Acessibilidade / Reportar erro

Política externa brasileira e trabalho: a questão sindical no centro das atenções (1964-1965) * * Agradeço aos colegas e professores do Programa de Pós-Graduação em História da UFSC e, em especial, ao Prof. Dr. Sidnei J. Munhoz, cujas indicações de leitura e reflexões foram caras para a escrita deste texto

Brazilian foreign policy and labor: the union issue in the spotlight (1964-1965)

Política exterior brasileña y trabajo: la cuestión sindical en el punto de mira (1964-1965)

Resumo

Este artigo busca compreender o papel do trabalho na condução da política externa brasileira e sua inserção na Organização Internacional do Trabalho (OIT) no período em que Arnaldo Lopes Süssekind ocupou o Ministério do Trabalho e da Previdência Social. Defendemos que a OIT se tornou um problema relevante para a diplomacia brasileira a partir de 1964, como ferramenta para obtenção de legitimidade ao Regime Militar, cuja política sindical era vista com desconfiança pela comunidade internacional, e que o Ministério do Trabalho, articulado com estrategistas trabalhistas estadunidenses, foi lócus privilegiado de elaboração e execução de estratégias de defesa do Estado brasileiro.

Palavras-chave:
Trabalho; Política externa; Organização Internacional do Trabalho; Arnaldo Lopes Süssekind

Abstract

This study aims to understand the role of the labor issue in the conduct of Brazilian foreign policy and in its performance at the International Labor Organization (ILO) during the period in which Arnaldo Lopes Süssekind occupied the Ministry of Labor and Social Welfare. We argue that ILO became a relevant problem for Brazilian diplomacy from 1964 onward as a tool to obtain legitimacy for the military regime, whose union policy was viewed with suspicion by the international community and that the Ministry of Labor, in conjunction with US labor strategists, was a privileged locus for the elaboration and execution of defense strategies for the Brazilian State.

Keywords:
Labor; Foreign policy; International Labor Organization; Arnaldo Lopes Süssekind

Resumen

Este texto busca comprender el papel de la cuestión laboral en la conducción de la política exterior brasileña y la inclusión del país en la Organización Internacional del Trabajo (OIT) durante el período en que Arnaldo Lopes Süssekind estuvo a cargo del Ministerio de Trabajo y Seguridad Social. Se sostiene que la OIT se convirtió en un problema relevante para la diplomacia brasileña a partir de 1964 al ser utilizada como herramienta para obtener legitimidad al régimen militar, cuya política sindical era vista con recelo por la comunidad internacional. Además, se argumenta que el Ministerio de Trabajo, en conjunto con los estrategas laborales estadounidenses, era un lugar privilegiado para la elaboración y ejecución de estrategias de defensa del Estado brasileño.

Palabras clave:
Labor; Política externa; Organización Internacional del Trabajo; Arnaldo Lopes Süssekind

Introdução

O senhor jamais sentiu algum tipo de resistência [na Organização Internacional do Trabalho] devido ao fato de o Brasil viver sob um regime autoritário?

Senti uma crítica velada, apenas, no ano de 1964. […] Herman Becker, adido trabalhista dos Estados Unidos, em Genebra, sugeriu que eu promovesse uma reunião com os líderes da Confederação Internacional das > Organizações Sindicais Livres (CIOSL). Nessa reunião, fechada, expliquei que o Movimento de 1964 tivera apoio popular e vinha acatando as normas do Direito do Trabalho. […] Mais tarde, durante os trabalhos da > conferência, li trechos do discurso do Castelo Branco, no 1º de maio de 1964, em que ele se referia à OIT, à reforma agrária e à justiça social. Isso deve ter apaziguado os ânimos.

Arnaldo Lopes Süssekind

(Gomes; Pessanha; Morel, 2004GOMES, Ângela de Castro; PESSANHA, Elina G.; MOREL, Regina de Moraes (org.). Arnaldo Süssekind, um construtor do direito do trabalho. Rio de Janeiro: Renovar, 2004.: 151-52)

Este trecho da entrevista conduzida por três historiadoras com Arnaldo Lopes Süssekind, ministro do Trabalho e Previdência Social do Brasil entre 1964 e 1965, levanta questões a respeito da relevância, na Organização Internacional do Trabalho (OIT), da questão trabalhista na condução da política externa brasileira nos primeiros anos pós-Golpe de 1964.

Para começar, qual foi a repercussão do Golpe de 1964 naquele fórum de governança global? Depois, quais foram as estratégias diplomáticas do Brasil, o papel do ministro e os resultados obtidos? E ainda: Qual o interesse estadunidense nas questões trabalhistas brasileiras, inseridas num contexto de Guerra Fria e de “batalha” pelo Brasil, país geopoliticamente relevante do conflito global durante a década de 1960?

O Brasil, como signatário do Tratado de Versalhes, é membro da OIT desde 1919. Todavia, o trecho acima indica que, entre 1964 e 1965, foram observadas tensões na atuação brasileira nesse organismo. Assim, almejamos aqui compreender o papel do trabalho na condução da política externa nos primeiros anos da Ditadura Civil-Militar brasileira, partindo das questões elencadas no parágrafo anterior. Para respondê-las, entendemos que é necessário explorar três frentes: a atividade brasileira na OIT; as movimentações do ministro Süssekind; e as sempre relevantes relações entre o Brasil e os Estados Unidos, principalmente no campo sindical.

A consecução de nossos objetivos se baseia em corpo documental guardado em diferentes acervos: correspondências da plataforma Opening the Archives nos ajudam a rastrear as observações dos Estados Unidos; os Records of Proceedings — anais das Conferências Internacionais do Trabalho (CIT) constantes no Labordoc, acervo on-line da OIT — nos proporcionam uma visão geral dos procedimentos e discussões ocorridas; 1 1 São nossas todas as traduções dos originais em língua inglesa. por fim, do arquivo do Tribunal Superior do Trabalho, conservado no fundo Ministro Arnaldo Süssekind, documentos referentes à viagem do ministro a Londres logo após a conferência de 1965, importantes para nossas reflexões acerca daquele momento.

Posto isso, este artigo afere inicialmente o interesse dos Estados Unidos em temas relacionados ao trabalho no Brasil no contexto do Golpe de 1964, no qual o desenvolvimento, o sindicalismo e a contenção do comunismo são elementos imbricados. Em seguida, analisa-se as movimentações do ministro Süssekind e a execução da estratégia de abordagem com a OIT durante as duas conferências e a viagem a Londres. Depois, lança uma hipótese que liga a política externa do período com os direitos humanos, discussão em voga na OIT desde a década de 1940. E, finalmente, o texto é concluído com algumas considerações parciais.

A política estadunidense para a América Latina no pós-Segunda Guerra: desenvolvimento, cooperação e sindicatos

No contexto da Segunda Guerra Mundial, os Estados Unidos estreitaram laços de cooperação econômica com os países da América Latina a fim de auxiliá-los em seu esforço de guerra. A expertise adquirida pelo país do norte nessas relações econômicas e a emergência de debates sobre a modernização (atrelada ao seu papel na contenção do “perigo vermelho”) foram decisivas para a elaboração e a execução do Ponto IV: plano de cooperação internacional iniciado pelo governo Truman, em 1949, e encerrado em meados dos anos 1950, em parceria com a Organização das Nações Unidas (ONU), voltado para os países da América Latina, da África e da Ásia. O plano atrelava

estrategicamente, por meio do auxílio técnico, o desenvolvimento dos países periféricos à segurança nacional dos Estados Unidos. A partir desse programa, a promoção global do desenvolvimento se institucionalizou como uma política fundamental da diplomacia estadunidense voltada ao combate ao comunismo e à expansão da hegemonia política e econômica dos Estados Unidos

(Damasceno, 2022DAMASCENO, Natália Abreu. O programa Ponto IV e a articulação de projetos estadunidenses de desenvolvimento para a América Latina (1949-1954). 2022. 274 f. Tese (Doutorado) – Centro de Filosofia e Ciências Humanas, Programa de Pós-Graduação em História, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2022. 274 p.: 15).

