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História da Matemática nas Questões do Provão e Enade – 1998 a 2021

History of Mathematics in Provão and Enade questions - 1998 to 2021

Resumo

O artigo apresenta os resultados de uma pesquisa de doutorado cujo objetivo foi caracterizar as maneiras as quais a História da Matemática tem sido abordada nos exames nacionais que avaliam o curso de Matemática, sendo eles o Exame Nacional de Cursos (ENC), mais conhecido como Provão, e o Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (Enade). Para isso, foram consideradas todas as edições desses exames em que o curso de Matemática foi avaliado até 2021, compreendendo os seguintes anos: Provão - 1998; 1999; 2000; 2001; 2002 e 2003, e Enade – 2005; 2008; 2011; 2014; 2017 e 2021. O referencial metodológico utilizado no trabalho foi a análise de conteúdo qualitativa estruturante, a partir da qual estabelecemos três categorias de análises de acordo com o que se esperava que fosse mobilizado pelos educandos acerca dos conhecimentos históricos na resolução das questões, e uma quarta categoria, que emergiu das análises. Ao todo, foram selecionadas 29 questões: 13 na categoria Constituição da problemática; 5 na categoria Uso motivacional; 6 na categoria Recurso didático e 5 na categoria Potencial histórico. De modo geral, a História da Matemática no Provão e no Enade tem avaliado principalmente a capacidade dos alunos de aplicar de fórmulas e métodos, sendo listada apenas como conteúdo específico para a Licenciatura. No entanto, notamos nas últimas edições do Enade um direcionamento de abordagem nas questões que vai ao encontro do que se espera que um estudante na formação inicial conheça de História da Matemática e de como incorporá-la em sala de aula.

História na Educação Matemática; História da Matemática na Formação Inicial de Professores de Matemática; Avaliação da Educação Superior; Exame Nacional de Cursos; Exame Nacional de Desempenho de Estudantes

Abstract

The article presents the results of a doctoral research whose objective was to characterize how the History of Mathematics has been addressed in the national exams that assess the Mathematics course, the Exame Nacional de Cursos (ENC), better known as Provão, and the Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (Enade). For this, we considered all editions of these exams in which the Mathematics course was evaluated until 2021, comprising the following years: Provão – 1998; 1999; 2000; 2001; 2002 and 2003, and Enade – 2005; 2008; 2011; 2014; 2017 and 2021. The methodological framework used in the work was the analysis of qualitative structuring content, from which we established three categories of analyses according to what was expected to be mobilized by the students about historical knowledge in the resolution of the questions, and a fourth category, that emerged from the analyses. In all, 29 questions were selected: 13 in the category Constitution of the problem, 5 in the category Motivational use, 6 in the category Didactic Resource, and 5 in the category Historical potential. In general, the History of Mathematics in Provão and Enade has mainly evaluated the capacity of students to apply formulas and methods, being listed only as specific content for the Degree. We could notice, in the last editions of Enade, an approach directed to meeting what is expected that a student in the initial training knows of the History of Mathematics, and how to incorporate it in the classroom.

History in Mathematics Education; History of Mathematics in the Initial Training of Mathematics Teachers; Higher Education Assessment; National Course Exam (Provão); National Student Performance Exam (Enade)

1 Introdução

Na década de 1980, com o esgotamento do modelo produtivista de eficiência do governo militar e o processo de redemocratização do país, a avaliação ganha destaque e “[...] é concebida como instrumento para a implementação de políticas que permitam a superação da crise que vive a universidade [...]” (Zainko, 2008ZAINKO, M. A. S. Avaliação da Educação Superior no Brasil: processo de construção histórica. Avaliação, Campinas, v. 13, n. 3, p. 827-831, nov. 2008., p. 828). A partir disso, destacaram-se quatro propostas voltadas para a reforma e avaliação do Ensino Superior: o Programa de Avaliação da Reforma Universitária (Paru), em 1983; o relatório da Comissão Nacional de Reforma do Ensino Superior (CNRES), Uma Nova Política para a Educação Superior Brasileira, em 1985; o relatório do Grupo Executivo para Reformulação do Ensino Superior (Geres), em 1986; e o documento da Comissão Nacional de Avaliação do Ensino Superior Programa de Avaliação Institucional das Universidades Brasileiras (Paiub), em 1993 (Barreyro; Rothen, 2008BARREYRO, G. B., ROTHEN, J. C. Para uma história da avaliação da Educação Superior Brasileira: análise dos documentos do Paru, Cnres, Geres e Paiub. Avaliação, Revista da Rede de Avaliação Institucional da Educação Superior, Campinas, v. 13, n. 1, p. 131-152, 2008.).

A obrigatoriedade da realização de avaliações periódicas das instituições de Educação Superior e dos cursos de graduação pelo Ministério da Educação (MEC) ocorreu em 1995, por determinação do Governo Federal, por meio da Lei nº 9.131, de 24 de novembro. Em decorrência disso, em março de 1996, foi instituído o Exame Nacional de Cursos (ENC), comumente chamado de Provão, com foco na avaliação dos cursos a partir dos resultados de desempenho dos estudantes (Brasil, 2021a).

