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Trabalho a céu aberto: passado, presente e futuro sobre exposição ocupacional ao calor

Resumo

Considerando as mudanças climáticas e o impacto das temperaturas elevadas na saúde humana, especialmente devido ao aquecimento global, são relevantes as ações de prevenção ao calor voltadas aos trabalhadores que laboram a céu aberto. Neste ensaio, são apresentados resultados de recentes pesquisas, bem como destacadas inovações tecnológicas para monitoramento do calor no Brasil. Também são expostas reflexões sobre o futuro do trabalho a céu aberto diante das mudanças climáticas. O trabalho a céu aberto é em geral caracterizado por atividades pesadas, que geram elevado calor metabólico. Contudo, são escassos os esforços no campo da Saúde e Segurança do Trabalho para a busca de alternativas que minimizem ou eliminem os efeitos do calor para os trabalhadores. Além disso, as alternativas de proteção dos trabalhadores são reduzidas. O Monitor IBUTG é apresentado como inovação tecnológica de monitoramento remoto do calor em ambiente a céu aberto. Apesar das medidas de controle previstas em lei para proteção dos trabalhadores submetidos ao calor, em razão do aquecimento global, serão necessários intervenções inovadoras e controles especiais da exposição ao calor nos ambientes externos. Portanto, é desejável maior empenho na produção de conhecimento com vistas a fomentar a elaboração ou o aprimoramento de políticas públicas.

Palavras-chave:
aquecimento global; ambiente externo de trabalho; estresse térmico; saúde do trabalhador

Abstract

Given the current climate change and high-temperature impact on human health, especially due to global warming, actions for heat prevention focused on outdoor workers are relevant. This essay presents the results of recent research and highlights technological innovations for heat monitoring in Brazil. Also, it reflects on the future of outdoor work given climate change. Outdoor work is generally characterized as heavy, leading to higher metabolic heat production. However, Occupational Safety and Health have made few efforts to find alternatives to minimize or eliminate heat impact on workers. Moreover, the worker’s protection alternatives are reduced. WBGT Monitor is presented as a technological innovation for remote heat monitoring in outdoor environments. Despite the control measures provided to workers subjected to heat, global warming demands innovative interventions and special exposure controls at outdoor workplaces. Thus, an increased commitment to knowledge production to elaborate or improve public policy is desirable.

Keywords:
global warming; outdoor work; occupational health; heat stress

Introdução

O trabalho a céu aberto é muitas vezes caracterizado por atividades que aumentam o calor metabólico do trabalhador. Esse processo é diretamente afetado pela temperatura do ar e demais parâmetros ambientais, tais como a umidade e a velocidade do ar e a radiação solar, que podem gerar sobrecarga térmica. Estresse térmico é o resultado da carga de calor à qual os trabalhadores são expostos, ocorrendo principalmente a partir da combinação entre condições do ambiente de trabalho, atividade física e vestimentas utilizadas pelo trabalhador. Como consequência da sobrecarga térmica, ocorre o estresse fisiológico do trabalhador exposto.

Os impactos causados pelo calor são amplamente abordados na literatura científica, especialmente na área da Saúde Pública11. Son JY, Gouveia N, Bravo MA, Freitas CU, Bell ML. The impact of temperature on mortality in a subtropical city: effects of cold, heat, and heat waves in São Paulo, Brazil. Int J Biometeorol. 2016;60(1):113-21.), (22. Orru H, Åström DO. Increases in external cause mortality due to high and low temperatures: evidence from northeastern Europe. Int J Biometeorol. 2017;61(5):963-6.), (33. Ikefuti PV, Barrozo LV, Braga AL. Mean air temperature as a risk factor for stroke mortality in São Paulo, Brazil. Int J Biometeorol. 2018;62(8):1535-42.), (44. Geirinhas JL, Trigo RM, Libonati R, Castro LCO, Sousa PM, Coelho CAS, et al. Characterizing the atmospheric conditions during the 2010 heatwave in Rio de Janeiro marked by excessive mortality rates. Sci Total Environ. 2019;650(1):796-808.. Embora se apresentem com diferentes metodologias, geralmente esses estudos consideram “calor” quando a temperatura do ar, em determinada região e época do ano, atinge valores acima da média mais um desvio padrão ou acima do percentil de 90%. Esses parâmetros estatísticos devem ser calculados preferencialmente a partir de uma série histórica de no mínimo 30 anos. Sinteticamente, tem sido demonstrado que o calor provoca aumento da taxa de mortalidade e de internações hospitalares por doenças respiratórias e cardiovasculares11. Son JY, Gouveia N, Bravo MA, Freitas CU, Bell ML. The impact of temperature on mortality in a subtropical city: effects of cold, heat, and heat waves in São Paulo, Brazil. Int J Biometeorol. 2016;60(1):113-21.)-(44. Geirinhas JL, Trigo RM, Libonati R, Castro LCO, Sousa PM, Coelho CAS, et al. Characterizing the atmospheric conditions during the 2010 heatwave in Rio de Janeiro marked by excessive mortality rates. Sci Total Environ. 2019;650(1):796-808..