O Ponto IV desenvolveu projetos que incluíam oferta de treinamento de pessoal para indústria e comércio, incluindo intercâmbio para estudantes de áreas como administração pública, economia, entre outras. E fomentou também estudos nas áreas de economia, saúde pública, agricultura e afins (Damasceno, 2022DAMASCENO, Natália Abreu. O programa Ponto IV e a articulação de projetos estadunidenses de desenvolvimento para a América Latina (1949-1954). 2022. 274 f. Tese (Doutorado) – Centro de Filosofia e Ciências Humanas, Programa de Pós-Graduação em História, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2022. 274 p. ).

Assim como o Plano Marshall, o Ponto IV visava promover o sistema liberal capitalista no pós-guerra. Essa promoção envolvia também a criação de um arcabouço institucional de governança, que incluía parcerias entre Estado, iniciativa privada e instituições como o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial (Westad, 2007WESTAD, Odd. The Global Cold War: Third World Interventions and the Making of Our Times. New York: Cambridge, 2007. ). De fato, entre os estadunidenses, havia a crença de que os Estados Unidos lideravam um processo de modernização calcado na ciência, no progresso, na democracia, na tecnologia e no individualismo, ante sociedades com estruturas arcaicas. Dessa forma, era necessário modernizar o terceiro mundo para evitar o caos dessas sociedades em desarticulação e, por conseguinte, evitar janelas de oportunidades para a expansão de regimes comunistas. Foi dessa leitura que, no início dos anos 1960, surgiu a Aliança para o Progresso (Munhoz, 2020MUNHOZ, Sidnei J. Guerra Fria: história e historiografia. Curitiba: Appris, 2020. ). Fica patente então a centralidade dos planos de cooperação e auxílio para a política estadunidense na luta contra seu oponente ideológico no fronte de disputa que era então o terceiro mundo.

A cooperação com a intenção de modernizar a América Latina se estendia aos sindicatos. Entre as décadas de 1940 e 1960, a Federação Americana do Trabalho e Congresso de Organizações Industriais (AFL-CIO), central sindical estadunidense, articulou, com suas contrapartes latino-americanas, uma série de ações de intercâmbio, cursos e seminários para espalhar seu modelo para o restante do continente e isolar lideranças comunistas. A ação sindical era igualmente parte do escopo do Ponto IV:

O propósito do Ponto IV era combater o comunismo com a prosperidade, tal como sugerido pelo próprio título da legislação existente, a Lei de Segurança Mútua. As seções 516 e 528 do documento previam que os Estados Unidos deveriam incentivar nos países participantes “normas justas e boas condições de trabalho” e o desenvolvimento do “movimento sindical autônomo, bem como as iniciativas coletivas de negociação da mão de obra”. De acordo com as diretrizes, as metas do Ponto IV queriam aumentar a produtividade e promover o “desenvolvimento econômico e social equilibrado”, somado a um “forte movimento sindical autônomo que contribuiria com todos estes objetivos e seria a melhor garantia contra a invasão das organizações dos trabalhadores por comunistas profissionais e outros revolucionários”. […] No contexto dos anos 1950, tanto os Estados Unidos como a AFL viam o treinamento técnico e a assistência como centrais para cumprir essa missão

(Welch, 2009WELCH, Cliff. Internacionalismo trabalhista: o envolvimento dos Estados Unidos nos sindicatos brasileiros, 1945-1964. Perseu, São Paulo, n. 3, ano 3, p. 185-219, maio 2009.: 196-197).

Porém, problemas na execução do Ponto IV e, posteriormente, da Aliança para o Progresso fizeram os Estados Unidos, no início dos anos 1960, relegar os planos de auxílio e cooperação a um segundo plano “para centrar-se na contenção do comunismo por outros meios: treinamento militar e policial em operações de contrainsurgência e desenvolvimento econômico por intermédio da abertura do mercado aos investimentos externos privados” (Joffily, 2018JOFFILY, Mariana. A política externa dos EUA, os golpes no Brasil, no Chile e na Argentina e os direitos humanos. Topoi, Rio de Janeiro, v. 19, n. 38, p. 58-80, maio/ago. 2018.: 62). O país procurou, de maneira mais intensa, interferir no movimento sindical — e, por conseguinte, na política brasileira, com a criação do American Institute for Free Labor Development (AIFLD), administrado pela AFL-CIO e orientado pela Central Intelligence Agency (CIA). O AIFLD era parte do esforço do programa Aliança para o Progresso. Reforçaram-se os projetos “educacionais”, mas a avaliação feita pelos estrategistas trabalhistas dos Estados Unidos 2 2 Emprestando a acepção de Welch ( 2009 ), trata-se de burocratas estadunidenses ligados especificamente ao trabalho — líderes sindicais, secretários do trabalho e adidos às embaixadas —responsáveis pela articulação de ações de cooperação no campo sindical e do trabalho em âmbito internacional, a exemplo das mencionadas no parágrafo. Estendemos a denominação a seus contrapartes brasileiros — sindicalistas e burocratas, incluindo o ministro do Trabalho Arnaldo Lopes Süssekind — e também a estrategistas e articuladores da política para o trabalho. era de que o alcance das ações do AIFLD era limitado: “Muitos líderes sindicais não se comoveram com a promessa da ideologia sindical dos Estados Unidos, [e] mantiveram-se impassivelmente despreocupados com o comunismo e apoiados no CGT [Comando Geral dos Trabalhadores, o qual será abordado mais adiante neste artigo]” (Welch, 2009WELCH, Cliff. Internacionalismo trabalhista: o envolvimento dos Estados Unidos nos sindicatos brasileiros, 1945-1964. Perseu, São Paulo, n. 3, ano 3, p. 185-219, maio 2009.: 206).

Mesmo de alcance limitado, William Doherty Jr., diretor do AIFLD, notou que participantes dos cursos estiveram envolvidos na conspiração que levou ao Golpe de 1964, embora Welch minimize a participação dele. Todavia, os governos militares escolheram quadros sindicalistas simpáticos aos Estados Unidos para cargos de destaque, formados em cursos nos anos 1950 e 1960 (incluindo os do AIFLD), a exemplo de Ary Campista, para o Tribunal Superior do Trabalho, já no governo Médici (Dreifuss, 1981DREIFUSS, René. 1964: a conquista do Estado: ação política, poder e golpe de classe. Petrópolis, RJ: Vozes, 1981. ).

Podemos notar até aqui que a historiografia sobre o tema aponta para uma articulação no governo estadunidense, que incluía o componente dos estrategistas trabalhistas ligados aos sindicatos para influenciar ideológica e tecnicamente o movimento sindical brasileiro.

Num contexto de Guerra Fria, no qual os Estados Unidos vinham de uma derrota em Cuba e enfrentavam problemas no Brasil, Parker ( 1977PARKER, Phyllis R. 1964: o papel dos Estados Unidos no golpe de estado de 31 de março. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1977. ) salienta a participação estadunidense no golpe que derrubou o presidente João Goulart por meio do apoio institucional desde o primeiro momento e de suporte militar.