Na primeira edição em que o curso de Matemática foi avaliado no Provão, em 1998, a História da Matemática é listada como um dos conteúdos avaliados, conforme a Portaria nº 57, de 05 de fevereiro de 1998, Art. 3º, tendo como uma das referências para o perfil do graduando: “[...] visão histórica e crítica da Matemática, tanto no seu estado atual como nas várias fases de sua evolução [...]” (Brasil, 1998, p. 1).

O Provão teve sua última edição em 2003, e, em 2004, foi estabelecido o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (Sinaes), que integra o Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes – Enade, juntamente com a Avaliação de cursos de graduação e pela Avaliação Institucional, que atualmente constituem o processo avaliativo para aferir a qualidade dos cursos e das instituições de Educação Superior Brasileira (Brasil, 2021a).

Partindo do pressuposto de que a História da Matemática faz parte da formação docente e que os exames que avaliam o desempenho dos estudantes em sua formação apresentam a concepção de que existem conhecimentos que devem ter sido desenvolvidos durante a formação inicial dos estudantes, nos propomos a investigar que tipos de conhecimentos históricos estão presentes nas avaliações e o que se espera da formação inicial dos estudantes em relação à História da Matemática nesses exames.

Para atingir os objetivos, utilizamos como referencial metodológico a técnica de análise de conteúdo qualitativa estruturante, na qual o foco foi filtrar as questões do Provão e do Enade que continham algum tipo de abordagem histórica. Para isso, foram elaboradas três categorias, de acordo com o que se esperava que fosse mobilizado pelos educandos acerca dos conhecimentos históricos na resolução das questões, sendo elas: Constituição da problemática; Uso motivacional e Recurso didático, sendo que uma quarta categoria emergiu das análises e foi denominada, Potencial Histórico. Para cada categoria, foram estabelecidas regras de codificação e exemplos de âncoras que auxiliaram na caracterização e seleção das questões.

2 Exame Nacional de Cursos – ENC/Provão

A partir da segunda metade da década de 1990, os processos de avaliação e regulação da Educação Superior se efetivaram junto às ações governamentais. O Governo Federal, por meio da Lei n. º 9.131, de 24 de novembro de 1995, alterou as diretrizes e bases da educação nacional (Lei n. º 4.024/1961), e determinou que MEC realizasse avaliações periódicas das instituições de Educação Superior e dos cursos de graduação (Brasil, 2021b).

Estabelecia-se, assim, a obrigatoriedade de realização anual de “[...] exames nacionais com base nos conteúdos mínimos estabelecidos para cada curso, previamente divulgados e destinados a aferir os conhecimentos e competências adquiridos pelos alunos em fase de conclusão dos cursos de graduação [...]” (art. 3º, §1º, da Lei n.º 4.024/1961 — redação alterada pela Lei n.º 9.131/1995) (Brasil, 2021b).

Em decorrência da Lei nº 9.131/1995, em março de 1996, o MEC instituiu, por meio da Portaria nº 249/1996, o Exame Nacional de Cursos (ENC), comumente chamado de Provão, com foco na avaliação dos cursos por meio dos resultados de desempenho dos estudantes (Brasil, 2021b).

De acordo com a Portaria MEC nº 249, de 18 de março de 1996, Art. 2º, a prestação do Exame Nacional de Cursos era condição obrigatória para a obtenção do diploma, sendo prestada no ano de conclusão do curso. A abrangência, os objetivos e outras especificações necessárias à elaboração das provas a serem aplicadas para cada curso seriam definidas por comissões de curso designadas por Portaria Ministerial (Art. 3º). Cada comissão seria composta por até dez membros, especialistas de notório saber na área respectiva, de livre escolha do ministro de Estado da Educação e do Desporto que, para tanto, consultaria as comissões de especialistas de ensino da Secretaria de Ensino Superior – SESu, o Conselho de Reitores das Universidades Brasileiras e os conselhos federais e associações nacionais de ensino de profissões regulamentadas, cada um podendo indicar até 5 (cinco) nomes, sendo garantida a representatividade de cada entidade (Art. 4º).

O Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) era o responsável por organizar e executar a avaliação dos cursos e instituições; tal avaliação compreendia, além das notas obtidas no Provão, uma análise das condições de oferta dos cursos superiores. De acordo com o decreto nº 3.860, o desempenho das avaliações subsidiaria os processos de credenciamento e recredenciamento das instituições.

O Provão foi implementado em 1996, avaliando cursos de três áreas do conhecimento: administração, direito e engenharia civil, ampliando sua abrangência gradualmente.

As provas eram compostas por questões objetivas e questões discursivas, além de um questionário para coletar informações sobre o contexto social, econômico e cultural do estudante. Particularmente, as provas que avaliavam o curso de Matemática eram constituídas por questões objetivas comuns aos formandos do Bacharelado e Licenciatura, questões abertas comuns aos formandos do Bacharelado e Licenciatura, questões abertas específicas aos formandos do Bacharelado e questões abertas específicas aos formandos de Licenciatura.

