Acessibilidade / Reportar erro

O pronto-atendimento em um Hospital Oftalmológico no Sul do Brasil

Resumo

Objetivo:

Traçar um perfil epidemiológico de pacientes com emergências oftalmológicas, e a prevalência de conjuntivites em duas estações do ano.

Métodos:

Estudo retrospectivo, transversal, através de revisão de prontuários de pacientes do pronto-atendimento do Hospital de Olhos do Paraná, referente ao período de uma semana do primeiro mês do verão e do inverno. As idades, queixas principais e diagnósticos foram organizados em grupos.

Resultados:

Foram revisados 2086 prontuários. O sexo masculino abrangeu 51,9%. A média da idade foi de 38±21 anos. O grupo de conjuntivites se destacou, com 46,4% do total de diagnósticos. Conjuntivites infecciosas (virais e bacterianas) somam 57,1%, 46,7%, 57,6%, 59,3% e 54,7% do total de conjuntivites nos grupos etários de 0-9 anos, 10-19 anos, 20-39 anos, 40-59 anos e ≥60 anos, respectivamente. No verão, dentre as conjuntivites, as alérgicas foram as mais prevalentes (34,7%), seguido por virais (29,6%), bacterianas (27,2%) e não especificadas (8,5%). Já no inverno, tiveram maior prevalência as virais (35%), seguido pelas alérgicas (34,7%), bacterianas (21,7%) e não especificadas (8,6%). A conjuntivite foi responsável por 78,5% dos diagnósticos na 1a década de vida contra 26,4% a partir da 7a década. Os outros diagnósticos mais prevalentes foram hordéolo/calázio (9,59%), ceratite ou úlcera bacteriana (6,52%) e hiposfagma (5,51%).

Conclusão:

O grupo de conjuntivites, em especial as conjuntivites infecciosas, foram as doenças mais frequentes dentre todos os diagnósticos. O inverno trouxe maior prevalência de conjuntivites gerais. Em ambas as estações houveram mais casos de conjuntivites virais que bacterianas, mas as virais foram mais expressivas no inverno. A prevalência de conjuntivites alérgicas foi a mesma nas duas estações. A faixa etária mais acometida por conjuntivites gerais foi a de 0 a 9 anos de idade.

Descritores:
oftalmológicas; Departamento de Emergência; Oftalmopatias; Sazonalidade; Conjuntivite/epidemiologia

Abstract

Purpose:

To ascertain the main ophthalmological acute diseases and the prevalence of conjunctivitis in two seasons of the year.

Methods:

Retrospective study by reviewing medical records review of medical records for the one-week period of the first month of summer and winter of the emergency department of the Hospital de Olhos do Paraná, in summer and winter seasons. The ages, major complaints and diagnoses were organized into groups.

Results:

Of 2086 patients, conjunctivitis had 46.4% of diagnoses. Infective conjunctivitis (viral and bacterial) accounted for 57.1%, 46.7%, 57.6%, 59.3% and 54.7% of total conjunctivitis in the age groups of 0-9 years, 10-19 years, 20-39 years, 40-59 years and ≥60 years, respectively. In summer, the most prevalent type of conjunctivitis was allergic (34.7%), followed by viral (29.6%), bacterial (27.2%) and unspecified (8.5%). In the winter, the prevalence sequence was viral (35%), allergic (34.7%), bacterial (21.7%) and unspecified (8.6%). Furthermore, conjunctivitis was responsible for 78.5% of the diagnoses in the first decade of life versus 26.4% from the seventh decade. The other most prevalent diagnoses were hordeolum / chalazion (9.59%), keratitis or bacterial ulcer (6.52%) and hyposphagma (5.51%).

Conclusion:

The group of conjunctivitis had the higher prevalence among the diagnosis. The winter season had a higher prevalence of general conjunctivitis. Both seasons have more viral than bacterial cases, but viral cases were more expressive in the winter. Allergic conjunctivitis had the same prevalence in the analyzed seasons. The age group most affected by general conjunctivitis was 0 to 9 years of age.