As situações nas quais o calor perdura por um período de pelo menos três dias consecutivos, com ampla abrangência espacial, são chamadas de ondas de calor, as quais, desde os anos 2000, têm ocorrido com maior frequência e intensidade no Brasil55. Bitencourt DP, Fuentes MV, Maia PA, Amorim FT. Frequência, duração, abrangência espacial e intensidade das ondas de calor no Brasil. Rev Bras Meteorol. 2016;31(4):506-17.),(66. Bitencourt DP, Fuentes MV, Franke AE, Silveira RB, Alves MP. The climatology of cold and heat waves in Brazil from 1961 to 2016. Int J Climatol. 2020;40(4):2464-78.. Os efeitos do calor podem levar à hospitalização por distúrbios hidroeletrolíticos, insuficiência renal, infecção do trato urinário, septicemia e, até mesmo, insolação. Além da insolação e da rabdomiólise77. Xiang J, Bi P, Pisaniello D, Hansen A. The impact of heat waves on workers' health and safety in Adelaide, South Australia. Environ Res. 2014;133:90-5., que podem ocasionar a morte, os efeitos adversos mais comuns do calor sobre a saúde são a exaustão térmica, as câimbras e os problemas de pele.

É imprescindível que as organizações considerem a exposição ocupacional ao calor como um importante risco, oferecendo melhores condições de trabalho nos ambientes laborais88. Rosa VC, Lima LEM. O estresse térmico visto como um risco ocupacional. R Gestão Industrial. 2019;15(2):53-73.. Os cortadores de cana-de-açúcar de São Paulo, por exemplo, são fortemente impactados pelo calor, inclusive com a ocorrência de morte em pleno exercício da atividade99. Bitencourt DP, Ruas AC, Maia PA. Análise da contribuição das variáveis meteorológicas no estresse térmico associada a morte de cortadores de cana-de-açúcar. Cad Saude Publica. 2012;28:65-74.. Esses trabalhadores sofrem danos musculares, o que eleva o risco de lesão renal1010. Diniz CO, McKenna Z, Canuto LBS, Magalhães F, Machado-Moreira CA, Shibuya E, et al. A preliminary evaluation of the kidney function of sugarcane cutters from Brazil. J Occup Environ Med. 2021;63(2):e53-8.. O limite legal de exposição para esses trabalhadores é ultrapassado durante todo o turno de trabalho em cerca de 7% dos dias para uma atividade considerada pesada e em 3% para uma atividade moderada1111. Roscani RC, Bitencourt DP, Maia PA, Ruas AC. Risco de exposição à sobrecarga térmica para trabalhadores da cultura de cana-de-açúcar no estado de São Paulo, Brasil. Cad Saude Publica. 2017;33(3):e00211415.. Outro estudo, voltado para áreas rurais do Nordeste brasileiro, mostrou que, aplicando-se o regime trabalho/descanso previsto na antiga legislação brasileira, a atividade considerada pesada seria impedida de ser executada durante aproximadamente 54% do período, enquanto para atividades moderadas e leves, os trabalhadores deveriam parar cerca de 33,5% e 6,6% do período, respectivamente1212. Roscani RC, Maia PA, Monteiro MI. Sobrecarga térmica em áreas rurais: a influência da intensidade do trabalho. Rev Bras Saude Ocup. 2019;44:e14.. A classificação de atividade leve, moderada e pesada foi utilizada na legislação brasileira até o fim de 2019, objetivando determinar três situações para estimar o calor metabólico produzido pelo trabalhador.

Estudos realizados em outros países, quase sempre destacando as mudanças climáticas, avaliaram a percepção dos trabalhadores em relação ao calor1313. Xiang J, Hansen A, Pisaniello D, Bi P. Workers' perceptions of climate change related extreme heat exposure in South Australia: a cross-sectional survey. BMC Public Health. 2016;16:549., relacionaram a saúde ocupacional com perdas econômicas1414. Kjellstrom T. Impact of climate conditions on occupational health and related economic losses: a new feature of global and urban health in the context of climate change. Asia Pac J Public Health. 2016;28(2 Suppl):28S-37., avaliaram os impactos sociais e as estratégias de adaptação dos trabalhadores1515. Nunfam VF, Adusei-Asante K, Van Etten EJ, Oosthuizen J, Frimpong K. Social impacts of occupational heat stress and adaptation strategies of workers: a narrative synthesis of the literature. Sci Total Environ. 2018;643:1542-52. e associaram a saúde ocupacional com a perda de produtividade no trabalho1616. Levi M, Kjellstrom T, Baldasseroni A. Impact of climate change on occupational health and productivity: A systematic literature review focusing on workplace heat. Med Lav. 2018;109(3):163-79.. Além disso, há resultados que apontam o impacto do calor tanto para a maior incidência de acidentes no trabalho quanto para a queda da produtividade dos trabalhadores1717. Calkins MM, Bonauto D, Hajat A, Lieblich M, Seixas N, Sheppard L, et al. A case-crossover study of heat exposure and injury risk among outdoor construction workers in Washington State. Scand J Work Environ Health. 2019;45(6):588-99.),(1818. Fatima SH, Rothmore P, Giles LC, Varghese BM, Bi P. Extreme heat and occupational injuries in different climate zones: A systematic review and meta-analysis of epidemiological evidence. Environ Int. 2021;148:106384.. Isso se deve à diminuição do ritmo de trabalho ou a pausas para ingestão de água, descanso e esfriamento do corpo, assim como ao afastamento permanente do trabalho devido a doenças relacionadas ao calor1616. Levi M, Kjellstrom T, Baldasseroni A. Impact of climate change on occupational health and productivity: A systematic literature review focusing on workplace heat. Med Lav. 2018;109(3):163-79..