Mas o interesse estadunidense no movimento sindical brasileiro não parou com o Golpe. O país observou atentamente a formação do gabinete de Castelo Branco e os primeiros movimentos do novo governo no campo das relações sindicais.

Em telegrama para o Departamento de Estado, em 4 de abril de 1964, o embaixador estadunidense Lincoln Gordon teceu comentários sobre as nomeações de pastas civis. O perfil de Süssekind, nomeado ministro do Trabalho e Previdência Social, foi o mais longo:

Funcionário de carreira do Ministério do Trabalho, que, no presente momento, atua como presidente da Comissão Permanente de Direito Social no Ministério do Trabalho. 3 3 No telegrama completo, esse trecho está em branco. Contudo, em outro documento, na mensagem recebida pelo Departamento de Estado, consta o trecho completo. Nessa qualidade, é responsável pela elaboração da revisão do código do trabalho (agora pendente). Há muito tempo é amigo dos Estados Unidos; manteve contato próximo com a embaixada durante o governo Goulart. Apoiador entusiasta de organizações trabalhistas internacionais de orientação ocidental . Participou da conferência da OIT de dezembro de 1963 em Genebra, onde se elegeu membro do Comitê Relator. Süssekind manifestou preocupação aos funcionários da embaixada sobre a orientação ideológica e a ineficiência administrativa do Ministério sob Amaury Silva . Extremamente conhecedor dos problemas trabalhistas e da legislação trabalhista brasileira. Dada a tarefa particularmente difícil (considerando o grau de subversão do movimento trabalhista), ele esperava continuar a desempenhar o papel de administrador e técnico, em vez de político

(Gordon, 1964 GORDON, Lincoln. Brief Comment on CEW GOB Civilian Appointments. Rio de Janeiro: Foreign Service of the United States of America, 1964. Telegrama, 2 f. Brown University Library (Providence, RI); Brown Digital Repository; Opening the Archives: Documenting US-Brazil Relations, 1960s-1980s. Disponível em: https://repository.library.brown.edu/studio/item/bdr:985299/ . Acesso em: 29 set. 2023.
https://repository.library.brown.edu/stu...
: 1, grifos nossos).

Gordon reconhecia o novo ministro como um apoiador das organizações “de orientação ocidental”, ponto central para a AFL-CIO, criadora da Confederação Internacional de Organizações Sindicais Livres (CIOSL), cujo objetivo era ser rival da Federação Sindical Mundial (FSM), sediada no bloco socialista. Na mesma linha dessa observação, o embaixador informava que Süssekind pretendia ser um “técnico”, não um “político”, à frente da pasta. Esses sinais deveriam ser vistos como auspiciosos pela AFL-CIO, de que seu trabalho, através do AIFLD, pouco efetivo durante o governo Jango, teria agora um parceiro no Ministério do Trabalho — um “amigo” que “manteve contato” com a embaixada.

Süssekind teve seus primeiros passos acompanhados pela embaixada estadunidense. Em novo telegrama para o Departamento de Estado, em 8 de abril, houve relato de uma reunião no ministério envolvendo funcionários e representantes sindicais e empresariais. As impressões do telegrama anterior pareciam se reforçar entre os observadores estadunidenses. Foi relatado que Süssekind prometeu uma administração “não partidária” e que, na avaliação do adido trabalhista à embaixada, a fala do novo ministro foi bem recebida.

Um tema não exatamente novo, mas que emergiu no telegrama, foi o da intervenção no movimento sindical. Se, por um lado, Süssekind garantiu que o governo não restringiria os direitos dessas associações, por outro, afirmou: “A minha primeira preocupação é resolver o problema da intervenção das confederações sindicais e dos institutos de segurança social”. E seguiu assim o informe do discurso do ministro: “Anunciou a nomeação de funcionários de carreira não política para cargos-chave do ministério e como interventores da CNTI [Confederação Nacional dos Trabalhadores na Indústria, fundada em 1946] e outras confederações trabalhistas pró-CGT” (First…, 1964 FIRST Public Appearance for New Labor Minister. Rio de Janeiro: US Department of State, 1964. Telegrama, 1 f. Brown University Library (Providence, RI); Brown Digital Repository; Opening the Archives: Documenting US-Brazil Relations, 1960s-1980s. Disponível em: https://repository.library.brown.edu/studio/item/bdr:356751/ . Acesso em: 29 set. 2023.
https://repository.library.brown.edu/stu...
: 1).

Amigo dos Estados Unidos, pró-ocidental e técnico: características que iam ao encontro das pretensões de modernização ao estilo liberal-capitalista — o oposto do trabalhismo encarnado por João Goulart. Daí a aprovação dispensada ao novo ministro.

Embora a sua política trabalhista para a América Latina desaprovasse o controle estatal da organização sindical, os Estados Unidos, em determinados momentos, admitiram a necessidade do contrário. No contexto pós-golpe, essa contradição gerou tensões entre os estrategistas trabalhistas estadunidenses:

Em maio de 1964, Victor Reuther, diretor do Departamento de Assuntos Internacionais do Sindicato dos Trabalhadores do Setor Automotivo, levantou questões sobre o papel da ética do trabalho no Brasil na primeira reunião da Comissão Consultiva do Trabalho realizada após o Golpe. A título oficioso, Reuther ouviu relatos sobre a duplicidade das atividades da AIFLD no Brasil e sobre as frequentes reuniões entre os agentes, “o embaixador Gordon, o ministro do Trabalho, Arnaldo Süssekind, e o adido trabalhista, Baker”. O representante interamericano da AFL-CIO, Andrew McLellan, defendeu a prática do governo brasileiro de intervir nos sindicatos como “necessária para dar continuidade no aconselhamento jurídico e aos serviços de assistência social” prestados pelos sindicatos. O Ministério do Trabalho tinha marcado um simpósio sindical para o dia 8 de junho, o qual, nas palavras de McLellan, prometia “resultar no estabelecimento de um novo associativismo democraticamente orientado no movimento sindical”. Ao longo desse ano, a estrutura institucional do sistema trabalhista norte-americano estava chegando ao Brasil

(Welch, 2009WELCH, Cliff. Internacionalismo trabalhista: o envolvimento dos Estados Unidos nos sindicatos brasileiros, 1945-1964. Perseu, São Paulo, n. 3, ano 3, p. 185-219, maio 2009.: 207).

Como se vê, as articulações eram intensas entre o ministro do Trabalho e a embaixada estadunidense. O país do norte seguiu a linha de monitorar e procurar intervir nos destinos brasileiros. Welch chegou, em seu texto, à conclusão de que tal objetivo nunca foi amplamente cumprido, pois foi preciso enfrentar a “liberdade tolerada” dos sindicatos brasileiros, que em várias ocasiões rejeitaram os prepostos formados nos cursos estadunidenses, e também a autonomia dos governos, que, nem sempre, seguiram os desígnios yankees . Mas, em 1964, o governo brasileiro se apoiou nos Estados Unidos, como veremos a seguir.

A agenda internacional do ministro Arnaldo Lopes Süssekind na 48ª Conferência Internacional do Trabalho

Um dos tópicos de atrito entre Reuther e seus colegas em torno da política estadunidense para o Brasil era a prisão de Clodesmidt Riani, então presidente do CGT, e o fator de controvérsia que poderia gerar na próxima CIT. Mas os estrategistas estavam preparados:

Sobre este assunto, a Comissão decidiu preparar os governos dos Estados Unidos e da América Latina e os delegados trabalhadores para desviar o debate sobre a prisão de Riani, alegando que se tratava de um criminoso, e não de um problema trabalhista, pois Riani havia sido acusado pelo Código Penal

(Welch, 2009WELCH, Cliff. Internacionalismo trabalhista: o envolvimento dos Estados Unidos nos sindicatos brasileiros, 1945-1964. Perseu, São Paulo, n. 3, ano 3, p. 185-219, maio 2009.: 208).