Keywords:
Opthalmic emergencies; Emergency Department; Eye diseases; Sazonality; Conjunctivitis/epidemiology

Introdução

A população está exposta a fatores biológicos, físicos, sociais e ambientais que podem culminar na necessidade de pronto atendimento oftalmológico. (11 Adam Netto A, Wayhs LF, Santos Júnior EC. Diagnósticos emergenciais em oftalmologia em um hospital universitário. Rev Bras Oftalmol. 2002;61(12): 877-83.,22 Figueiredo MN, Tanarah ML, Stival LR, Junior JJ. Perfil epidemiológico dos atendimentos oftalmoógicos em um serviço público (SUS). Rev Cient ITPAC. 2015;8(2):5.) Frente a doenças oculares agudas, o comportamento dos pacientes varia de automedicação por informações de internet, amigos, drogarias; a atendimento médico com clínicos gerais ou oftalmologistas. (33 Carvalho RS, Kara José N. Ophthalmology emergency room at the University of São Paulo General Hospital: a terciary hospital providing primary and secondary level care. Clinics. 2007;62(3):301-8.)

As situações emergenciais abrangem desde desconforto visual como ardência, prurido, lacrimejamento e hiperemia ocular, até perda súbita da visão. (11 Adam Netto A, Wayhs LF, Santos Júnior EC. Diagnósticos emergenciais em oftalmologia em um hospital universitário. Rev Bras Oftalmol. 2002;61(12): 877-83.,22 Figueiredo MN, Tanarah ML, Stival LR, Junior JJ. Perfil epidemiológico dos atendimentos oftalmoógicos em um serviço público (SUS). Rev Cient ITPAC. 2015;8(2):5.) Alguns sintomas e diagnósticos tendem a apresentar padrões de incidência de acordo com as estações do ano. (44 Sen E, Celik S, Inanc M, Elgin U, Ozyurt B, Yilmazbas P. Seasonal distribution of ocular conditions treated at the emergency room: a 1-year prospective study. Arq Bras Oftalmol. 2018; 81(2):116-9.

5 Rusticucci M, Bettolli LM, de IA. Association between weather conditions and the number of patients at the emergency room in an Argentine hospital. Int J Biometeorol. 2002; 46(1):42-51.
-66 Epstein D, Kvanta A, Lindqvist PG. Seasonality and incidence of central retinal vein occlusion in Sweden: a 6-year study. Ophthalmic Epidemiol. 2015;22(2):94-7.) Como em qualquer serviço de emergências médicas, o exame clínico minucioso, o diagnóstico correto e o tratamento eficaz são mandatórios para minimizar a chance de complicações mais graves. (33 Carvalho RS, Kara José N. Ophthalmology emergency room at the University of São Paulo General Hospital: a terciary hospital providing primary and secondary level care. Clinics. 2007;62(3):301-8.)

As doenças oculares mais prevalentes em serviços de emergências oftalmológicas estão descritas na literatura. (44 Sen E, Celik S, Inanc M, Elgin U, Ozyurt B, Yilmazbas P. Seasonal distribution of ocular conditions treated at the emergency room: a 1-year prospective study. Arq Bras Oftalmol. 2018; 81(2):116-9.,77 Vieira CG, Marques ML, Lacerda R. Emergências oculares - Clínica de Olhos da Santa Casa de Belo Horizonte. Rev Bras Oftalmol. 2002;61(10) 738-41.) Porém, no Brasil ainda existe uma falta relativa de dados médicos e sociais, o que poderia ajudar no planejamento e estratégias de ações de saúde comunitárias. (22 Figueiredo MN, Tanarah ML, Stival LR, Junior JJ. Perfil epidemiológico dos atendimentos oftalmoógicos em um serviço público (SUS). Rev Cient ITPAC. 2015;8(2):5.,33 Carvalho RS, Kara José N. Ophthalmology emergency room at the University of São Paulo General Hospital: a terciary hospital providing primary and secondary level care. Clinics. 2007;62(3):301-8.) Casos de baixo risco poderiam ser tratados em unidades de cuidados primários ou secundários, o que implicaria em redução do alto fluxo de pacientes em serviços de emergências oftalmológicas, melhora da qualidade do atendimento e satisfação do paciente. (33 Carvalho RS, Kara José N. Ophthalmology emergency room at the University of São Paulo General Hospital: a terciary hospital providing primary and secondary level care. Clinics. 2007;62(3):301-8.,88 Kara-Junior N, Zanatto MC, Villaça VT, Nagamati LT, Takeshi L, Kara-José N. Aspectos médicos e sociais no atendimento oftalmológico de urgência. Arq Bras Oftalmol. 2001;64(1):39-43.