O aquecimento global, caracterizado pela elevação da temperatura média do mundo, é causado pelas mudanças climáticas, provenientes do aumento excessivo da emissão global de gases de efeito estufa, tais como o dióxido de carbono. No Brasil, também tem sido observada a elevação da temperatura ao longo das últimas décadas, com maior intensificação do calor a partir dos anos 200055. Bitencourt DP, Fuentes MV, Maia PA, Amorim FT. Frequência, duração, abrangência espacial e intensidade das ondas de calor no Brasil. Rev Bras Meteorol. 2016;31(4):506-17.),(66. Bitencourt DP, Fuentes MV, Franke AE, Silveira RB, Alves MP. The climatology of cold and heat waves in Brazil from 1961 to 2016. Int J Climatol. 2020;40(4):2464-78.. Além disso, as projeções futuras dos modelos de simulação climática de longo prazo indicam, mesmo sob cenários mais otimistas, a continuidade da curva de elevação da temperatura1919. Bitencourt DP, Alves LL, Shibuya EK, Cunha I, Souza JP. Climate change impacts on heat stress in Brazil-past, present, and future implications for occupational heat exposure. Int J Climatology. 2020;41:2741-56.. Essa situação, entre outras consequências, implicará o aumento da frequência e intensidade das ondas de calor55. Bitencourt DP, Fuentes MV, Maia PA, Amorim FT. Frequência, duração, abrangência espacial e intensidade das ondas de calor no Brasil. Rev Bras Meteorol. 2016;31(4):506-17.),(66. Bitencourt DP, Fuentes MV, Franke AE, Silveira RB, Alves MP. The climatology of cold and heat waves in Brazil from 1961 to 2016. Int J Climatol. 2020;40(4):2464-78..

Nesse sentido, o aquecimento global é um importante aspecto a ser considerado na temática exposição ocupacional ao calor. Relacionando essa abordagem ao ambiente laboral, estudos do risco de estresse térmico sob a perspectiva das mudanças climáticas mostram que as ações de prevenção ao calor devem se concentrar nos trabalhadores, buscando treinamento das equipes e implementação de processos de adaptação2020. Nunfam VF, Oosthuizen J, Adusei-Asante K, Etten EJV, Frimpong K. Perceptions of climate change and occupational heat stress risks and adaptation strategies of mining workers in Ghana. Sci Total Environ. 2019;657:365-78.),(2121. Nunfam VF, Etten EJV, Oosthuizen J, Adusei-Asante K, Frimpong K. Climate change and occupational heat stress risks and adaptation strategies of mining workers: perspectives of supervisors and other stakeholders in Ghana. Environ Research. 2019.169:147-55.. Outra pesquisa aplicada à indústria da construção australiana, no que se refere à exposição ocupacional ao calor, apontou a necessidade de maior conscientização sobre os impactos das mudanças climáticas, assim como a aplicação de soluções práticas e reformulações da legislação2222. Hurlimann AC, Warren-Myers G, Browne GR. Is the Australian construction industry prepared for climate change? Building Environ. 2019;153:128-37..

Considerando o contexto apresentado, este ensaio tem como objetivo apresentar as recentes pesquisas e uma inovação tecnológica de monitoramento do calor no Brasil. Pretende-se também fazer uma reflexão sobre as perspectivas futuras do trabalho a céu aberto diante do advento das mudanças climáticas. O estudo, a partir desta seção introdutória, é apresentado em mais cinco seções. Na segunda seção, abordam-se as recentes pesquisas voltadas ao tema calor no Brasil. Na terceira, é apresentada a inovação tecnológica de monitoramento remoto do calor em ambiente a céu aberto, chamada Monitor IBUTG. Na quarta, discutem-se os temas emergentes com potencial para eliminar ou minimizar os efeitos do calor no trabalhador. Na quinta seção, é realizada uma reflexão sobre o futuro do trabalho a céu aberto, abordando entre outros aspectos, os cenários futuros de mudança climática. Por fim, apresentam-se as considerações finais.

