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Do negro-vida ao pretuguês: contribuições do pensamento social brasileiro negro para o Direito

FROM NEGRO-VIDA TO PRETUGUÊS: CONTRIBUTIONS OF BRAZILIAN BLACK SOCIAL THOUGHT TO LAW

DE LO NEGRO-VIDA AL PRETUGUÊS: CONTRIBUCIÓN DEL PENSAMIENTO SOCIAL BRASILEÑO A LO DERECHO

Resumo

O presente artigo tem por objetivo apresentar as contribuições do pensamento social brasileiro negro para o campo jurídico brasileiro recente. Adotamos como método a revisão de literatura. Primeiro, apresentamos como o debate racial é abordado no pensamento social brasileiro clássico. A seguir, utilizamos as categorias centrais no pensamento de Lélia Gonzalez e Guerreiro Ramos, especificamente os conceitos de “amefricanidade”, “pretuguês” e “negro-vida”, destacando as suas contribuições fundamentais para o pensamento social negro. Em seguida, a partir de pesquisa em bases de dados de periódicos, demonstramos como as produções desses intérpretes são mobilizadas, atualmente, por pesquisadores no campo do Direito e das relações raciais. Concluímos que, nos últimos seis anos, o pensamento social brasileiro negro tem sido utilizado para atualizar as pesquisas acadêmicas no campo do Direito e das relações raciais, principalmente por meio de artigos científicos e dissertações de mestrado, sendo, assim, fundamental para a racialização do debate jurídico.

Palavras-chave
Pensamento social negro; pensamento social brasileiro; pesquisa empírica em Direito; Lélia Gonzalez; Guerreiro Ramos

Abstract

This article aims to present the contributions of black Brazilian social thought to the recent Brazilian legal field. We adopted a literature review as a method. First, we present how the racial debate is addressed in classical Brazilian social thought. Next, we use the central categories in the thought of Lélia Gonzalez and Guerreiro Ramos, specifically the concepts of “amefricanity”, “pretuguês” and “negro-vida”, highlighting their fundamental contributions to black social thought. Then, based on research in journal databases, we demonstrate how the productions of these interpreters are currently mobilized by researchers in the field of law and race relations. We conclude that, in the last six years, black Brazilian social thought has been used to update academic research in the field of law and racial relations, mainly through papers and master’s dissertations, thus being fundamental for the racialization of the legal debate.

Keywords
Black social thought; Brazilian social thought; empirical legal research; Lélia Gonzalez; Guerreiro Ramos

Resumen

Este artículo tiene como objetivo presentar las contribuciones del pensamiento social brasileño negro al campo jurídico brasileño reciente. Adoptamos la revisión de la literatura como método. Primero, presentamos cómo se aborda el debate racial en el pensamiento social clásico brasileño. A continuación, utilizamos las categorías centrales en el pensamiento de Lélia González y Guerreiro Ramos, específicamente los conceptos de “amefricanidade”, “pretuguês” y “negro-vida”, destacando sus contribuciones fundamentales al pensamiento social negro. Luego, a partir de investigaciones en bases de datos periódicas, demostramos cómo las producciones de estos intérpretes son actualmente movilizadas por investigadores en el campo del Derecho y las relaciones raciales. Concluimos que, en los últimos seis años, el pensamiento social negro brasileño ha sido utilizado para actualizar la investigación académica en el campo del Derecho y las relaciones raciales, principalmente a través de artículos científicos y disertaciones de maestría, siendo fundamental para la racialización del debate jurídico.

Palabras clave
Pensamiento social negro; pensamiento social brasileño; investigación empírica en Derecho; Lélia González; Guerreiro Ramos

Introdução1 1 Os autores agradecem ao professor Silvio Luiz de Almeida por suas contribuições dadas a partir da disciplina ministrada no Curso de Pós-Graduação em Direito e Desenvolvimento na Escola de Direito de São Paulo da Fundação Getulio Vargas (FGV DIREITO SP) denominada “Estado e Direito no Pensamento Social Brasileiro”. Este artigo é fruto das reflexões obtidas ao longo das aulas e das referências indicadas pelo professor. Agradecem também à Fulbright Brasil, ao Fulbright Scholarship Board e ao Bureau of the Educational and Cultural Affairs do Departamento de Estado dos Estados Unidos pela bolsa concedida a Julia dos Santos como parte do programa Doctoral Dissertation Research Award. Ainda, agradecem à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) pela concessão da bolsa de estudo do mestrado (Processo n. 2021/03918-5) a Luciano Santana Pinheiro.

Neste artigo, buscamos elucidar como o pensamento social brasileiro negro contribuiu e contribui para a pesquisa em Direito no Brasil. Partindo de uma revisão de literatura, e adotando como marcos teóricos principais as obras de dois autores negros, Lélia Gonzalez e Guerreiro Ramos, sustentamos a hipótese de que os conceitos “pretuguês”, “amefricanidade” e “negro-vida”, desenvolvidos por esses autores, ajudam-nos com substratos teóricos e metodológicos importantes para repensar o pensamento social brasileiro e alterar a forma como se produz conhecimento jurídico.

Escolhemos esses autores porque o conjunto de preocupações que enfrentaram se enquadra no que é comumente denominado pensamento social brasileiro. Trata-se de dois intelectuais negros cujo debate racial rompeu com as formulações organizadas pela ideia de “negro tema” e colocou os negros como protagonistas da narrativa nacional.

Assim, o objetivo do texto é tanto dar centralidade à variável racial no debate do Direito por meio do pensamento social negro quanto estimular a relação entre pensamento social e Direito. Diante desse escopo, revisitamos os quadros teóricos das obras de Gonzalez e Ramos e observamos as pesquisas empíricas em Direito publicadas entre os anos de 2016 e 2022, a fim de verificar a hipótese segundo a qual o pensamento social negro tem influência fundamental para o desenvolvimento das pesquisas no campo do Direito e das relações raciais.

Para cumprir esse propósito, o texto está dividido em cinco momentos, além desta introdução e das considerações finais. Primeiro, descrevemos a metodologia adotada para a consecução deste artigo. Segundo, apresentamos as principais características do pensamento social brasileiro clássico, com enfoque no discurso sobre raça encontrado em autores como Gilberto Freyre, Caio Prado Jr. e Sérgio Buarque de Holanda. Terceiro, introduzimos os conceitos criados por Guerreiro Ramos e Lélia Gonzalez para contextualizar suas obras no debate nacional e sistematizar as suas contribuições. Quarto, tomando como ponto de partida a discussão apresentada e o conjunto de pesquisas no campo do Direito e das relações raciais, identificamos como as contribuições dos autores ajudam-nos a pensar a produção acadêmica recente. Por fim, discutimos os resultados encontrados.