9 Almeida HG, Fernandes VB, Lucena AC, Kara-Junior N. Avaliação das urgências oftalmológicas em um hospital público de referência em Pernambuco. Rev Bras Oftalmol. 2016; 75(1):18-20.
-1010 Jones NP, Hayward JM, Khaw PT, Claoué CM, Elkington AR. Function of an ophthalmic "accident and emergency” department: results of a six month survey. Br Med J (Clin Res Ed). 1986; 292(6514):188-90.)

Este estudo traçou o perfil epidemiológico de emergências atendidas em um Hospital oftalmológico no Sul do Brasil, a fim de traçar um perfil epidemiológico de pacientes com emergências oftalmológicas, e determinar a apresentação clínica das conjuntivites no verão e no inverno.

Métodos

Estudo retrospectivo, transversal, através de revisão de prontuários de pacientes atendidos no setor privado de emergências do Hospital de Olhos do Paraná nos primeiros sete dias dos meses de julho de 2017 e janeiro de 2018. Foram incluídos todas as primeiras consultas no setor e períodos informados e excluídos prontuários cujas informações encontravam-se incompletas ou de difícil interpretação. Os dados foram armazenados e cruzados no programa Excel (Microsoft Inc. ©, EUA), utilizando-se medias e desvio padrão para análise estatística.

As queixas principais foram agrupadas em: indicando doença de superfície ocular; indicando corpo estranho; pálpebras e anexos; queimadura; queda aguda e acentuada de visão; trauma ocular; indicando glaucoma agudo; outros.

Os diagnósticos foram descritos individualmente e também classificados em grandes grupos: conjuntiva e esclera; córnea e cristalino; pálpebra, órbita e vias lacrimais; uveíte; glaucoma; retina e neurites; outros.

As idades dos pacientes foram agrupadas da seguinte forma: 0 a 9 anos; 10 a 19 anos; 20 a 39 anos; 40 a 59 anos; e 60 anos ou mais.

Os horários de atendimento foram divididos de acordo com a escala de plantão do serviço: das 08h às 19h; 19h às 22h; 22h às 08h.

Projeto aprovado pela Faculdade Evangélica Mackenzie Paraná, Curitiba/PR. , número CAAE: 02199218.0.0000.0103.

Resultados

Foram revisados 2086 prontuários de pacientes atendidos no pronto-atendimento oftalmológico: 865 no inverno e 1221 verão.

A distribuição dos atendimentos por sexo foi similar no volume de consultas e nos períodos dos plantões (Tabela 1). O sexo masculino abrangeu 51,9% do total de atendimentos. A idade média geral foi de 38±21,3 anos. O período mais procurado foi o das 8h às 19h, com 81,78% dos atendimentos.

Tabela 1
Atendimentos distribuídos por sexo, idade e horários dos plantões

Das queixas principais relatadas pelos pacientes, predominaram aquelas relacionadas à doenças de superfície ocular (70,9%). Quanto aos diagnósticos, os grupos que se destacaram foram: conjuntiva e esclera (55,4%); córnea e cristalino (19,3%); e pálpebras e anexos (17,9%). Uma abordagem mais detalhada pode ser visualizada na tabela 2, a qual apresenta os diagnósticos mais prevalentes como conjuntivites (46,45%), hordéolo/calázio (9,59%), ceratite/ úlcera bacterianas (6,52%), hiposfagma (5,51%) e corpo estranho ocular (5,17%). Somente 12,30% dos atendimentos (257 casos) foram relacionados à trauma ocular: 108 casos de corpo estranho ocular, 82 casos tiveram trauma contuso, 51 casos de abrasão de córnea, 14 casos de queimaduras, e 2 tiveram trauma perfurante.

Tabela 2
Demonstração das principais queixas principais e diagnósticos, divididos em grupos e relacionados ao sexo

O grupo de conjuntivites prevaleceu, com 46,4% do total de diagnósticos. Conjuntivites infecciosas (virais e bacterianas) somam 57,1%, 46,7%, 57,6%, 59,3% e 54,7% do total de conjuntivites nos grupos etários de 0-9 anos, 10-19 anos, 20-39 anos, 40-59 anos e ≥60 anos, respectivamente, conforme demonstrado no figura 1. Em análise geral, 34,7% das conjuntivites foram alérgicas, 32% virais, 24,7% bacterianas e 8,6% não especificadas.

