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Adolescências e identidades estéticas no cotidiano

Adolescence and aesthetic identities in daily life

Resumos

Este artigo trata das transformações contemporâneas que vêm produzindo diferentes visões de importantes conceitos, entre os quais destaco os de cultura, consumo, estética, adolescência e arte. Faz-se a abordagem desses conceitos, relacionados entre si, tendo como centro da discussão o adolescente. O estudo procura trazer o cotidiano adolescente para o centro da cena, valorizando toda ação e fala como passíveis de investigação da adolescência, considerando a velocidade das mudanças que marcam o tempo e o espaço presentes. A investigação revelou um cotidiano no qual a adolescência é celebrada em nossa cultura, ao mesmo tempo em que é interpelada por uma sociedade fortemente voltada para o consumo, o que interfere na concepção de valores sociais e culturais, produzidos e reproduzidos constantemente.

Adolescência; Cultura; Cotidiano


This article deals with the contemporary transformations that have put forward different views of important concepts, of which we highlight those of culture, consumption, esthetics, adolescence and art. These concepts, related to one another, have been approached having the adolescent as the center of the discussion. The study attempts to bring the quotidian of the adolescent to the center of the scene, valuing every action and speech as a means to enable the investigation of adolescence, whereas considering the speed of the changes that mark the present time and space. The investigation has unveiled a quotidian in which adolescence is celebrated in our culture, at the same time influenced by a society strongly directed towards consumption, interfering in the conception of social and cultural values constantly produced and reproduced.

Adolescence; Culture; Daily life


ARTIGOS ARTICLES

Adolescências e identidades estéticas no cotidiano

Adolescence and aesthetic identities in daily life

Celso Vitelli

Doutor em Educação pela Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS); Professor do curso de Artes Visuais da Universidade Luterana do Brasil (ULBRA). E-mail: cevit@terra.com.br

Contato

RESUMO

Este artigo trata das transformações contemporâneas que vêm produzindo diferentes visões de importantes conceitos, entre os quais destaco os de cultura, consumo, estética, adolescência e arte. Faz-se a abordagem desses conceitos, relacionados entre si, tendo como centro da discussão o adolescente. O estudo procura trazer o cotidiano adolescente para o centro da cena, valorizando toda ação e fala como passíveis de investigação da adolescência, considerando a velocidade das mudanças que marcam o tempo e o espaço presentes. A investigação revelou um cotidiano no qual a adolescência é celebrada em nossa cultura, ao mesmo tempo em que é interpelada por uma sociedade fortemente voltada para o consumo, o que interfere na concepção de valores sociais e culturais, produzidos e reproduzidos constantemente.

Palavras-chave: Adolescência; Cultura; Cotidiano.

ABSTRACT

This article deals with the contemporary transformations that have put forward different views of important concepts, of which we highlight those of culture, consumption, esthetics, adolescence and art. These concepts, related to one another, have been approached having the adolescent as the center of the discussion. The study attempts to bring the quotidian of the adolescent to the center of the scene, valuing every action and speech as a means to enable the investigation of adolescence, whereas considering the speed of the changes that mark the present time and space. The investigation has unveiled a quotidian in which adolescence is celebrated in our culture, at the same time influenced by a society strongly directed towards consumption, interfering in the conception of social and cultural values constantly produced and reproduced.

Keywords: Adolescence; Culture; Daily life.

Neste artigo serão discutidos os conceitos de adolescência, identidade, consumo e estética de um grupo específico de adolescentes1 1 Refiro-me aos doze adolescentes (seis meninos e seis meninas de 14 a 17 anos) de escolas particulares de Porto Alegre/RS - Brasil que foram entrevistados para esta pesquisa, todos pertencentes às classes A e B. Previamente, esses adolescentes, e mais 268, já haviam sido entrevistados por mim por mio de um questionário escrito com 27 perguntas. Tal questionário serviu de roteiro para algumas das questões formuladas durante as entrevistas gravadas no período de maio a agosto de 2001. . Proponho aqui uma revisão de tais conceitos, primeiro: a partir de diferentes exemplos, farei uma discussão sobre algumas perspectivas históricas no que se refere ao modo de entender adolescência e juventude; segundo, os conceitos que se têm sobre seus grupos e a relação dos mesmos com as diferentes identidades; o papel do consumo (o shopping como espaço de lazer e identidade) e, por último, as visões que esses jovens têm da (sua) estética contemporânea e as relações que estabelecem com a arte e a escola. Apresento também análises envolvendo os depoimentos dos adolescentes com algumas produções de singularidades e diferenças existentes na sociedade. Devo salientar que os jovens entrevistados desta pesquisa são apenas um recorte da adolescência, respondendo sobre "o que seria hoje ser um adolescente de classes A e B". Interessa-me, sobretudo, a possibilidade que a reunião (revisão) e o cruzamento desses conceitos tem de ajudar no entendimento das práticas escolares cotidianas e, principalmente, aquelas relacionadas com o ensino de Artes. Desta forma, inicia-se a seguir o subtítulo que apresenta os adolescentes nos seus diferentes espaços e tempos.

Cartografias do cotidiano adolescente

53º dia de férias - quarta-feira, 28

De manhã fiz meu dever de teoria e depois do almoço fui com Elsinha ver Dindinha. Voltamos de ônibus e, à tarde, estudei solfejo. Assisti à bênção, dei duas voltas pela floresta com Dona Lídia e as meninas e brinquei com um cachorrinho parecido com o Puck (que saudades dele, meu Deus!), que encontrei na farmácia. Dormi em casa de minhas amigas.

Por mais estranho que pareça, estou fazendo regime para engordar. Comecei a emagrecer tanto que meus ossos se tornaram salientes e eu me vi obrigada a comer muito mais, para evitar qualquer fraqueza ou tuberculose (ANDRADE, 1985, p. 65).

Essas coisas gostosas de ser adolescente é que me fazem odiar a idéia de fazer 20 anos daqui a dois dias. O jeito é tentar conservar o coração de adolescente e fazer muita ginástica pro corpinho não cair, porque o tempo tá passando (GUIMARÃES, 1992, p. 90).

Pra mim não interessa se é gordo, magro, negro, branco, amarelo. Eu não gosto de me sentir gorda. Acho que ninguém gosta, né? Então, a minha família é uma geração assim de gordinhos sabe, tem peso acima da média, entendeu? Não que eu passe só de vegetais, porque eu não passo. Mas eu me cuido. E (...) eu tenho vários amigos gordos, amigos bem magros, amigos negros. Eu não tenho preconceito nenhum com isto, cada um cada um. Se não quer se cuidar o problema é dele, entendeu? (Priscila)

Optei por iniciar com essas três citações, tentando mostrar, desta forma, não só os diferentes tempos de adolescências, mas a marca que cada texto nos traz, como documentos em recorte das experiências vividas que narram testemunhos de cada época2 2 Sobre as mudanças existentes em cada época, a reportagem da Veja ( Veja Jovem, set. 2001, p. 27) ilustra bem as transformações acontecidas nos registros dos diários das adolescentes. As meninas continuam fazendo diários, porém, na internet já existe um diário on-line. "Vale colocar na rede tudo o que recheia um diário comum: confissões, desabafos, fotografias. A diferença é que, como numa sala de bate-papo, quem quiser pode ler. Mais do que isso: é possível dar palpites. Existe um campo em que qualquer pessoa pode deixar sua mensagem. 'É uma mudança completa na maneira de lidar com a privacidade', constata a psicanalista paulista Iraci Galias". , de cada sociedade (através do cotidiano) e dos diferentes tipos de adolescências. Através da leitura de tais depoimentos, podemos entender um pouco mais sobre quem somos ou, quem sabe, fazer valer o que nos diz Italo Calvino (1990) quando pergunta e afirma:

Quem somos nós, quem é cada um de nós senão uma combinatória de experiências, de informações, de leituras, de imaginações? Cada vida é uma enciclopédia, uma biblioteca, um inventário de objetos, uma amostragem de estilos, onde tudo pode ser continuamente remexido e reordenado de todas as maneiras possíveis. (CALVINO, 1990, p. 138)

Nessas "enciclopédias" às quais se refere o autor, encontrei registros na escolha dos trechos selecionados, reunindo, não coincidentemente, falas de três meninas sobre os cuidados com o corpo3 3 Nas afirmações que se faz hoje sobre os cuidados do corpo, podemos pensar também sobre o conhecimento de si, como aquilo que Foucault afirma em uma passagem de A Hermenêutica do Sujeito, quando se refere a Platão e a sua relação com o conhecimento divino. A comparação entre o que nos dizem as três meninas e o que escreveu Foucault marca, evidentemente, épocas distintas. Porém, falar sobre o conhecimento e os cuidados de si nos faz rever práticas que são recorrentes tantos nos textos clássicos examinados por Foucault, quanto nas mais prosaicas atitudes nos dias de hoje. Foucault afirmava que Platão fazia do "conhecimento do divino a condição do conhecimento de si" (2004, p. 89). Assim, passa a ser recorrente a seguinte pergunta: E o que seria olhar para si mesmo hoje? , mesmo em épocas distintas (1942 - 1992 - 2002). Começando com a citação de Julieta Drummond de Andrade (1985), ela registra em seu diário os acontecimentos das suas férias nos anos de 1941 e 1942. Andrade tem uma narrativa que marca sua época4 4 Interessante comparar os prefácios dos dois diários, o de Julieta Drummond de Andrade, que, em 1942, começa contando sobre um caderno que ela ganhou do seu "papai", no qual irá registrar os acontecimentos das suas próximas férias, e que será este o seu diário. Já Maria Mariana (que não está presente na citação anterior, mas o texto de Ingrid Guimarães faz parte do livro Confissões de adolescente), inicia seu texto (do diário) com uma poesia na qual ela se diz ser, entre outras coisas, "vaidosa demais, perdida demais, gostosa demais". Nesta pequena comparação, narram-se diferentes posições do adolescente diante da sua sociedade, de como ele(a) se vê, como se refere a si mesmo e aos outros e sobre aquilo que se pode ou não falar em determinadas épocas. através de seus registros do cotidiano. São registros sobre as saídas que fez com as amigas, com as tias, algumas idas às sorveterias, casas de doces; enfim, em nenhum momento sequer no seu diário aparece algo que se refira a namoro, sexo ou qualquer outra intimidade. Logicamente, é um registro daquilo que se poderia falar sobre a sua época e também aquilo que se permitia confessar, mesmo que na mais secreta intimidade, no diário.

Já o texto de Ingrid Guimarães (1992) salienta o imperativo da juventude como uma fase na qual muitos querem permanecer, completando-se com o aviso que ela nos dá sobre os cuidados com o corpo. Certamente a linguagem e a liberdade de Ingrid são outras, 50 anos separam essas falas. No depoimento de Priscila (2002), com seus mesmos 14 anos de Julieta Drummond de Andrade (1942), damos um salto de sessenta anos, quando observamos vocabulários e hábitos diferentes. Priscila traz (dentro do que possa parecer uma simples resposta a um questionamento) um apontamento sobre a aparência das pessoas muito diferente daquele que Julieta faz quando se refere, por exemplo, a seus amigos e amigas - quando Priscila os diferencia como sendo amigos gordos, magros, negros, ela carrega em sua fala uma herança cultural que classifica as pessoas pela aparência, pela raça, pelo corpo. Impressiona-me também, além de outros registros sobre o mundo adolescente, a manutenção, ou melhor, a preocupação sempre existente sobre os cuidados de si e, principalmente, com o corpo, presentes nessas falas. São tempos diferentes que apresento aqui, porém, eles nos contam um pouco sobre as diferentes vidas de três meninas, ensinando alguns hábitos e práticas sociais referentes às épocas pelas suas experiências de vida, seja através dos seus diários (Julieta e Ingrid) seja da entrevista gravada (Priscila).