1. Metodologia

Para a consecução desta pesquisa, que consiste em uma revisão de literatura, consultamos as bases de dados do Google AcadêmicoGOOGLE ACADÊMICO. [S.l.], [s.d.]. Disponível em: Disponível em: https://scholar.google.com.br/?hl=pt . Acesso em: 11 jan. 2024.
https://scholar.google.com.br/?hl=pt...
(s.d.) e da Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações do Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e TecnologiaBIBLIOTECA DIGITAL BRASILEIRA DE TESES E DISSERTAÇÕES. [S.l.], [s.d.]. Disponível em: Disponível em: https://bdtd.ibict.br/vufind/ . Acesso em: 11 jan. 2024.
https://bdtd.ibict.br/vufind/...
(s.d.), em novembro de 2021, e, novamente, entre novembro e dezembro de 2022, utilizando as seguintes palavras-chave: (i) “negro-vida” AND “pesquisa em Direito”, para coletar os trabalhos da obra de Guerreiro Ramos; (ii) “amefricanidade” AND “pesquisa em Direito”, para coletar os trabalhos da Lélia Gonzalez; e (iii) “pretuguês” AND “pesquisa em Direito”, para coletar os trabalhos de Gonzalez. A utilização das palavras em aspas com o conector aditivo “AND” permite que apenas os trabalhos que apresentem tais categorias e a expressão “pesquisa em Direito” sejam capturados pelo mecanismo de busca.

Elegemos as categorias mencionadas por serem centrais no pensamento de Guerreiro Ramos e Lélia Gonzalez, fato que aumenta a possibilidade de serem encontradas nas pesquisas empíricas em Direito que versam sobre questões raciais.

Assim, após a busca, fizemos a leitura dos trabalhos para classificá-los individualmente conforme os critérios da pesquisa, isto é, trabalhos no campo do Direito e das relações raciais que mobilizassem diretamente as categorias “amefricanidade”, “pretuguês” e “negro-vida”. Classificamos como jurídicos os trabalhos cujos autores/cujas autoras estivessem vinculados/vinculadas ao departamento jurídico das universidades ou dos centros de pesquisa, ou aqueles que, embora vinculados a outras áreas, desenvolvessem pesquisas sobre Direito e relações raciais. Foram excluídos, portanto, trabalhos duplicados, publicações que não citassem os autores no corpo do texto e pesquisas fora do campo do Direito.

Além da busca sistematizada nas bases de dados bibliográficos, foram incluídos trabalhos já conhecidos previamente pelos autores deste artigo. Ao final, restaram 32 trabalhos, entre os quais 17 mobilizam a categoria “pretuguês”, 9 a categoria “amefricanidade” e 8 a expressão “negro-vida”.

Os tipos de publicação são, em sua maioria, artigos científicos, seguidos de dissertações, monografias e, por fim, teses. Além disso, os textos foram publicados entre 2016 e 2022, e podemos perceber certa concentração de publicações nos anos de 2020 e 2021.

2. O discurso sobre raça no pensamento social brasileiro clássico

Antes de avançarmos para o que entendemos como pensamento social negro e para melhor compreendermos os diálogos estabelecidos a partir das ideias dos seus principais representantes, precisamos compreender o contexto do pensamento social brasileiro clássico que os precedeu.

O pensamento social brasileiro pode ser caracterizado como: (i) imaginativo, na medida em que reúne um conjunto de intelectuais preocupados com a identidade nacional, isto é, com questões relacionadas a entender o que faz o Brasil ser o Brasil; (ii) intervencionista, ao procurar pensar em como o contexto internacional implica e produz saídas a partir dos diagnósticos para o país.

De acordo com a antropóloga brasileira Lilia Schwarcz e o antropólogo André Botelho (2011SCHWARCZ, Lilia Moritz; BOTELHO, André. Pensamento social brasileiro, um campo vasto ganhando forma. Lua Nova, São Paulo, v. 82, p. 11-16, 2011. Disponível em: Disponível em: https://www.scielo.br/pdf/ln/n82/a02n82.pdf . Acesso em: 5 nov. 2021.
https://www.scielo.br/pdf/ln/n82/a02n82....
), o campo é caracterizado pelo seu caráter multidisciplinar, na medida em que, atualmente, não compreende apenas as três disciplinas básicas das Ciências Sociais - a Antropologia, a Ciência Política e a Sociologia -, mas também áreas da História, da Teoria Literária e da Filosofia Política, entre outras. Esse “alargamento da noção de pensamento social”, provocado pela multidisciplinaridade do campo, tem como objetivo a superação da ideia de que o pensamento social estaria comprometido com o “conhecimento antiquário” e sem compromisso com a sociedade contemporânea.

Com efeito, o pensamento social brasileiro tem desde então aproximado questões do passado às indagações contemporâneas. Tal área compreende pesquisas voltadas tanto para as grandes temáticas de estudo da formação da sociedade brasileira nas várias dimensões desse processo quanto para o debate de temas como modernidade, mudança social, política, cidade, identidade, exclusão e “as diferentes modalidades de produtores e de produção intelectual e artística em sentido amplo” (Schwarcz; Botelho, 2011SCHWARCZ, Lilia Moritz; BOTELHO, André. Pensamento social brasileiro, um campo vasto ganhando forma. Lua Nova, São Paulo, v. 82, p. 11-16, 2011. Disponível em: Disponível em: https://www.scielo.br/pdf/ln/n82/a02n82.pdf . Acesso em: 5 nov. 2021.
https://www.scielo.br/pdf/ln/n82/a02n82....
, p. 12).

Além do seu caráter multidisciplinar, outra característica do pensamento social é o seu aspecto imaginativo e intervencionista. Por estar preocupado em enfrentar os problemas nacionais, os autores inseridos nesse campo tinham como meta encontrar soluções para os problemas enfrentados no Brasil.

Não é por outro motivo que os autores do pensamento social brasileiro são chamados de intérpretes. A preocupação central desses intelectuais é entender as características, as condições e os elementos que tornam o Brasil um país peculiar. Ou seja, há nesse conjunto de pensadores uma busca de definição do DNA brasileiro, por assim dizer. Para Freyre (2006FREYRE, Gilberto. Casa-grande & senzala: formação da família brasileira sob o regime da economia patriarcal. 51. ed. São Paulo: Global, 2006.), por exemplo, essa identidade pode ser encontrada nos “antagonismos equilibrados”; para Sérgio Buarque de Holanda (2014HOLANDA, Sérgio Buarque de. Raízes do Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 2014.), na cordialidade fruto da influência ibérica no país; já para Vianna (1987VIANNA, Oliveira. Populações meridionais do Brasil: história, organização, psicologia. Belo Horizonte: Itatiaia: Niterói: Editora da Universidade Federal Fluminense, 1987.), tal resposta pode ser encontrada no fortalecimento do Estado. Enfim, cada um desses autores, a seu modo, elegeu elementos explicativos fundamentais da sociedade brasileira.