Figura 1
Distribuicao dos subgrupos de conjuntivites dentro do total de conjuntivites de cada faixa etaria

As conjuntivites foram responsáveis por 44,3% dos atendimentos no verão e 49,5% no inverno. No verão, tiveram maior prevalência dentre as conjuntivites as alérgicas (34,7%), seguido por virais (29,6%), bacterianas (27,2%) e não especificadas (8,5%). O grupo infeccioso abrangeu, portanto, 56,8%. Já no inverno, tiveram maior prevalência as virais (35%), seguido pelas alérgicas (34,7%), bacterianas (21,7%) e não especificadas (8,6%), somando, portanto, 56,7% de conjuntivites infecciosas.

Somente 85 pacientes (4%) utilizavam lentes de contato (LCs). Destes, a grande maioria (92,9%) tinham queixas de superfície ocular e 42,35% tiveram diagnóstico de úlcera de córnea infecciosa. Analisando de forma reversa, do total de 136 pacientes com ceratite ou úlcera infecciosa, 40 (29,41%) usavam LCs.

As principais doenças, distribuídas por faixas etárias, podem ser observadas no figura 2 por grupos diagnósticos e no figura 3 por prevalência.

Figura 2
Prevalencia dos diagnosticos por grandes grupos dentro de faixas etarias

Figura 3
Prevalencia dos principais diagnosticos encontrados em cada faixa etaria

Discussão

Alguns estudos colocam o traumatismo ocular dentre os principais motivos de consulta em pronto atendimentos oftalmológicos. (99 Almeida HG, Fernandes VB, Lucena AC, Kara-Junior N. Avaliação das urgências oftalmológicas em um hospital público de referência em Pernambuco. Rev Bras Oftalmol. 2016; 75(1):18-20.,1111 Araújo ÂA, Almeida DV, Araújo VM, Góes MR. Urgência Oftalmológica: corpo estranho ocular ainda como principal causa. Arq Bras Oftalmol. 2002;65(2):223-7.) No presente estudo, a maior procura emergencial foi por conjuntivite, havendo baixa prevalência de trauma ocular (12,30%), fato que pode ser explicado pela existência de hospitais terciários referências para traumatismos gerais na Capital paranaense, enquanto o presente estudo foi realizado em um Hospital oftalmológico.

Em relação aos fatores sócio-demográficos, não houve prevalência de gênero, diferentemente do encontrado no estudo do Sen et al. (44 Sen E, Celik S, Inanc M, Elgin U, Ozyurt B, Yilmazbas P. Seasonal distribution of ocular conditions treated at the emergency room: a 1-year prospective study. Arq Bras Oftalmol. 2018; 81(2):116-9.) e Almeida et al. (99 Almeida HG, Fernandes VB, Lucena AC, Kara-Junior N. Avaliação das urgências oftalmológicas em um hospital público de referência em Pernambuco. Rev Bras Oftalmol. 2016; 75(1):18-20.), em que o sexo masculino prevalece. Segundo Hussein et al. ,(1212 Hussein RP, Rangel FLB, Almeida HG, Gracia M, Rehder JR, Kara-Junior N. Avaliação das características do atendimento de urgências oftalmológicas em um hospital público da Grande São Paulo. Rev Bras Oftalmol. 2015; 74(2):89-91.) os homens estão mais suscetíveis a fatores de risco, como profissões perigosas, trânsito e esporte.

A maior procura de pronto-atendimento na primeira semana de janeiro (1.121 pacientes), em relação à primeira semana de julho (865 pacientes), pode ser em razão da temporada de férias. Também foi observado preferência de procura por atendimento no período diurno (8h-19h), com mais de 80% das consultas. Isto pode ter sido ocasionado devido ao horário de atendimento oferecido abranger o horário comercial. (1313 Abelin MV, Rodrigues ML. Demand profile in an ophthalmologic primary care service. Rev Bras Oftalmol. 2010; 69(2):77-83.) Outro aspecto relevante, é a maior frequência de atendimentos por traumas e corpo estranho ocular neste período, em decorrência da atividade ocupacional do indivíduo. Estima-se que nos Estados unidos, ocorram aproximadamente 2,4 milhões de traumas oculares ao ano, e destes, 1 milhão são decorrentes de acidentes em ambiente de trabalho. De maneira abrangente, a procura por atendimento médico devido a trauma possui maior incidência durante o período diurno, em que há também maior atividade econômica e laboral, bem como maior circulação de pessoas na sociedade, aumentando assim frequência de acidentes. No Brasil, cerca de 10% dos acidentes de trabalho são oculares. (1414 Leal FA, Filho AP, Neiva DM, Learth JC, Silveira DB. Work-related eye trauma due to superficial foreing body. Arq Bras Oftalmol 2003;66(1):57-60)

A média da idade geral foi de 38±21,3 anos, faixa etária esta que se inclui na população economicamente ativa e que estaria mais exposta a fatores de risco, segundo Leonor et al. (1515 Leonor AC, Dalfré JT, Moreira PB, Gaiotto Júnior OA. Emergências oftalmológicas em um hospital dia. Rev Bras Oftalmol. 2009; 68(4):197-200.)