Deve ficar claro que os adolescentes investigados aqui estão em posições de passagem, eles podem partir de ou para várias direções, com direito a tudo o que engloba essa posição - a posição "adolescentes", marcada muito mais pelo início desta fase, evidenciada pela maturação física, do que pelo seu término5 5 Mais adiante abordarei este tema, apoiado na visão de alguns autores que se referem à fase final da adolescência como algo não demarcado. . No corpo adolescente falam a criança, o adulto que está vindo e o próprio adolescente.

No corpo onde residem o adulto, a criança e o adolescente coexistem diferentes vozes, que vão desde uma fala mais madura, reflexiva, até uma simples resposta singela, incluindo-se aí as trocas de lugar. Roberto (14 anos), quando relata seus sonhos6 6 No questionário escrito, ele havia respondido que seus ideais de vida seriam: ser médico e ter uma família. de vida e os planos para o futuro, nos fala como um adulto, quando diz:

(...) não sei se eu posso te dizer agora. Isso acontece quando a gente começa a viver (...) Agora eu já não penso mais em ser médico, penso fazer outra coisa que me interessa mais. Acho que no decorrer dos anos a pessoa vai mudando e vai mudando os seus ideais também.

E quando perguntado se ainda gostaria de ser médico, ele afirma, diante dos seus 14 anos, quase na voz de uma criança indecisa:

Não gosto muito dessas coisas de hospitais. Daí eu pensei (...) tá, eu abro um consultório pra mim, mas tem estágio (...) daí eu vou ter que conviver com aquilo tudo.

Nos depoimentos de Roberto, estão presentes a certeza e a visão adulta da possibilidade de mudança no surgimento de diferentes ideais no seu caminho para a maturidade: a dificuldade na escolha profissional, as trocas de ideais - e a insegurança do menino diante das obrigações de uma profissão que lida diretamente com o compromisso da vida e o impedimento da morte, resumindo, dessa forma, o "aquilo tudo" a que ele se refere. Várias vozes atuam no discurso de Roberto as quais poderíamos chamar de vozes da sociedade (pais, amigos, mídia, etc.). Portanto, esse adolescente também questiona que, nem sempre partindo de uma estação na qual estamos, saberemos se o destino será sempre para frente; são sempre processos de ir e vir.

Quantas vezes nos deparamos com a fala do adulto e da criança na expressão do adolescente? A "criança-adolescente" pode chorar descompassadamente diante da mais trivial negação a um pedido, por exemplo, de ida a um show musical ou da não-compra de determinado objeto. O "adolescente-adulto" pode aparecer no claro argumento sobre um ponto de vista a respeito de determinado assunto. Além desses "descompassos", o adolescente vive em uma sociedade que apresenta um leque de identidades firmadas sob o ponto de vista daquilo que se apresenta a respeito dos jovens nas mídias: como são representados pelas Artes (no cinema, no teatro, nas novelas, nas artes plásticas), identidades firmadas através de imagens e comportamentos que atendem à demanda de uma sociedade de consumo. Como escreve Baudrillard (1991, p. 25), "podemos definir o lugar do consumo: é a vida cotidiana7 7 O autor explica que a vida cotidiana não é apenas a soma de fatos e gestos diários, a dimensão da banalidade e da repetição, ele acredita que seria um sistema de representação (BAUDRILLARD, 1991). "A quotidianidade constitui a dissociação de uma práxis total numa esfera transcendente, autônoma e abstrata (do político, do social e cultural) e na esfera imanente, fechada e abstrata, do privado" (BAUDRILLARD, 1991, p. 25). ". Daí a importância da aproximação deste cotidiano (rotina diária do adolescente - na escola - em casa) como locus de análise.

As observações que têm sido feitas sobre a fase da adolescência podem coincidir ou não com aquilo que ela nos mostra do seu cotidiano entre nós. Mesmo com sua face visível, a adolescência conserva um tesouro oculto no seu cotidiano que faz com que nunca possamos esgotá-la. Quando escrevo tesouro oculto, refiro-me ao surgimento de novas gírias, de novos comportamentos que aparecem tão rapidamente que algumas vezes nós (adultos) nem chegamos a tomar conhecimento e, quando chegamos, já fomos ultrapassados pelos mesmos.

Falar de adolescência implica falar das qualidades que a definem, estabelecidas por discursos, parâmetros, tanto no senso comum como na reflexão acadêmica. Se mudam os discursos, as imagens e os estilos, mudam também as qualidades e os parâmetros estabelecidos anteriormente. Para Stuart Ewen, "o estilo, hoje, é uma cacofonia incongruente de imagens espalhadas ao largo da paisagem social" (1991, p. 30, tradução minha)8 8 El estilo hoy es una cacofonía incongruente de imágenes esparcidas a lo largo del paisaje social. . O estilo, completa ainda o autor, "faz afirmações, mas não tem convicções" (EWEN, 1991, p. 30, tradução minha)9 9 Hace afirmaciones, pero no tiene convicciones. . Através de diversos anúncios norte-americanos sobre moda, Ewen desvenda as mais diversas possibilidades nas quais um sujeito pode enquadrar-se nas mais variadas categorias de estilo oferecidas pela mídia. São mensagens (principalmente televisivas), para o autor, que definem estilo segundo a aparência das pessoas, relacionada a tudo o que estas possuem ou que devem possuir. "Este modo de vida está marcado por uma sucessão interminável de objetos materiais, ainda que se trate de uma vida que curiosamente parece flutuar mais além dos confins do mundo real. Isto é essencial para a magia do estilo, sua fascinação e encanto" (Ewen, 1991, p. 30, tradução minha)10 10 Este modo de vida está marcado por una sucesión interminable de objetos materiales, aunque se trata de una vida que curiosamente parece flotar más allá de los confines del mundo real. Esto es essencial para la magia del estilo, su fascinación y encanto. .

O autor afirma ainda que do outro lado da tela encontra-se o espectador inserido num cotidiano muito longe desta riqueza (que define estilo), com suas roupas baratas, não vivendo em castelos e com suas contas acumuladas. Ele segue escrevendo sobre a relevância que tem o estilo na vida das pessoas, estilo este pautado na riqueza, na obtenção de determinados objetos, mesmo para aquelas que não os conseguem ter. Dessa forma, Ewen salienta a importância do estilo na busca de identidade, do estilo presente na moda, no futebol, etc. Finalizando, o autor acrescenta que "o estilo, cada vez mais, tem se convertido no idioma oficial do mundo mercantil" (EWEN, 1991, p. 39, tradução minha)11 11 El estilo, cada vez más, se há convertido en el idioma oficial del mundo mercantil. , e mais, "o estilo, por outro lado, é um componente profundo da subjetividade, entrelaçado com as aspirações e ansiedades das pessoas" (EWEN, 1991, p. 39, tradução minha)12 12 El estilo, por outra parte, es un componente profundo de la subjetividad, entrelazado con las aspiraciones y ansiedades de la gente. .

Ser jovem, manter-se jovem é a palavra do nosso tempo. Mas nem sempre foi assim. O ar sisudo e senil foi meta dos jovens ainda no início do século XX, na qual toda uma linha de produtos atendia à demanda de um envelhecimento precoce. No seu texto para a Folha de S. Paulo (20/09/1999), Sevcenko (1998) elenca uma lista de cuidados referentes a esse envelhecimento que vão desde o uso de casacas, cartolas, bengalas, óculos e monóculos, até uma pomada para amarelar os dentes. Como ele mesmo explica, fizeram-se fortunas vendendo "pacotes de velhice instantânea". As mulheres também acompanhavam o padrão masculino, usando enchimentos, anáguas, saiotes, cabelos presos, chapéu e véu, que ocultavam o rosto. Na verdade, a mudança para a valorização de "ser jovem", segundo Sevcenko (1998, p. 3), veio com o cinema e a invenção do close-up, tornando a juventude o imperativo do momento. Ampliado na tela, o rosto deveria ser jovem. Ainda assim, com aparente jovialidade, o mundo dos adultos mantinha-se com seus saberes e segredos estritamente próprios, com seus códigos e distinções entre o bem e o mal e seus valores definidos, mesmo que questionáveis.

Para Jésus Martín Barbero (2000), o mundo dos adultos criou espaços próprios de saber e comunicação sobre a vida social, nos quais as crianças eram apartadas de determinados conhecimentos e assuntos. Existia um filtro imposto pela própria sociedade para as imagens mostradas, por exemplo, dentro dos livros feitos para as crianças. Mas esse filtro do discurso sobre a imagem da criança e do adolescente se rompe em parte pela ação da televisão, como um dos agentes que informa e transforma a circulação da informação, fazendo com que o discurso da família e o da escola deixem de ser a única fonte de autoridade sobre os assuntos políticos, sociais, sexuais, etc. Essas mudanças carregam consigo a formação, a transformação e a presença de novas identidades.

Gerações se sucedem e a cada uma delas são designadas terminologias diferentes. Começando pelos anos 1950, a escritora italiana Luisa Passerini escreve sobre tal década e sobre as terminologias que foram se constituindo socialmente em torno das gerações de adolescentes nas quais

(...) muitos notaram que foi adotada para os adolescentes uma terminologia que acentuava a estranheza deles em relação à sociedade existente: "casta", "tribo", "subcultura", expressões derivadas dos estudos etnográficos sobre povos 'diferentes' do sujeito considerado central nas sociedades ocidentais. (PASSERINI, 1996, p. 355)

Ainda sobre os anos 50, Abramo (1997) diz que "os rebeldes sem causa" (assim eram chamados os adolescentes da época) corporificavam a transgressão e a delinquência. "De certa forma, é nesse momento que assume uma dimensão social a noção que vinha sendo cunhada desde o final do século passado a respeito da adolescência como uma fase turbulenta e difícil" (ABRAMO, 1997, p. 30).

É uma geração marcada pelo alucinante rock'n'roll, música que esboça um comportamento ligado à turbulência pela qual passavam os jovens. Nos anos 1960 e 70, vivia-se intensamente em função das mudanças nos campos da política, do amor livre, da revolução sexual (anos marcados pela presença ativa do jovem adolescente na luta a favor das mudanças dentro desses campos). Abramo (1997) apresenta a juventude como portadora da possibilidade de profundas transformações sociais, recusando a cultura estabelecida através de manifestações do movimento hippie, que levava os jovens a se mudarem para comunidades à parte do meio social onde viviam e "questionavam os padrões de comportamento - sexuais, morais, na relação com a propriedade e o consumo" (ABRAMO, 1997, p. 30). Segundo a autora, o medo da sociedade era duplo, "por um lado o da reversão do sistema; por outro, o medo de que, não conseguindo mudar o sistema, os jovens condenavam a si próprios a jamais conseguirem se integrar ao funcionamento normal da sociedade" (ABRAMO, 1997, p. 30).