É dessa preocupação em entender a identidade nacional que o debate das relações raciais no Brasil se confunde com a biografia discursiva do pensamento social brasileiro. Autores como Euclides da Cunha, Gilberto Freyre, Sérgio Buarque de Holanda e Oliveira Vianna, a partir de diferentes abordagens, depositaram na raça as perspectivas analíticas para pensar os rumos do país. Desde o racismo científico até a política do branqueamento, a questão racial permeia o pensamento social brasileiro (Schwarcz, 2018SCHWARCZ, Lilia Moritz. O espetáculo das raças: cientistas, instituições e questão racial no Brasil - 1870-1930. São Paulo: Companhia das Letras, 2018.).

Para entendermos como o pensamento social brasileiro negro rompe com o discurso racial utilizado para a construção teórica da nacionalidade brasileira encontrada nos pensadores clássicos, comparamos as abordagens sobre raça feitas na primeira metade do século XX por Gilberto Freyre, Sérgio Buarque de Holanda e Caio Prado Jr.

Neste artigo, voltamo-nos para os escritos desses autores sobre pessoas negras, em particular, mas tangenciamos as pessoas indígenas e, claro, os portugueses. Apresentamos, dessa forma, uma breve revisão de literatura que tem como ambição expor semelhanças e diferenças na maneira como esses pensadores observam a formação da população nacional a partir do que chamam de três raças fundantes. Lusotropicalismo, mestiçagem e o olhar sobre as mulheres são alguns dos tópicos que se destacam e que, portanto, são utilizados para organizar esta seção.

O período a que os autores se referem se concentra principalmente no século XIX, com exceção de Freyre, que aborda todo o período colonial.

Para além do debate sobre a invenção do ser negro na passagem da monarquia para a república e, portanto, na construção do que se entende por povo brasileiro, os discursos travados pelos autores nos ajudam a compreender a formação do que Neusa Santos Souza (2021SOUZA, Neusa Santos. Tornar-se negro: Ou As vicissitudes da identidade do negro brasileiro em ascensão social. Rio de Janeiro: Zahar, 2021.) chama de “mito negro”. Sem a pretensão de anacronismos acríticos, a leitura sobre a formação nacional a partir da raça em suas “fontes” certamente enriquece a percepção de pesquisadores e pesquisadoras e ajuda na compreensão das referências críticas ao mito da democracia racial.

2.1. Portugueses e lusotropicalismo

Comecemos com Freyre, não apenas por ter sido o seu livro o primeiro a ser publicado e a influenciar os demais, mas também porque o autor rompe com certa tradição de racismo científico que se baseia em princípios darwinistas que justificariam diferenças intelectuais entre brancos e negros (Santos, 2002SANTOS, Gislene Aparecida dos. A invenção do “ser negro”: um percurso das ideias que naturalizaram a inferioridade dos negros. Brasil: Educ, 2002., p. 149).

Freyre publicou Casa-grande & senzala pela primeira vez em 1933 e a ele se atribui o conceito de “lusotropicalismo”, isto é, a maior adaptação dos portugueses ao clima tropical e à mestiçagem em comparação aos anglo-saxões (Santos, 2002SANTOS, Gislene Aparecida dos. A invenção do “ser negro”: um percurso das ideias que naturalizaram a inferioridade dos negros. Brasil: Educ, 2002.). É interessante notar na leitura direta de sua obra a forma como o autor constrói essa narrativa. Diferentemente de Sérgio Buarque de Holanda e de Caio Prado Jr., que são mais diretos em seus argumentos - o que não exclui reflexões a partir de exemplos cotidianos -, Freyre dedica-se a construir uma história de relações sociais que nos parecem relatos de sua própria vida. E isso ocorre por meio tanto da relação que o autor estabelece entre a proximidade dos portugueses com os povos africanos do norte da África quanto da própria descrição que faz da presença negra no Brasil. A narrativa é construída de tal forma que nos parece um conto de ficção, de encontro de culturas em que a leitura apaixonada de seus pares brancos levaria ao afastamento, de pronto, dos vestígios de racismo científico que o autor pretende refutar (Freyre, 2006FREYRE, Gilberto. Casa-grande & senzala: formação da família brasileira sob o regime da economia patriarcal. 51. ed. São Paulo: Global, 2006., p. 74-75).

Freyre coloca o negro como figura central na formação do povo brasileiro e faz isso por meio, entre outros recursos, da narrativa sobre o falar, o andar e o cantar nos cuidados das amas de leite, das mucamas e dos moleques. Também defende a importância do negro para a formação econômica do país a partir da sua maior capacidade de trabalho nas lavouras em comparação aos indígenas, decorrente de uma extroversão social e predisposição cultural, e de uma interpretação das diferenças raciais a partir do que chama de antropologia cultural, já que os africanos trazidos para o Brasil seriam “superiores” àqueles levados aos Estados Unidos. A influência do clima também é mencionada.

Sérgio Buarque de Holanda, em Raízes do Brasil (2014HOLANDA, Sérgio Buarque de. Raízes do Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 2014.), publicado pela primeira vez em 1936, discorda da centralidade do negro nesse processo.

A escrita de Holanda não parece ter o condão de exaltar as qualidades dos portugueses, pelo menos não a priori, já que o autor associa a cultura lusitana ao que chama de “sobranceria”,2 2 De acordo com Sérgio Buarque de Holanda, sobre o conceito de “sobranceria” (2014, p. 37): “Essa concepção espelha-se fielmente em uma palavra bem hispânica - ‘sobranceria’ -, palavra que indica inicialmente a ideia de superação. Mas a luta e emulação que ela implica eram tacitamente admitidas e admiradas, engrandecidas pelos poetas, recomendadas pelos moralistas e sancionadas pelos governos. É dela que resulta largamente a singular tibieza das formas de organização, de todas as associações que impliquem solidariedade e ordenação entre esses povos. Em terra onde todos são barões não é possível acordo coletivo durável, a não ser por uma força exterior respeitável e temida”. isto é, certo caráter aventureiro, pouco afeito à racionalidade necessária à fundação de uma nova sociedade, ponto que também é encontrado em Prado Jr. Ainda, Holanda (2014HOLANDA, Sérgio Buarque de. Raízes do Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 2014., p. 71) destaca as qualidades afetivas, emocionais e irracionais da população brasileira, a qual se mostra “o contrário do que parece convir a uma população em vias de organizar-se politicamente”. A sua abordagem, diferentemente da de Freyre, parte do papel central da adaptabilidade do português às duas outras “raças fundantes”, ou seja, a cultura portuguesa é a base sobre a qual as demais culturas se assentam, o que não contradiz o lusotropicalismo de Freyre, que Holanda também adota. Para isso, utiliza-se da comparação entre portugueses e holandeses no Brasil.