A prevalência de queixas de hordéolo/calázio de 9,59% no presente estudo foi semelhante à encontrada no trabalho de Carvalho et al. (33 Carvalho RS, Kara José N. Ophthalmology emergency room at the University of São Paulo General Hospital: a terciary hospital providing primary and secondary level care. Clinics. 2007;62(3):301-8.) e Kara-Junior et al. (88 Kara-Junior N, Zanatto MC, Villaça VT, Nagamati LT, Takeshi L, Kara-José N. Aspectos médicos e sociais no atendimento oftalmológico de urgência. Arq Bras Oftalmol. 2001;64(1):39-43.), realizados em Hospital terciário em São Paulo.

Todos os diagnósticos de conjuntivites foram realizados através de anamnese e exame clínico, sem a necessidade de exames complementares. As conjuntivites gerais foram mais prevalentes no inverno (49,5% no inverno contra 44,3% no verão). Em ambas as estações, o subgrupo de conjuntivites infecciosas foi o mais prevalente, com 56,8% do total de conjuntivites no verão e 56,7% no inverno. Esta porcentagem pode ser ainda maior, uma vez que existe o subgrupo de conjuntivites não especificadas que expressam 8,6% dos diagnósticos de conjuntivites. Estes achados vão ao encontro com alguns autores como Edwards et al. , (1616 Edwards RS. Ophthalmic emergencies in a district general hospital casualty department. Br J Ophthalmol. 1987;71(12):938-42.) que refere que conjuntivite e blefarite foram os diagnósticos mais comuns no verão.

Concordando com Carvalho(33 Carvalho RS, Kara José N. Ophthalmology emergency room at the University of São Paulo General Hospital: a terciary hospital providing primary and secondary level care. Clinics. 2007;62(3):301-8.) e Kara-Junior et al. ,(88 Kara-Junior N, Zanatto MC, Villaça VT, Nagamati LT, Takeshi L, Kara-José N. Aspectos médicos e sociais no atendimento oftalmológico de urgência. Arq Bras Oftalmol. 2001;64(1):39-43.) o diagnóstico mais frequente encontrado foi de conjuntivite. O grupo de conjuntivites, em especial as conjuntivites infecciosas, foram as doenças mais frequentes dentre todos os diagnósticos, com a mesma expressividade no verão e no inverno. Porém, especificamente as conjuntivites virais foram mais expressivas no inverno (35% no inverno contra 29,6% no verão). Isso pode ser explicado devido ao aumento de atividades em ambientes fechados nessa época do ano, aumentando a transmissibilidade, segundo Figueredo etal. (22 Figueiredo MN, Tanarah ML, Stival LR, Junior JJ. Perfil epidemiológico dos atendimentos oftalmoógicos em um serviço público (SUS). Rev Cient ITPAC. 2015;8(2):5.) As conjuntivites bacterianas foram mais prevalentes no verão (27,2% no verão contra 21,7% no inverno), enquanto as alérgicas tiveram a mesma prevalência de 34,7% em ambas as estações, considerando que são dados obtidos no período de uma semana do verão e do inverno. Segundo Epstein, et al. ,(66 Epstein D, Kvanta A, Lindqvist PG. Seasonality and incidence of central retinal vein occlusion in Sweden: a 6-year study. Ophthalmic Epidemiol. 2015;22(2):94-7.) possíveis fatores que levam a este aumento de apresentação no verão incluem temperaturas mais quentes, umidade mais elevada e maior exposição ocular a água.