A pesquisa sobre exposição ocupacional ao calor no Brasil

Algumas iniciativas abordam estudos voltados à exposição ocupacional ao calor em ambientes a céu aberto sob a ótica da Saúde Pública. Seus resultados apontam claramente o aumento da temperatura no Brasil55. Bitencourt DP, Fuentes MV, Maia PA, Amorim FT. Frequência, duração, abrangência espacial e intensidade das ondas de calor no Brasil. Rev Bras Meteorol. 2016;31(4):506-17.),(2323. Geirinhas JL, Trigo RM, Libonati R, Coelho CA, Palmeira AC. Climatic and synoptic characterization of heat waves in Brazil. Int J Climatology. 2017;38:1760-76.),(66. Bitencourt DP, Fuentes MV, Franke AE, Silveira RB, Alves MP. The climatology of cold and heat waves in Brazil from 1961 to 2016. Int J Climatol. 2020;40(4):2464-78.. Contudo, são ainda mais preocupantes as projeções obtidas de simulações numéricas da atmosfera, pois indicam um futuro contendo dias e noites progressivamente mais quentes2424. Stocker TF, Qin D, Plattner GK, Tignor M, Allen SK, Boschung J, et al., editors. Climate Change 2013: the physical science basis: contribution of working group I to the fifth assessment report of the Intergovernmental Panel on Climate Change. Cambridge: Cambridge University Press; 2013. p. 1535..

No âmbito da Saúde Pública, artigos recentes mostram o aumento da taxa de mortalidade devido ao calor nas cidades de São Paulo33. Ikefuti PV, Barrozo LV, Braga AL. Mean air temperature as a risk factor for stroke mortality in São Paulo, Brazil. Int J Biometeorol. 2018;62(8):1535-42. e Rio de Janeiro44. Geirinhas JL, Trigo RM, Libonati R, Castro LCO, Sousa PM, Coelho CAS, et al. Characterizing the atmospheric conditions during the 2010 heatwave in Rio de Janeiro marked by excessive mortality rates. Sci Total Environ. 2019;650(1):796-808.. Em atividades com exposição ocupacional ao calor, a associação das variáveis atmosféricas importantes ao estresse térmico com dados de óbitos de cortadores de cana-de-açúcar apontou a ocorrência de mortes súbitas. Muitas vezes, essas mortes ocorreram no próprio local de trabalho, tendo o calor como uma importante causa99. Bitencourt DP, Ruas AC, Maia PA. Análise da contribuição das variáveis meteorológicas no estresse térmico associada a morte de cortadores de cana-de-açúcar. Cad Saude Publica. 2012;28:65-74.. Uma revisão de mais de 50 artigos que abordam o trabalho de corte de cana-de-açúcar indicou que esses trabalhadores são expostos a vários riscos ocupacionais - e um dos principais é a exposição ao calor2525. Leite MR, Zanetta DMT, Trevisan IB, Burdmann EA, Santos UP. Sugarcane cutting work, risks, and health effects: a literature review. Rev Saude Publica. 2018;52:80..

Uma importante medida para a proteção dos trabalhadores em áreas externas submetidos ao calor é o monitoramento individual da temperatura interna do corpo. Esse tipo de medição é capaz de identificar o impacto direto do calor no corpo do trabalhador como resultado de vários aspectos, incluindo suscetibilidade individual, idade, sexo, índice de massa corporal, condicionamento físico, vestimentas, doenças e uso de bebidas alcoólicas e drogas. A relação da frequência cardíaca com a temperatura interna do corpo em trabalhadores expostos ao calor serviu como base para a proposição de uso de medidores de frequência cardíaca. Com isso, por meio de sinais de alerta, é possível indicar ao trabalhador a necessidade de diminuição do esforço físico ou pausas no trabalho para sua recuperação2626. Ruas AC, Maia PA, Roscani RC, Bitencourt DP, Amorim FT. Heat stress monitoring based on heart rate measurements. Rev Bras Med Trab. 2020;18:232-40.. Tecnologias que visam monitorar a temperatura interna do corpo podem ser extremamente úteis para cortadores de cana-de-açúcar, por exemplo, quando há alto risco relacionado à atividade laboral pesada.

Focando as condições ambientais, alguns estudos foram conduzidos para diagnosticar a variabilidade espacial e temporal da exposição ao calor no trabalho a céu aberto. A realização de simulações numéricas do Índice de Bulbo Úmido Termômetro de Globo (IBUTG) para situações de ondas de calor mostraram que, em muitos casos, os valores de IBUTG ultrapassam o limite de exposição durante todo ou quase todo o turno diurno de trabalho2727. Bitencourt DP. Maximum wet-bulb globe temperature mapping in Central-South Brazil: a numerical study. Meteorol Applic. 2019;26(3):385-95.. A estimativa do IBUTG para o ambiente de trabalho de corte de cana-de-açúcar indicou situações com limite de tolerância sendo superado em todo o turno laboral para atividades pesada e moderada1111. Roscani RC, Bitencourt DP, Maia PA, Ruas AC. Risco de exposição à sobrecarga térmica para trabalhadores da cultura de cana-de-açúcar no estado de São Paulo, Brasil. Cad Saude Publica. 2017;33(3):e00211415.. Estimativas similares a essas, realizadas para todo o Brasil, mostram que o risco de estresse térmico tem aumentado nas últimas décadas2828. Bitencourt DP, Maia PA, Roscani RC. The heat exposure risk to outdoor workers in Brazil. Arch Environ Occup Health. 2019;74:1-8.. As avaliações do IBUTG para a região semiárida brasileira2929. Oliveira BFA, Silveira IH, Feitosa RC, Horta MAP, Junger WL, Hacon S. Human heat stress risk prediction in the Brazilian semiarid region based on the Wet-Bulb Globe temperature. Anais Acad Bras Cienc. 2019;91:e20180748., assim como para todo o Brasil1919. Bitencourt DP, Alves LL, Shibuya EK, Cunha I, Souza JP. Climate change impacts on heat stress in Brazil-past, present, and future implications for occupational heat exposure. Int J Climatology. 2020;41:2741-56., foram projetadas para as futuras décadas, mostrando panoramas preocupantes quanto ao estresse térmico, devido às mudanças climáticas. Considerando apenas cenários futuros com alta emissão de gases de efeito estufa, foi constatado que há tendências de agravamento das condições de estresse térmico até o fim deste século3030. Nobre CA, Marengo JA, Soares WR. Climate change risks in Brazil. Cham: Springer; 2019.. Contudo, estudos posteriores concluíram que a situação futura de estresse térmico no Brasil será pior tanto na perspectiva pessimista quanto na otimista em relação à emissão de gases de efeito estufa1919. Bitencourt DP, Alves LL, Shibuya EK, Cunha I, Souza JP. Climate change impacts on heat stress in Brazil-past, present, and future implications for occupational heat exposure. Int J Climatology. 2020;41:2741-56..