A mestiçagem igualmente é um ponto central, mas é o português quem “se torna negro”, sem nunca ser retirado, todavia, do papel de protagonista da formação civilizatória. O português, assim, age - nunca é levado a agir -, e americaniza-se ou africaniza-se a depender das circunstâncias. O autor reconhece ser essa adaptabilidade a transformação do seu defeito na sua maior vantagem em termos de colonização (Holanda, 2014HOLANDA, Sérgio Buarque de. Raízes do Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 2014.).

Caio Prado Jr., no capítulo “Raças” de seu livro Formação do Brasil contemporâneo: colônia, publicado em 1942, afirma realizar um estudo da composição étnica do Brasil e, ao fazê-lo, parte do pressuposto de que os brancos brasileiros, pelo menos até os primeiros anos do século XIX, têm origem majoritariamente portuguesa. Mais uma vez, a mestiçagem e o lusotropicalismo se encontram presentes, então o discurso sobre as três raças fundantes permanece. Em Prado Jr. (2011PRADO JR., Caio. Raças. In: PRADO JR., Caio. Formação do Brasil contemporâneo: colônia. São Paulo: Companhia das Letras, 2011.), assim como nos autores anteriores, a mestiçagem é o processo que auxilia a colonização portuguesa diante do baixo número de colonos e de mulheres brancas que os acompanhavam.

O autor trata da legislação pombalina como um divisor de águas no que chama de “problema indígena”, isto é, a educação jesuíta e a escravização dos povos originários. Com a imposição da língua portuguesa e a expulsão dos jesuítas, buscava-se preparar o indígena para a “vida civilizada”. É nesse momento, ainda, que a escravidão indígena teria sido substituída pela africana, já que a escravização do índio seria incompatível com seus caracteres étnicos e psicológicos. Percebe-se, portanto, que o autor mantém a lógica freyriana de continuidade do físico sobre o moral. Na visão do autor, essa lógica terá consequências sobre a integração dos indígenas à “sociedade civilizada” em comparação aos negros, apesar de entender que estes trouxeram maior contribuição que os primeiros, já que a sua análise se concentra no trabalho e na produção econômica (Prado Jr., 2011PRADO JR., Caio. Raças. In: PRADO JR., Caio. Formação do Brasil contemporâneo: colônia. São Paulo: Companhia das Letras, 2011., p. 111).

2.2. Mestiçagem, sexualidade e escravidão

A mestiçagem está no cerne das três obras ora analisadas. Com estilos de escrita diferentes, como já pontuado, Freyre, Holanda e Prado Jr. expõem a sua farta imaginação sobre o desenrolar da mestiçagem no Brasil no período colonial. Sem a pretensão de esgotar um assunto tão largamente explorado na academia, trazemos aqui algumas observações sobre a maneira que os autores interpretam a relação entre o lusotropicalismo tratado anteriormente, os mitos negros e indígenas e a formação econômica nacional, baseada nas “colônias de plantação” (Freyre) ou nas “colônias de exploração” (Prado Jr.). A necessidade de povoamento e estabilidade, o casamento, a sexualidade portuguesa e negra e o papel da escravidão sobre a moral sexual dos atores são alguns pontos abordados nesses textos.

Ao colocar os negros como centrais na formação do povo brasileiro, Freyre discorre extensamente sobre diversas etnias africanas, em consonância com a sua formação antropológica. Dá destaque especial aos “maometanos”, por exemplo, e considera que os africanos trazidos para o Brasil seriam superiores àqueles levados aos Estados Unidos, ocupando aqui os lugares necessários ao modo de vida socioeconômica colonial (Freyre, 2006FREYRE, Gilberto. Casa-grande & senzala: formação da família brasileira sob o regime da economia patriarcal. 51. ed. São Paulo: Global, 2006., p. 391). O autor se debruça, ainda, sobre figuras como a da mãe preta, da mucama sensual e do moleque amigo do sinhozinho, por exemplo.

As mucamas, as mães pretas e os moleques são apresentados em Sérgio Buarque de Holanda, de forma geral, como parte de uma relação de dependência ou proteção entre senhores e escravos. A raça, para Holanda, não era um problema entre a população, e, mesmo quando havia leis que a utilizassem como critério de segregação, estas eram superadas pela pessoalidade das relações travadas entre brancos e negros (Holanda, 2014HOLANDA, Sérgio Buarque de. Raízes do Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 2014., p. 64).

Nesse ponto, percebemos como a narrativa em torno da inexistência de separação entre público e privado para os portugueses é utilizada como base para justificar as relações entre as raças, ou seja, as estruturas formais de hierarquização entre as raças não impediriam relações pessoais de fraternidade (Holanda, 2014HOLANDA, Sérgio Buarque de. Raízes do Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 2014.).

Voltemos a Freyre por um momento. Ao romper com o racismo científico, Freyre não nega a existência de diferenças inatas entre brancos e negros, apenas decide dar relevância à cultura (e.g., culinária e alimentação) e ao clima. A mestiçagem, nesse sentido, surge como uma forma de adaptação do negro à cultura e aos modos brancos, com transmissibilidade genética desses caracteres adquiridos. Dito isso, Freyre destaca que não se deve atribuir aos negros sexualidade exacerbada, já que haveria provas de que os brancos seriam os verdadeiros depravados. A escravidão exerceria, na verdade, um papel crucial sobre a sexualidade, visto que, em suas palavras, “[n]ão há escravidão sem depravação sexual. É da essência mesma do regime” (Freyre, 2006FREYRE, Gilberto. Casa-grande & senzala: formação da família brasileira sob o regime da economia patriarcal. 51. ed. São Paulo: Global, 2006., p. 399). E nesse ponto, Prado Jr. (2011PRADO JR., Caio. Raças. In: PRADO JR., Caio. Formação do Brasil contemporâneo: colônia. São Paulo: Companhia das Letras, 2011., p. 114) parece concordar. Dessa forma, os portugueses seriam os responsáveis pela depravação sexual dos negros escravizados, os quais, em sua origem africana, não eram sexuais da forma como Nina Rodrigues descreve; seriam, assim, vítimas passivas da falta de refinamento erótico causado pela situação social à qual estavam submetidos pelo regime.