Comparando-se os grupos etários, é perceptível a diferença de ocorrência de doenças entre estes. A conjuntivite foi responsável por 78,5% dos diagnósticos na 1ª década de vida contra 26,4% a partir da 7ª década. No estudo de Sen et al. ,(44 Sen E, Celik S, Inanc M, Elgin U, Ozyurt B, Yilmazbas P. Seasonal distribution of ocular conditions treated at the emergency room: a 1-year prospective study. Arq Bras Oftalmol. 2018; 81(2):116-9.) o diagnóstico mais comum em indivíduos com até 15 anos de idade foi de conjuntivite alérgica e infecciosa. Isso difere do estudo de Soares et al. ,(1717 Soares AS, Netto AA, Soares AS. Análise da prevalência de conjuntivite no atendimento emergencial do Serviço de oftalmologia do Hospital Universitário da Universidade Federal de Santa Catarina nos anos de 2004 a 2008. ACM Arq Catarin Med. 2010;39(2).) em que a faixa etária entre 20 a 29 anos representou 34,9% dos pacientes atendidos com conjuntivite, e do estudo de Netto et al. ,(1818 Netto AA, Müller TP, Queiroz AA, Siewert MC, Silvano RE, Thiesen EB. Prevalência das doenças conjuntivais no atendimento emergencial do Serviço de Oftalmologia do Hospital Universitário da Universidade Federal de Santa Catarina. ACM Arq Catarin Med. 2006;35 (4):44-9.) em que a faixa etária predominante era de 15 a 29 anos, correspondendo a 35,3% dos atendimentos no pronto atendimento do hospital estudado. Menores cuidados de higiene das mãos e imunidade com pouco espectro de anticorpos talvez explicam a maior prevalência de conjuntivites na infância. O hiposfagma abrangeu 13,6% dos diagnósticos em idosos contra 1,65% nas crianças até 9 anos. A maior fragilidade vascular em idosos, associado à doenças que são mais prevalentes em adultos e idosos como hipertensão arterial e diabetes, poderiam explicar a maior prevalência de hiposfagma. Porém, este estudo não pesquisou doenças sistêmicas associadas aos diagnósticos.

Hordéolo e calázio se destacaram na 2ª década de vida com 10,6% dos diagnósticos desta faixa etária. Encontramos uma preval levemente superior nessa faixa etária, indo ao encontro dos autores Nemet. (1919 Nemet AY, Vinker S, Kaiserman I. Associated morbidity of chalazia. Cornea. 2011;30(12):1376-81.) e Netto. (2020 Netto AA, Rolim AP, Müller TP. Prevalência de doenças palpebrais no serviço emergencial de oftalmologia do Hospital Universitário da Universidade Federal de Santa Catarina. ACM Arq Catarin Med. 2006;35(4):64-9.) Corpo estranho teve a mesma porcentagem de 6,8% de 20-40 anos e 40-60 anos, o que está dentro do esperado já que a maioria destes foram decorrentes de acidente de trabalho, por negligência no uso do equipamento de proteção individual (EPI).

Os pronto-atendimentos oftalmológicos devem estar preparados com protocolos adequados para reduzir a chance de contágio dentro do próprio ambiente ambulatorial ou hospitalar, envolvendo treinamento de médicos, auxiliares, funcionários e fornecendo educação comportamental para o paciente com potencial contagiosidade. Pronto-atendimentos não especializados em oftalmologia, mas que realizam estes atendimentos, devem também estabelecer protocolos para restringir o contágio ao receber queixas de superfície ocular, devido à alta frequência de doenças contagiosas encontradas no presente estudo. Mais estudos em diferentes regiões do país são necessários para comparação estatística, pois o Brasil possui uma vasta diversidade climática, em função da continentalidadedo país, muitas das vezes em estações climáticas marcantes em determinadas regiões.

A divulgação das informações sobre patologias oculares em serviços de urgência e emergência se faz necessária a fim de elaborar melhores estratégias de gestão e planejamento na prevenção, proteção e tratamento da população susceptível.