Toda essa presença ativa da geração de 60 com o compromisso político e as mudanças de padrões de comportamento é vista por Hobsbawm (1995) também como uma realização de motivos pessoais. Ele afirma que "em algumas bocas, significava simplesmente: 'Chamarei de política qualquer coisa que me preocupe', como num título de um livro da década de 1970, Fat is a feminist issue (Gordura é uma questão feminista)" (HOBSBAWM, 1995, p. 326).

De qualquer modo, escolas, universidades, família, enfim, grande parte dos segmentos da sociedade mobilizaram-se na direção de mudanças nos campos já citados. Aos jovens dos anos 60 podemos atribuir a qualidade de contestadores (cientes de todos os limites e ações difusas mencionadas por Hobsbawm, o qual alerta para a ambiguidade dos atos praticados por esses jovens, que podem ser tanto de cunho político quanto individual). Isso não quer dizer que nos dias de hoje não existam manifestações nos campos político, social, sexual, etc. De formas diferentes, a juventude participa e tem influência nesses campos. As formas de participação hoje podem ser mostradas através da música, da criação de novos estilos, de diferentes estéticas, de grupos de ação solidária. Sobre os grupos de ação solidária, Regina Novaes (2000), ao relatar sua experiência com a juventude carioca e a formação do grupo GerAção13 13 Segundo a autora, GerAção é um grupo "composto por jovens cariocas de classe média que se organizaram no âmbito da Campanha contra a Fome" (NOVAES, 2000, p. 49). Ainda segundo Novaes (2000, p. 50), esse grupo nasceu no terceiro ano da Campanha contra a Fome. "Os organizadores queriam mais do que a participação de um pequeno grupo de jovens de classe média; eles queriam motivar a organização de muitos grupos em diferentes espaços e segmentos. Os jovens do Grupo GerAção resolveram, então, buscar uma aproximação com os jovens de Vigário Geral. Já havia uma idéia de incentivar a política da "boa vizinhança" entre asfalto e favela, que partiu do movimento Viva Rio - também nascido a partir das grandes feridas da cidade. Através dessa política, incentivam-se os jovens de colégios de classe média a olhar para a favela e para os habitantes de lá e a oferecer trocas de serviços" (NOVAES, 2000, p. 50-51). , ressalta a importância desse tipo de participação dos jovens e a aposta política que eles fazem ao engajar-se nesse tipo de movimento:

Pude apreender que a aposta política que o grupo estava fazendo naquele momento pressupunha mudanças de sentimentos e de percepções. Controlar o próprio sentimento do medo e questionar preconceitos bastante interiorizados no processo de socialização eram os dois passos importantes para iniciar uma intervenção social desse tipo. (NOVAES, 2000, p. 51)

A autora deixa claro que ainda seria uma minoria o número de jovens engajados em trabalhos sociais, mas lembra, nesse momento, a comparação feita entre a geração contemporânea e os movimentos estudantis nos anos 1960, argumentando que "esquecemos que nos chamados 'anos rebeldes' e, também, nos 'anos de chumbo', os jovens que participavam dos movimentos constituíam a minoria. Não representavam, de modo algum, estatisticamente, a juventude de uma época" (NOVAES, 2000, p. 52). O depoimento de Novaes ressalta o que ela chamaria de "novas" formas de participação que se esboçam no presente. Esse tipo de ação dos jovens poderia ser visto também como uma das possibilidades de participação que eles encontram nos grupos de coetâneos. Por exemplo, a adolescente Fátima diz:

Eu já participei do PJE, que é a Pastoral da Juventude Estudantil, que trabalha com os jovens de escola e com jovens que já saíram das escolas. Trabalham por um mundo melhor. É ligado à Igreja Católica, não precisa ser católico pra entrar, mas é uma coisa que está no mundo inteiro, pelo Brasil inteiro, muito forte, e que procura sempre trabalhar assim: trabalhar a questão do voto, te trabalhar, te ensinar a ser verdadeiro, te ensinar os verdadeiros valores, aquela coisa toda, e te ensinar a ajudar as outras pessoas. É o que eu tenho contato, que não seja coisas que saem na televisão e em jornal, que eu sei, posso te explicar o que seria o PJE. Só que eu entrei na PJE com aquela utopia de mudar o mundo, aquela coisa toda, por Jesus Cristo. Entrei lá, virei as minhas costas e tive que ir embora, porque eu vi manipulação lá dentro, eu vi uma massa jovem embaixo de um palco sendo manipulada por um padre.

Mesmo apresentando os prós e contras da instituição, a menina deixa claro, mais adiante, ainda dentro dessa mesma resposta, que acredita nas "boas idéias" do PJE. Para Fátima, esse espaço (o PJE) pode ser encarado como uma busca de novas referências, de novos comportamentos, questionando os valores que muitas vezes se diferenciam do grupo ao qual ela pertence. É evidente que não podemos afirmar que o tipo de participação de Fátima seja marcado como uma "expressão da juventude", uma vez que acredito ser ainda minoritário o número de adolescentes envolvidos nesse tipo de projeto.

A experiência no movimento de participação social que teve Fátima pode ser vista sob dois ângulos: o movimento de entrada no projeto, a vontade de participar, de fazer algo pela sociedade, sua "utopia", como ela mesma diz, e o movimento inverso, quando ela revela a manipulação que presenciou, existente no discurso de um padre diante da massa juvenil. Outros exemplos também poderiam ilustrar as diferentes participações de grupos de jovens. Refiro-me às "diferentes participações" levando em conta os exemplos citados e as especificidades de cada cidade no Brasil. No Rio de Janeiro, por exemplo, o trabalho com os moradores das favelas teria atuação diferente do trabalho que o PJE faz em algumas escolas de Porto Alegre. A atuação de Fátima no PJE pode ser vista também como uma revolução molecular, como nos diz Paulo Sérgio do Carmo (2001). O autor, ao referir-se aos jovens de hoje, diz que eles "não estão preocupados em partir para grandes projetos de transformação social. Abrem-se a toda espécie de rebelião, sem objetivo único" (CARMO, 2001, p. 261). Ele explica que essas pequenas iniciativas, mesmo que não tenham grande visibilidade na mídia, "contribuem para a transformação social e dão esperanças de que contestar, resistir e propor alternativas não é uma atitude ultrapassada e fora de propósito" (CARMO, 2001, p. 262).

Outros exemplos de participação dos jovens podem ser vistos na reação de negação que certos grupos têm em relação a determinados padrões estéticos impostos pela mídia. Existe na mídia um apelo acirrado pelo erotismo, valorizando os corpos delgados, a barriga de fora. Alguns grupos responderão a esse erotismo negando tal estética. A leitura de Contardo Calligaris (2000) sobre o uso do piercing pelas meninas seria um bom exemplo dessa negatividade: ele refere-se ao adorno como sendo

(...) uma lembrança do nenê de umbigo apenas cicatrizado. É uma curiosa distração lúdica no caminho do órgão genital, ou uma alusão a uma fechadura de castidade. É, sobretudo, uma maneira de chamar o olhar para o encontro permanente, não tão longe da vagina, de uma abertura do corpo metálico e duro. (CALLIGARIS, 2000, p. 73)

Já para Fred Góes, o piercing funciona como "(...) elemento que desperta sentidos, acorda e intensifica zonas corporais. Com o piercing, ou 'brinco', como denominam os iniciados, o corpo torna-se um mapa de agulhas, argolas, pinos marcam lugares de intensidade únicas, singulares. São marcas de memória" (GÓES, 1999, p. 38).

Eu diria mais, são marcas estéticas de determinada época. Marcas também "a ferro quente", como revela Calligaris (1996) em outro estudo sobre esse tipo e das demais marcas (etiquetas14 14 É pertinente, neste momento, apresentar algumas das questões levantadas por Calligaris (1996, p. 112) sobre o uso das etiquetas, nas interrogativas que se seguem: "Quando e para onde se foram os tempos, quando a etiqueta do alfaiate estava no bolso de dentro do casaco, quando raros e minúsculos bottons manifestavam a fervente adesão a um partido ou a uma idéia, ou então testemunhavam um mérito decisivo na frente da comunidade? Em outras palavras, por que vivemos tempos tão apaixonados pelas marcas? Por que somos tão desejosos de ser etiquetados ou marcados?" , tatuagens). Na própria pele, algumas gangues, raças, marcam com ferro a sua identificação, "são inscrições simbólicas que asseguram e confirmam que seus portadores, por exemplo, são membros de pleno direito de sua comunidade" (CALLIGARIS, 1996, p. 111), e mais, a "marca no corpo" poderia ser traduzida como lugar de identidade.

Outro exemplo, mais leve, seria o dos meninos com suas bermudas compridas de cintura baixa, deixando parte da cueca aparente, esboçando-se assim quase um modo infantil de se vestir. Sobre o modo de ser e vestir do adolescente, Calligaris (2000) diz que "a estética da adolescência atravessa assim todas as idades. E os continentes. Os adolescentes são os mesmos no mundo inteiro ou, ao menos, no mundo ocidental" (CALLIGARIS, 2000, p. 73). Nas palavras do autor: "Uma mesmice muito americana" (CALLIGARIS, 2000, p. 73). Ao referir-se à adolescência, ele afirma que o uso desse termo teve seu nascimento nos Estados Unidos. Haja vista, saliento apenas um exemplo, dos muitos sobre a influência americana - Pierre Bourdieu escreve: "(...) os adolescentes de todos os países que vestem baggy pants, calças cujo fundilho bate no meio das pernas, provavelmente desconhecem que a moda que julgam ultrachique e ultramoderna nasceu nas prisões do Estados Unidos, assim como certo gosto por tatuagens!" (BOURDIEU, 2001, p. 85).

Retomando os anos 1960 e 70 no Brasil, e em outros países, especialmente na América Latina, víamos naqueles jovens facções moderadas e radicais que se mostravam em reivindicações das mais diversas, por exemplo, contra o regime militar. Mostrava-se um engajamento mais visível dos jovens em relação aos acontecimentos políticos. Dos anos 80 para cá, poucas manifestações (em termos de Brasil) mostram uma participação mais efetiva dos jovens. De maior relevância, vimos a atuação dos caras-pintadas no impeachment do presidente Fernando Collor de Melo, em 1992. Um dado interessante a ressaltar sobre esse acontecimento, segundo Carmo (2001, p. 164), é que "mais de dez mil estudantes caminhavam em passeata de protesto pelas principais avenidas de São Paulo15 15 Mais adiante em seu texto, o autor escreve que as passeatas se proliferaram pelas demais cidades do Brasil. , a maioria deles oriundos de colégios da rede privada". Ainda sobre a manifestação dos caras-pintadas, alguns trechos da revista Veja, em agosto de 1992, tentam descrever o adolescente manifestante da época e a influência da mídia16 16 A minissérie Anos rebeldes, realizada pela Rede Globo de Televisão, em julho de 1992, ambientava-se na época do movimento estudantil de 1968, dando ênfase às manifestações dos grupos jovens da época. (televisão), nas seguintes frases: "Foram momentos poéticos, nos quais se confundiram ficção e realidade, passado e presente, a minissérie Anos rebeldes e a CPI de PC. Alegria, alegria: a rebeldia juvenil está de volta, juntando mauricinhos e militares, skatistas e esquentados" (Veja, ago. 1992, p. 18). E, acrescentando, a reportagem aponta os participantes das cidades do Rio de Janeiro e de São Paulo como sendo "uma garotada bonita e bem-humorada, habituada a freqüentar shopping centers e curtir a praia, entendeu muito bem o que está se passando nas altas esferas do poder" (Veja, ago. 1992, p. 18). Nos dias de hoje, pode-se citar o acampamento de jovens em Porto Alegre, vindos de diversos estados do Brasil e de outros países para participarem do I Fórum Social Mundial 17 17 O I Fórum Social Mundial foi realizado na cidade de Porto Alegre, entre 25 e 30 de janeiro de 2001, contrapondo-se, em ideias e em participantes, ao Fórum Econômico Mundial de Davos, que aconteceu simultaneamente na Suíça. Os debates principais giraram em torno de grandes temas como a produção de riquezas e a reprodução social, afirmação da sociedade civil e dos espaços públicos, poder político e ética numa nova sociedade, reunindo palestrantes e debatedores de diferentes países. .