2.3. Mulheres

Freyre, Holanda e Caio Prado Jr. se referem às mulheres em ao menos três eixos: mulheres negras, na figura da mãe preta e da mucama; mulheres indígenas; e sinhás. Destacam-se, ainda, a relação entre essas categorias e o papel das crianças em assuntos como casamento e religião.

Sobre a relação entre homens brancos e mulheres negras, e o silêncio de Freyre sobre as violências impostas pela escravidão, fazemos as seguintes observações. Freyre assume os locais de cada uma das mulheres a partir da sua posição social, de modo que cada uma - negra, branca e indígena - tem um papel (Freyre, 2006FREYRE, Gilberto. Casa-grande & senzala: formação da família brasileira sob o regime da economia patriarcal. 51. ed. São Paulo: Global, 2006.).

Vemos, portanto, que a preferência sexual do homem branco pela “morena” integra a narrativa lusotropicalista, quase como se o casamento fosse apenas um detalhe. A mesma lógica está presente em Holanda (2014HOLANDA, Sérgio Buarque de. Raízes do Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 2014., p. 65), já que o autor entende existir mestiçagem, apesar do desestímulo ao casamento com pessoas negras, e em Prado Jr. (2011PRADO JR., Caio. Raças. In: PRADO JR., Caio. Formação do Brasil contemporâneo: colônia. São Paulo: Companhia das Letras, 2011., p. 102), diante da “licença dos costumes” típica do Brasil.

Entretanto, Freyre, especialmente, faz menção à violência a partir da depravação moral resultante da escravidão e, em diversos momentos, alude à perversão sexual do homem branco, em uma dualidade que, quase como uma armadilha, coloca a mulher negra no lugar de passividade decorrente do domínio escravista (Freyre, 2006FREYRE, Gilberto. Casa-grande & senzala: formação da família brasileira sob o regime da economia patriarcal. 51. ed. São Paulo: Global, 2006., p. 462).

Assim, para além das relações de violência nos papéis romantizados das mulheres que os valores defendidos hoje como feministas enxergam, Freyre (2006FREYRE, Gilberto. Casa-grande & senzala: formação da família brasileira sob o regime da economia patriarcal. 51. ed. São Paulo: Global, 2006., p. 462) trata da violência de forma explícita como fundante das relações entre negras e brancos e do “sadismo característico do brasileiro”. A violência não é uma constatação pós-freyriana, ela integra a obra do autor.

A violência também é descrita como fruto da inveja das mulheres brancas, as sinhás, sobre as mulheres negras. As sinhás são associadas a adjetivos como “anjos”, “virgens” e a sua descrição é diretamente associada à sua idade. A inocência e o casar-se cedo são atributos que andam juntos (Freyre, 2006FREYRE, Gilberto. Casa-grande & senzala: formação da família brasileira sob o regime da economia patriarcal. 51. ed. São Paulo: Global, 2006.).

É interessante notar, em Freyre, a diferença de abordagem entre meninas brancas e negras. No caso das sinhazinhas, o autor trata como usuais no período analisado os casamentos entre homens adultos e meninas de 12, 13 e 14 anos, para que não se macule a sua inocência. Entretanto, ao tratar da feitiçaria no período colonial, Freyre (2006FREYRE, Gilberto. Casa-grande & senzala: formação da família brasileira sob o regime da economia patriarcal. 51. ed. São Paulo: Global, 2006.) descreve as relações sexuais entre homens brancos idosos e meninas negras com naturalidade.

Se a pedofilia é a regra, não podemos dizer o mesmo do casamento.

Isso posto, vemos que os mitos fundantes das raças brasileiras andam lado a lado com o lugar das mulheres: cada uma tem o seu papel na narrativa colonial e na imaginação dos homens que teorizaram a formação do Brasil.

2.4. Algumas notas acerca do discurso sobre raça no pensamento social brasileiro clássico

Observamos que o lusotropicalismo e a mestiçagem são teses compartilhadas por Freyre, Holanda e Prado Jr., que interpretam o Brasil como um país fundado em três raças - branca, negra e indígena - e em relações sexuais que permitiram a estabilização dos colonos portugueses no território. Em Freyre, o negro é o elo entre as raças, ao se relacionar com o branco e, ainda, ao catequizar os “índios”. Sérgio Buarque de Holanda, por sua vez, defende a centralidade do português nesse processo.

A mestiçagem também seria fruto da qualidade dos africanos trazidos para o Brasil, em uma perspectiva comparada aos anglo-saxões que se vê presente nas obras analisadas. Entretanto, é em Freyre que se destaca o papel da violência da escravidão sobre o comportamento das pessoas negras. A passividade das raças não brancas igualmente conecta os pensadores brasileiros clássicos.

Por fim, às mulheres atribuem-se papéis sociais relacionados à raça a que pertencem. Narrativas fantasiosas sobre o carinho das mucamas e a inocência das sinhás se somam à função de futuras esposas das sinhás-moças e de objeto de lascívia das meninas negras. Em todos esses contextos, os homens brancos são colocados como o centro da narrativa, e todos os personagens da fundação do Brasil lhes servem, de uma forma ou de outra; é o regozijo do patriarca.

As pessoas negras, dessa forma, são colocadas como tema na construção da narrativa nacional. É contra essa abordagem que se opõe o pensamento social brasileiro negro, como demonstraremos a seguir.

3. O pensamento social brasileiro negro

Como vimos, não há como abordar o pensamento social brasileiro sem tratar de raça. Entretanto, os pensadores clássicos têm em comum o posicionamento da população negra em um lugar de passividade ou mesmo de problema nacional, que apenas parcialmente rompe com o racismo científico importado para o país. O pensamento social brasileiro negro rompe de vez com essa visão ao humanizar as pessoas negras e colocá-las como protagonistas da história nacional, e fora do lugar de subalternidade imposto pela hierarquização entre as raças.

Dessa forma, o pensamento social negro carrega consigo as características do pensamento social hegemônico, por refletir sobre o contexto nacional, mas com a peculiaridade de pensar a questão racial por uma abordagem que vê o negro como protagonista.

Além disso, outros diferenciais do campo são o ponto de vista de quem emite as formulações e o contexto de onde emergem suas ideias. Ou seja, a especificidade do pensamento negro vem da sua formulação por pesquisadores/pesquisadoras negros/negras e do protagonismo e da emancipação negros como pontos de partida.