Monitoramento remoto do IBUTG no Brasil

O IBUTG é adotado pela norma internacional ISO 72433131. ISO 7243:2017. Ergonomics of the Thermal Environment - Assessment of Heat Stress Using the WBGT (Wet Bulb Globe Temperature) Index [Internet]. [place unknown]: ISO; 2017 [citado em 23 out 2023]. Disponível em: https://www.iso.org/obp/ui/en/#iso:std:iso:7243:ed-3:v1:en.
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, sendo utilizado para a avaliação da exposição ocupacional ao calor por muitos países do mundo. No Brasil, o Anexo 3 da Norma Regulamentadora 15 (NR 15) (3232. Brasil. Ministério do Trabalho e Previdência. NR-15 - Atividades e Operações Insalubres. Brasília (DF): Ministério do Trabalho e Previdência; 2022., que trata das atividades e operações insalubres, determina que a exposição ao calor deve ser analisada por meio do IBUTG. Para tanto, conforme detalhado na Norma de Higiene Ocupacional 06 (NHO 06) (3333. Giampaoli E, Saad IFSD, Cunha IA, Shibuya EK. Norma de higiene ocupacional: NHO 06: procedimento técnico: avaliação da exposição ocupacional ao calor. São Paulo: Fundacentro; 2017., existe um conjunto de procedimentos padrão para montagem e utilização de equipamentos/instrumentos no intuito de medir as temperaturas necessárias ao cálculo desse índice: temperaturas de bulbo seco, de bulbo úmido natural e de globo.

O monitoramento diário do IBUTG nos ambientes de trabalho a céu aberto é operacionalmente difícil, muitas vezes inviável devido à necessidade de equipamentos e recursos humanos especializados. Buscando solucionar essas dificuldades e possibilitar aplicações estatísticas usando série de dados históricos, alguns estudos ao redor do mundo têm apresentado propostas de estimativa do IBUTG por meio do uso de dados atmosféricos. Tais dados são medidos automaticamente por estações meteorológicas, com padrão definido pela Organização Meteorológica Mundial (OMM), que permite adequada representatividade espacial de todas as variáveis atmosféricas. Uma vez que as temperaturas de bulbo úmido natural e de globo, necessárias para o cálculo do IBUTG, não fazem parte do rol de dados fornecidos pelas estações meteorológicas, é necessário estimar essas duas temperaturas com base em outras variáveis atmosféricas relacionadas ao estresse térmico.

Assim, em 2009, a Fundação Jorge Duprat Figueiredo de Segurança e Medicina do Trabalho (Fundacentro) realizou medições do IBUTG em campo e relacionou estatisticamente essas medidas com dados atmosféricos a fim de desenvolver uma metodologia de estimativa do IBUTG adequada ao clima brasileiro. A proposta, apresentada por Maia et al. (3434. Maia PA, Ruas AC, Bitencourt DP. Wet-bulb globe temperature index estimation using meteorological data from São Paulo State, Brazil. Int J Biometeorol. 2015;59:1395-403., estima a temperatura de bulbo úmido natural por meio de uma equação de regressão múltipla e a temperatura de globo mediante a equação de balanço térmico do globo. Essas temperaturas, juntamente com a temperatura de bulbo seco medida pelas estações meteorológicas, permite o cálculo final do IBUTG. O método apresentado por Maia et al. (3434. Maia PA, Ruas AC, Bitencourt DP. Wet-bulb globe temperature index estimation using meteorological data from São Paulo State, Brazil. Int J Biometeorol. 2015;59:1395-403. representa um marco histórico para o monitoramento remoto do IBUTG no Brasil, uma vez que possibilitou a condução de diversas pesquisas e importantes inovações tecnológicas, tais como o desenvolvimento do Monitor IBUTG.