Enfim, não faço aqui uma descrição minuciosa de todos os acontecimentos que marcaram cada época. Não se trata também de uma análise que resultaria na "cobrança" de uma participação mais efetiva dos jovens na atualidade. A análise pretendida se debruça sobre o entendimento de novos comportamentos e estéticas, hoje.

Adolescentes e jovens em form(ação)

Há sempre algo novo que nos motiva a buscar não só respostas, mas questionamentos sobre o tempo presente. Qualquer fase da vida, faixa etária, grupo social, traz consigo um conceito relacional, que estará ligado a símbolos e valores pertinentes de cada época. Por exemplo, para o adolescente Hermes, o conceito de liberdade está atrelado ao seu "bom comportamento" como filho, como estudante. Vale a pena ler seu depoimento sobre aquilo que ele considera viver uma "vida livre":

Porque hoje em dia, tudo não é assim totalmente livre. Por mais que dizem que a gente tá num país livre. Mas acho que livre, assim é [...] acho que tu conquista essa liberdade assim até pelo fato de tu ir ao shopping, livre assim se eu quiser fazer uma viagem com os meus amigos, por exemplo, assim, meu bom comportamento, minhas boas notas, ser um bom filho, assim é um passo pra liberdade. Por isso eu me considero livre, né?

Interessante visualizar as versões plurais do conceito de liberdade que tem Hermes com seus 15 anos de idade. Nesse depoimento, em especial, vemos a singularidade de um adolescente posicionando-se através do seu sentimento de autonomia, que se realiza por meio da sua saída de casa para um shopping center. Esse tipo de comportamento traz à tona uma reflexão maior sobre a sociedade contemporânea, levando em conta uma concepção de mundo a partir do consumo. Um dos exemplos de lugar escolhido por Hermes, quando se referia à sua saída de casa como "liberdade", foi o shopping center. Nesse caso, como afirma Gilles Lipovetsky (2007, p. 70), o "(...) consumo mantém relações íntimas com a questão do tempo existencial. Em uma época de consumo emocional, o importante já não é tanto acumular coisas quanto intensificar o presente vivido".

Por isso, não é vã nossa preocupação com os rumos da adolescência como fase de vida e como expressão de determinada estética. Depositamos nas crianças e adolescentes projetos, ilusões, temores, transformando os mais jovens no símbolo do surgimento de alternativas para a sociedade contemporânea. Sobre o vestibular e a escolha profissional, vemos, no depoimento de Fátima, uma situação que, na verdade, não é nova, mas ressalta as imposições feitas tanto pela família quanto pela sociedade sobre as condições de oferta profissional, construídas dentro de certas restrições que refletem a situação dessa época:

(...) a primeira coisa que eu estou sofrendo agora é o vestibular. Eu quero fazer o vestibular pra Artes Cênicas. E é um problema fazer o vestibular pra Artes Cênicas porque apesar de ser na UFRGS que não precisa pagar é um problema, por quê? Porque ator passa fome, porque arte não põe comida na mesa (...) e aquela coisa toda. Então eu tive que escolher uma profissão paralela às Artes Cênicas, então me chamou muito a atenção, Psicologia. Tipo assim, eu vejo na minha aula todo mundo sofrendo este impasse. Os pais estão ditando regras! Os pais estão dizendo: - Tu vais fazer o vestibular. Pra que tu vai fazer o vestibular. E aí acontece o quê? Chega todo mundo na aula e ninguém tá interessado no vestibular, ninguém tá interessado naquela profissão! Entendeu?

Mais do que o peso existente de uma escolha profissional, o depoimento de Fátima vem carregado com a força de certos estereótipos sedimentados na sociedade, referentes a certas profissões - tanto de sucesso quanto de fracasso, de altos e baixos status. Mas a história quase sempre se repete. Rosa Fischer já escrevia sobre os conflitos existentes na escolha profissional das adolescentes, ao analisar um trecho da série Confissões de Adolescente:

O conflito gerado pela escolha da profissão, por ocasião do vestibular - e que existe quase exclusivamente para as famílias de classe média e alta -, embora seja apresentado criticamente, não questiona nem o ensino nem a escola, concentrando-se no estado de perdição da adolescente Bárbara - aliás, extremamente bem explorado no roteiro: 'Por que eu tenho que fazer uma faculdade? / 'É fogo, com 16, 17 anos você já tem que saber o que vai ser para o resto da vida...' - e na pressão que lhe faz o pai, para que faça logo sua escolha ('Você não vai ter papai para te sustentar a vida toda') . Entre imagens bem humoradas de vestibulandos perturbados pelo volume de informações que decoram, e depoimentos de médicos e professores falando de baixos salários e de péssimas condições de trabalho, mostra-se principalmente a dificuldade de diálogo entre pai e filha, gerada por uma situação que diz respeito ao modo como se faz a educação dos mais jovens em nossa sociedade: criados desde a infância sem qualquer comprometimento social, sem um papel significativo, os adolescentes de classe média (diferentemente dos jovens das classes populares, que ingressam no mundo do trabalho muito cedo) são repentinamente chamados a decidir-se sobre uma profissão, decisão que passa necessariamente pelo vestibular. (FISCHER, 1996, p. 165)

Ilustrado por esse exemplo, arrisco a falar da construção de certos conceitos de identidades associados à escolha profissional. Seriedade, compromisso, posição social (financeira) elevada, etc., parecem pertencer somente a um lado, o do psicólogo - para o artista, sobra a incerteza de um futuro profissional, o descrédito e as outras descrenças que cercam a profissão. "Nossa posição no mundo - em todos os sentidos - depende de nossos sucessos ou fracassos: o sangue que carregamos ao nascer não é garantia de nada, e tampouco nos condena a nada" (CALLIGARIS, 1996, p. 6). A escolha que Fátima faz, em relação à Psicologia, pode ser vista como uma forma mais leve de projetar seu futuro.

A administração que os adultos exercem sobre seus filhos, é sabido, começa desde cedo, e não aparece somente na fase da adolescência. Para a criança, a garantia de uma vida salutar está centrada no compromisso da gerência que os adultos têm sobre suas vidas, dando-lhes amor, alimento, enfim, todas as condições necessárias para se viver bem. Calligaris (2000) nos apresenta o termo "sacralização da infância"; para ele, os pais e adultos em geral veem nelas "consolação e esperança" e, graças a estas, "os adultos estendem o sentido e a expectativa de suas vidas para além do limite estreito de sua sobrevivência individual" (CALLIGARIS, 2000, p. 65). O autor vai mais além, em relação à infância, argumentando que ela "preenche a função cultural essencial de tornar a modernidade suportável" (CALLIGARIS, 2000, p. 65). Essa suportabilidade se pauta no prazer estético que o adulto geralmente tem ao se deparar com uma criança, fazendo-lhe agrados, brincando com ela. Das crianças não se exigem tantas respostas imediatas quanto dos adolescentes. Quem não se pergunta sobre como seremos gerenciados, administrados politicamente (em todos os âmbitos: sociais, culturais...) por esta juventude no futuro? Assim, essas crianças e jovens adolescentes acabam por se tornar os depósitos de valores futuros que a sociedade pôs em prática no presente. Dessa forma, o debate sobre este tema acaba sendo, de certa forma, uma reflexão que a sociedade faz sobre si mesma.

As pesquisas sobre os jovens, em geral, pautam-se também numa perspectiva de futuro, ou do que ainda está por se realizar. Fazendo um levantamento dos autores que estudaram a fase da adolescência e os modos pelos quais ela é lida e interpretada na nossa sociedade, Fischer (1996, p. 41) aponta, numa reportagem publicada pela revista IstoÉ, em 1994, uma das descrições do adolescente dos anos 1990, no seguinte texto: "Costumam andar em bandos e adoram um shopping center. Hoje atendem pelo nome de teens, termo importado do inglês que significa jovens... Mal sabem que os bolsos de seus jeans guardam um fabuloso poder econômico e comandam os destinos de uma indústria bilionária" (Revista IstoÉ, 1994 citado por FISCHER, 1996, p. 41).

Bolsos estes que também apontam as distinções existentes entre as marcas, distinção de preços e status que, por mais sutis que sejam, localizam na pirâmide da moda diferentes posições sociais. A descrição feita na reportagem acima é atual porque ilustra bem um comportamento relativo a esse momento, principalmente quando se refere ao espaço dos shopping centers como sendo um dos locais de encontro e frequência de jovens adolescentes (dos 280 adolescentes que entrevistei, 107 - 38,21% - apontaram o shopping como um espaço "para reunir os amigos e se divertir, ver a 'galera'"; 76 - 27,14% - deles, "para fazer compras"; e em terceiro, 35 - 12,50% - "namorar", entre outras razões).

Em outra reportagem nos anos 90, também da revista IstoÉ (MARINI, 1996), constata-se a repetição de conceitos que se tem sobre a juventude, conceitos que o jovem constrói ou repete sobre si mesmo, da eleição do shopping como espaço de preferência, no caso de Porto Alegre. Nessa reportagem, vários adolescentes foram entrevistados sobre o que seria ter 16 anos. Os depoimentos desses meninos e meninas enfatizavam os projetos para o futuro, a profissão que eles têm hoje, como eles veem o uso de drogas, a independência financeira, as questões sobre ética que envolvem o Brasil, etc. Num desses depoimentos, conhecemos um pouco mais sobre a relação do adolescente na contemporaneidade, na frase da brasiliense Kizzy Pinheiro, estudante de pré-vestibular: ela declara que sua paixão é ser "viciada em shopping centers" (MARINI, 1996, p. 4). Em textos dessa mesma revista, verifiquei a importância de palavras que se referem diretamente aos shoppings, como vício, religião, amor, bênção...

Em uma das entrevistas gravadas que realizei também aparece o shopping como um lugar descontraído. Lemos, nas palavras de Carla, o seguinte:

Porque não tem tensão, tu é livre, tu pode relaxar, tu pode gastar, tu pode fazer várias coisas. Tu pode ir lá só pra olhar, encher os olhos assim, eu acho que é uma coisa legal tu ir não com um objetivo, mas tu ir olhar, encher os olhos com aquelas coisas bonitas que têm, principalmente o Iguatemi, eu gosto muito. Têm várias coisas bonitas, decorações, os ambientes assim ... aonde tem os cafés têm aquelas coisas diferentes.