Esse trecho parece reforçar uma consideração nossa sobre a importância da OIT como fórum internacional, como espaço de disputa e busca do governo Castelo Branco por legitimidade. Nessa busca, destacamos a figura do ministro do Trabalho e chefe da delegação brasileira para a CIT daquele ano, Arnaldo Lopes Süssekind.

Em entrevista citada na epígrafe deste artigo, concedida décadas depois dos acontecimentos aqui analisados, Süssekind efetivamente relatou a existência de críticas em 1964. Seu relato corrobora Welch no sentido de expor uma articulação entre estrategistas estadunidenses e brasileiros para enfrentar possíveis críticas na CIT, realizada dois meses após o Golpe. Um dos frutos dessa aliança, a reunião com a CIOSL, liderada pela AFL-CIO, foi bem avaliada pelo ministro brasileiro.

Durante a 48ª CIT, realizada entre 17 de junho e 9 de julho de 1964, em Genebra, na Suíça, confirmou-se o receio de Reuther e dos demais estrategistas trabalhistas estadunidenses: o Brasil foi denunciado pela prisão de Riani, que, em 1963, havia sido delegado dos trabalhadores brasileiros na conferência e eleito para mandato temporário no Conselho de Administração.

Inicialmente em plenário, Jan Wiszkielis, conselheiro da delegação dos trabalhadores poloneses (ou seja, do bloco socialista) e representante sindical, em extenso discurso, denunciou, de modo geral, as violações ao direito à liberdade de associação pelo mundo:

Não se pode ficar calado sobre a flagrante violação dos direitos e liberdades sindicais e as medidas repressivas contra os sindicalistas que ocorrem em países, entre outros, como Espanha, Brasil e Iraque, onde recentemente as organizações sindicais foram liquidadas. Tais atos não só devem ser condenados pela opinião mundial, mas também devem induzir o movimento sindical mundial a empreender, em acordo com a OIT, a ação que é indispensável para travar a onda de repressão dos sindicatos e contribuir para devolver aos trabalhadores desses países os direitos que lhes são conferidos no que diz respeito à liberdade de associação

(Record…, 1964RECORD of Proceedings: International Labour Conference, 48th Session, Geneva, 1964. Geneva: ILO, 1964.: 114).

Posteriormente, em vista da denúncia nominal propriamente dita, o ministro tratou de elaborar a defesa da legalidade da prisão de Riani, calcando-se na alegação de que o sindicalista não foi encarcerado por sua atividade sindical:

De posse de uma certidão da Justiça, provei que ele fora condenado por razões que não eram políticas, e a queixa foi arquivada. Era dirigente sindical? Sim. Opunha-se ao governo? Sim. Sua condenação devia-se a isso? Formalmente, não. A OIT respeita muito o Judiciário

(Gomes; Pessanha; Morel, 2004GOMES, Ângela de Castro; PESSANHA, Elina G.; MOREL, Regina de Moraes (org.). Arnaldo Süssekind, um construtor do direito do trabalho. Rio de Janeiro: Renovar, 2004.: 153).

Embora seja uma mistificação a versão de que a prisão de Riani, também deputado estadual pelo Partido Trabalhista Brasileiro de Minas Gerais (PTB-MG), não tivesse motivos políticos, 4 4 Conforme salienta Teixeirense ( 2022 ), o afã punitivo de setores das Forças Armadas ensejou um conjunto de dispositivos arbitrários, a exemplo dos famigerados Inquéritos Policiais Militares (IPM). A respeito do IPM instaurado para investigar supostas irregularidades na Confederação Nacional dos Trabalhadores na Indústria (CNTI), da qual Riani era presidente, discorre o historiador que, já em 1965 — Riani estava encarcerado desde o ano anterior —, o tenente-coronel Luiz Gonzaga de Andrada Serpa, encarregado do referido inquérito, “solicitava ‘documentos e provas’, os quais possibilitem ‘à Justiça ter uma visão de conjunto da corrupção e subversão existentes no governo deposto’. Em outras palavras: a conclusão do IPM já havia sido alcançada antes mesmo da análise dos dados; agora, era chegado o momento da reunião de documentos e de provas que sustentassem as conclusões” (Teixeirense, 2022: 120). Fica patente a arbitrariedade destes procedimentos, também demonstrada em outra passagem, uma entrevista concedida por Ernesto Geisel, quando respondeu uma questão sobre o embasamento jurídico dos processos instaurados naquele período: “Sobre o embasamento jurídico, prevalecia a revolução. Era um problema da revolução. Eram cassados, uns porque eram corruptos, outros pela ação nociva durante o governo Jango, e outros, enfim, porque poderiam prejudicar a ação da revolução” (Geisel apud Teixeirense, 2022: 46-47). realmente o Brasil não foi condenado. A confiança dos peritos da OIT no judiciário brasileiro parecia indicar também a normalização do golpe de Estado no país.

O que acreditamos ter sido uma operação de legitimação do novo governo prosseguiu nas sessões plenárias da CIT. A seguir, destacamos as intervenções de dois delegados brasileiros: Ary Campista e o ministro Süssekind.

Campista 5 5 Aparece em Dreifuss ( 1981: 438) como sindicalista pelego formado nos cursos estadunidenses e associado a institutos como o Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais (IPÊS) e o Instituto Brasileiro de Ação Democrática (IBAD). Deve-se a esse histórico a sua não surpreendente seleção como delegado dos trabalhadores na CIT. discursou na quarta sessão plenária, em 19 de julho: um libelo contra a política trabalhista de João Goulart, acusado de querer instalar uma república “sindicalista” no país e uma camarilha nos sindicatos por meio de eleições fraudulentas. É curioso o fato de que Campista insinuava que a liberdade sindical, conforme os preceitos da Convenção 87 da OIT, não era cumprida no Brasil de Jango, pois os sindicatos não eram representativos, visto que eram dirigidos por prepostos do presidente e instalados em processos eleitorais “fraudulentos”. Campista, nesse sentido, invertia a acusação de Wiszkielis, que, ao criticar a supressão da liberdade sindical, atentava para o ponto de que sindicatos controlados prejudicariam a seleção de legítimos representantes. A “Revolução” de 1964, por seu turno, aparecia como movimento de “regeneração”:

Foi em obediência à vontade popular […] que as Forças Armadas se empenharam num movimento regenerador, e mais tarde o movimento sindical e o povo se empenharam no processo revolucionário que está agora em pleno curso. Uma vez estabelecida a moralidade administrativa e sindical e restaurado o genuíno caráter representativo dos sindicatos, o movimento pôde, mais uma vez, desempenhar o seu papel de liderança na vida política, social e econômica do país

(Record…, 1964RECORD of Proceedings: International Labour Conference, 48th Session, Geneva, 1964. Geneva: ILO, 1964.: 35).

Ele finalizou sua fala lendo o discurso de 1º de maio pronunciado por Castelo Branco, assim como havia feito Süssekind na reunião diante da CIOSL.

