais exposta ao fluxo aéreo e ao maior impacto de aeroalérgenos e irritantes, é mais representativa para avaliação do processo inflamatório da mucosa nasal3131 Augusto AGLBS, Bussolotti Filho I, Dolci JEL, König Júnior B. Estudo morfofuncional estrutural e ultra-estrutural da mucosa das regiões anteriores do septo e da concha inferior. Braz J Otorhinolaryngol. 1999;65:472-481. se coletada a maior quantidade de tecido e muco para minimizar o dano à amostra.3030 Lima WTA. Tratamento cirúrgico dos cornetos nasais. Rev Bras Otorrinolaringol Cadern Debat (Suplem). 1998;64:5-10.,3131 Augusto AGLBS, Bussolotti Filho I, Dolci JEL, König Júnior B. Estudo morfofuncional estrutural e ultra-estrutural da mucosa das regiões anteriores do septo e da concha inferior. Braz J Otorhinolaryngol. 1999;65:472-481. A amostra foi fixada em formaldeído e o bloco de tecido embebido em parafina para posterior corte e confecção de lâminas.88 Chanez P, Vignola AM, Vic P, Guddo F, Bonsignore G, Godard P, et al. Comparison between nasal and bronchial inflammation in asthmatic and control subjects. Am J Respir Crit Care Med. 1999;159:588-595.,3232 Ponikau JU, Sherris DA, Kephart GM, Kern EB, Gaffey TA, Tarara JE, et al. Features of airway remodeling and eosinophilic inflammation in chronic rhinosinusitis: is the histopathology similar to asthma?. J Allergy Clin Immunol. 2003;112:877-882. As colorações empregadas foram a Hematoxilina-Eosina (HE) para identificar leucócitos, Periodic Acid-Schiff (PAS) para auxiliar na identificação das células caliciformes e tricômico Gomory para auxiliar na identificação e medida da espessura do colágeno subepitelial, segundo a rotina do Serviço de Anatomia Patológica do Hospital de Clínicas-UFPR.
Foram avaliadas as áreas de epitélio preferentemente recobertas com muco, excluíram-se os campos com evidências de desprendimento iatrogênico do epitélio e presença de hemácias extravasadas. Para evitar resultado falseado pela tangência do corte, foram avaliadas imagem e posição do núcleo das células.3333 Salib RJ, Howarth PH. Remodelling of the upper airways in allergic rhinitis: is it a feature of the disease?. Clin Exp Allergy. 2003;33:1629-1633.
O estadiamento da lesão epitelial (LE) e do grau de espessamento da membrana basal foi baseado no escore proposto por Ponikau et al.3232 Ponikau JU, Sherris DA, Kephart GM, Kern EB, Gaffey TA, Tarara JE, et al. Features of airway remodeling and eosinophilic inflammation in chronic rhinosinusitis: is the histopathology similar to asthma?. J Allergy Clin Immunol. 2003;112:877-882. Estadiamento do grau de lesão epitelial variou de 0?3 (0: epitélio intacto; 1: ausência de cílios; 2: erosão da camada superior de células com camada de células basais intacta; 3: erosão completa do epitélio) e o estadiamento do espessamento da membrana basal variou de 0?2 (0: membrana basal não visualizada; 1: membrana basal visível com espessura ≤ 20 µm, 2: membrana basal visível com espessura ˃ 20 µm).3232 Ponikau JU, Sherris DA, Kephart GM, Kern EB, Gaffey TA, Tarara JE, et al. Features of airway remodeling and eosinophilic inflammation in chronic rhinosinusitis: is the histopathology similar to asthma?. J Allergy Clin Immunol. 2003;112:877-882.
À análise estatística, a estimativa da diferença de variáveis de distribuição assimétrica foi feita por teste não paramétrico (Mann-Whitney), variáveis categóricas foram comparadas pelos testes exato de Fisher e qui-quadrado de Pearson. Para todos os testes foi considerado um nível mínimo de significância de 5% e poder de teste mínimo de 90%. A Curva Roc (Receiver Operation Curve) foi construída para estimativa do ponto de corte com maior sensibilidade e especificidade. Regressão logística univariada foi feita para estimar a probabilidade de atopia de acordo com a contagem de eosinófilos.