Nessa resposta da adolescente, mais uma vez, vejo como o consumo vem atravessando outros conceitos, como, por exemplo, o local da beleza. A menina vê no shopping, do alto dos seus 15 anos, um cenário cheio de belezas. E que cenário é esse? Não vejo a necessidade de descrevê-lo porque quem entre nós já não esteve dentro de um shopping center? Para alguns autores, justifica-se assim o nome "templo" que é dado a esse espaço. "O shopping enfim, combina a plenitude iconográfica de todas as etiquetas com as marcas 'artesanais' de alguns produtos folk-ecológico-naturistas, completando assim a soma de estilos que define uma estética adolescente. Kitsch industrial e compact disc" (SARLO, 2000, p. 22).

Todo esse arsenal de depoimentos de jovens adolescentes - nas entrevistas gravadas e nos questionários que fiz, complementado também com as imagens e depoimentos que aparecem na mídia, em revistas, na televisão, no rádio, nos jornais - não é o resultado apenas da especificidade dos jovens, mas também surge da imposição dos adultos, de toda uma lógica do contexto social18 18 Para Calligaris (1996, p. 6), "o foro íntimo, em uma cultura individualista, é o lugar (sofrido inevitavelmente) onde se decidem as realidades sociais". em que essa juventude está inserida. Portanto, se vivemos num momento social, no qual "ser individualista", "ser imediatista", "não priorizar a profundidade dos relacionamentos de amizade, amor, sexo", "não se colocar no lugar do outro" são práticas do cotidiano, elas não são privilégios somente da juventude contemporânea, mas da sociedade em geral, independentement de idade. Para Lasch,

Viver para o momento é a paixão predominante - viver para si, não para os que virão a seguir, ou para a posteridade. Estamos rapidamente perdendo o sentido de continuidade histórica, o senso de pertencermos a uma sucessão de gerações que se originaram no passado e que se prolongarão no futuro. É o enfraquecimento do sentido do tempo histórico - em particular, a erosão de qualquer preocupação maior com a posteridade. (LASCH, 1983, p. 25)

Mesmo em se tratando de uma realidade norte-americana (objeto de análise principal do livro desse autor), o texto se faz atual à nossa realidade brasileira, quando Lasch afirma que "uma vez que a sociedade não tem futuro, faz sentido vivermos somente para o momento, fixarmos nossos olhos em nossos próprios desempenhos particulares" (LASCH, 1983, p. 26). A falta de um "futuro" que Lasch nos apresenta pode ser vista sob o prisma das más previsões, no que se refere às relações de convivência e seus previsíveis rumos, ou seja, no isolamento do ser humano, que, cada vez mais, se adapta às relações a distância, via telefone, internet, enclausurando-se nesse tipo de comunicação.

A questão de "viver para o momento" e "viver para si" que Lasch afirma lembra-me a fase da adolescência, no que se refere a uma busca do reconhecimento de si, reconhecimento dado pela tribo em que deseja se incluir, uma vez que no espaço dos adultos é difícil essa inclusão. As tribos dão a esses adolescentes o reconhecimento de que necessitam dentro de uma estética de pertença ao grupo, nas relações estabelecidas pelas escolhas de viagens19 19 Por exemplo, os grupos que viajam para o Disney World. São grupos constituídos geralmente (apesar de abrangerem diferentes classes sociais) de adolescentes que convivem e dividem espaços semelhantes: escolas particulares, clubes, e que têm por hábito lazeres semelhantes, ida a shoppings, festas nos mesmos clubes. , passeios, clubes, festas noturnas, moda, gírias; enfim, tudo que priorize uma inserção no momento atual. Para Dolto (1993), "o grupo é um pouco como a placenta. Necessária para viver durante um momento, mas é algo provisório, que deve abandonar-se algum dia" (DOLTO, 1993, p. 106, tradução minha)20 20 "(...) la pandilla es un poco como la placenta. Necesaria para vivir durante un momento, pero es algo provisorio, hay que abandonarla algún día". .

Na dificuldade de separar-se dessas formas de sociabilidade, o adolescente ou se inclui em grupos ou acaba por excluir-se deles. Essa exclusão pode surgir na forma de um afastamento de uma estética social esperada pelo grupo, quando o adolescente não se vê, por exemplo, dentro da moda vigente. O sentimento de pertencer a um grupo passa pela cobrança que o adolescente faz para si mesmo diante dos seus grupos de convívio, como a escola, as festas, os shoppings que frequenta. Essa necessidade de atender às exigências de um grupo para a ele pertencer pode ser a resposta à lógica da realização de alguns desejos expostos na mídia; por exemplo, parecer-se com um ator ou atriz famosa de televisão, ter os mesmos objetos que essas pessoas têm, vestir-se como elas se vestem. O jovem entrevistado de 17 anos, Daniel, diz que

O meu ídolo é o cara do Friends21 21 Série (comédia) exibida no Canal Sony (TV a cabo) diariamente. São seis amigos nova-iorquinos que dividem apartamentos no mesmo prédio, compartilhando seus problemas pessoais/profissionais uns com os outros. , o Matthew Perry, que faz o Chandler, aquele lá pra mim mata a pau. Agora, na vida real ele engordou porque está usando drogas. Pra mim aquele lá é o cara! Me identifico bastante com ele.

A identificação com o ator do seriado, salientada por ele, está no fato de como esse personagem atua na série,

(...) no jeito dele, como ele atua pra mim como personagem, não sei como ele é na vida real, mas como personagem assim, eu me identifico com ele, sabe? As caretas assim, o jeito que ele atua. Eu me acho bem parecido.

A necessidade vem refletida no acompanhar a velocidade de transformação do novo: da moda, do comportamento, dos lugares de convivência. Há uma urgência em atender o momentâneo, mesmo que o momentâneo do comportamento, da moda, dos hábitos não tenha permanência de longa duração. Essas coisas reinam, se excluem e se substituem velozmente - redizem e reduzem valores, para mais valorar o objeto, criando armadilhas para o sujeito, seduzindo-o. Tudo é deglutido e consumido rapidamente.

O que não tem mudado em nossa sociedade contemporânea é o espetáculo da juventude. Ser jovem não tem saído de moda. Instalado há bastante tempo, o conceito imperativo de juventude tem atraído os adultos e os coloca na "pele" de adolescentes. Em 1997, na Inglaterra, inventou-se o termo "adultescente"22 22 O termo usado por Calligaris (1998) refere-se a um adulto que se faz de adolescente, assemelhando-se com a moda, o gosto musical e o comportamento da fase. para significar que muitos adultos adotaram o comportamento e o estado de espírito adolescentes. Na galeria de retratos, Calligaris (1998, p. 2) aponta "os carecas de rabinho e patins, os flácidos tatuados, os avôs surfe-praianos e por aí vai". E Lipovetsky lembra que vemos seguidamente "adultos comprarem para si ursinhos, usar camisetas Barbie, circular de patins ou patinetes, participar de reuniões sociais em que se cantam as canções dos programas de televisão de sua infância" (2007, p. 71).

Mas Calligaris não vê de todo um mal nessa adultescência:

Estar adolescente é um traço normal da vida adulta moderna... Pouco importa os traços da cultura adolescente que podemos adotar. Idealizar a adolescência é um gesto celebrador de nossa própria cultura, uma maneira de tecer o elogio da liberdade. Difícil para todos. Para os adolescentes, que não sabem mais como ser rebeldes, pois a rebeldia é um valor estabelecido. Para os adultos, pois pela mesma razão, como podem um dia desistir de ser rebeldes, ou seja, adolescentes? Resta-nos, em vez de crescer, seguir adultescendo. (CALLIGARIS, 1998, p. 2)

"A juventude já não é uma questão de idade e sim de atitude" 23 23 Jornal Pulso Latino - Americano. "Juventude Consumidora", março de 2001, p. 3. . Essa frase encontra-se como legenda de uma foto dentro de uma reportagem que tem como manchete de capa do Jornal Pulso Latino-Americano a expressão "Juventude Consumidora". A reportagem é sobre os jovens latino-americanos, sua relação com o consumo, o trabalho e o entretenimento. São índices de pesquisa apresentados através de gráficos sobre o continente jovem (de 14 e 24 anos) no Brasil, na Argentina, no Uruguai, no Chile, que nos levam a acreditar na existência de um lazer pautado na perspectiva do consumo, na dependência de bens materiais que acabam gerando uma sensação de bem-estar temporária. Antes de ganharem dinheiro, entrarem no mercado de trabalho, esses jovens acabam gastando por procuração o dinheiro dos pais.

Nesse estar colado aos objetos24 24 Importante marcar que esses objetos temporários diferenciam-se, e muito, dos objetos que envelhecem com o seu possuidor; estes estão de outro lado, "Quanto mais voltados ao uso cotidiano, mais expressivos são os objetos: os metais se arredondam, se ovalam, os cabos de madeira brilham pelo contato com as mãos, tudo perde as arestas e se abranda. São estes os objetos que Violette Morin chama de objetos biográficos, pois envelhecem com seu possuidor e incorporam à sua vida: o relógio da família, a medalha do esportista, a máscara do etnólogo, o mapa-mundi do viajante. Cada um destes objetos representa uma experiência vivida" (GONÇALVES FILHO, José Moura, 2000, p. 111, In: O Olhar. São Paulo: Companhia das Letras, 2000). que traz uma suposta ou temporária felicidade, surgem as atitudes que fazem parte de um pacote que dita a forma como se deve proceder socialmente.

A alienação do espectador em favor do objeto contemplado (o que resulta de sua própria atividade inconsciente) se expressa assim: quanto mais ele contempla, menos vive; quanto mais aceita reconhecer-se nas imagens dominantes da necessidade, menos compreende sua própria existência e seu próprio desejo. (DEBORD,1997, p. 24)

Em sua afirmação, Guy Debord está nos alertando exatamente sobre certos procedimentos sociais (atitudes) presentes no espetáculo cotidiano, no qual nada mais passa despercebido. "A sociedade proclamou-se oficialmente espetacular. Ser conhecido fora das relações espetaculares equivale a ser conhecido como inimigo da sociedade" (DEBORD, 1997, p. 180). Mesmo após 40 anos da primeira publicação de A sociedade do espetáculo, Debord permanece atualizado na sua escrita e se faz presente nas mais prosaicas atitudes do cotidiano. Delineadas previamente pela mídia, hoje, tais atitudes desenham, em alguns aspectos, o "certo" ou o "errado" sobre a moda e o comportamento adolescente.