A ferramenta Monitor IBUTG foi originada do software Sobrecarga Térmica desenvolvido em meados de 2010 pela Fundacentro que, em sua base de cálculo, considera o método de estimativa do IBUTG de Maia et al. (3434. Maia PA, Ruas AC, Bitencourt DP. Wet-bulb globe temperature index estimation using meteorological data from São Paulo State, Brazil. Int J Biometeorol. 2015;59:1395-403.. O Monitor IBUTG, atualmente disponível online (https://monitoributg.fundacentro.gov.br/Inicio) e em aplicativo para smartphone (Android e iOS), tem fins preventivos com a vantagem de eliminar a necessidade de deslocamento para o local de trabalho e de todas as outras dificuldades para operacionalização do monitoramento da exposição ao calor a céu aberto. A disponibilização dessa ferramenta na forma de aplicativo potencializou o alcance das informações, principalmente para o trabalhador rural, para o qual essa inovação tecnológica é direcionada.

O Monitor IBUTG utiliza dados atmosféricos observados em todas as regiões do Brasil pela rede de estações meteorológicas do Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet). Assim, o monitoramento do IBUTG e a avaliação completa da exposição ocupacional ao calor são apresentados em tempo quase real, diariamente, a cada hora do turno diurno de trabalho. Além disso, esses resultados podem ser obtidos para toda a série histórica disponível pelo Inmet, possibilitando avaliações estatísticas de períodos passados para fins de pareceres técnicos e estudos científicos. Em sua última atualização, o Monitor IBUTG passou a fazer as estimativas do IBUTG utilizando, além dos dados do Inmet, dados do Modelo de Simulação Atmosférica ETA, fornecido pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). Com essa nova base de dados, o usuário pode fazer um planejamento para o turno diurno de trabalho do dia atual e para os sete dias posteriores, contando com recomendações para medidas preventivas e de controle disponíveis no sistema.

Temas emergentes

No intuito de prevenir e controlar a exposição ocupacional ao calor, há ainda muito para ser investigado e desenvolvido. O monitoramento individual e contínuo, por meio de estimativas ou medições diretas da temperatura interna do corpo do trabalhador, é importante objeto para evitar danos causados pelo calor.

O monitoramento individual da exposição ao calor pode permitir a emissão de alertas quando, ainda de forma reversível, ocorre o estresse térmico. Tendo em vista que esse processo é influenciado principalmente pelo tipo de atividade do trabalhador e pelas condições de calor observadas no ambiente de trabalho (sobrecarga térmica), um alerta de estresse térmico individual poderá evitar situações de risco, favorecendo a prevenção de doenças e mortes. As perspectivas para esse tipo de solução tendem a ser maiores com os últimos avanços tecnológicos, como a tecnologia de internet móvel 5G recentemente implantada no Brasil, que abriu um leque de oportunidades na comunicação e no monitoramento, especialmente em relação a alertas de situação de risco, mesmo em ambientes rurais.

Investigações sobre a produtividade do trabalho a céu aberto também são importantes, uma vez que no Brasil há muitas regiões com elevadas temperaturas. A fadiga pode prejudicar os trabalhadores da construção civil quanto à capacidade física e mental3535. Rowlinson S, Yunyanjia A, Li B, Chuanjingju C. Management of climatic heat stress risk in construction: a review of practices, methodologies, and future research. Accid Anal Prev. 2014;66:187-98.. A exposição ocupacional ao calor atinge diretamente a saúde e produtividade, fato que exigirá ações para mitigar os efeitos das mudanças climáticas3636. Flouris AD, Dinas PC, Ioannou LG, Nybo L, Havenith G, Kenny GP, Kjellstrom T. Workers' health and productivity under occupational heat strain: A systematic review and meta-analysis. Lancet Planet Health. 2018;2(12):e521-31.. Além disso, estudos sobre aclimatização também são muito relevantes, uma vez que no Brasil muitos trabalhadores migram de regiões relativamente mais frias para regiões quentes. Por fim, considerando que o calor metabólico é um dos principais aspectos na avaliação da exposição ocupacional ao calor, estudos que versam sobre a melhoria da estimativa da taxa metabólica do trabalhador nos diferentes tipos de atividades laborais são eminentemente importantes.

Outros temas importantes para controle e prevenção estão relacionados ao desenvolvimento de vestimentas3737. Zeng S, Pian S, Su MS. Hierarchical-morphology metafabric for scalable passive daytime radiative cooling. Science. 2021;373(6555):692-6. adequadas à exposição ao calor, com tecidos de isolamento térmico mais eficazes, e à instituição de novas tecnologias para a produção de equipamentos de proteção individual (EPI) concebidos para esse fim.

Reflexões sobre o futuro do trabalho a céu aberto

A tese do aumento da temperatura provocado pelas mudanças climáticas tem sido amplamente aceita pela comunidade científica e pelos governos, culminando em grandes esforços na busca de alternativas que minimizem ou eliminem os efeitos do calor sobre o setor produtivo e a economia. Contudo, de modo geral, não se percebe o mesmo empenho no campo da Saúde e Segurança do Trabalho, em especial no caso dos que laboram a céu aberto. O trabalho nesses ambientes é caracterizado frequentemente por atividades pesadas, as quais geram elevado calor metabólico. Além disso, as alternativas de proteção do trabalhador são reduzidas, assumindo processos complexos de operacionalização das medidas preventivas. Quanto a elas, são limitadas atualmente ao uso de roupas claras e leves e de cremes para proteção solar, assim como à diminuição do tempo de exposição por meio de rodízios, à realização de pausas e ao incentivo à ingestão de água e sais. Assim, o planejamento estratégico voltado às atividades laborais a céu aberto, de curto e médio prazo, torna-se prioritário, principalmente se for direcionado aos incentivos para pesquisa e inovação tecnológica e às adequações da legislação trabalhista.