Este estudo foi submetido ao e aprovado pelo comitê de ética em pesquisas em seres humanos do Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Paraná (UFPR), registro 755.174/2003-11.
Resultados
Foram analisadas 56 amostras de pacientes, agrupados de acordo com a presença de atopia. Testes cutâneos alérgicos foram negativos em 20/56 (36,0%) e positivos em 36/56 (64,0%). Entre os atópicos o teste cutâneo alérgico foi positivo para D. pteronyssinus em 35/36 (97,0%) e/ou L. perenne em 18/36 (50,0%). O teste foi exclusivamente positivo ao D. pteronyssinus em 18/36 (50%) e ao L. perenne em apenas 1/36 (3%).
A mediana foi de 24,5 anos (14 a 58), com igual distribuição por gênero. A pontuação total do escore de sintomas foi maior entre os atópicos (9 [1?18]) em relação aos não atópicos (6,5 [0–12]) (p = 0,01).
Atópicos tenderam a apresentar maior frequência de prurido e espirros de moderada a grave intensidade (47,2%), embora no limite de significância (p = 0,05). A frequência do sintoma obstrução nasal de grau moderado a grave, presente em 25/36 (69,0%) dos atópicos, foi comparável aos não atópicos (p = 0,16).
A contagem da celularidade total e diferencial, além da dosagem de albumina e IL-8, é apresentada na tabela 1. O número total de células do LN e pela contagem diferencial, as células epiteliais, neutrófilos e mononucleares, tiveram igual distribuição entre atópicos e não atópicos. Apenas o percentual de eosinófilos foi maior entre os atópicos (p < 0,01).
Contagem total e diferencial de células, níveis de albumina e IL-8 no lavado nasal de atópicos e não atópicos
A frequência dos casos por faixas de número percentual de eosinófilos no LN (fig. 1) mostrou que a maioria dos não atópicos se concentrou na faixa de 0% a 2%, 14/20 (70%) dos casos em relação a 13/36 (36%) dos atópicos (p = 0,01). Por outro lado, foi maior a frequência dos casos com contagem de eosinófilos superior a 4% entre os atópicos, observada em 16/36 (45,0%) desses pacientes, em comparação a apenas 2 (10%) dos não atópicos.
Frequência dos casos distribuídos por faixas de percentual de número de eosinófilos no lavado nasal. Teste qui-quadrado com tendências lineares (p = 0,01).
O ponto de corte com maiores índices de sensibilidade e especificidade foi 4% de eosinófilos no LN, o que diferenciou atópicos de não atópicos; nesse critério a sensibilidade foi de 44% e a especificidade foi de 90%. Também com ponto de corte 4%, a probabilidade de atopia foi 80% (p < 0,001); aumentou para 100% com contagem de 10% de eosinófilos.
Na maioria das amostras o epitélio foi o pseudoestratificado colunar ciliado (fig. 2). Em algumas amostras foi observada a presença em algumas áreas de epitélio displásico (n = 1), transicional para escamoso não queratinizado (n = 7). O infiltrado no córion/lâmina própria foi predominantemente mononuclear, linfoplasmocitário.
Estadiamento da lesão epitelial (LE) e do espessamento de MB: (A) LE grau 0 (epitélio intacto) e MB 0 (não visualizada), Coloração PAS; (B) LE grau 1 (ausência de cílios) e MB 0 (não visualizada), Coloração HE; (C) LE grau 1 (ausência de cílios) e MB 1 (MB visível, espessura ≤ 20 µm), Coloração PAS; (D) LE grau 1(ausência de cílios) e MB 2 (MB visível, espessura > 20 µm), Coloração HE; (E) LE grau 2 (erosão epitelial, camada de células basais intacta) e MB 1 (MB ≤ 20 µm); (F) Destaque para infiltração de eosinófilos, Coloração HE.
A presença de lesão epitelial e de espessamento da membrana basal é apresentada na figura 2.
Entre os atópicos a prevalência de lesão epitelial foi de 94,4% e a razão de prevalência de lesão epitelial foi 1,4 vez maior (p < 0,01). A prevalência de lesão à membrana basal foi de 67,0%, indicou nos atópicos a chance não significante de apresentar algum grau de espessamento de membrana basal 1,2 vez maior em relação aos não atópicos (p = 0,40).