Um exemplo mais próximo do que foi escrito anteriormente podemos encontrar no caderno Zerou25 25 Zerou era um caderno publicado semanalmente pelo Jornal Zero Hora e tinha como alvo o público adolescente. , o qual exibia em uma de suas páginas a seção "sempre certo"; nesta, encontrávamos dicas e depoimentos de adolescentes das mais diversas idades quanto ao modo "certo" de se vestir. Mas além das dicas e dos depoimentos sobre o que está na moda (de adolescentes para os adolescentes), geralmente havia uma frase no topo da reportagem (acima das imagens) e outra no rodapé - esta última, quase sempre de um poeta ou de um cientista, um filósofo ou um cantor conhecido, em que, entre tantos, desfilavam nomes como Sigmund Freud, Caetano Veloso, Vinícius de Moraes, etc. Mas o que "desconhecem" nossos tão ilustres autores é que suas frases são usadas para ilustrar e explicar os atos mais prosaicos de consumo, tentando dialogar (a favor) teoricamente com a frase escrita no topo da reportagem. Exemplo26 26 Caderno Zerou de sexta-feira, 10 de março de 2000. : Acima de uma ilustração com meninas usando diferentes bolsas, a frase: "Que cadernos, que nada! Mochilas e assemelhados carregam mesmo é o nosso estilo, a nossa cara" - e logo mais, abaixo das imagens, a seguinte frase: "O destino assume, para cada um de nós, a forma de uma mulher (ou de várias)." - Sigmund Freud. Esse tipo de matéria exibida no caderno Zerou seria uma repetição daquilo que se apresenta em outras revistas e jornais. Por exemplo, Fischer (1996) fez um extenso levantamento das matérias apresentadas na revista Capricho e seus conteúdos, nos quais, em um dos itens selecionados, vemos a seção "moda", a qual apresenta também o "Certo ou Errado" como orientação para o que se pode ou não vestir. Repete-se no Zerou (como na Capricho e em outras do mesmo gênero) também a seção de cartas, pedidos e opiniões sobre diversos temas como os sonhos, o futuro, o namoro. Lê-se em alguns desses depoimentos a necessidade e a importância de sonhar, de criticar posições alienadas em relação à mídia, de ser solidário. Existe também certa consciência de uma velocidade do tempo que não é natural, mas planejada por nós mesmos. "O que anda muito ligeiro somos nós. Não temos tempo para parar e conversar com o vizinho. Mal damos 'Oi'. Na escola, já chegamos reclamando e rezando para soltar cedo e dormir".27 27 Trecho retirado da carta de uma adolescente de 16 anos para o encarte Zerou. Jornal Zero Hora de 29 de dezembro de 2000, p. 6. Alega-se que não é o tempo que tem passado depressa demais e sim o nosso controle em relação a ele e o que priorizamos nessa relação.

Ao lado de toda essa leitura crítica do social repousam também posições que mantêm uma visão de mundo voltada para o individualismo. Para algumas tribos, só interessa aquilo que se refere ao adolescente e somente a ele, considerando com maior importância somente os assuntos cotidianos que se referem à sua classe social, ao seu modo de ser, de vestir-se, de agir, deixando para trás as outras apresentadas no contexto social mais amplo. Esse comportamento individualista remete a uma das visões que tenho do comportamento de alguns adolescentes feito nas observações tanto em sala de aula, quanto dentro dos shopping centers de Porto Alegre. São ações que se repetem em espaços diferenciados28 28 Porto Alegre, 5 de outubro de 2000, quinta-feira. Shopping Center Iguatemi. - 15h40. Sentado na Praça de Alimentação do referido shopping, observo um grupo de adolescentes pela faixa dos 15 aos 17 anos de idade. São cinco meninas: uma delas, cabelos castanhos, presos (rabo-de-cavalo), blusa vermelha escura colada no corpo, gola alta, calça jeans. Ela mexe na bolsa o tempo inteiro diante das outras quatro meninas. Para, se abraça na bolsa e repousa a cabeça sobre ela. Bolsas sobre a mesa, sorvete e um álbum de fotos que passa de mão em mão. Sorrisos. Olhares atentos para as fotos e olhares dispersos para os que passam pela Praça de Alimentação. Todas têm em comum uma bolsa de alças para segurar nas costas. Agora, três delas estão agarradas nas bolsas enquanto conversam. Falam-se, mas não se olham. Uma delas atende o celular, olhares dispersos novamente, desliga. Em seguida, todas levantam e vão embora. ; falar alto, mexer em objetos pessoais, fotos, telefones celulares, como se essas ações determinassem um cotidiano que não escolhe hora nem lugar, ou seja, eles tanto podem querer usar o celular dentro da aula, quanto no cinema, no teatro, etc.

Assim como a criança, o adolescente é uma figura mítica do imaginário. Tal figura permite que nos distanciemos de algumas de nossas falhas, clivagens, desmentidos, ou simplesmente desejos. Ela no-los dá para ver, entender, ler, reificando-os na figura de alguém que ainda não cresceu. (KRISTEVA, 2002, p. 145)

Eu acho que a adolescência é um passo pra tua maturidade. Um meio estágio. O próximo passo já vai ser a maturidade, tu já vai estar por ti mesmo. Então a adolescência é o que vai te moldar para o futuro. (Hermes, 15 anos)

(...) acho que a gente não tá num país que usa muito a arte, leitura, um país que lê muito, porque lá na Europa - Inglaterra, as pessoas passam o tempo lendo, estudando. (Hermes, 15 anos)

Eu acho que o jovem hoje em dia é uma pessoa desiludida, por isso que ele não tem um ..., não é que nem a juventude de antigamente, que tinha algo por lutar, tinha um propósito de vida. Eu acho que o jovem hoje em dia não é assim, eu acho que o jovem é uma pessoa totalmente perdida no mundo. Ele não sabe o que procurar, ele não sabe pelo que viver. Eu acho que isto é muita ilusão ... a sociedade inteira coloca muita pressão em cima da gente e pede muitos rótulos, muitos estereótipos hoje em dia para as pessoas. E os jovens que normalmente teriam potencial muito maior são os jovens que não se adequam direito a esses rótulos que a sociedade impõe e a gente acaba se desiludindo com certas coisas, e aí eu acho que o jovem acaba se tornando uma massa meio alienada assim, por não ter um pouco de liberdade, por sempre estar fazendo ... seguindo regras e coisas do gênero. (Fátima, 14 anos)

Ampliando os conceitos de beleza e arte na estética cotidiana

As respostas dos questionários escritos e as entrevistas feitas com os 12 adolescentes escolhidos apontaram para identidades que se configuram no consumo, nos diferentes estilos - já que estéticas definem identidades e identidades marcam tribos. A inclusão em determinadas tribos demanda atos de consumo - e posições éticas são marcadas por uma estética do corpo. O que construí neste texto, a meu ver, foi o encontro de duas histórias: aquelas narradas por todo um aparato das teorias lidas, discutidas, repensadas por mim, com tudo aquilo que foi narrado e escrito por esses jovens adolescentes que foram entrevistados. A investigação do cotidiano adolescente define sua importância neste momento, pela marca de uma época em fatos, ações, posições, que tanto produzem quanto muitas vezes reproduzem o tempo presente. Nessa produção e reprodução do tempo, introduzem-se as diferenças de percepção do mundo em geral: dos sentidos, das mais variadas práticas cotidianas e, certamente, das visões que cercam a arte, a beleza, a identidade, o consumo, a educação. A realidade confronta-se com a teoria. Simultaneamente, o discurso teórico vem elucidar, repensar ou questionar as práticas cotidianas desses jovens adolescentes e vice-versa.

Minha tentativa se pautou em rever e discutir certas posições, colocações de um universo social no qual se inserem os adolescentes. Os discursos desses jovens foram discutidos com os discursos de diferentes teóricos, evidenciando as relações deles com o consumo, com as identidades, as diferentes estéticas - eles estão datados e marcados aqui. Uma asserção bem condensada de tudo isso que foi discutido ao longo deste artigo encontra-se nas palavras de João Francisco Duarte Junior, quando o autor nos lembra a importância da "educação" (grifo meu) necessária aos sentidos humanos e ao olhar sobre o cotidiano. Ele afirma que não será demais insistir que a educação do sensível deve, antes de significar um desfile da arte consagrada e de discussões históricas e técnicas perante os olhos e ouvidos dos educandos, voltar-se inicialmente "para o seu cotidiano mais próximo, para a cidade onde vive, as ruas e praças pelas quais circula e os produtos que consome, na intenção de despertar sua sensibilidade para com a vida mesma, consoante levada no dia-a-dia" (DUARTE JR., 2001, p. 25).

Logicamente, no discorrer do seu pensamento, Duarte ressalta a importância da educação estética através da arte, mas lembra que, antes dela, "é preciso possibilitar ao educando a descoberta de cores, formas, sabores, texturas, odores, etc., diversos daqueles que a vida moderna lhe proporciona" (DUARTE JR., 2001, p. 26). A reflexão de Duarte me faz lembrar as palavras do personagem Rick, do filme Beleza Americana (American Beauty, Sam Mendes, 1999), quando o adolescente, assistindo a uma filmagem29 29 Vale a pena registrar aqui dois momentos do filme que julgo importantes. Um primeiro, no qual os personagens Rick e Jane, caminhando por uma rua, acompanham com os olhos um funeral. O diálogo da cena é o seguinte: "Jane: Isso é um funeral? Rick: Conheceu alguém que já morreu? Jane: Não, e você? Rick: Não. Mas vi uma sem teto congelar até morrer. Deitada na calçada. Ela parecia muito triste. Eu a filmei. Jane: Por que a filmou? Rick: Porque era incrível. Jane: O que havia de tão incrível? Rick: Quando se vê algo assim, é como se Deus estivesse nos olhando por um segundo. E, se prestar atenção, pode fazer o mesmo. Jane: E o que vê? Rick: Beleza". A outra cena é quando Rick convida Jane para ver o filme que ele fez (ao qual me refiro acima): "Rick: Quer ver a coisa mais linda que já filmei? Foi num desses dias, quando está prestes a nevar (...) e há uma eletricidade no ar. Você quase pode ouvir. Certo? E este saco estava dançando para mim (...) como uma criança chamando para brincar. Por quinze minutos. Foi quando entendi que havia essa vida toda por trás das coisas (...) e essa incrível força benevolente (...) que dizia não haver razão para ter medo (...) nunca. Em vídeo não é a mesma coisa, eu sei. Mas ajuda a lembrar. Preciso me lembrar. Às vezes, há tanta beleza (...) no mundo. Parece que não posso suportar. E meu coração (...) parece que vai sucumbir". feita por ele mesmo (ele está nessa cena acompanhado por outra personagem adolescente, Jane), traz a marca muito precisa sobre tudo aquilo que representa para ele "a beleza". É uma entre outras tantas visões de beleza e sensibilidade que pode ter um jovem adolescente, no caso, um norte-americano. Mas bem próximo da nossa realidade, temos na escrita de um jovem brasileiro, portoalegrense, uma visão de beleza diante das cenas exibidas da destruição das torres gêmeas do World Trade Center em Nova Iorque. Mudança de conceito, de visão, deslocamentos daquilo que possa ser considerado belo? De tudo o que foi dito por esses adolescentes, fica para mim a certeza de que devemos estar muito atentos para a amplitude de leituras que as imagens propõem e os diferentes conceitos de beleza que se configuram no nosso universo e, até, a dificuldade de vê-la, como alguns adolescentes entrevistados apontaram.