A questão da liberdade sindical também foi central no discurso de Arnaldo Süssekind em 1º de julho, tanto que iniciou sua fala reforçando a crença na necessidade de sindicatos independentes, interligando essa necessidade ao treinamento de dirigentes sindicais através de parceria com a OIT:

Pensamos, portanto, que o trabalho do Instituto Internacional de Estudos do Trabalho neste campo é muito oportuno, pois ministra aulas, seminários e palestras para a formação de dirigentes, dirigentes sindicais e dirigentes especializados em questões sociais e laborais

(Record…, 1964RECORD of Proceedings: International Labour Conference, 48th Session, Geneva, 1964. Geneva: ILO, 1964.: 310).

Adiante, clamou à OIT para que fizesse o “máximo” em termos de cooperação técnica para os países em desenvolvimento, “pois são eles que mais precisam de ajuda”. Essa cooperação deveria, portanto, se estender à formação de quadros sindicais. Süssekind invocou também Castelo Branco, que estaria “convencido de que as organizações sindicais devem realmente representar as classes em questão e, num clima de autonomia e respeito à lei, manter a indispensável discussão permanente com os empregadores e as autoridades públicas” (Record…, 1964RECORD of Proceedings: International Labour Conference, 48th Session, Geneva, 1964. Geneva: ILO, 1964.: 310).

Em outra frente, ao elencar as ações do governo desde abril, buscava reforçar que se estava buscando cumprir as convenções ratificadas pelo país, diferentemente do período anterior — aqui, Süssekind não deixou de cutilar João Goulart —, e agilizar no Poder Legislativo a homologação de novas normas. Na conferência do ano seguinte, a adoção de onze convenções pelo governo brasileiro foi uma das grandes notícias apresentadas pelo ministro Süssekind.

Na 49ª Conferência Internacional do Trabalho

Em seu único discurso em plenário naquele 1965, em 18 de junho, o então ministro procurou reafirmar os laços de cooperação do Brasil com a OIT, supostamente reforçados desde o início do governo “eleito pelo Congresso Nacional após a revolução democrática de 31 de março de 1964” — note-se ainda a busca por legitimidade para o novo regime. Para ilustrar esse tópico, Süssekind aludiu à ratificação das onze convenções, o que

fortalece ainda mais os laços entre o Brasil e o grande trabalho desenvolvido por esta organização e, ao mesmo tempo, comprova a decisão e determinação do presidente da República e do Congresso Nacional em aplicar integralmente todas as normas adotadas por esta conferência

(Record…, 1965RECORD of Proceedings: International Labour Conference, 49th Session, Geneva, 1965. Geneva: ILO, 1965.: 345).

A questão sindical, central nas manifestações brasileiras em 1964, passou a dividir espaço com outros assuntos, como previdência, reforma agrária e justiça do trabalho. Entretanto, ainda como tema principal, o sindicalismo era mencionado no intuito de assegurar que a liberdade sindical não havia sido afetada no Brasil e que, mesmo não ratificada pelo país, a Convenção 87 não estava sendo desrespeitada:

O atual governo tem feito muitas revisões e limpezas, e só agora começa a ser compreendido pelas nações livres e democráticas. Muitos sindicatos estavam vinculados ao governo através do Fundo Social Sindical, que deixou de existir em dezembro passado. Muitos líderes sindicais obedeceram a ordens de autoridades governamentais, partidos ou facções políticas, e até de grupos estrangeiros. O atual governo libertou as organizações sindicais desta relação de subordinação, devolvendo-lhes a independência que é condição sine qua non na defesa dos seus interesses nas respectivas categorias. De 1º de abril de 1964 a 31 de maio de 1965, realizaram-se 1.040 eleições sindicais sem qualquer influência governamental, partidária, política ou econômica

(Record…, 1965RECORD of Proceedings: International Labour Conference, 49th Session, Geneva, 1965. Geneva: ILO, 1965.: 344-345).

As intervenções em sindicatos, tema debatido entre os estrategistas trabalhistas estadunidenses e brasileiros, voltou à baila novamente, agora com o objetivo de normalizar a situação no país e desmentir, mais uma vez, qualquer violação da Convenção 87.

Conferência na Chatham House: ponto alto da viagem de Süssekind

Para 1965, porém, o tour europeu do ministro era mais longo. Ele deixou Genebra mais cedo para atender compromissos em Londres, entre 23 e 25 de junho. Segundo Süssekind, “o presidente da República determinou que fosse a Londres, antes de regressar ao Brasil, para pronunciar uma conferência na Shelton House [sic], explicando os objetivos do Movimento de 1964” (Gomes; Pessanha; Morel, 2004GOMES, Ângela de Castro; PESSANHA, Elina G.; MOREL, Regina de Moraes (org.). Arnaldo Süssekind, um construtor do direito do trabalho. Rio de Janeiro: Renovar, 2004.: 134).

A agenda incluiu, posteriormente, reuniões com Ray Gunter, ministro britânico do Trabalho, e Lord Walston, subsecretário no Foreign Office. No dia seguinte, realizou audiência com George Woodcock, secretário-geral do Trade Union Congress, central sindical britânica, e almoço com o embaixador brasileiro no Reino Unido, Carlos Alves de Souza. Finalmente, no dia 25, reunião com Margaret Herbison, ministra de Pensões e Seguridade Nacional (Programme…, 1965PROGRAMME for the Visit of His Excellency Dr. Arnaldo Lopes Sussekind, Minister of Labour and Social Insurance of Brazil. London: Foreign Office, 1965. 2 f. Arquivo do Tribunal Superior do Trabalho (TST); Fundo Ministro Arnaldo Lopes Süssekind; pasta 161.: 1-2).

Podemos notar que os encontros denotam a interpenetração da agenda do trabalho, com audiências de ministros e representantes sindicais e agenda das relações exteriores de modo mais amplo, ilustrada pelo acompanhamento recebido do Foreign Office.

Efetivamente, o ponto alto (e inicial) foi a conferência na Chatham House, sede do Instituto Real de Assuntos Internacionais (em inglês, The Royal Institute of International Affairs), think tank sediado na capital inglesa. O objetivo da comunicação era relatar “o progresso, verificado em nosso país, no que diz respeito às relações humanas e ao alcance à profundidade das nossas conquistas no campo da legislação social” (Süssekind, 1965SÜSSEKIND, Arnaldo Lopes. A Previdência Social e os sindicatos no Brasil. [S. l.]: Ministério do Trabalho e Previdência Social, 1965. 13 f. Arquivo do Tribunal Superior do Trabalho (TST); Fundo Ministro Arnaldo Lopes Süssekind; pasta 161.: 2). E, com esse relato, “fazer luz sobre importantes setores da atividade do Ministério, que, pela própria natureza de suas atribuições, tem sido vítima de incompreensões e de deturpações propositadas” (Süssekind, 1965SÜSSEKIND, Arnaldo Lopes. A Previdência Social e os sindicatos no Brasil. [S. l.]: Ministério do Trabalho e Previdência Social, 1965. 13 f. Arquivo do Tribunal Superior do Trabalho (TST); Fundo Ministro Arnaldo Lopes Süssekind; pasta 161.: 12-13).

Os tópicos abordados pelo ministro foram diversos. Iniciou relembrando os laços diplomáticos entre Brasil e Inglaterra, cuja “constante assistência”, desde o século XIX, contribuiu para o êxito de “muitos fatos da evolução brasileira”.