Para todos os cursos avaliados, ao final da prova havia um Questionário Pesquisa, cujo objetivo era levantar informações que permitissem identificar as condições institucionais de ensino, bem como traçar o perfil do conjunto de graduandos, a fim de planejar ações na busca de melhoria da qualidade dos cursos. A partir da edição de 1999, foi acrescentado um questionário nomeado Impressões sobre a prova, com o objetivo de que os estudantes expressassem suas opiniões acerca da qualidade e adequação da prova.

A prova era elaborada por uma Banca Examinadora composta por sete professores titulados e experientes, provenientes das diferentes regiões do país, que se reuniam durante quarenta dias para definir o perfil do graduando, os conteúdos e as especificações da prova. Cada profissional se responsabilizava pela elaboração de certo número de questões, participando também da análise, julgamento, seleção e aperfeiçoamento das que compuseram a prova em sua versão definitiva. Esses professores permaneciam na comissão examinadora durante dois anos e as substituições eram progressivas, de modo que não fossem substituídos todos ao mesmo tempo.

Em suas oito edições, de 1996 a 2003, o curso de Matemática foi avaliado em seis edições do Exame Nacional de Cursos, a contar do ano de 1998 até a última edição, em 2003. A portaria nº 57, de 05 de fevereiro de 1998, estabeleceu que todos os graduandos dos cursos de bacharelado e licenciatura plena em Matemática e dos cursos de Ciências com habilitação plena em Matemática, deveriam tomar parte no Exame Nacional dos Cursos de Matemática.

O Exame, no caso específico da Matemática, tinha por objetivos: a. contribuir para um diagnóstico dos cursos de Matemática; b. contribuir como subsídio para a elaboração de diretrizes curriculares; c. contribuir para o processo de ensino-aprendizagem; d. induzir à valorização dos cursos de graduação em Matemática; e. avaliar o domínio dos conteúdos básicos de Matemática pelos graduandos; f. dar oportunidade ao graduando de avaliar seu desempenho e avaliar seu próprio curso em comparação com os outros. Além disso, o Exame Nacional do Curso de Matemática tomou como uma das referências para o perfil do graduando “[...] visão histórica e crítica da Matemática, tanto no seu estado atual como nas várias fases de sua evolução [...]” (Brasil, 1998, p. 1), apresentando, dentre o rol de conteúdos específicos para a licenciatura, a História da Matemática como tendência em Educação Matemática (Brasil, 1998).

Essa indicação circunscreve-se a um período no qual há movimento em torno do amadurecimento científico da área de pesquisa em História da Matemática no Brasil. O interesse por essa área resultou no aumento do número de trabalhos e de pesquisadores, o que levou à criação de um espaço específico para reunir pesquisadores em História da Matemática, envolvendo eventos e a criação de uma sociedade científica, que são fatores a serem considerados como influências da inserção da História da Matemática como um dos conteúdos avaliados no Provão.

O Provão teve sua última edição em 2003, dando lugar ao Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior, que possui como um de seus processos de avaliação o Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes – Enade, que ocorre até os dias atuais.

3 Exame Nacional de Desempenho de Estudantes – Enade

De acordo com o Inep, o Enade é um dos pilares da avaliação do Sinaes, criado pela Lei nº 10.861, de 14 de abril de 2004. O exame tem como objetivo:

[...] aferir o desempenho dos estudantes em relação aos conteúdos programáticos previstos nas diretrizes curriculares do respectivo curso de graduação, suas habilidades para ajustamento às exigências decorrentes da evolução do conhecimento e suas competências para compreender temas exteriores ao âmbito específico de sua profissão, ligados à realidade brasileira e mundial e a outras áreas do conhecimento (Brasil, 2019).

Aplicado pelo Inep desde 2004, o Enade integra o Sinaes, composto também pela Avaliação de cursos de graduação e pela Avaliação institucional. Juntos, eles formam o tripé avaliativo que permite conhecer a qualidade dos cursos e instituições de Educação Superior Brasileiras. Os resultados do Enade, aliados às respostas do Questionário do Estudante, são insumos para o cálculo dos Indicadores de Qualidade da Educação Superior (Brasil, 2019).

O Enade é componente curricular obrigatório para os cursos de graduação pertencentes ao Sistema Federal de Educação Superior e para as Instituições de Educação Superior (IES) estaduais que aderem ao Sinaes (Brasil, 2022BRASIL. Instituto Nacional De Estudos E Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira - INEP. Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (Enade). Brasília: MEC/INEP, 2022. Disponível em: < https://www.gov.br/inep/pt-br/areas-de-atuacao/avaliacao-e-exames-educacionais/enade>. Acesso em: 31 ago 2022.
https://www.gov.br/inep/pt-br/areas-de-a...
). Até 2008, o exame era realizado por amostragem, passando a ser censitário em 2009. Em 2011, tornou-se obrigatório somente para os alunos concluintes, sendo que os alunos ingressantes foram dispensados da realização do Enade, passando a ser avaliados com base na nota do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) (Souza, 2013SOUZA, L. H. G. R de. Políticas Públicas em Educação Superior no Brasil: análise do Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes - ENADE, na perspectiva o modelo ciclo político. 2013. 141. folhas. Dissertação (Mestrado em Administração) - Universidade Federal de Viçosa, Viçosa, 2013.).