Com tudo o que por mim foi exposto até o momento, e como professor de Artes Visuais, volto a frisar a importância dos programas de ensino de Artes que têm se desenvolvido nos espaços formais ou não. Tais programas não devem se apoiar somente na teoria que envolve os conteúdos de história da arte, questionários aplicados nas visitas aos museus, etc. Acredito que, para o bom aproveitamento dessa matéria dentro das escolas ou fora delas, reforçando o que já foi escrito pelo autor acima citado, deva existir um espaço de discussão sobre as imagens que estão nos museus e também sobre as imagens que povoam nosso cotidiano: nos outdoors, nos muros, nos filmes, nas revistas em quadrinhos, nos videoclipes, nos álbuns de fotos dos adolescentes no Orkut, nos blogs, nos fotologs, enfim, na própria estética dos adolescentes que se produz velozmente em novas formas. Essas imagens, que ocupam a maior parte da nossa existência, também constroem conceitos sociais e culturais sobre beleza, feiúra, gosto, etc., necessitando também de um diálogo estético constante que amplie a discussão sobre estes. E tal diálogo estético se enriqueceria com diferentes possibilidades, e uma delas estaria na visão maximizada que Gianni Vattimo apresenta na qual

(...) se pode falar de estetização geral da vida na medida em que a mídia, que distribui informação, cultura, entretenimento, mas sempre sob critérios gerais de 'beleza' (atração formal dos produtos), assumiu na vida de todos um peso infinitamente maior do que em qualquer outra época do passado. Identificar a esfera da mídia com o estético pode, por certo, levantar algumas objeções, mas não é tão difícil admitir semelhante identificação, se levarmos em conta que, além de e mais profundamente do que distribuir informação, a mídia produz consenso, instauração e intensificação de uma linguagem comum no social. (VATTIMO, 1996, p. 44)

Penso que, dessa forma, estaríamos ampliando também o âmbito e a qualidade da experiência estética visual. Ficar circulando somente entre os conceitos de uma arte europeia seria um percurso um tanto limitado, fadado à inutilidade, fechado - não possibilitando, volto a insistir, uma discussão mais ampla sobre a estética e a arte em geral. Logicamente, nesse percurso do ensino de Artes, não podemos deixar de lado a experiência que o aluno traz do seu conhecimento estético, aquilo que ele considera esteticamente bonito, interessante. Seria uma ignorância acreditar que somente na escola residiria todo conhecimento, ensino e experiência acerca do campo estético do aluno.

Se a cultura é o conjunto das relações simbólicas do indivíduo com o mundo, a sociedade e ele próprio, a mudança cultural é a modificação no tempo de uma parte destas relações simbólicas. Elas variam sob o efeito das inovações, das demoras, das desigualdades, dos conflitos entre o que é antigo e o que é novo, conforme os grupos, as classes, os meios. (DUMAZEDIER, 1999, p. 183)

Dumazedier concentra muito bem, nesse trecho, aquilo a que me referia no parágrafo anterior em relação à arte e à cultura. Cada palavra do autor poderia ser exemplificada, em termos resumidos, da seguinte forma, brincando um pouco com suas palavras, as quais também qualificam exemplos: das inovações, a internet, os reality shows; das demoras, consumos culturais das mais variadas linguagens, as desigualdades no acesso à cultura; das desigualdades, sociais, consumos culturais, preconceito (a demora); dos conflitos entre as tribos adolescentes, entre as gerações pais e filhos, entre as classes sociais, entre as culturas e seus valores. A brincadeira entre essas palavras poderia ainda ir mais longe, sendo construída com outras formas gramaticais que possibilitariam inúmeras relações que provavelmente marcariam nosso presente, dizendo um pouco sobre nosso tempo - certamente em outros tempos30 30 Para isso, basta lembrar um pouco da minha adolescência: das minhas aulas de Matemática, Biologia, Artes. Das músicas, das tribos que marcaram aquele tempo. Eu também não tinha computador, internet, videogame. Poderia também exemplificar em outras diferentes narrações que marcaram cada época, como no diário de Julieta Drummond de Andrade, citado anteriormente. eu estaria fazendo relações completamente diferentes das que aqui foram expostas.

Mais uma vez utilizando um jogo de composição com as palavras, minha intenção não foi a de desvendar verdades ou mentiras sobre as supostas cultura-shopping, cultura-consumo, cultura-identidade, cultura-estética e cultura-arte dos adolescentes, mas a análise dos significados socioculturais trazidos por eles. A validade da investigação sobre determinados campos me levou a pensar sobre a verdade que existe na afirmativa de Mead apud Bodgan, Robert C.; Biklen, Savi Knoop (1991, p. 26), os quais dizem que "os professores necessitam estudar, através de observações e experiências em primeira mão, os contextos cambiantes dos processos de socialização dos seus alunos, para se tornarem melhores professores". Começo a ver, nesse estudo, a possibilidade da obtenção de subsídios que clarifiquem mais a maneira como me movimento no campo da educação, e até que ponto aquilo que faço como professor está de acordo com aquilo que penso que deveria ou gostaria de fazer. Em outras palavras, quais os obstáculos que se definem interpondo-se neste fazer do educador?

Acredito que os discursos sobre as posições que ocupa cada disciplina no espaço escolar, de tempo, importância, sabedoria e inteligência, vêm mobilizando certos valores, concepções de gosto, de ser humano, de ser sensível, de ser homem, ser mulher e de formação dos grupos sociais.

Visualizo agora, nas falas, nas escritas, nos comportamentos desses adolescentes, diferentes modos de ser, de relacionar-se, de apresentarem novos valores, de criarem estilos, de estarem juntos, que estão em construção na sociedade. Sei que ainda haveria espaço para outras relações além das que aqui expus, limitei-me, numa proximidade maior, às evidências salientadas acerca do cotidiano. E é nesse mesmo cotidiano que investigadores como Ewen (1991) assumem a posição sobre a relação existente entre adolescência-estilo-identidade, quando nos lembram que

(...) com freqüência silenciosamente, em ocasiões desapercebidas, o estilo trabalha com as maneiras nas quais as pessoas entendem e se relacionam com o mundo que as rodeia. Sua influência pode observar-se dentro dos limites inseguros, mas no entanto formativos, da adolescência, quando se acelera a busca da identidade. (EWEN, 1991, p. 37, tradução minha)31 31 "Con frecuencia silenciosamente, en ocasiones despercebido, el estilo trabaja con las maneras en que las personas entiendem y se relacionan con el mundo que las rodea. Su influencia puede observarse dentro de los límites inseguros, pero sin embargo formativos, de la adolescencia, cuando se acelera la búsqueda de la identidad."

Ewen conecta, dessa forma, as questões de estilo, identidade e adolescência dentro de um quadro muito próximo dos objetivos que procurei estudar e que se aproximaram demasiadamente das falas dos adolescentes, como a de Hermes, por exemplo, quando ele se refere ao modo de vestir dos seus coetâneos na escola:

Aqui no colégio tá todo mundo vestido igual. Tu consegues ver que é tudo o mesmo padrão.

Pela experiência que tive com as entrevistas, foi muito interessante ler e ouvir, como no depoimento acima, as críticas que muitos desses jovens fizeram sobre os seus coetâneos e também sobre os valores sociais, salientando cada vez mais uma sociedade que se desenvolve dentro de certos padrões, envolvendo-se numa cultura mais voltada para o consumo. A reflexão de Hermes aponta não só para um consumo de vestir-se igual, mas também sobre os modos de "estar junto" dos adolescentes. Além do espaço das escolas, dos shoppings, das tribos, esses encontros hoje também são vivenciados de outras formas, como, por exemplo, os que se estabelecem pela internet, pelos videogames, etc. Por exemplo, sobre os games32 32 A revista Veja, em 2001, publicou a reportagem "Os games vão ao museu" (MARTHE, 2001). Tal reportagem comenta sobre a premiação de jogos digitais nos Estados Unidos pela Academia de Artes e Ciências. Um dos objetivos desse evento seria o de reconhecer os jogos como uma forma de arte popular, assim como o cinema ou o rock. , existem estudos que promovem a sua inserção de forma mais efetiva no mundo atual como arte popular. Para Beatriz Sarlo (2000, p. 52) "o videogame propõe a ilusão de que as ações um dia poderão mudar o infinito periódico que a máquina tem inscrito e apresenta ao jogador em potencial, na primeira tela do jogo, onde suas alternativas se repetem indefinidamente". A autora ainda aponta que a combinação existente entre velocidade e desvanecimento, semelhante ao zapping televisivo, poderia significar "o signo de uma época" (SARLO, 2000, p. 52).

Por outro lado, evidenciam-se também necessidades de contato entre os jovens. Segundo a adolescente Fátima,

O adolescente, ele precisa do contato. Tipo as gurias, elas tão sempre de mãos dadas, tão sempre se abraçando; e os guris, tão sempre se batendo, mas se batem porque eles não têm coragem de se abraçar, então eles vão ter o contato através do soco, mas eles vão ter aquele contato de pele, e eu acho que isso é muito importante pro desenvolvimento da pessoa.

Esse contato sobre o qual nos fala Fátima é aquele que ela descreve sobre o cotidiano escolar ou sobre as festas que eles frequentam. E a necessidade desse contato também pode ser vista como alvo de mercado, direcionando-se em outros sentidos - agrega-se assim o contato entre os jovens às máquinas e às diferentes fontes de consumo. Dessa forma, criaram-se novos espaços nos quais vimos o surgimento dos cybercafés, dos postos de conveniência, etc. Alguns espaços ganharam um rejuvenescimento pela presença do jovem, talvez porque, em certos casos, são criados exatamente em função deles. Às vezes, até quando esses espaços não foram pensados para os jovens - mas eles começaram a frequentá-lo -, começou-se a pensar em como atendê-los (lembrando o exemplo dos postos de conveniência, que, no final dos anos 1990, passaram a ser frequentados por adolescentes).

As questões que me motivaram a realizar este artigo partiram principalmente da experiência cotidiana de sala de aula como professor de Artes. Assim, perguntei-me e continuo me perguntado até os dias de hoje: Qual o papel do professor de arte dentro de uma sociedade com valores acentuados para o consumo? Como o adolescente vê a arte, que conceito(s) tem dela? Quem são essas pessoas com as quais tento me relacionar diariamente na busca e na troca de conhecimentos? O que o adolescente "rotulado" socialmente pensa de si próprio, da sua adolescência?

Chegando ao final deste artigo, penso ter conseguido responder a algumas dessas perguntas. Entendi, porém, que é importante manter vivas tais indagações, porque dialogar implica "reconhecer a linguagem e os gestos do outro como um elemento para estabelecer uma forma de relação" (HERNÁNDEZ, 2000, p. 124). Como os modos de nos relacionarmos mudam constantemente, este estudo não deixa de ser a marca de mais uma estação datada de tempo.