Entretanto, esses diferenciais têm um preço, pago pelo “lixo que ousa falar” (Gonzalez, 2020GONZALEZ, Lélia. A mulher negra na sociedade brasileira: uma abordagem político-econômica. In: GONZALEZ, Lélia. Por um feminismo afro-latino-americano. Rio de Janeiro: Zahar, 2020.): a marginalização de tais ideias no meio acadêmico.

Segundo Gabriel Delphino e Thiago Campos da Silva (2021SOUZA, Gabriel Delphino Fernandes de; SILVA, Thiago Campos da. Pensamento negro em debate: as ideias de Ronilso Pacheco e de Emicida. Temáticas, Campinas, SP, v. 29, n. 57, p. 183-207, 2021. Disponível em: hDisponível em: https://econtents.bc.unicamp.br/inpec/index.php/tematicas/article/view/13813 . Acesso em: 5 nov. 2021.
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), o pensamento social negro está relacionado ao reconhecimento de sua posição periférica de interpretação, em termos nacionais e internacionais, isto é, à invisibilidade e à marginalização de tais reflexões, sendo possível estabelecer paralelos com o que ocorre com intelectuais de outros países também periféricos.

Há, portanto, três características fundamentais do pensamento social negro: (i) o protagonismo da experiência negra para entender os problemas nacionais; (ii) a produção intelectual e acadêmica originada de sujeitos não brancos e, por vezes, em diálogo com a diáspora africana; e (iii) os desafios enfrentados pelos seus autores a partir da marginalização das ideias dos sujeitos subalternizados. Nessa categoria, portanto, enquadram-se pensadores como Clóvis MouraMOURA, Clóvis. Sociologia do negro brasileiro. 2. ed. São Paulo: Perspectiva, 2019., Lélia Gonzalez, Juliano Moreira, Abdias do Nascimento, Beatriz do Nascimento, Virgínia Leone Bicudo, entre outros.

3.1. Lélia Gonzalez e Guerreiro Ramos: do pretuguês ao negro-vida

Com o objetivo de sistematizar as produções analisadas, esta seção abordará as categorias centrais das obras de Lélia Gonzalez e Guerreiro Ramos. Primeiro, apresentamos as ideias de amefricanidade e pretuguês desenvolvidas por Gonzalez e, em seguida, o conceito de “negro-vida” de Ramos.

3.1.1. Lélia Gonzalez

Lélia Gonzalez foi uma intelectual, militante, professora universitária, feminista negra brasileira, nascida em Minas Gerais, em 1935. Ela faleceu no ano de 1994, no Rio de Janeiro. Sua mãe era indígena, empregada doméstica, e seu pai, um ferroviário. Gonzalez é uma das figuras históricas mais importantes do movimento social negro e do movimento de mulheres negras hoje no Brasil. A autora publicou inúmeros textos, entre artigos, ensaios, entrevistas e crônicas, que recentemente foram reunidos (Gonzalez, 2020GONZALEZ, Lélia. A mulher negra na sociedade brasileira: uma abordagem político-econômica. In: GONZALEZ, Lélia. Por um feminismo afro-latino-americano. Rio de Janeiro: Zahar, 2020.).

A sua obra é vasta. Porém, para entender os conceitos formulados pela socióloga e para cumprir o propósito deste artigo a fim de extrair as categorias de amefricanidade e pretuguês, dois textos são fundamentais: “Racismo e sexismo na cultura brasileira”, publicado em 1984, e “A categoria político-cultural da amefricanidade”, publicado em 1988 (Gonzalez, 1984GONZALEZ, Lélia. Racismo e sexismo na cultura brasileira. Ciências Sociais Hoje, Brasília, n. 2, p. 223-244, 1984., 1988).

No primeiro texto, marcado por crítica e irreverência utilizando desde a Antropologia até a Psicanálise, a autora constrói uma compreensão da sociedade brasileira passando por conceitos como “mãe preta”, “mulata” e “empregada”, porque, para ela, a construção da identidade brasileira foi possível graças à experiência das mulheres negras. A pensadora mineira se detém no conhecimento de autores do pensamento social brasileiro para realizar críticas às ideias de Gilberto Freyre e Caio Prado Jr., destacando o racismo e o sexismo nas suas interpretações sobre a formação socioeconômica do Brasil.

É nesse texto que a autora alcunha a expressão “pretuguês”, que se refere à influência da tradição oral africana na língua portuguesa falada.

Segundo a autora, tais manifestações na língua falada são mais do que um resquício da influência dos povos africanos sobre o idioma, são a comprovação de que não houve uma aceitação passiva da língua dominante, mas, sim, uma apropriação criativa que a transformou. Ou seja, aquilo visto pelos defensores da norma padrão como erro é, na verdade, fruto da resistência negra contra a imposição da língua do colonizador, que se dá de forma infiltrada até mesmo nas elites.

Quatro anos após ter publicado o primeiro texto, imbuída dos mesmos esforços do primeiro artigo, isto é, conferir centralidade à influência negra na formação histórico-cultural do continente americano, Gonzalez (1988GONZALEZ, Lélia. A categoria político-cultural de amefricanidade. Tempo Brasileiro, Rio de Janeiro, v. 92, n. 93, p. 69-82, jan./jun. 1988.), inspirada e contrapondo-se à obra Améfrica Ladina: introdução a uma abertura, de Machado Dias Magno, alcunha a categoria da amefricanidade, negando a latinidade da América.

O conceito de “amefricanidade” é “unidade que, sem apagar as matrizes africanas, resgata a experiência fora da África como central” (Bairros, 2000BAIRROS, Luiza. Lembrando Lélia Gonzalez 1935-1994. Afro-Ásia, Salvador, n. 23, 2000. Disponível em: Disponível em: https://periodicos.ufba.br/index.php/afroasia/article/view/20990 . Acesso em: 15 mar. 2024.
https://periodicos.ufba.br/index.php/afr...
, p. 350).

A amefricanidade, dessa forma, expõe um flagrante esforço em romper com os resquícios do colonialismo. No que diz respeito às suas dimensões epistemológica e metodológica, a amefricanidade nos aponta para a possibilidade de resgatar uma unidade específica condicionada pela experiência histórica comum do povo negro em diáspora. Como prova disso, a autora cita os inúmeros espaços de resistência organizados na experiência diaspórica que oferecem modelos alternativos de organização social ao redor do mundo, como quilombos, cimarrones, cumbes, palanques, marronages e marron societies (Gonzalez, 1988GONZALEZ, Lélia. A categoria político-cultural de amefricanidade. Tempo Brasileiro, Rio de Janeiro, v. 92, n. 93, p. 69-82, jan./jun. 1988.).