Atualmente, a prova do Enade é aplicada aos estudantes concluintes dos cursos de graduação relacionados às áreas de avaliação do exame, aprovadas pela Comissão Nacional de Avaliação da Educação Superior (Conaes), com periodicidade anual, em conformidade com as áreas de avaliação do ciclo avaliativo trienal (Brasil, 2019BRASIL. Instituto Nacional De Estudos E Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira - INEP. Nota Técnica - Cálculo da nota final do Enade. Brasília: MEC/INEP, 2019. Disponível em: < http://download.inep.gov.br/educacao_superior/Enade/notas_tecnicas/2019/nota_tecnica_n20-2019_CGCQES-DAES_calculo_NF_Enade.pdf>. Acesso em: 20 out 2020.
http://download.inep.gov.br/educacao_sup...
).

As provas são compostas por uma parte de Formação Geral, que afere aspectos da formação profissional relativos à atuação ética, competente e comprometida com a sociedade. Tal parte compreende oito questões de múltipla escolha e duas discursivas, envolvendo situações-problema e estudos de casos, correspondendo a 25% da nota final do Enade. Nas questões discursivas são avaliados aspectos como clareza, coerência, coesão, estratégias argumentativas, utilização de vocabulário adequado e correção gramatical do texto.

A segunda parte da prova é composta pelo Componente Específico de cada área de avaliação, delimitada por diretriz de prova e estruturada a partir de uma matriz que envolve competências, habilidades e objetos de conhecimento. Corresponde a 75% da nota do Enade e apresenta trinta questões, sendo três discursivas e vinte e sete de múltipla escolha, envolvendo situações-problema e estudos de casos. A prova também é composta por nove questões de percepção do exame.

No caso específico do curso de Matemática, nas edições de 2005, 2008 e 2011, a prova era composta por um único caderno para Licenciatura e Bacharelado, contendo questões objetivas e discursivas comuns às duas modalidades, questões objetivas e discursivas específicas de cada uma delas, e, por último, um questionário de percepção sobre a prova, com o objetivo de obter a opinião do estudante acerca da qualidade e da adequação da prova. Nas edições de 2014, 2017 e 2021, as provas foram separadas em dois cadernos: um específico para os formandos do Bacharelado e outro específico aos formandos de Licenciatura, mas ainda seguindo a mesma composição.

Assim como ocorre no Provão, o conhecimento histórico, nas indicações do Enade, aparece como uma das competências necessárias ao formando do curso de Matemática, além de ser indicado nos conteúdos específicos da Licenciatura.

4 Encaminhamentos metodológicos

Com base nos objetivos da pesquisa, optamos por utilizar a técnica de análise de conteúdo qualitativa para as análises realizadas no âmbito do trabalho. De acordo com Mayring (2002MAYRING, P. Introdução à Pesquisa Social Qualitativa: uma orientação ao pensamento qualitativo. 5. ed. Tradução de Hartmut Günther. Weinheim: Beltz, 2002., p. 114), a ideia-base da análise de conteúdo qualitativa é “[...] analisar textos de maneira sistemática, por meio de um sistema de categorias, desenvolvido a partir do material e guiado por teoria”. O material é dividido em unidades que são analisadas uma após a outra, seguindo um passo a passo com controle metodológico rígido. O ponto central é um sistema de categorias, desenvolvidas a partir do material e guiadas por teoria, a partir da qual, determinam-se os aspectos do material a serem considerados.

As categorias foram elaboradas de acordo com o que se esperava que fosse mobilizado pelos educandos acerca dos conhecimentos históricos na resolução das questões, bem como, possíveis formas de abordagens da História da Matemática no enunciado das perguntas.

A categoria Constituição da problemática teve como regra de codificação as questões que mobilizavam conhecimentos históricos da Matemática para a sua resolução. Para isso, foram constituídos como exemplos de âncoras: reprodução de métodos matemáticos como teoremas e fórmulas atribuídas a algum estudioso; indicações de passagens históricas de algum conteúdo matemático; constituição, transformação e permanência da atividade matemática em diversos contextos e documentos matemáticos históricos.

Na categoria Uso motivacional, foram consideradas as questões que continham algum dado ou informação histórica de forma explícita em seus enunciados, os quais não eram necessários para a compreensão e resolução do exercício, cuja regra de codificação eram questões abordando passagens históricas como forma de contextualização. Nesse caso, buscaram-se menções históricas explícitas nos enunciados, tais como a citação de matemáticos e de métodos históricos, trechos referindo-se ao desenvolvimento histórico do conteúdo abordado ou datas. Para isso, foram estabelecidos como exemplos de âncoras: anedotas; lendas; textos introdutórios de um conteúdo; notas históricas; datas e nomes de matemáticos e cientistas.