Com efeito, a primeira metade de seu texto procurava traçar um histórico da questão do trabalho, da previdência e da desigualdade econômica e social no Brasil, passando pela formação do país até 1964. Aqui, gostaríamos de pontuar a interpretação dada para 1930, apontando para a Primeira República e os “obstáculos decorrentes de preconceitos de um liberalismo econômico e de um anti-intervencionismo estatal” (Süssekind, 1965SÜSSEKIND, Arnaldo Lopes. A Previdência Social e os sindicatos no Brasil. [S. l.]: Ministério do Trabalho e Previdência Social, 1965. 13 f. Arquivo do Tribunal Superior do Trabalho (TST); Fundo Ministro Arnaldo Lopes Süssekind; pasta 161.: 4) — que contribuíram para agravar os problemas sociais e gerar um sentimento de insatisfação crescente entre as “camadas inferiores”, o que exigia mudanças na sociedade. E então,

antes que esse estado de inconformismo se convertesse em consciência coletiva de revolta, a visão política brasileira […] antecipou-se, a partir de 1930, ao movimento das massas, fazendo promulgar uma legislação trabalhista que, pelas inovações que apresentava, poderia ser considerada, na época, das mais avançadas do mundo

(Süssekind, 1965SÜSSEKIND, Arnaldo Lopes. A Previdência Social e os sindicatos no Brasil. [S. l.]: Ministério do Trabalho e Previdência Social, 1965. 13 f. Arquivo do Tribunal Superior do Trabalho (TST); Fundo Ministro Arnaldo Lopes Süssekind; pasta 161.: 3).

Dito de outro modo, Süssekind interpretava 1930 como um momento em que a classe política brasileira passou a dirigir um processo de modernização conservadora, de cima para baixo, aprimorado durante os anos do Estado Novo, e expressou isso na criação do Ministério do Trabalho, dos Institutos de Pensão, da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), entre outras medidas.

Ele procurou argumentar que a obra iniciada em 1930 no campo social estava desvirtuada pela gestão de João Goulart, que teria convertido sindicatos e institutos previdenciários em “instrumentos importantes para a realização da política partidária pessoal”. Esse cenário de aparelhamento e corrupção teria sido o exclusivo causador do déficit previdenciário que sua gestão “técnica” e “apartidária”, a partir de abril de 1964, procurou sanar. O ministro, inclusive, apresentou números favoráveis de sua gestão à audiência britânica.

O tópico do sindicalismo foi amplamente abordado. Inicialmente, não escondeu o papel do Estado na vida sindical, afirmando que, em sua gestão, “o Estado se preocupava em ordenar as relações entre as forças do capital e do trabalho, regulando-lhes a vida associativa através da atividade sindical” (Süssekind, 1965SÜSSEKIND, Arnaldo Lopes. A Previdência Social e os sindicatos no Brasil. [S. l.]: Ministério do Trabalho e Previdência Social, 1965. 13 f. Arquivo do Tribunal Superior do Trabalho (TST); Fundo Ministro Arnaldo Lopes Süssekind; pasta 161.: 8).

Em seguida, explanou a escolha pela unidade em vez da pluralidade sindical, opção adotada na Lei Sindical de 1939 e consolidada na CLT em 1943: “Atendeu a condições de natureza sociológica e geográfica, pois visou ao fortalecimento da organização sindical num país cuja extensão territorial impedia, com algumas exceções, a formação de grandes concentrações operárias” (Süssekind, 1965SÜSSEKIND, Arnaldo Lopes. A Previdência Social e os sindicatos no Brasil. [S. l.]: Ministério do Trabalho e Previdência Social, 1965. 13 f. Arquivo do Tribunal Superior do Trabalho (TST); Fundo Ministro Arnaldo Lopes Süssekind; pasta 161.: 9).

A unidade sindical era uma herança do corporativismo estado-novista e deveria, em suas palavras, ser uma forma de evitar a infiltração político-partidária nas atividades sindicais. Mesmo assim, ele ponderava que a autonomia não estaria prejudicada, desde que “exercida dentro da moldura legal que estabelece as fronteiras além das quais a ação dos sindicatos se divorcia dos seus fundamentos e finalidades” (Süssekind, 1965SÜSSEKIND, Arnaldo Lopes. A Previdência Social e os sindicatos no Brasil. [S. l.]: Ministério do Trabalho e Previdência Social, 1965. 13 f. Arquivo do Tribunal Superior do Trabalho (TST); Fundo Ministro Arnaldo Lopes Süssekind; pasta 161.: 10).

Toda essa introdução abriu caminho para as já mencionadas críticas à “instrumentalização” do movimento sindical, supostamente realizadas pelo presidente Goulart e, como contraste, para a política do novo regime, o qual se caracterizava pelas intervenções em sindicatos, como citado antes. Süssekind foi rápido em justificá-las, com base na legislação da CLT, de que, mesmo ocorrendo, não teriam suprimido a vida sindical, posto que atingiam “apenas” 15% das associações, que estavam sob comando dos “comunistas”, como os do CGT. Ele chegou a apresentar um plano: até o fim de 1965, não haveria mais nenhum sindicato sob intervenção. Depois desse momento, qual seria o futuro? Eleições e liberdade sindical: para justificar e demonstrar a legalidade do processo, apontou, assim como feito na CIT, a ocorrência de 1.040 eleições sindicais desde o Golpe, “e nunca foram elas tão livres, pois nem o governo, nem os partidos políticos, nem os agentes da subversão interferem nos respectivos pleitos” (Süssekind, 1965SÜSSEKIND, Arnaldo Lopes. A Previdência Social e os sindicatos no Brasil. [S. l.]: Ministério do Trabalho e Previdência Social, 1965. 13 f. Arquivo do Tribunal Superior do Trabalho (TST); Fundo Ministro Arnaldo Lopes Süssekind; pasta 161.: 12).

Liberdade sindical: um debate sobre direitos humanos?

De um lado, a articulação entre estrategistas trabalhistas estadunidenses e brasileiros, em 1964, para blindar o Brasil de críticas na CIT daquele ano, de outro, a estratégia de busca de legitimação internacional para o regime e, mais especificamente, para a sua política sindical, perseguida em 1965. Ambas demonstravam preocupação com a questão sindical, que nos parece central. Todavia, isso também nos chamou a atenção para o tema dos direitos humanos no âmbito da OIT. Nesta seção, portanto, procuramos situar esse debate sobre liberdade de associação no contexto da década de 1960, defendendo que os estrategistas se viram com um problema em mãos: um problema de direitos humanos, posto o estatuto da Convenção 87 da OIT.

No pós-Segunda Guerra, especialmente depois da Declaração da Filadélfia, de 1944, a OIT aumentou seu escopo de atuação, como uma tática de sobrevivência no novo sistema de organizações internacionais. Assim, durante os anos sob a direção-geral do estadunidense David Morse (1948-1970), a OIT tomou para si funções de assistência técnica e passou a atentar para a questão dos direitos humanos na redação de suas normas. A organização almejava que suas atividades se constituíssem como um caminho para a realização desses direitos. O impacto dessa mudança pode ser verificado nas novas normas adotadas no período:

A nova ênfase nos direitos humanos na definição de normas torna-se mais evidente pelo fato de que todas, exceto três das que a OIT considera hoje como suas normas trabalhistas fundamentais, foram adotadas durante suas conferências anuais entre 1948 e 1958, ou seja, durante os primeiros dez anos de Morse no cargo (Liberdade de Associação, 1948; Direito à Negociação Coletiva, 1949; Igualdade de Remuneração, 1951; Abolição do Trabalho Forçado, 1957; e Discriminação no Emprego e Ocupação, 1958)

(Maul, 2010MAUL, Daniel Roger. The “Morse Years”: The ILO 1948-1970. In: VAN DAELE, Jasmien et al. (ed.). ILO Histories: Essays on the International Labour Organization and Its Impact on the World during the Twentieth Century. Bern: Lang, 2010. p. 365-400.: 393).