A relação entre o processo inflamatório da luz da cavidade nasal (lavado nasal) e da mucosa nasal (histopatológico) mostrou que, não obstante a atopia, na presença de algum grau de lesão epitelial foi semelhante a contagem total de células do LN (p = 0,18); de eosinófilos (p = 0,17) e neutrófilos (p = 0,75); níveis de albumina (p = 0,50) e de IL-8 (p = 0,09) (figs. 3 e 4). Porém, apenas dois casos dos atópicos não apresentavam lesão epitelial histopatológica. Por outro lado, não houve diferença de celularidade e mediadores nos não atópicos que apresentavam ou não lesão epitelial. Portanto, na amostra em estudo, a presença de lesão epitelial não se associou a alterações no LN.
Eosinófilos (%) no lavado nasal de atópicos e não atópicos de acordo com lesão epitelial e espessamento da membrana basal. — Mediana dos valores (limites); Teste de Mann-Whitney.
Neutrófilos (%) no lavado nasal de atópicos e não atópicos de acordo com lesão epitelial e espessamento da membrana basal. — Mediana dos valores (limites); Teste de Mann-Whitney.
A diferença na contagem de eosinófilos no LN de atópicos e não atópicos, sem EMB, foi limítrofe (p = 0,05). Na presença de EMB, não se evidenciaram diferenças nos subgrupos de pacientes quanto ao número de eosinófilos no LN. Por outro lado, EMB se associou a aumento de neutrófilos no LN de NAT (p < 0,01). O número de neutrófilos no LN de AT sem EMB foi maior do que em NAT (p = 0,04). Análise dos demais parâmetros do LN não evidenciou diferenças significativas na presença de EMB (figs. 3 e 4).
Discussão
Rinite é consequência de processo inflamatório alérgico e não alérgico da mucosa nasal, associado ao acúmulo de células inflamatórias na luz da cavidade nasal e a alterações estruturais na mucosa nasal. Quantificar a extensão e grau de lesão epitelial, bem como a relação com diferentes tipos celulares na mucosa nasal, nas diferentes formas de rinite, pode auxiliar na determinação do remodelamento da mucosa nasal.
Estudos sobre a ocorrência e extensão do remodelamento em rinite são conflitantes, por ser a mucosa nasal mais exposta a estímulos externos, o que resulta em algum grau de processo inflamatório adaptativo ou pelos diferentes critérios de remodelamento empregados nos estudos.33 Bousquet J, Van Cauwenberge P, Khaltaev N, Aït-Khaled N, Annesi-Maesano I, Bachert C, et al. Allergic rhinitis and its impact on asthma (ARIA). J Allergy Clin Immunol. 2001;108:S147-S336.,55 Cruz AA, Popov T, Pawankar R, Annesi-Maesano I, Fokkens W, Kemp J, et al. Common characteristics of upper and lower airways in rhinitis and asthma: ARIA update, in collaboration with GA(2)LEN. Allergy. 2007;62(Suppl. 84):1-41.,99 Bousquet J, Jacquot W, Vignola AM, Bachert C, Cauwenberge PV. Allergic rhinitis: a disease remodeling the upper airways?. J Allergy Clin Immunol. 2004;113:43-49.,1010 Watelet JB, Van Zele T, Gjomarkaj M, Canonica GW, Dahlen SE, Fokkens W, et al. Tissue remodelling in upper airways: where is the link with lower airway remodeling?. Allergy. 2006;61:1249-1258.,1414 Amin K, Rinne J, Haahtela T. Inflammatory cell and epithelial characteristics of perennial allergic and nonallergic rhinitis with a symptom history of 1 to 3 years’ duration. J Allergy Clin Immunol. 2001;107:249-257.,1515 Howarth PH, Persson CG, Meltzer EO, Jacobson MR, Durham SR, Silkoff PE. Objective monitoring of nasal airway inflammation in rhinitis. J Allergy Clin Immunol. 2005;115(Suppl. 1):S414-S441.,3131 Augusto AGLBS, Bussolotti Filho I, Dolci JEL, König Júnior B. Estudo morfofuncional estrutural e ultra-estrutural da mucosa das regiões anteriores do septo e da concha inferior. Braz J Otorhinolaryngol. 1999;65:472-481.–3333 Salib RJ, Howarth PH. Remodelling of the upper airways in allergic rhinitis: is it a feature of the disease?. Clin Exp Allergy. 2003;33:1629-1633. Obstrução nasal é um dos sintomas mais comuns e incômodos da rinite,3434 Meltzer EO, Blaiss MS, Naclerio RM, Stoloff SW, Derebery MJ, Nelson HS, et al. Burden of allergic rhinitis: allergies in America, Latin America, and Asia-Pacific adult surveys. Allergy Asthma Proc. 2012;33(Suppl. 1):S113-S141. queixa importante nesse grupo de pacientes, sejam alérgicos ou não alérgicos. Entretanto, foram selecionados casos do ambulatório de otorrinolaringologia, pela indicação cirúrgica de correção de desvio de septo e/ou turbinectomia por hipertrofia de conchas, que são alterações anatômicas que também contribuem para a obstrução nasal.