Embora reconheça as similaridades entre África e América, a autora destaca que a experiência amefricana se diferencia daquela vivida no continente africano. Assim, com o conceito de “amefricanidade”, Gonzalez não está propondo uma confusão entre a experiência africana e a americana, ao contrário, ela critica essa abordagem e aponta tal postura como evolucionista. Para ela, o esforço de buscar no continente americano os exemplos de “sobrevivências” da cultura africana pode ofuscar as tecnologias de resistências e a criatividade da luta contra a escravidão, o genocídio e a exploração. A amefricanidade, portanto, assume um sentido criativo inscrito na vida em diáspora, pois “foi dentro da comunidade escravizada que se desenvolveram formas político-culturais de resistência que hoje nos permitem continuar uma luta plurissecular de liberação” (Gonzalez, 1988GONZALEZ, Lélia. A categoria político-cultural de amefricanidade. Tempo Brasileiro, Rio de Janeiro, v. 92, n. 93, p. 69-82, jan./jun. 1988., p. 79).

Dessa forma, a ideia de amefricanidade carrega consigo a síntese de aclimatação da experiência negra africana e americana no continente americano.

Percebemos, portanto, que a amefricanidade está intimamente relacionada às características do pensamento social brasileiro, na medida em que há uma preocupação com a ideia de formação nacional, que pensa como a cultura do país é marcada pelas influências internacionais, nesse caso, o continente africano e o americano. Além disso, há uma preocupação em propor uma perspectiva para interpretar o Brasil.

3.1.2. Guerreiro Ramos

No mesmo sentido, a categoria “negro-vida” proposta por Guerreiro Ramos constitui uma possibilidade alternativa afro-brasileira de resistência e pensamento autônomo. Alberto Guerreiro Ramos nasceu em 1915, na cidade de Santo Amaro, Bahia, e faleceu em 1982, já no Rio de Janeiro, onde obteve sua formação em Ciências Sociais pela Faculdade Nacional de Filosofia, e em Direito pela Faculdade Nacional de Direito, na mesma cidade (Bariani Jr., 2013BARIANI JR., Edison. Guerreiro Ramos e a redenção sociológica: capitalismo e sociologia no Brasil. São Paulo: Editora Unesp, 2013.). Além dessa formação acadêmica, Guerreiro Ramos era poeta, professor, pesquisador e foi um importante militante do movimento negro.

A ideia de negro-vida parece ajudar a pensar a produção acadêmica sobre relações raciais no Brasil. Ao abordar a questão do negro no Brasil, foi central nos trabalhos de Guerreiro Ramos a crítica à metodologia, à importação equivocada de conceitos e à transplantação de ideias. Esses conjuntos de críticas aparecem reiteradamente em suas produções acadêmicas. Em primeiro lugar, o autor questiona a divisão entre “sujeito” e “objeto” comumente realizada pelos sociólogos, já que, de acordo com a epistemologia que adota, os dois eram faces do mesmo problema.

Em “O problema do negro na sociologia brasileira”, o autor afirma que o negro teria sido estudado no Brasil, “[...] a partir de categorias e valores induzidos predominantemente da realidade europeia. E assim, do ponto de vista da atitude ou da ótica, os autores nacionais não se distinguem dos estrangeiros, no campo em apreço” (Ramos, 1981RAMOS, Alberto Guerreiro. O problema do negro na Sociologia brasileira. In: SCHWARTZMAN, Simon. O pensamento nacionalista e os “Cadernos de Nosso Tempo”. Brasília: Câmara dos Deputados e Biblioteca do Pensamento Brasileiro, 1981. p. 39-69., p. 39). Ou seja, o olhar dos antropólogos/sociólogos brasileiros para o contexto nacional é caracterizado pela descontextualização e marcado pelo estranhamento, de tal maneira que veem a realidade nacional como algo exótico, tal como os estrangeiros observaram o país.

No texto “Patologia social do branco brasileiro”, Guerreiro Ramos (1995RAMOS, Alberto Guerreiro. Patologia social do branco brasileiro. In: RAMOS, Alberto Guerreiro. Introdução crítica à sociologia brasileira. 2. ed. Rio de Janeiro: UFRJ, 1995. p. 171-192.) traz uma discussão que orienta esse debate. Na sua clássica passagem, o santo-amarense diferencia os conceitos de “negro-tema” e “negro-vida”, e estabelece uma crítica à forma como os negros foram estudados como objetos e sujeitos passivos na Sociologia e destacando a maneira altiva e protagonista que o negro-vida assume diante da vida.3 3 “Há o tema do negro e há a vida do negro. Como tema, o negro tem sido, entre nós, objeto de escalpelação perpetrada por literatos e pelos chamados ‘antropólogos’ e ‘sociólogos’. Como vida ou realidade efetiva, o negro vem assumindo o seu destino, vem se fazendo a si próprio, segundo lhe têm permitido as condições particulares da sociedade brasileira. Mas uma coisa é o negro-tema; outra, o negro-vida. O negro-tema é uma coisa examinada, olhada, vista, ora como ser mumificado, ora como ser curioso, ou de qualquer modo como um risco, um traço da realidade nacional que chama a atenção. O negro-vida é, entretanto, algo que não se deixa imobilizar; é despistador, profético, multiforme, do qual, na verdade, não se pode dar versão definitiva, pois é hoje o que não era ontem e será amanhã o que não é hoje” (Ramos, 1995, p. 215).

Ou seja, a díade negro-tema e negro-vida apresenta perspectivas diferentes na análise das relações raciais no Brasil. Cada uma impõe uma lógica distinta no campo das ciências sociais, na forma de pensar a posição do negro na sociedade brasileira. Na primeira abordagem, o negro é um ser passivo, sobre o qual se produzem investigações e criam-se discursos. No entanto, o negro-vida tem seu caráter autônomo, marcado pela dinamicidade de transformação, ou seja, o negro assume um lugar de devir, uma vez que ele não ocupa uma posição definitiva, tampouco se deixa imobilizar.

Como se pode observar, a ideia de negro-vida rompe com a tradição das Ciências Sociais de estudar negro como objeto. No mesmo sentido, Gonzalez (1984GONZALEZ, Lélia. Racismo e sexismo na cultura brasileira. Ciências Sociais Hoje, Brasília, n. 2, p. 223-244, 1984., p. 225) coloca a sua voz como protagonista da própria produção intelectual: “[...] Ou seja, o lixo vai falar, e numa boa”.