Referências

  • 1
    Adam Netto A, Wayhs LF, Santos Júnior EC. Diagnósticos emergenciais em oftalmologia em um hospital universitário. Rev Bras Oftalmol. 2002;61(12): 877-83.
  • 2
    Figueiredo MN, Tanarah ML, Stival LR, Junior JJ. Perfil epidemiológico dos atendimentos oftalmoógicos em um serviço público (SUS). Rev Cient ITPAC. 2015;8(2):5.
  • 3
    Carvalho RS, Kara José N. Ophthalmology emergency room at the University of São Paulo General Hospital: a terciary hospital providing primary and secondary level care. Clinics. 2007;62(3):301-8.
  • 4
    Sen E, Celik S, Inanc M, Elgin U, Ozyurt B, Yilmazbas P. Seasonal distribution of ocular conditions treated at the emergency room: a 1-year prospective study. Arq Bras Oftalmol. 2018; 81(2):116-9.
  • 5
    Rusticucci M, Bettolli LM, de IA. Association between weather conditions and the number of patients at the emergency room in an Argentine hospital. Int J Biometeorol. 2002; 46(1):42-51.
  • 6
    Epstein D, Kvanta A, Lindqvist PG. Seasonality and incidence of central retinal vein occlusion in Sweden: a 6-year study. Ophthalmic Epidemiol. 2015;22(2):94-7.
  • 7
    Vieira CG, Marques ML, Lacerda R. Emergências oculares - Clínica de Olhos da Santa Casa de Belo Horizonte. Rev Bras Oftalmol. 2002;61(10) 738-41.
  • 8
    Kara-Junior N, Zanatto MC, Villaça VT, Nagamati LT, Takeshi L, Kara-José N. Aspectos médicos e sociais no atendimento oftalmológico de urgência. Arq Bras Oftalmol. 2001;64(1):39-43.
  • 9
    Almeida HG, Fernandes VB, Lucena AC, Kara-Junior N. Avaliação das urgências oftalmológicas em um hospital público de referência em Pernambuco. Rev Bras Oftalmol. 2016; 75(1):18-20.
  • 10
    Jones NP, Hayward JM, Khaw PT, Claoué CM, Elkington AR. Function of an ophthalmic "accident and emergency” department: results of a six month survey. Br Med J (Clin Res Ed). 1986; 292(6514):188-90.
  • 11
    Araújo ÂA, Almeida DV, Araújo VM, Góes MR. Urgência Oftalmológica: corpo estranho ocular ainda como principal causa. Arq Bras Oftalmol. 2002;65(2):223-7.
  • 12
    Hussein RP, Rangel FLB, Almeida HG, Gracia M, Rehder JR, Kara-Junior N. Avaliação das características do atendimento de urgências oftalmológicas em um hospital público da Grande São Paulo. Rev Bras Oftalmol. 2015; 74(2):89-91.
  • 13
    Abelin MV, Rodrigues ML. Demand profile in an ophthalmologic primary care service. Rev Bras Oftalmol. 2010; 69(2):77-83.
  • 14
    Leal FA, Filho AP, Neiva DM, Learth JC, Silveira DB. Work-related eye trauma due to superficial foreing body. Arq Bras Oftalmol 2003;66(1):57-60
  • 15
    Leonor AC, Dalfré JT, Moreira PB, Gaiotto Júnior OA. Emergências oftalmológicas em um hospital dia. Rev Bras Oftalmol. 2009; 68(4):197-200.
  • 16
    Edwards RS. Ophthalmic emergencies in a district general hospital casualty department. Br J Ophthalmol. 1987;71(12):938-42.
  • 17
    Soares AS, Netto AA, Soares AS. Análise da prevalência de conjuntivite no atendimento emergencial do Serviço de oftalmologia do Hospital Universitário da Universidade Federal de Santa Catarina nos anos de 2004 a 2008. ACM Arq Catarin Med. 2010;39(2).
  • 18
    Netto AA, Müller TP, Queiroz AA, Siewert MC, Silvano RE, Thiesen EB. Prevalência das doenças conjuntivais no atendimento emergencial do Serviço de Oftalmologia do Hospital Universitário da Universidade Federal de Santa Catarina. ACM Arq Catarin Med. 2006;35 (4):44-9.
  • 19
    Nemet AY, Vinker S, Kaiserman I. Associated morbidity of chalazia. Cornea. 2011;30(12):1376-81.
  • 20
    Netto AA, Rolim AP, Müller TP. Prevalência de doenças palpebrais no serviço emergencial de oftalmologia do Hospital Universitário da Universidade Federal de Santa Catarina. ACM Arq Catarin Med. 2006;35(4):64-9.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    20 Nov 2020
  • Data do Fascículo
    Sep-Oct 2020

Histórico

  • Recebido
    22 Abr 2020
  • Aceito
    19 Ago 2020
Sociedade Brasileira de Oftalmologia Rua São Salvador, 107 , 22231-170 Rio de Janeiro - RJ - Brasil, Tel.: (55 21) 3235-9220, Fax: (55 21) 2205-2240 - Rio de Janeiro - RJ - Brazil
E-mail: rbo@sboportal.org.br