A pontuação total do escore de rinite foi maior entre os pacientes atópicos. Para investigação de atopia, os extratos empregados no teste cutâneo alérgico foram selecionados de acordo com os aeroalérgenos regionais mais relevantes,2525 Rosário Filho NA, Baggio D, Suzuki MM. Ácaros na poeira domiciliar em Curitiba. Rev Bras Alerg Imunopatol. 1992;25:15-25.–2727 Dutra BMRS, Rosário Filho NA, Zavadniak AF. Alérgenos inaláveis em Curitiba: uma revisão de sua relevância clínica. Rev Bras Alerg Imunopatol. 2001;24:189-195. a frequência de sensibilização foi de 97% para Dermatophagoides pteronyssinus e de 50% para Lolium perenne. Provocação nasal com alérgenos poderia contornar o viés de incluir no grupo de não atópicos, pacientes com rinite alérgica local ou sensibilizados a outros alérgenos além de ácaros e pólen de gramíneas.3535 Rondón C, Campo P, Togias A, Fokkens WJ, Durham SR, Powe DG, et al. Local allergic rhinitis: concept, pathophysiology, and management. J Allergy Clin Immunol. 2012;129:1460-1467.
Neste estudo, os seis pacientes sensibilizados ao pólen também eram sensibilizados ao D. pteronyssinus e sua pontuação do escore de rinite não foi diferente em relação aos demais atópicos.
A avaliação do processo inflamatório da mucosa nasal pelo lavado e a análise pela citologia quantitativa do lavado nasal permitem determinar o infiltrado celular e de mediadores,33 Bousquet J, Van Cauwenberge P, Khaltaev N, Aït-Khaled N, Annesi-Maesano I, Bachert C, et al. Allergic rhinitis and its impact on asthma (ARIA). J Allergy Clin Immunol. 2001;108:S147-S336.,1818 Bascom R, Pipkorn U, Lichtenstein LM, Naclerio RM. The influx of inflammatory cells into nasal washings during the late response to antigen challenge. Effect of systemic steroid pretreatment. Am Rev Respir Dis. 1988;138:406-412.–2020 Kovalhuk LCS, Rosário NA, Carvalho A. Mediadores inflamatórios, citograma em lavado nasal e tomografia computadorizada de seios paranasais em crianças atópicas. J Pediatr (Rio J). 2001;77:271-278. a coleta é mais representativa quando feita de ambas as narinas,1515 Howarth PH, Persson CG, Meltzer EO, Jacobson MR, Durham SR, Silkoff PE. Objective monitoring of nasal airway inflammation in rhinitis. J Allergy Clin Immunol. 2005;115(Suppl. 1):S414-S441. razão pela qual foram coletadas amostras de ambas no presente estudo.
As células recuperadas pelo lavado nasal são provenientes da descamação epitelial e pelo aumento da permeabilidade vascular e do epitélio, o que permite a passagem de proteínas plasmáticas e células inflamatórias para luz da cavidade nasal.1515 Howarth PH, Persson CG, Meltzer EO, Jacobson MR, Durham SR, Silkoff PE. Objective monitoring of nasal airway inflammation in rhinitis. J Allergy Clin Immunol. 2005;115(Suppl. 1):S414-S441.