Das convenções citadas, as duas últimas foram ratificadas no “pacotão” de 1965, mas a de liberdade de associação (Liberdade Sindical), Convenção 87, não foi adotada pelo Brasil. Não ratificar uma convenção não exime um Estado-membro de responsabilidades, visto que, em última instância, deve respeitar a constituição da organização. O próprio Arnaldo Süssekind estava ciente disso:

Relativamente às convenções não ratificadas e às recomendações, os governos dos Estados-membros têm a obrigação de enviar relatórios ao diretor-geral da RIT [Repartição Internacional do Trabalho, em inglês, International Labour Office, o secretariado técnico e administrativo da organização], nas datas fixadas pelo Conselho de Administração, informando-lhe sobre o estado de sua legislação e a prática, no que respeita aos assuntos versados no diploma, indicando em que medida aplica ou se propõe a pôr em execução qualquer das suas disposições, seja por via legislativa ou administrativa, seja mediante contratos coletivos ou outras formas, esclarecendo ainda as dificuldades que impedem ou retardam a ratificação (art. 19, §5º e §6º, da Const.)

(Süssekind, 1986SÜSSEKIND, Arnaldo Lopes. O Brasil e a Organização Internacional do Trabalho. Revista do Tribunal Superior do Trabalho, São Paulo, v. 55, p. 105-116, 1986.: 111).

Tampouco os Estados Unidos incorporaram a Convenção 87 até a presente data ao seu ordenamento jurídico interno. Mesmo assim, havia, nos estrategistas de ambos os países, o receio de que as prisões de sindicalistas no Brasil pudessem gerar reações na OIT por violarem diretamente essa norma.

O conteúdo dos direitos humanos encontrou centralidade na diplomacia estadunidense apenas no governo Carter (1977-1981), porém, à época do golpe no Brasil (e depois, subsequentemente, em outros países do Cone Sul), o assunto apresentava uma contradição:

Quando iniciaram os expurgos de simpatizantes do governo de João Goulart e as violências contra os setores oposicionistas, incluindo prisões ilegais, a diplomacia estadunidense teve de enfrentar um dilema que seria uma constante em sua política externa: dar sustentação ao aliado anticomunista, comprometendo a coerência de sua retórica democrática e legalista e arriscando-se a alimentar o antiamericanismo, ou distanciar-se do governo que ajudara a colocar no poder, enfraquecendo sua influência política no país. No caso brasileiro, como em outros, optou-se pela primeira alternativa

(Joffily, 2018JOFFILY, Mariana. A política externa dos EUA, os golpes no Brasil, no Chile e na Argentina e os direitos humanos. Topoi, Rio de Janeiro, v. 19, n. 38, p. 58-80, maio/ago. 2018.: 63-64).

As conclusões de Joffily corroboram as de Welch quanto às tensões entre os estrategistas trabalhistas estadunidenses em 1964. Conforme demonstramos, eles optaram por articular no Ministério do Trabalho do Brasil uma estratégia de blindagem e legitimação ao novo regime, o defendendo de acusações de violação dos direitos humanos à liberdade de associação feitas à OIT. Em outros termos, sob a lente das relações de trabalho, os estrategistas do Brasil e dos Estados Unidos já se preocupavam com a questão dos direitos humanos no contexto do Golpe de 1964. Mesmo não mencionando diretamente o termo “direitos humanos”, estavam tratando deles por meio da defesa da política sindical aplicada pela pasta do ministro Arnaldo Süssekind.

Um balanço da “operação”

No decorrer do texto, defendemos que uma “diplomacia do trabalho” foi traçada primordialmente no Ministério do Trabalho pós-Golpe de 1964, em aliança com as figuras ligadas ao sindicalismo dos Estados Unidos — país preocupado, desde os anos 1940, em exportar seu modelo sindical para o Brasil e para a América Latina como parte de um plano maior, que envolvia cooperação e modernização econômica nos moldes liberais e capitalistas com o fito de conter o avanço comunista no continente. Essa diplomacia tinha como objetivo executar uma campanha de legitimação do novo regime, a qual foi dirigida com sucesso, entre 1964 e 1965, pelo ministro do Trabalho Arnaldo Lopes Süssekind.

Na OIT, a defesa do governo contra a denúncia da prisão de Clodesmidt Riani foi bem-sucedida, assim como o pacote de convenções ratificadas em 1965, incluindo as 105 e 111, de direitos humanos fundamentais para a OIT. Tanto as relações estavam normalizadas que o relatório do diretor-geral David Morse, redigido para a 49ª CIT explanando as atividades da organização durante o ano anterior, relatava a continuidade dos programas de educação e formação profissional tocados por ela em cooperação com instituições brasileiras, como o Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (Senac) (Morse, 1965MORSE, David A. Report of the Director-General to the International Labour Conference. Geneva: ILO, 1965.: 38). No Reino Unido, Süssekind teve espaço privilegiado para defender o governo Castelo Branco e, com maior ênfase, sua política sindical, criticada no âmbito da OIT.

Os meandros, as resistências e as táticas dessa operação nos levam a concluir que a questão do trabalho foi relevante na condução da política externa brasileira no contexto pós-Golpe de 1964, dada sua repercussão naquela organização na forma de denúncias contra o Brasil e também na atenção dedicada à elaboração das estratégias de aproximação com a comunidade internacional.

Entendemos ainda que a discussão sobre direitos humanos permeou a operação, mesmo sem citar diretamente a expressão. Os pontos de controvérsia a serem eximidos eram a violação da liberdade sindical e, amplamente, a supressão do movimento sindical no contexto da repressão do novo regime. Ora, a liberdade sindical é um dos direitos fundamentais dos trabalhadores na visão da OIT e a convenção que a normatiza é, por isso, uma convenção de direitos humanos, aprovada num período de grande atenção da organização e de seus Estados-membros a esse tópico.

A “batalha do Brasil” foi vencida também na OIT — um regime autoritário, com apoio dos Estados Unidos, foi normalizado. Mas a questão dos direitos humanos não se encerraria ali. Ao contrário: para os policymakers estadunidenses, ela se tornaria pedra angular da política externa durante o governo Carter (1977-1981). E para o Brasil, a denúncia pela prisão de Riani não seria a última acusação de violação de direitos humanos enfrentada na OIT durante a Ditadura Civil-Militar. Há, portanto, muito ainda a ser estudado nessa seara.