Na categoria Recurso didático, foram consideradas as questões com indicações de uso e das potencialidades da História da Matemática para o ensino de Matemática, tendo como exemplos de âncoras: uso de procedimentos históricos como proposta de ensino do conhecimento matemático e indicações da importância da História da Matemática no processo de ensino e aprendizagem.

Já a categoria Potencial histórico emergiu da leitura das provas e teve como regra de codificação questões em que a História da Matemática poderia ser explorada no problema ou aparecia de forma implícita. Como exemplos de âncoras, temos a História da Matemática como possibilidade de resposta e enunciados demonstrando alguma preocupação com o ensino de Matemática, nos quais a História da Matemática teria potencial para ser abordada na questão.

Para cada edição, buscamos descrever os conteúdos e habilidades avaliados, bem como as questões que foram selecionadas, com base nas categorias estabelecidas.

5 Exemplos de questões selecionadas

A primeira questão trata-se de uma questão objetiva específica da Licenciatura, conforme a Figura 1:

Figura 1
Questão objetiva específica da Licenciatura da edição de 2005 do Enade

O enunciado dessa questão faz menção explícita à História da Matemática egípcia ao se referir ao papiro Rhind ou Ahmes. De acordo Eves (2011)EVES, H. Introdução à História da Matemática. Tradução de Hygino H. Domingues. 5. ed. Campinas: Editora Unicamp, 2011., este é um texto matemático na forma de manual prático que contém 85 problemas, sendo uma das principais fontes de informações referentes à Matemática egípcia antiga, descrevendo métodos de multiplicação e divisão egípcias, o uso que faziam das frações unitárias, o emprego da regra de falsa posição, solução para o problema da determinação da área de um círculo e muitas aplicações da Matemática em problemas práticos.

Nos problemas geométricos que constam no papiro Rhind, assume-se que a área de um círculo é igual à de um quadrado de lado igual à 89 do diâmetro. Essa informação é apresentada na questão analisada por meio dos problemas 1 e 2, constando também na descrição da solução. Na sequência, são apresentados três itens a serem julgados pelo estudante. Como a questão está centrada em um documento histórico de grande importância para a Matemática, classifica-se na categoria Constituição da problemática.

O segundo exemplo de questão selecionada é da edição 2000 do Provão e compreende uma questão discursiva específica da Licenciatura:

Figura 2
Questão discursiva específica da Licenciatura da edição de 2000 do Provão

O enunciado da questão apresenta o período da introdução do conceito de logaritmo na Matemática e afirma que, apesar da perda de interesse no emprego dos logaritmos por conta das tecnologias, há sua permanência e de suas inversas nos cursos médio e superior. As formulações dos questionamentos são a respeito da justificativa da permanência da função logarítmica e sua inversa a partir de um exemplo de aplicabilidade da Matemática a outra Ciência envolvendo a função logaritmo ou sua inversa e a resolução dos cálculos do exemplo apresentado.

De acordo com as diretrizes da correção da prova, o conteúdo predominante é Tendências em Educação Matemática (PCN) e as habilidades aferidas foram: Elaborar modelos e resolver problemas, integrando os vários campos da Matemática.

Nesse caso, a informação histórica se limita apenas à menção da introdução do logaritmo no século XVII, o que classifica a questão na categoria Uso motivacional.

A terceira questão da edição de 2021 classifica-se na categoria Recurso didático, e refere-se a uma questão discursiva que traz dois textos-base, apresentando citações contidas nos Parâmetros Curriculares Nacionais e na Base Nacional Comum Curricular, abordando a importância da Matemática na formação do aluno do Ensino Fundamental e seus contextos históricos e culturais. Com base nessas citações, solicita-se ao estudante responder três questionamentos que buscam avaliar conhecimentos dos formandos sobre a História da Matemática, demandando reflexões sobre como se dá a produção do conhecimento matemático e sobre as influências de contribuições das civilizações da Antiguidade no conhecimento matemático atual, assim como as perspectivas didáticas de sua implementação em sala de aula.

Figura 3
Questão discursiva específica da Licenciatura da edição de 2021 do Enade

O último exemplo é da edição 2001 do Provão e trata-se de uma questão discursiva específica da Licenciatura que se enquadra na categoria Potencial histórico, uma vez que não há menção explícita da História da Matemática no enunciado ou na problemática da questão, todavia, a partir de outro encaminhamento, ela poderia certamente ser abordada.

Figura 4
Questão discursiva específica da Licenciatura da edição de 2001 do Provão

O enunciado afirma que, em alguns livros didáticos, as fórmulas são apresentadas sem nenhuma explicação de como surgiram ou informações acerca da estrutura lógica-dedutiva da Matemática que as produziram, cabendo então ao aluno apenas reproduzi-las com valores específicos.

Apesar da introdução da questão trazer uma preocupação com o ensino e a compreensão da Matemática, a questão em si demonstra desconsiderar esse aspecto, pois solicita apenas uma demonstração das raízes reais de uma equação de segundo grau com base na fórmula resolutiva da equação de segundo grau.