Nesta casuística, foram indetectáveis os níveis de IL-4, IL-5 e de IFN-γ, possivelmente por serem lábeis e mínimas as quantidades desses mediadores em amostras coletadas sem o estímulo alergênico da provocação nasal. Entretanto, os níveis de IL-4, IL-5 e IL-13 podem estar elevados na secreção nasal de pacientes com rinite alérgica grave persistente.3636 Eifan AO, Orban NT, Jacobson MR, Durham SR. Severe persistent allergic rhinitis. Inflammation but no histologic features of structural upper airway remodeling. Am J Respir Crit Care Med. 2015;192:1431-1439.
O amplo limite de distribuição de IL-8 nas amostras de LN de atópicos e não atópicos pode ter mascarado eventual diferença entre os grupos. Neste estudo não houve correlação entre a concentração de albumina e o percentual de eosinófilos do lavado nasal, em ambos os grupos de pacientes com rinite. Tal associação está descrita em provocação nasal com alérgenos, na qual o aumento da permeabilidade vascular e o afluxo de células inflamatórias são significativamente maiores;3737 Raphael GD, Igarashi Y, White MV, Kaliner AK. The pathophysiology of rhinitis – sources of protein in allergen-induced nasal secretions. J Allergy Clin Immunol. 1991;88:33-42.,3838 Braunstahl GJ, Overbeek SE, Kleinjan A, Prins JB, Hoogsteden HC, Fokkens WJ. Nasal allergen provocation induces adhesion molecule expression and tissue eosinophilia in upper and lower airways. J Allergy Clin Immunol. 2001;107:469-476. bem como em pacientes com rinite alérgica e asma, que também apresentavam extenso comprometimento à tomografia computadorizada de seios paranasais.2020 Kovalhuk LCS, Rosário NA, Carvalho A. Mediadores inflamatórios, citograma em lavado nasal e tomografia computadorizada de seios paranasais em crianças atópicas. J Pediatr (Rio J). 2001;77:271-278.
A infiltração celular na luz da cavidade nasal, que reflete a descamação do epitélio e o aumento da permeabilidade da mucosa, foi semelhante nesse grupo de pacientes com rinite alérgica ou não; apenas o número de eosinófilos no LN diferenciou o grupo de atópicos.
Aumento do número de eosinófilos nasais apresenta melhor correlação com o sintoma obstrução nasal, em pacientes com rinite alérgica persistente.1212 Ciprandi G, Vizzaccaro A, Cirillo I, Tosca M, Massolo A, Passalacqua G. Nasal eosinophils display the best correlation with symptoms, pulmonary function and inflammation in allergic rhinitis. Int Arch Allergy Immunol. 2005;136:266-272. Nos casos em estudo, com obstrução nasal de moderada a grave intensidade, a proporção de eosinófilos no lavado nasal foi maior no grupo dos atópicos. A infiltração de eosinófilos é mais evidente após provocação nasal com alérgenos,1818 Bascom R, Pipkorn U, Lichtenstein LM, Naclerio RM. The influx of inflammatory cells into nasal washings during the late response to antigen challenge. Effect of systemic steroid pretreatment. Am Rev Respir Dis. 1988;138:406-412.,3838 Braunstahl GJ, Overbeek SE, Kleinjan A, Prins JB, Hoogsteden HC, Fokkens WJ. Nasal allergen provocation induces adhesion molecule expression and tissue eosinophilia in upper and lower airways. J Allergy Clin Immunol. 2001;107:469-476. porém há divergência quanto ao ponto de corte do número de eosinófilos considerado elevado nas amostras de secreção nasal.
A dificuldade na comparação entre os resultados dos estudos se deve aos diferentes métodos de coleta de material, seja por raspado, secreção assoada e diferentes técnicas de lavado nasal; bem como diversos métodos de coloração e de critérios para quantificação do número de eosinófilos nasais.1515 Howarth PH, Persson CG, Meltzer EO, Jacobson MR, Durham SR, Silkoff PE. Objective monitoring of nasal airway inflammation in rhinitis. J Allergy Clin Immunol. 2005;115(Suppl. 1):S414-S441.–1717 Nair P, Goodwin S, Hargreave FE. Reproducibility, validity, and responsiveness of cell counts in blown nasal secretions. Allergy Rhinol (Providence). 2011;2:3-5. Em amostras pela citologia quantitativa do lavado nasal, o ponto de corte de 5% de eosinófilos resultou em acurácia de 82% (sensibilidade 80% e especificidade 83%) no diagnóstico de rinite alérgica perene.1919 Cruz AA, Naclerio RM, Proud D, Togias A. Epithelial shedding is associated with nasal reactions to cold, dry air. J Allergy Clin Immunol. 2006;117:1351-1358.