Referências

  • DAMASCENO, Natália Abreu. O programa Ponto IV e a articulação de projetos estadunidenses de desenvolvimento para a América Latina (1949-1954). 2022. 274 f. Tese (Doutorado) – Centro de Filosofia e Ciências Humanas, Programa de Pós-Graduação em História, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2022. 274 p.
  • DREIFUSS, René. 1964: a conquista do Estado: ação política, poder e golpe de classe. Petrópolis, RJ: Vozes, 1981.
  • FIRST Public Appearance for New Labor Minister. Rio de Janeiro: US Department of State, 1964. Telegrama, 1 f. Brown University Library (Providence, RI); Brown Digital Repository; Opening the Archives: Documenting US-Brazil Relations, 1960s-1980s. Disponível em: https://repository.library.brown.edu/studio/item/bdr:356751/ . Acesso em: 29 set. 2023.
    » https://repository.library.brown.edu/studio/item/bdr:356751/
  • GOMES, Ângela de Castro; PESSANHA, Elina G.; MOREL, Regina de Moraes (org.). Arnaldo Süssekind, um construtor do direito do trabalho. Rio de Janeiro: Renovar, 2004.
  • GORDON, Lincoln. Brief Comment on CEW GOB Civilian Appointments. Rio de Janeiro: Foreign Service of the United States of America, 1964. Telegrama, 2 f. Brown University Library (Providence, RI); Brown Digital Repository; Opening the Archives: Documenting US-Brazil Relations, 1960s-1980s. Disponível em: https://repository.library.brown.edu/studio/item/bdr:985299/ . Acesso em: 29 set. 2023.
    » https://repository.library.brown.edu/studio/item/bdr:985299/
  • JOFFILY, Mariana. A política externa dos EUA, os golpes no Brasil, no Chile e na Argentina e os direitos humanos. Topoi, Rio de Janeiro, v. 19, n. 38, p. 58-80, maio/ago. 2018.
  • MAUL, Daniel Roger. The “Morse Years”: The ILO 1948-1970. In: VAN DAELE, Jasmien et al. (ed.). ILO Histories: Essays on the International Labour Organization and Its Impact on the World during the Twentieth Century. Bern: Lang, 2010. p. 365-400.
  • MORSE, David A. Report of the Director-General to the International Labour Conference. Geneva: ILO, 1965.
  • MUNHOZ, Sidnei J. Guerra Fria: história e historiografia. Curitiba: Appris, 2020.
  • PARKER, Phyllis R. 1964: o papel dos Estados Unidos no golpe de estado de 31 de março. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1977.
  • PROGRAMME for the Visit of His Excellency Dr. Arnaldo Lopes Sussekind, Minister of Labour and Social Insurance of Brazil. London: Foreign Office, 1965. 2 f. Arquivo do Tribunal Superior do Trabalho (TST); Fundo Ministro Arnaldo Lopes Süssekind; pasta 161.
  • RECORD of Proceedings: International Labour Conference, 48th Session, Geneva, 1964. Geneva: ILO, 1964.
  • RECORD of Proceedings: International Labour Conference, 49th Session, Geneva, 1965. Geneva: ILO, 1965.
  • SÜSSEKIND, Arnaldo Lopes. A Previdência Social e os sindicatos no Brasil. [S. l.]: Ministério do Trabalho e Previdência Social, 1965. 13 f. Arquivo do Tribunal Superior do Trabalho (TST); Fundo Ministro Arnaldo Lopes Süssekind; pasta 161.
  • SÜSSEKIND, Arnaldo Lopes. O Brasil e a Organização Internacional do Trabalho. Revista do Tribunal Superior do Trabalho, São Paulo, v. 55, p. 105-116, 1986.
  • TEIXEIRENSE, Pedro Ivo. A invenção do inimigo: história e memória dos dossiês e contradossiês da Ditadura Militar Brasileira: 1964-2001. Rio de Janeiro: Arquivo Nacional, 2022. 287 p.
  • WELCH, Cliff. Internacionalismo trabalhista: o envolvimento dos Estados Unidos nos sindicatos brasileiros, 1945-1964. Perseu, São Paulo, n. 3, ano 3, p. 185-219, maio 2009.
  • WESTAD, Odd. The Global Cold War: Third World Interventions and the Making of Our Times. New York: Cambridge, 2007.

Notas

  • 1
    São nossas todas as traduções dos originais em língua inglesa.
  • 2
    Emprestando a acepção de Welch ( 2009WELCH, Cliff. Internacionalismo trabalhista: o envolvimento dos Estados Unidos nos sindicatos brasileiros, 1945-1964. Perseu, São Paulo, n. 3, ano 3, p. 185-219, maio 2009. ), trata-se de burocratas estadunidenses ligados especificamente ao trabalho — líderes sindicais, secretários do trabalho e adidos às embaixadas —responsáveis pela articulação de ações de cooperação no campo sindical e do trabalho em âmbito internacional, a exemplo das mencionadas no parágrafo. Estendemos a denominação a seus contrapartes brasileiros — sindicalistas e burocratas, incluindo o ministro do Trabalho Arnaldo Lopes Süssekind — e também a estrategistas e articuladores da política para o trabalho.
  • 3
    No telegrama completo, esse trecho está em branco. Contudo, em outro documento, na mensagem recebida pelo Departamento de Estado, consta o trecho completo.
  • 4
    Conforme salienta Teixeirense ( 2022TEIXEIRENSE, Pedro Ivo. A invenção do inimigo: história e memória dos dossiês e contradossiês da Ditadura Militar Brasileira: 1964-2001. Rio de Janeiro: Arquivo Nacional, 2022. 287 p. ), o afã punitivo de setores das Forças Armadas ensejou um conjunto de dispositivos arbitrários, a exemplo dos famigerados Inquéritos Policiais Militares (IPM). A respeito do IPM instaurado para investigar supostas irregularidades na Confederação Nacional dos Trabalhadores na Indústria (CNTI), da qual Riani era presidente, discorre o historiador que, já em 1965 — Riani estava encarcerado desde o ano anterior —, o tenente-coronel Luiz Gonzaga de Andrada Serpa, encarregado do referido inquérito, “solicitava ‘documentos e provas’, os quais possibilitem ‘à Justiça ter uma visão de conjunto da corrupção e subversão existentes no governo deposto’. Em outras palavras: a conclusão do IPM já havia sido alcançada antes mesmo da análise dos dados; agora, era chegado o momento da reunião de documentos e de provas que sustentassem as conclusões” (Teixeirense, 2022TEIXEIRENSE, Pedro Ivo. A invenção do inimigo: história e memória dos dossiês e contradossiês da Ditadura Militar Brasileira: 1964-2001. Rio de Janeiro: Arquivo Nacional, 2022. 287 p.: 120). Fica patente a arbitrariedade destes procedimentos, também demonstrada em outra passagem, uma entrevista concedida por Ernesto Geisel, quando respondeu uma questão sobre o embasamento jurídico dos processos instaurados naquele período: “Sobre o embasamento jurídico, prevalecia a revolução. Era um problema da revolução. Eram cassados, uns porque eram corruptos, outros pela ação nociva durante o governo Jango, e outros, enfim, porque poderiam prejudicar a ação da revolução” (Geisel apud Teixeirense, 2022TEIXEIRENSE, Pedro Ivo. A invenção do inimigo: história e memória dos dossiês e contradossiês da Ditadura Militar Brasileira: 1964-2001. Rio de Janeiro: Arquivo Nacional, 2022. 287 p.: 46-47).
  • 5
    Aparece em Dreifuss ( 1981DREIFUSS, René. 1964: a conquista do Estado: ação política, poder e golpe de classe. Petrópolis, RJ: Vozes, 1981.: 438) como sindicalista pelego formado nos cursos estadunidenses e associado a institutos como o Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais (IPÊS) e o Instituto Brasileiro de Ação Democrática (IBAD). Deve-se a esse histórico a sua não surpreendente seleção como delegado dos trabalhadores na CIT.
  • *
    Agradeço aos colegas e professores do Programa de Pós-Graduação em História da UFSC e, em especial, ao Prof. Dr. Sidnei J. Munhoz, cujas indicações de leitura e reflexões foram caras para a escrita deste texto
  • Fonte de financiamento: Não houve.
  • Contribuição dos autores: Não se aplica.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    26 Abr 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    14 Dez 2023
  • Aceito
    18 Mar 2024
Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil da Fundação Getúlio Vargas Secretaria da Revista Estudos Históricos, Praia de Botafogo, 190, 14º andar, 22523-900 - Rio de Janeiro - RJ, Tel: (55 21) 3799-5676 / 5677 - Rio de Janeiro - RJ - Brazil
E-mail: eh@fgv.br