Com outro encaminhamento, a questão poderia abordar que uma possibilidade de trabalho com os alunos seria tratar a origem da equação quadrática e seus diferentes métodos de resolução, destacando que uma dessas resoluções é conhecida como fórmula de Bháskara, a mais usual e, muitas vezes, a única apresentada aos alunos. O questionamento poderia discutir outros aspectos para além da demonstração solicitada.

6 Síntese dos resultados

Ao todo, foram selecionadas 29 questões, sendo 9 questões nas edições do Provão e 20 questões nas edições do Enade. Somente nas edições do Provão de 1998 e 1999 não foram identificadas questões que abordassem a História da Matemática. Com relação à classificação, 13 questões se enquadraram na categoria Constituição da problemática, 5 questões na categoria Uso motivacional, 6 questões na categoria Recurso didático e 5 questões na categoria Potencial histórico.

As questões selecionadas na categoria Potencial histórico, em sua maioria, estão localizadas nas edições do Provão, com trechos indicando a preocupação com o ensino da Matemática voltado para memorização e reprodução de fórmulas, mas que não exploravam situações que pudessem auxiliar na superação dessa perspectiva de ensino. É válido destacar que, no período de ocorrência do Provão, as discussões acerca da História da Matemática na formação de professores ainda eram muito incipientes, o que pode justificar essas questões se limitarem a apenas expressarem a preocupação, sem fazer indicativos de meios de solução.

Nas edições do Enade, em específico a de 2021, há a presença de questões que abordam as contribuições da História da Matemática para o ensino de Matemática, trazendo citações dos documentos oficiais e indicações dessa tendência para o ensino de Matemática, o que nos parece ser indicação de um direcionamento da abordagem da História da Matemática ao encontro do que se espera da formação inicial dos professores de Matemática.

No entanto, no Relatório Síntese da área de Matemática de 2021, com base nas respostas apresentadas pelos estudantes do curso de Matemática em uma das questões, concluiu-se que o papel da História da Matemática na formação que receberam na Educação Superior foi meramente contextualizar os conteúdos estudados. Tal indicação sinaliza que existe ainda um longo caminho a ser percorrido para que haja consonância entre o que se espera de conhecimentos históricos dos estudantes e aquilo que lhes é ensinado.

Sabemos que não existe uma receita pronta a ser seguida, tampouco um único modo de trabalho com a História da Matemática. De modo geral, conhecimentos históricos, quando transmitidos, o são por meio de uma disciplina específica ou vinculados a outras disciplinas que abordam tópicos de História da Matemática.

No caso de uma disciplina específica, Moraes (2018)MORAES, S. R. A. A História da Matemática e sua articulação com a educação básica em disciplinas dos cursos de formação de professores de Universidades Federais localizadas no estado de Minas Gerais. 2018. 100. folhas. Dissertação (Mestrado em Educação em Ciências) - Universidade Federal de Itajubá, Itajubá, 2018. e Rodrigues (2016)RODRIGUES, G. F. História da matemática: um olhar sob a perspectiva para a formação do professor de matemática. 2016. 109. folhas. Dissertação (Mestrado Acadêmico em Ensino de Ciências e Educação Matemática) - Universidade Estadual da Paraíba, Campina Grande, 2016. apresentam que, no trabalho dessa disciplina, há tentativas de possibilitar que os alunos em formação tomem contato com aspectos que podem ser compreendidos como um recurso didático para ensinar e aprender Matemática.

Outro elemento verificado nas pesquisas de Moraes (2018)MORAES, S. R. A. A História da Matemática e sua articulação com a educação básica em disciplinas dos cursos de formação de professores de Universidades Federais localizadas no estado de Minas Gerais. 2018. 100. folhas. Dissertação (Mestrado em Educação em Ciências) - Universidade Federal de Itajubá, Itajubá, 2018., Balestri (2008)BALESTRI, R. D. A participação da história da matemática na formação inicial de professores de matemática na ótica de professores e pesquisadores. 2008. 104. folhas. Dissertação (Mestrado em Ensino de Ciências e Educação Matemática) - Universidade Estadual de Londrina, Londrina, 2008. e Fragoso (2011)FRAGOSO, W. C. História da Matemática: uma disciplina do curso de licenciatura em Matemática da Universidade Federal de Juiz de Fora. 2011. 210. folhas. Dissertação (Mestrado Profissional em Educação Matemática) - Universidade Federal de Juiz de Fora, Programa de Pós-Graduação em Educação Matemática, Juiz de Fora, 2011. diz respeito às indicações de que as atividades da disciplina dependem da formação específica dos professores que ministram as aulas. Essa formação ainda apresenta lacunas, o que representa um empecilho para a incorporação da História da Matemática em cursos de formação de professores de Matemática (Balestri, 2008BALESTRI, R. D. A participação da história da matemática na formação inicial de professores de matemática na ótica de professores e pesquisadores. 2008. 104. folhas. Dissertação (Mestrado em Ensino de Ciências e Educação Matemática) - Universidade Estadual de Londrina, Londrina, 2008.). Assim, muitas das articulações entre a História da Matemática e a Educação Matemática partem de iniciativas particulares (Moraes, 2018MORAES, S. R. A. A História da Matemática e sua articulação com a educação básica em disciplinas dos cursos de formação de professores de Universidades Federais localizadas no estado de Minas Gerais. 2018. 100. folhas. Dissertação (Mestrado em Educação em Ciências) - Universidade Federal de Itajubá, Itajubá, 2018.), sendo significativa a influência de professores que tiveram formação em História da Matemática ou são pesquisadores dela, na inclusão ou na reformulação da disciplina História da Matemática nos Projetos Pedagógicos dos cursos de Matemática (Fragoso, 2011FRAGOSO, W. C. História da Matemática: uma disciplina do curso de licenciatura em Matemática da Universidade Federal de Juiz de Fora. 2011. 210. folhas. Dissertação (Mestrado Profissional em Educação Matemática) - Universidade Federal de Juiz de Fora, Programa de Pós-Graduação em Educação Matemática, Juiz de Fora, 2011.; Stamato, 2003STAMATO, J. M. de A. A disciplina história da Matemática e a formação do professor de Matemática: dados e circunstâncias de sua implantação na Universidade Estadual Paulista, campi de Rio Claro, São José do Rio Preto e Presidente Prudente. 2003. 197. folhas. Dissertação (Mestrado em Educação Matemática) - Universidade Estadual Paulista, Instituto de Geociências e Ciências Exatas, Rio Claro, 2003.).