Em adultos, a contagem de eosinófilos no fluido nasal foi de 6% em pacientes com rinite alérgica e 2% em rinite não alérgica, foi estabelecido em 4% o melhor ponto de corte.3939 Di Lorenzo G, Mansueto P, Pacor M, Martinelli N, Rizzo M, Ditta V, et al. Clinical importance of eosinophil count in nasal fluid in patients with allergic and non-allergic rhinitis. Int J Immunopathol Pharmacol. 2009;22:1077-1087.
No presente estudo, com o ponto de corte 4% de eosinófilos, a probabilidade de atopia foi 80% e aumentou para 100% com contagem de eosinófilos de 10%. O ponto de corte de 4% de eosinófilos no lavado nasal tem melhores índices de sensibilidade e especificidade para diferenciar rinite alérgica de não alérgica.
A desvantagem da técnica do lavado nasal é o fato de as células recuperadas serem provenientes somente da luz da cavidade nasal e não necessariamente refletir o processo inflamatório tissular epitelial,4040 Quirce S, Lemière C, De Blay F, Del Pozo V, Gerth VWR, Maestrelli P, et al. Noninvasive methods for assessment of airway inflammation in occupational settings. Allergy. 2010;65:445-458. no qual o espessamento da membrana basal reticular é empregado como parâmetro de remodelamento da via aérea.99 Bousquet J, Jacquot W, Vignola AM, Bachert C, Cauwenberge PV. Allergic rhinitis: a disease remodeling the upper airways?. J Allergy Clin Immunol. 2004;113:43-49.
Atópicos apresentaram com maior frequência algum grau de lesão epitelial, mas esse achado não se associou a diferenças no processo inflamatório da luz da cavidade nasal, quando comparados a não atópicos. Amin et al. relatam perda da integridade epitelial associada a aumento de eosinófilos, mas não de neutrófilos, na mucosa nasal de pacientes com rinite alérgica e não alérgica persistente.1414 Amin K, Rinne J, Haahtela T. Inflammatory cell and epithelial characteristics of perennial allergic and nonallergic rhinitis with a symptom history of 1 to 3 years’ duration. J Allergy Clin Immunol. 2001;107:249-257.
Pelos achados de Lim et al., secreção nasal e mucosa nasal representam compartimentos distintos, com diferentes populações de leucócitos. Após provocação com alérgenos não havia destruição epitelial, espessamento de membrana basal ou deposição de colágeno subepitelial como descrito em asma brônquica.2121 Lim MC, Taylor RM, Naclerio RM. The histology of allergic rhinitis and its comparison to cellular changes in nasal lavage. Am J Respir Crit Care Med. 1995;151:136-144.
Poucos estudos investigaram o remodelamento estrutural na mucosa nasal de pacientes com rinite alérgica e os dados são conflitantes.3636 Eifan AO, Orban NT, Jacobson MR, Durham SR. Severe persistent allergic rhinitis. Inflammation but no histologic features of structural upper airway remodeling. Am J Respir Crit Care Med. 2015;192:1431-1439. A presença e o grau de espessamento da membrana basal podem variar de acordo com a região estudada. Na região anterior da concha inferior, onde predomina epitélio respiratório, é maior a proporção de espessamento da membrana basal.3131 Augusto AGLBS, Bussolotti Filho I, Dolci JEL, König Júnior B. Estudo morfofuncional estrutural e ultra-estrutural da mucosa das regiões anteriores do septo e da concha inferior. Braz J Otorhinolaryngol. 1999;65:472-481. Por estar mais exposta ao fluxo aéreo, local onde ocorre maior impacto de aeroalérgenos e irritantes, alguns aspectos do processo inflamatório e achados de remodelamento podem representar uma resposta adaptativa da mucosa nasal e dificultam a comparação de pacientes sem e com rinite.1414 Amin K, Rinne J, Haahtela T. Inflammatory cell and epithelial characteristics of perennial allergic and nonallergic rhinitis with a symptom history of 1 to 3 years’ duration. J Allergy Clin Immunol. 2001;107:249-257.,3131 Augusto AGLBS, Bussolotti Filho I, Dolci JEL, König Júnior B. Estudo morfofuncional estrutural e ultra-estrutural da mucosa das regiões anteriores do septo e da concha inferior. Braz J Otorhinolaryngol. 1999;65:472-481.,3333 Salib RJ, Howarth PH. Remodelling of the upper airways in allergic rhinitis: is it a feature of the disease?. Clin Exp Allergy. 2003;33:1629-1633.