No futuro, entre outras inovações tecnológicas, espera-se o desenvolvimento de vestimentas que, além de funcionar como barreira térmica, apresentem maior eficiência na transferência do calor do corpo para o ambiente. Consideradas como uma das principais possibilidades, as vestimentas com metatecidos3737. Zeng S, Pian S, Su MS. Hierarchical-morphology metafabric for scalable passive daytime radiative cooling. Science. 2021;373(6555):692-6. e os coletes de resfriamento3838. Golbabaei F, Heydari A, Moradi G, Dehghan H, Moradi A, Habibi P. The effect of cooling vests on physiological and perceptual responses: a systematic review. Int J Occup Saf Ergon. 2022;28(1):223-55. têm bom potencial para evitar o estresse fisiológico causado pelo estresse térmico no trabalho a céu aberto. Outra possibilidade é o desenvolvimento de exoesqueleto humano, uma estrutura alimentada por sistema de motores elétricos, fornecendo aos membros do corpo mais movimento, força e resistência. Esse tipo de auxílio diminui a fadiga do trabalhador, potencializando a capacidade de levantamento de cargas e transporte de materiais, resultando em menor geração de calor metabólico. Igualmente importante é o desenvolvimento ou aprimoramento dos sistemas de monitoramento da sobrecarga térmica, já existentes, voltados tanto para o trabalhador2626. Ruas AC, Maia PA, Roscani RC, Bitencourt DP, Amorim FT. Heat stress monitoring based on heart rate measurements. Rev Bras Med Trab. 2020;18:232-40. como para os ambientes de trabalho3434. Maia PA, Ruas AC, Bitencourt DP. Wet-bulb globe temperature index estimation using meteorological data from São Paulo State, Brazil. Int J Biometeorol. 2015;59:1395-403..

Entretanto, é presumível que, na prática, a aplicação dessas tecnologias seja viabilizada apenas em um cenário socioeconômico favorável, uma vez que o fomento à tecnologia depende na maioria das vezes de incentivos do governo. Para além disso, serão necessárias políticas públicas norteadoras a fim de beneficiar o trabalhador exposto às condições insalubres, lembrando que, nesse enfoque, a constante atualização das normas regulamentadoras é uma garantia legal de adoção de procedimentos preventivos e eficazes nos ambientes de trabalho. O adequado cumprimento dessas normas depende de um espectro amplo e complexo, que inclui vários aspectos, como a própria fiscalização, as forças políticas e de representatividade das diversas categorias de trabalhadores, as características das empresas, a organização do trabalho, a localização geográfica, os recursos econômicos e técnicos, entre outros.

Por outro lado, é fundamental questionar se as inovações tecnológicas ocorrerão no sentido de possibilitar a melhoria do trabalho a céu aberto, eliminando as condições insalubres e perigosas, ou se ocorrerão para a completa mecanização do trabalho, buscando, na realidade, maior produtividade. Alguns estudos concluem que frequentemente os interesses econômicos se sobrepõem aos cuidados com a saúde dos trabalhadores3939. Silva CP, Azevedo C, Monte A, Costa PFF. Condições de trabalho no cultivo da cana-de-açúcar no Brasil e repercussões sobre a saúde dos canavieiros. Rev Bras Saude Ocup. 2021;46:e22.. Considerando o exemplo do trabalho rural, a execução de atividades manuais e sua continuidade dependerá fortemente de políticas públicas que permitam a integridade e a preservação da saúde do trabalhador no campo. Caso a opção seja favorável ao trabalho humano, o investimento na preservação de sua segurança e saúde deverá ser prioritário. Nesse sentido, há de se lembrar que mesmo com as perspectivas de cenários climáticos mais otimistas, com menos emissões de gases de efeito estufa, o Brasil apresentará áreas com condições de estresse térmico tão críticas que inviabilizarão qualquer tipo de trabalho externo1919. Bitencourt DP, Alves LL, Shibuya EK, Cunha I, Souza JP. Climate change impacts on heat stress in Brazil-past, present, and future implications for occupational heat exposure. Int J Climatology. 2020;41:2741-56..