Nas Diretrizes Curriculares Nacionais para os Cursos de Matemática, Bacharelado e Licenciatura, nos conteúdos comuns a todos os cursos de Licenciatura, há a indicação de conteúdos da Ciência da Educação, da História e Filosofia das Ciências e da Matemática, tendo como uma das habilidades e competências próprias do educador matemático a capacidade de perceber a prática docente de Matemática como um processo dinâmico, carregado de incertezas e conflitos, um espaço de criação e reflexão, em que novos conhecimentos são gerados e modificados continuamente (Brasil, 2001BRASIL. Parecer CNE/CES 1.302/2001 - Diretrizes Curriculares Nacionais para os Cursos de Matemática, Bacharelado e Licenciatura. Brasília: MEC, 2001. Disponível em: < http://portal.mec.gov.br/cne/arquivos/pdf/CES13022.pdf >. Acesso em: 11 jul. 2022.
http://portal.mec.gov.br/cne/arquivos/pd...
). Essa indicação do conhecimento histórico apenas para a Licenciatura revela que não parece importante para o profissional do Bacharelado conhecer a história do desenvolvimento da Matemática.

No perfil esperado do profissional avaliado nas edições do Provão, e até a edição de 2011 do Enade, elenca-se “[...] conceber a Matemática como um corpo de conhecimentos rigoroso, formal e dedutivo, produto da atividade humana, historicamente construído [...]”(Brasil, 2011BRASIL. Instituto Nacional De Estudos E Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira - INEP. Portaria nº 223, de 26 de julho de 2011. Trata da Prova Enade - Área de Matemática. Brasília: MEC/INEP, 2011. Disponível em: https://download.inep.gov.br/educacao_superior/enade/legislacao/2011/diretrizes/diretrizes_matematica_n_223.pdf. Acesso em: 10 jan 2022.
https://download.inep.gov.br/educacao_su...
) e “[...] visão histórica e crítica da Matemática, tanto no seu estado atual como nas várias fases de sua evolução [...]” (Brasil, 2011BRASIL. Instituto Nacional De Estudos E Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira - INEP. Portaria nº 223, de 26 de julho de 2011. Trata da Prova Enade - Área de Matemática. Brasília: MEC/INEP, 2011. Disponível em: https://download.inep.gov.br/educacao_superior/enade/legislacao/2011/diretrizes/diretrizes_matematica_n_223.pdf. Acesso em: 10 jan 2022.
https://download.inep.gov.br/educacao_su...
), para ambas modalidades. Nas edições de 2014, 2017 e 2021 não há menções específicas de perfil tomado como referência para o graduando envolvendo a História da Matemática.

Já com relação aos conteúdos aferidos, a História da Matemática aparece no Provão apenas nas diretrizes de 1998 para o graduando de Licenciatura como parte das tendências em Educação Matemática. Análogo ao Provão, no Enade, as indicações de conhecimentos históricos da Matemática aparecem apenas para os graduandos da Licenciatura em todas as edições avaliadas, o que nos leva a questionar como atingir o perfil esperado do bacharel se nem em uma prova ele é avaliado nesse sentido?

Além disso, é preciso ter em mente que matemáticos também podem atuar na Educação Superior, na formação inicial de professores de Matemática e que sua formação influenciará em sua prática docente. Logo, o profissional que trata a Matemática como atemporal, fruto de um único ou poucos nomes, como algo associal etc., perpetuará essa visão para os demais. A esse respeito, Gil Pérez et al. (2001) apresentam que a visão ahistórica e aproblemática são visões deformadas do trabalho científico, em que “[...] transmitem-se os conhecimentos já elaborados, sem mostrar os problemas que lhe deram origem, qual foi a sua evolução, as dificuldades encontradas etc.,” e ainda “não dando igualmente a conhecer as limitações do conhecimento científico atual nem as perspectivas que, entretanto, se abrem” (Gil Pérez et al., 2001, p. 131).