Lesão epitelial, caracterizada pela presença de edema intercelular, descamação epitelial e agrupamentos de eosinófilos, foi evidenciada na mucosa nasal anterior de pacientes alérgicos a ácaros da poeira.66 Watanabe K, Kiuna C. Epithelial damage of nasal mucosa in nasal allergy. Ann Otol Rhinol Laryngol. 1998;107:564-570.,1414 Amin K, Rinne J, Haahtela T. Inflammatory cell and epithelial characteristics of perennial allergic and nonallergic rhinitis with a symptom history of 1 to 3 years’ duration. J Allergy Clin Immunol. 2001;107:249-257.,3131 Augusto AGLBS, Bussolotti Filho I, Dolci JEL, König Júnior B. Estudo morfofuncional estrutural e ultra-estrutural da mucosa das regiões anteriores do septo e da concha inferior. Braz J Otorhinolaryngol. 1999;65:472-481. Em oito das amostras do presente estudo, foram observadas áreas de epitélio displásico e transicional para escamoso não queratinizado, também descrito por outros autores.4141 Tulic MK, Hamid Q. Does airway remodelling occur in the upper airways of patients with allergic rhinitis?. Clin Exp Allergy. 2010;40:1714-1716.,4242 Ishii J, Naito K, Miyata S, Senoh Y, Yokoyama N, Baba R. An electron microscopic study of the relation between epithelial cell damage and eosinophils in the nasal mucosa of patients with nasal allergy. Arerugi. 2000;49:1156-1162.
Aumento de eosinófilos na submucosa em pacientes com rinite alérgica grave persistente nem sempre se acompanha de alterações na integridade epitelial e/ou espessamento de membrana basal,3636 Eifan AO, Orban NT, Jacobson MR, Durham SR. Severe persistent allergic rhinitis. Inflammation but no histologic features of structural upper airway remodeling. Am J Respir Crit Care Med. 2015;192:1431-1439. o que pode estar associado a mecanismos protetores que minimizam remodelamento e potencializam a regeneração epitelial.4141 Tulic MK, Hamid Q. Does airway remodelling occur in the upper airways of patients with allergic rhinitis?. Clin Exp Allergy. 2010;40:1714-1716.
Entretanto, quando há obstrução nasal grave, por hipertrofia persistente de conchas, foi descrita presença de fibrose subepitelial, além de associação com cronicidade de sintomas e pouca reversibilidade da restrição ao fluxo aéreo nasal.4343 Corren J, Togias A. Remodeling in allergic rhinitis. Adding new data to an old debate. Am J Respir Crit Care Med. 2015;192:1403-1404. Remodelamento também foi demonstrado na mucosa nasal de pacientes com rinite alérgica persistente de leve e grave intensidade, embora com epitélio relativamente intacto, caracterizado por intensa deposição de colágeno, nas camadas superficial e submucosa, além de significativo espessamento de membrana basal, o que poderia refletir o nível elevado de TGF-β e seu efeito pró-fibrótico.4444 Kim TH, Lee JY, Lee HM, Lee SH, Cho WS, Ju YH, et al. Remodelling of nasal mucosa in mild and severe persistent allergic rhinitis with special reference to the distribution of collagen, proteoglycans and lymphatic vessels. Clin Exp Allergy. 2010;40:1742-1754.