Notas

Contato:

Universidade Luterana do Brasil (ULBRA)

Curso de Licenciatura em Artes Visuais

Avenida Farroupilha, 8001

Canoas/RS

CEP 92425-900

Recebido: 06/11/08

Aprovado: 24/07/09

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  • 1
    Refiro-me aos doze adolescentes (seis meninos e seis meninas de 14 a 17 anos) de escolas particulares de Porto Alegre/RS - Brasil que foram entrevistados para esta pesquisa, todos pertencentes às classes A e B. Previamente, esses adolescentes, e mais 268, já haviam sido entrevistados por mim por mio de um questionário escrito com 27 perguntas. Tal questionário serviu de roteiro para algumas das questões formuladas durante as entrevistas gravadas no período de maio a agosto de 2001.
  • 2
    Sobre as mudanças existentes em cada época, a reportagem da
    Veja (
    Veja Jovem, set. 2001, p. 27) ilustra bem as transformações acontecidas nos registros dos diários das adolescentes. As meninas continuam fazendo diários, porém, na internet já existe um diário
    on-line. "Vale colocar na rede tudo o que recheia um diário comum: confissões, desabafos, fotografias. A diferença é que, como numa sala de bate-papo, quem quiser pode ler. Mais do que isso: é possível dar palpites. Existe um campo em que qualquer pessoa pode deixar sua mensagem. 'É uma mudança completa na maneira de lidar com a privacidade', constata a psicanalista paulista Iraci Galias".
  • 3
    Nas afirmações que se faz hoje sobre os cuidados do corpo, podemos pensar também sobre o conhecimento de si, como aquilo que Foucault afirma em uma passagem de
    A Hermenêutica do Sujeito, quando se refere a Platão e a sua relação com o conhecimento divino. A comparação entre o que nos dizem as três meninas e o que escreveu Foucault marca, evidentemente, épocas distintas. Porém, falar sobre o conhecimento e os cuidados de si nos faz rever práticas que são recorrentes tantos nos textos clássicos examinados por Foucault, quanto nas mais prosaicas atitudes nos dias de hoje. Foucault afirmava que Platão fazia do "conhecimento do divino a condição do conhecimento de si" (2004, p. 89). Assim, passa a ser recorrente a seguinte pergunta: E o que seria olhar para si mesmo hoje?
  • 4
    Interessante comparar os prefácios dos dois diários, o de Julieta Drummond de Andrade, que, em 1942, começa contando sobre um caderno que ela ganhou do seu "papai", no qual irá registrar os acontecimentos das suas próximas férias, e que será este o seu diário. Já Maria Mariana (que não está presente na citação anterior, mas o texto de Ingrid Guimarães faz parte do livro
    Confissões de adolescente), inicia seu texto (do diário) com uma poesia na qual ela se diz ser, entre outras coisas, "vaidosa demais, perdida demais, gostosa demais". Nesta pequena comparação, narram-se diferentes posições do adolescente diante da sua sociedade, de como ele(a) se vê, como se refere a si mesmo e aos outros e sobre aquilo que se pode ou não falar em determinadas épocas.
  • 5
    Mais adiante abordarei este tema, apoiado na visão de alguns autores que se referem à
    fase final da adolescência como algo não demarcado.
  • 6
    No questionário escrito, ele havia respondido que seus ideais de vida seriam: ser médico e ter uma família.
  • 7
    O autor explica que a vida cotidiana não é apenas a soma de fatos e gestos diários, a dimensão da banalidade e da repetição, ele acredita que seria um
    sistema de representação (BAUDRILLARD, 1991). "A quotidianidade constitui a dissociação de uma práxis total numa esfera transcendente, autônoma e abstrata (do político, do social e cultural) e na esfera imanente, fechada e abstrata, do privado" (BAUDRILLARD, 1991, p. 25).
  • 8
    El estilo hoy es una cacofonía incongruente de imágenes esparcidas a lo largo del paisaje social.
  • 9
    Hace afirmaciones, pero no tiene convicciones.
  • 10
    Este modo de vida está marcado por una sucesión interminable de objetos materiales, aunque se trata de una vida que curiosamente parece flotar más allá de los confines del mundo real. Esto es essencial para la magia del estilo, su fascinación y encanto.
  • 11
    El estilo, cada vez más, se há convertido en el idioma oficial del mundo mercantil.
  • 12
    El estilo, por outra parte, es un componente profundo de la subjetividad, entrelazado con las aspiraciones y ansiedades de la gente.
  • 13
    Segundo a autora, GerAção é um grupo "composto por jovens cariocas de classe média que se organizaram no âmbito da Campanha contra a Fome" (NOVAES, 2000, p. 49). Ainda segundo Novaes (2000, p. 50), esse grupo nasceu no terceiro ano da Campanha contra a Fome. "Os organizadores queriam mais do que a participação de um pequeno grupo de jovens de classe média; eles queriam motivar a organização de muitos grupos em diferentes espaços e segmentos. Os jovens do Grupo GerAção resolveram, então, buscar uma aproximação com os jovens de Vigário Geral. Já havia uma idéia de incentivar a política da "boa vizinhança" entre asfalto e favela, que partiu do movimento Viva Rio - também nascido a partir das grandes feridas da cidade. Através dessa política, incentivam-se os jovens de colégios de classe média a olhar para a favela e para os habitantes de lá e a oferecer trocas de serviços" (NOVAES, 2000, p. 50-51).
  • 14
    É pertinente, neste momento, apresentar algumas das questões levantadas por Calligaris (1996, p. 112) sobre o uso das etiquetas, nas interrogativas que se seguem: "Quando e para onde se foram os tempos, quando a etiqueta do alfaiate estava no bolso de dentro do casaco, quando raros e minúsculos
    bottons manifestavam a fervente adesão a um partido ou a uma idéia, ou então testemunhavam um mérito decisivo na frente da comunidade? Em outras palavras, por que vivemos tempos tão apaixonados pelas marcas? Por que somos tão desejosos de ser etiquetados ou marcados?"
  • 15
    Mais adiante em seu texto, o autor escreve que as passeatas se proliferaram pelas demais cidades do Brasil.
  • 16
    A minissérie
    Anos rebeldes, realizada pela Rede Globo de Televisão, em julho de 1992, ambientava-se na época do movimento estudantil de 1968, dando ênfase às manifestações dos grupos jovens da época.
  • 17
    O I Fórum Social Mundial foi realizado na cidade de Porto Alegre, entre 25 e 30 de janeiro de 2001, contrapondo-se, em ideias e em participantes, ao Fórum Econômico Mundial de Davos, que aconteceu simultaneamente na Suíça. Os debates principais giraram em torno de grandes temas como a produção de riquezas e a reprodução social, afirmação da sociedade civil e dos espaços públicos, poder político e ética numa nova sociedade, reunindo palestrantes e debatedores de diferentes países.
  • 18
    Para Calligaris (1996, p. 6), "o foro íntimo, em uma cultura individualista, é o lugar (sofrido inevitavelmente) onde se decidem as realidades sociais".
  • 19
    Por exemplo, os grupos que viajam para o Disney World. São grupos constituídos geralmente (apesar de abrangerem diferentes classes sociais) de adolescentes que convivem e dividem espaços semelhantes: escolas particulares, clubes, e que têm por hábito lazeres semelhantes, ida a shoppings, festas nos mesmos clubes.
  • 20
    "(...) la pandilla es un poco como la placenta. Necesaria para vivir durante un momento, pero es algo provisorio, hay que abandonarla algún día".
  • 21
    Série (comédia) exibida no Canal Sony (TV a cabo) diariamente. São seis amigos nova-iorquinos que dividem apartamentos no mesmo prédio, compartilhando seus problemas pessoais/profissionais uns com os outros.
  • 22
    O termo usado por Calligaris (1998) refere-se a um adulto que se faz de adolescente, assemelhando-se com a moda, o gosto musical e o comportamento da fase.
  • 23
    Jornal Pulso Latino - Americano. "Juventude Consumidora", março de 2001, p. 3.
  • 24
    Importante marcar que esses objetos temporários diferenciam-se, e muito, dos objetos que envelhecem com o seu possuidor; estes estão de outro lado, "Quanto mais voltados ao uso cotidiano, mais expressivos são os objetos: os metais se arredondam, se ovalam, os cabos de madeira brilham pelo contato com as mãos, tudo perde as arestas e se abranda. São estes os objetos que Violette Morin chama de objetos biográficos, pois envelhecem com seu possuidor e incorporam à sua vida: o relógio da família, a medalha do esportista, a máscara do etnólogo, o mapa-mundi do viajante. Cada um destes objetos representa uma experiência vivida" (GONÇALVES FILHO, José Moura, 2000, p. 111, In:
    O Olhar. São Paulo: Companhia das Letras, 2000).
  • 25
    Zerou era um caderno publicado semanalmente pelo
    Jornal Zero Hora e tinha como alvo o público adolescente.
  • 26
    Caderno Zerou de sexta-feira, 10 de março de 2000.
  • 27
    Trecho retirado da carta de uma adolescente de 16 anos para o encarte Zerou.
    Jornal Zero Hora de 29 de dezembro de 2000, p. 6.
  • 28
    Porto Alegre, 5 de outubro de 2000, quinta-feira. Shopping Center Iguatemi. - 15h40. Sentado na Praça de Alimentação do referido shopping, observo um grupo de adolescentes pela faixa dos 15 aos 17 anos de idade. São cinco meninas: uma delas, cabelos castanhos, presos (rabo-de-cavalo), blusa vermelha escura colada no corpo, gola alta, calça jeans. Ela mexe na bolsa o tempo inteiro diante das outras quatro meninas. Para, se abraça na bolsa e repousa a cabeça sobre ela. Bolsas sobre a mesa, sorvete e um álbum de fotos que passa de mão em mão. Sorrisos. Olhares atentos para as fotos e olhares dispersos para os que passam pela Praça de Alimentação. Todas têm em comum uma bolsa de alças para segurar nas costas. Agora, três delas estão agarradas nas bolsas enquanto conversam. Falam-se, mas não se olham. Uma delas atende o celular, olhares dispersos novamente, desliga. Em seguida, todas levantam e vão embora.
  • 29
    Vale a pena registrar aqui dois momentos do filme que julgo importantes. Um primeiro, no qual os personagens Rick e Jane, caminhando por uma rua, acompanham com os olhos um funeral. O diálogo da cena é o seguinte:
    "Jane: Isso é um funeral?
    Rick: Conheceu alguém que já morreu?
    Jane: Não, e você?
    Rick: Não. Mas vi uma sem teto congelar até morrer. Deitada na calçada. Ela parecia muito triste. Eu a filmei.
    Jane: Por que a filmou?
    Rick: Porque era incrível.
    Jane: O que havia de tão incrível?
    Rick: Quando se vê algo assim, é como se Deus estivesse nos olhando por um segundo. E, se prestar atenção, pode fazer o mesmo.
    Jane: E o que vê?
    Rick: Beleza".
    A outra cena é quando Rick convida Jane para ver o filme que ele fez (ao qual me refiro acima):
    "Rick: Quer ver a coisa mais linda que já filmei?
    Foi num desses dias, quando está prestes a nevar (...) e há uma eletricidade no ar. Você quase pode ouvir. Certo?
    E este saco estava dançando para mim (...) como uma criança chamando para brincar. Por quinze minutos. Foi quando entendi que havia essa vida toda por trás das coisas (...) e essa incrível força benevolente (...) que dizia não haver razão para ter medo (...) nunca. Em vídeo não é a mesma coisa, eu sei. Mas ajuda a lembrar. Preciso me lembrar. Às vezes, há tanta beleza (...) no mundo. Parece que não posso suportar. E meu coração (...) parece que vai sucumbir".
  • 30
    Para isso, basta lembrar um pouco da minha adolescência: das minhas aulas de Matemática, Biologia, Artes. Das músicas, das tribos que marcaram aquele tempo. Eu também não tinha computador, internet, videogame. Poderia também exemplificar em outras diferentes narrações que marcaram cada época, como no diário de Julieta Drummond de Andrade, citado anteriormente.
  • 31
    "Con frecuencia silenciosamente, en ocasiones despercebido, el estilo trabaja con las maneras en que las personas entiendem y se relacionan con el mundo que las rodea. Su influencia puede observarse dentro de los límites inseguros, pero sin embargo formativos, de la adolescencia, cuando se acelera la búsqueda de la identidad."
  • 32
    A revista
    Veja, em 2001, publicou a reportagem "Os
    games vão ao museu" (MARTHE, 2001). Tal reportagem comenta sobre a premiação de jogos digitais nos Estados Unidos pela Academia de Artes e Ciências. Um dos objetivos desse evento seria o de reconhecer os jogos como uma forma de arte popular, assim como o cinema ou o rock.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      18 Jan 2010
    • Data do Fascículo
      Dez 2009

    Histórico

    • Aceito
      24 Jul 2009
    • Recebido
      06 Nov 2008
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