Os autores apresentam outras visões deformadas do trabalho científico, a saber: concepção empiricoindutivista e ateórica, visão rígida (algorítmica, exata, infalível...), visão exclusivamente analítica, visão acumulativa de crescimento linear, visão individualista e elitista e visão deformada, que transmite uma imagem descontextualizada, socialmente neutra da ciência (Gil Pérez et al., 2001).

Gil Pérez et al. (2001), por fim, destacam a importância do reconhecimento dessas visões como ponto de partida para a conscientização e modificação das próprias concepções epistemológicas acerca da natureza da ciência e da construção do conhecimento científico por parte dos professores. Por isso, é necessário que os estudantes de Matemática, em ambas as modalidades, compreendam e de fato possam desenvolver uma visão histórica e crítica da Matemática.

7 Considerações

De modo geral, a História da Matemática no Provão e Enade tem avaliado principalmente a capacidade dos alunos na aplicação de fórmulas e métodos, aparecendo nas questões, enquanto um recurso didático, somente a partir de 2005, no Enade, tendo destaque, a edição de 2021, que continha três questões com indicações de uso e das potencialidades da História da Matemática para o ensino de Matemática, o que indica um deslocamento do entendimento e do modo como a História da Matemática vem sendo abordada.

Também verificamos a presença da História da Matemática relacionada a trechos introdutórios, com o intuito de contextualizar a questão, associando nomes à autoria de determinados conceitos matemáticos, bem como à data de sua descoberta.

Além disso, algumas questões foram selecionadas por terem potencial para incorporar a História da Matemática como possibilidade de solução do problema, por meio de indicações de explorações do conhecimento histórico e de sua importância no ensino.

Com relação ao que se espera da formação inicial dos estudantes no tocante à História da Matemática nos exames, as diretrizes das edições de 1998 e 2000 do Provão que foram localizadas, apresentam que um dos perfis tomado como referência para o graduando seria uma visão histórica e crítica da Matemática, tanto no seu estado atual como nas várias fases de sua evolução, e coloca a História da Matemática enquanto uma tendência em Educação Matemática listada apenas como conteúdo específico para a licenciatura e somente na edição de 1998.

Já no Enade, foi considerado o perfil de um profissional capaz de conceber a Matemática como um corpo de conhecimento rigoroso, formal e dedutivo, produto da atividade humana, historicamente construído, isso para as edições de 2005, 2008 e 2011. Nas edições de 2014, 2017 e 2021 esse perfil não consta nas diretrizes. No entanto, o que se observa é que nessas três últimas edições, apesar de não haver a indicação do desenvolvimento de um perfil voltado para a concepção do conhecimento histórico da Matemática, as questões continuam a abordar as características do perfil das primeiras edições, e de forma ainda mais completa, suscitando mais reflexões do estudante.

Somente na edição de 2005 do Enade há a indicação da avaliação do desenvolvimento de habilidades e competências, por parte do estudante, que lhe possibilitassem perceber a Matemática em uma perspectiva histórica e social, o que é possível perceber nas questões selecionadas dessa edição nas quais são abordados diferentes conceitos e problemas matemáticos e indicações de diferentes métodos matemáticos históricos para suas resoluções.

Com relação à indicação da História da Matemática como um tópico de conteúdo a ser avaliado, assim como no Provão, ela aparece apenas nas indicações específicas para os licenciandos no Enade, havendo uma mudança na descrição do conteúdo no decorrer das edições. Em 2005 e 2008 são indicados dois tópicos diferentes: i) Matemática, História e Cultura: conteúdos, métodos e significados na produção e elaboração do conhecimento matemático; ii) Matemática e Comunicação na sala de aula: interações entre alunos, professor e saberes matemáticos. Uso da História da Matemática, de tecnologias e de jogos. Modelagem e resolução de problemas em diferentes contextos culturais. Em 2011 e 2014, permanece a indicação de dois tópicos de conteúdos, havendo alterações na descrição dos itens: i) Matemática, História e Cultura: conteúdos, métodos e significados na produção e elaboração do conhecimento matemático para a Educação Básica; ii) Matemática, linguagem e comunicação na sala de aula: intenções e atitudes na escolha de procedimentos didáticos; História da Matemática, modelagem e resolução de problemas; uso de tecnologias e de jogos. Já em 2017 e 2021, a indicação de conteúdo se limita a apenas: Contextos históricos e culturais no/do ensino da Matemática.

Assim, podemos concluir que houve transformações no perfil esperado do profissional no que tange à História da Matemática, bem como nos conteúdos específicos para a Licenciatura, que se tornaram menos diretivos, mas, mesmo assim, continuam a figurar nas provas até com mais força, como visto na edição de 2021, na qual as questões abordam a História da Matemática como metodologia para sala de aula e o conhecimento histórico do professor.

Referências

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    29 Abr 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    29 Maio 2023
  • Aceito
    10 Jul 2023
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