Remodelamento em rinite alérgica, caracterizado por algum grau de espessamento de membrana basal, sem outras alterações no epitélio e submucosa,4545 Samitas K, Carter A, Kariyawasam HH, Xanthou G. Upper and lower airway remodelling mechanisms in asthma, allergic rhinitis and chronic rhinosinusitis: the one airway concept revisited. Allergy. 2018;73:993-1002. pode estar relacionado à deposição de colágeno.4444 Kim TH, Lee JY, Lee HM, Lee SH, Cho WS, Ju YH, et al. Remodelling of nasal mucosa in mild and severe persistent allergic rhinitis with special reference to the distribution of collagen, proteoglycans and lymphatic vessels. Clin Exp Allergy. 2010;40:1742-1754.,4646 Agha-Mir-Salim P, Rauhut O, Merker HJ. Electron and fluorescence microscopic investigations on composition and structure of the epithelial basement membrane of the human inferior nasal concha. Eur Arch Otorhinolaryngol. 1993;250:401-407. A inflamação alérgica potencializa e acelera esse processo fisiológico de deposição do colágeno na membrana basal da concha inferior.77 Sanai A, Nagata H, Konno A. Extensive interstitial collagen deposition on the basement membrane zone in allergic nasal mucosa. Acta Otolaryngol. 1999;119:473-478.,4747 Constantino GTL, Mello JF. Remodelamento das vias aéreas inferiores e superiores. Braz J Otorhinolaryngol. 2009;75:151-156.
A frequência de espessamento da membrana basal foi semelhante entre atópicos (67%) e não atópicos (55%) em nosso estudo. A proporção de eosinófilos e de neutrófilos no LN de atópicos e não atópicos foi semelhante, entre os que tinham espessamento de MB. Por outro lado, foi maior o número de neutrófilos no lavado nasal de não atópicos com espessamento da membrana basal, em comparação aos NAT sem EMB. Esse achado pode relacionar a infiltração neutrofílica ao mecanismo de lesão da mucosa em não alérgicos. Número semelhante de eosinófilos no LN de atópicos e não atópicos, com espessamento da membrana basal, também pode sugerir a participação dos eosinófilos na lesão de mucosa de pacientes com rinite alérgica ou não alérgica.
Infiltração eosinofílica é a principal causa de lesão epitelial, está associada à perda da integridade epitelial em pacientes com rinite alérgica ou não alérgica.66 Watanabe K, Kiuna C. Epithelial damage of nasal mucosa in nasal allergy. Ann Otol Rhinol Laryngol. 1998;107:564-570.,1414 Amin K, Rinne J, Haahtela T. Inflammatory cell and epithelial characteristics of perennial allergic and nonallergic rhinitis with a symptom history of 1 to 3 years’ duration. J Allergy Clin Immunol. 2001;107:249-257.,2929 Ciprandi G, Buscaglia S, Pesce G, Pronzato C, Ricca V, Parmiani S, et al. Minimal persistent inflammation is present at mucosal level in patients with asymptomatic rhinitis and mite allergy. J Allergy Clin Immunol. 1995;96:971-979.,3333 Salib RJ, Howarth PH. Remodelling of the upper airways in allergic rhinitis: is it a feature of the disease?. Clin Exp Allergy. 2003;33:1629-1633. Em rinossinusite crônica neutrofílica e eosinofílica, foram semelhantes os achados de remodelamento, o que também corrobora o conceito de que o estabelecimento do remodelamento da mucosa independe do tipo de reação inflamatória.4545 Samitas K, Carter A, Kariyawasam HH, Xanthou G. Upper and lower airway remodelling mechanisms in asthma, allergic rhinitis and chronic rhinosinusitis: the one airway concept revisited. Allergy. 2018;73:993-1002.
Conclusão
Os achados mostram que em pacientes com rinite, alérgica ou não alérgica, há algumas diferenças no processo inflamatório, mas podem resultar em semelhante lesão estrutural à mucosa nasal. Se há relação entre progressão do processo inflamatório na luz da cavidade nasal e da lesão histopatológica da mucosa (espessamento da membrana basal), essa associação independe da presença de atopia, em pacientes com rinite.
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Como citar este artigo: Kovalhuk LC, Telles EQ, Lima MN, Filho NA. Nasal lavage cytology and mucosal histopathological alterations in patients with rhinitis. Braz J Otorhinolaryngol. 2020;86:434–42.
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A revisão por pares é da responsabilidade da Associação Brasileira de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico-Facial.
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Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
28 Ago 2020 -
Data do Fascículo
Jul-Aug 2020
Histórico
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Recebido
15 Ago 2018 -
Aceito
8 Jan 2019