Por fim, considera-se que, mesmo existindo meios para identificar as situações de risco e informação e acesso às medidas de proteção, no futuro, serão necessárias medidas para induzir sua adoção. Nesse contexto e diante das perspectivas de agravamento do calor devido às mudanças climáticas, é fundamental a percepção dos riscos derivados do calor por parte de todos os envolvidos no processo de trabalho2020. Nunfam VF, Oosthuizen J, Adusei-Asante K, Etten EJV, Frimpong K. Perceptions of climate change and occupational heat stress risks and adaptation strategies of mining workers in Ghana. Sci Total Environ. 2019;657:365-78.. Atualmente, no Brasil, a situação real mostra que o regime de pausas, especificado na NR 153232. Brasil. Ministério do Trabalho e Previdência. NR-15 - Atividades e Operações Insalubres. Brasília (DF): Ministério do Trabalho e Previdência; 2022. como uma das medidas fundamentais para evitar a sobrecarga térmica, é raramente respeitado pelos empregadores. O regime de trabalho que remunera só por produção é outra situação extremamente crítica que contribui ainda mais para o agravamento do problema, pois leva os trabalhadores a ultrapassarem seus limites físicos a fim de obter o necessário para a sobrevivência3939. Silva CP, Azevedo C, Monte A, Costa PFF. Condições de trabalho no cultivo da cana-de-açúcar no Brasil e repercussões sobre a saúde dos canavieiros. Rev Bras Saude Ocup. 2021;46:e22.. A mudança dessa situação no trabalho a céu aberto exigirá esforços de órgãos públicos da área do trabalho e da saúde e de representações dos trabalhadores para induzir os empregadores a seguir as medidas de proteção adequadas.

Conclusões

Sem diminuir a importância de inúmeras iniciativas apresentadas em prol do controle da exposição ao calor, destaca-se a NHO 063333. Giampaoli E, Saad IFSD, Cunha IA, Shibuya EK. Norma de higiene ocupacional: NHO 06: procedimento técnico: avaliação da exposição ocupacional ao calor. São Paulo: Fundacentro; 2017. e o desenvolvimento da metodologia de Maia et al.3434. Maia PA, Ruas AC, Bitencourt DP. Wet-bulb globe temperature index estimation using meteorological data from São Paulo State, Brazil. Int J Biometeorol. 2015;59:1395-403.) para estimar o IBUTG. A NHO 063333. Giampaoli E, Saad IFSD, Cunha IA, Shibuya EK. Norma de higiene ocupacional: NHO 06: procedimento técnico: avaliação da exposição ocupacional ao calor. São Paulo: Fundacentro; 2017. é considerada uma referência técnica, principalmente no que tange aos procedimentos e métodos de avaliação do calor. Já a proposta de Maia et al. (3434. Maia PA, Ruas AC, Bitencourt DP. Wet-bulb globe temperature index estimation using meteorological data from São Paulo State, Brazil. Int J Biometeorol. 2015;59:1395-403. tem favorecido a avaliação completa da exposição ocupacional ao calor em todas as áreas externas do Brasil com o uso do Monitor IBUTG. Ela possibilita o desenvolvimento de estudos científicos, incluindo análises do risco ao calor no passado com o uso de dados meteorológicos1111. Roscani RC, Bitencourt DP, Maia PA, Ruas AC. Risco de exposição à sobrecarga térmica para trabalhadores da cultura de cana-de-açúcar no estado de São Paulo, Brasil. Cad Saude Publica. 2017;33(3):e00211415.),(2828. Bitencourt DP, Maia PA, Roscani RC. The heat exposure risk to outdoor workers in Brazil. Arch Environ Occup Health. 2019;74:1-8.. Além disso, estimando o IBUTG para o futuro por meio de dados meteorológicos numericamente simulados por modelos de mudanças climáticas1919. Bitencourt DP, Alves LL, Shibuya EK, Cunha I, Souza JP. Climate change impacts on heat stress in Brazil-past, present, and future implications for occupational heat exposure. Int J Climatology. 2020;41:2741-56., obtêm-se importantes subsídios para o planejamento estratégico de médio e longo prazos.

Aproximadamente a partir dos anos 2000, nítidos impactos das mudanças climáticas no Brasil têm sido percebidos, principalmente com o aumento da frequência e intensidade das ondas de calor. Se a aplicação de tecnologias de proteção pode estar ainda em um cenário remoto, as questões relacionadas à saúde, ao bem-estar e à vida dos trabalhadores são prementes. Nesse sentido, é de extrema importância a atenção a esses trabalhadores, inclusive com a aplicação de mecanismos já previstos no Anexo 3 da NR 094040. Brasil. Ministério do Trabalho e Previdência. NR-09 - Avaliação e controle das exposições ocupacionais a agentes físicos, químicos e biológicos. Brasília (DF): Ministério do Trabalho e Previdência; 2022..

Considera-se que, no futuro, o trabalho a céu aberto no Brasil será ainda mais difícil pela elevação das temperaturas, o que implicará a necessidade de esforços concentrados em pesquisa, inovação tecnológica e políticas públicas.

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  • Disponibilidade de dados:

    todo o conjunto de dados que dá suporte aos resultados deste estudo foi publicado no próprio artigo.
  • Financiamento:

    os autores declaram que o trabalho não foi subvencionado.
  • Apresentação do estudo em evento científico: os autores informam que este estudo não foi apresentado em evento científico.

Editado por

Editora-Chefe: Ada Ávila Assunção

Disponibilidade de dados

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    15 Dez 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    04 Out 2022
  • Revisado
    14 Set 2023
  • Aceito
    15 Set 2023
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