Em ambas as formulações há um diagnóstico do lugar da população negra nas Ciências Sociais e, em seguida, uma proposição teórica e metodológica de inverter essa lógica e apostar no negro como autor do discurso. Tanto na ideia de negro-vida de Guerreiro Ramos quanto na ideia de “o lixo vai falar” de Lélia investe-se em uma fala feita a partir da margem da sociedade.

Certamente, tais formulações carregam um potencial epistemológico na medida em que reinterpretam e invertem as lógicas da produção de conhecimento. A questão que surge diante desse potencial é como as pesquisas em Direito podem incorporar essas ideias no debate jurídico. Quais os sentidos das categorias de pretuguês, amefricanidade e negro-vida para o Direito? Essas são questões fundamentais para entender a reverberação do pensamento social negro nesse campo. A seção a seguir visa responder a parte desses questionamentos.

4. Contribuições do pensamento social negro para o Direito

A produção acadêmica brasileira do Direito e das relações raciais não é recente. São pioneiras nesses esforços duas pesquisadoras: Eunice Prudente (1980PRUDENTE, Eunice Aparecida de Jesus. Preconceito racial e igualdade jurídica no Brasil. 1980. 267 f. Dissertação (Mestrado em Direito do Estado) - Faculdade de Direito, Universidade de São Paulo, São Paulo, 1980.) e Dora Bertulio (1989BERTULIO, Dora Lucia de Lima. Direito e relações raciais: uma introdução crítica ao racismo. Dissertação (Mestrado em Direito) - Centro de Ciências Jurídicas, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 1989.). As autoras exercem papel fundamental em denunciar o orquestramento e a sedimentação do racismo científico no ordenamento e no pensamento jurídicos. A questão principal discutida ao longo dos textos das autoras é a desconstrução dos aspectos de neutralidade e imparcialidade conferidos ao Direito. Assim, a grande contribuição dessas autoras é nos permitir pensar o debate racial no Direito a partir de um olhar que se desloque da ideia de democracia racial.

Segundo Rodrigo Gomes (2021GOMES, Rodrigo Portela. Cultura jurídica e diáspora negra: diálogos entre direito e relações raciais e a teoria crítica da raça. Revista Direito e Práxis, Rio de Janeiro, v. 12, n. 2, p. 1203-1241, 2021.), em importante artigo sobre a sistematização do campo do Direito e das relações raciais, a partir dos trabalhos supramencionados, a produção crítica no Direito brasileiro foi responsabilizada, na década de 1980, por sua omissão quanto à problemática do racismo na estruturação da cultura jurídica. A professora Dora Bertulio (1989BERTULIO, Dora Lucia de Lima. Direito e relações raciais: uma introdução crítica ao racismo. Dissertação (Mestrado em Direito) - Centro de Ciências Jurídicas, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 1989., p. 12), em sua dissertação de mestrado, traz o seguinte diagnóstico: “A questão racial no Brasil tem sido tratada, ainda, com a displicência típica à atenção dada aos demais problemas de todo o povo brasileiro, quer na esfera política, acadêmica ou jurídica”. Da mesma forma, em Preconceito racial e igualdade jurídica no Brasil, a jurista Eunice Prudente (1980PRUDENTE, Eunice Aparecida de Jesus. Preconceito racial e igualdade jurídica no Brasil. 1980. 267 f. Dissertação (Mestrado em Direito do Estado) - Faculdade de Direito, Universidade de São Paulo, São Paulo, 1980.) expõe o status do racismo como elemento substancial inegociável na construção e na interpretação do pensamento jurídico brasileiro até então.

É a partir dessas brechas e desses adubos no terreno do campo jurídico que o pensamento social negro no Brasil encontra as condições para germinar nas pesquisas empíricas do Direito, especialmente de intelectuais negros/negras. Ou seja, é a partir do campo do Direito e das relações raciais que foi possível importar das Ciências Sociais, em especial do pensamento de Lélia Gonzalez e Guerreiro Ramos, as ideias para questionar, pensar e reformular o Direito.

Na revisão de literatura construída para este artigo a partir de publicações realizadas entre 2016 e 2022, vemos que os autores criticam os pressupostos teóricos que fundamentam o saber jurídico no Brasil e propõem uma epistemologia negra, como veremos a seguir.

4.1. Racializando o conhecimento jurídico

As categorias de amefricanidade e pretuguês são acionadas para apresentar uma proposição teórica no sentido de dar centralidade ao debate racial no direito. assim, ao utilizar esses conceitos, os esforços dos pesquisadores do campo do direito objetivam mostrar a racialização do conhecimento jurídico e denunciar a ideia de universalidade e neutralidade do direito.

Como um primeiro exemplo dessa abordagem, temos o trabalho da jurista Thula Pires, que tem se utilizado do pensamento de Guerreiro Ramos e Lélia Gonzalez para propor abordagens racializadas das diversas áreas do Direito, como direitos humanos, criminologia e constitucionalismo. A professora faz uso dessa ferramenta teórico-metodológica em um nítido esforço de produzir rasuras no campo jurídico. Nesse sentido, destacam-se três textos importantes, quais sejam: “Direitos humanos traduzidos em pretuguês” (Pires, 2017aPIRES, Thula Rafaela de Oliveira. Direitos humanos traduzidos em pretuguês. In: 13o MUNDOS DE MULHERES & FAZENDO GÊNERO 11, 2017, Florianópolis. Anais [...]. Florianópolis: UFSC, 2017a.), “Por um constitucionalismo ladino-amefricano” (Pires, 2019PIRES, Thula Rafaela de Oliveira. Por um constitucionalismo ladino-amefricano. In: BERNARDINO-COSTA, Joaze; MALDONADO-TORRES, Nelson; GROSFOGUEL, Ramón (orgs.). Decolonialidade e pensamento afrodiaspórico. Belo Horizonte: Autêntica, 2019. p. 285-304.) e, por último, “Criminologia crítica e pacto narcísico: por uma crítica criminológica apreensível em pretuguês” (Pires, 2017bPIRES, Thula Rafaela de Oliveira. Criminologia crítica e pacto narcísico: por uma crítica criminológica apreensível em pretuguês. Revista Brasileira de Ciências Criminais: RBCCrim, São Paulo, v. 25, n. 135, p. 541-562, set. 2017b.).

No primeiro texto, Pires (2017aPIRES, Thula Rafaela de Oliveira. Direitos humanos traduzidos em pretuguês. In: 13o MUNDOS DE MULHERES & FAZENDO GÊNERO 11, 2017, Florianópolis. Anais [...]. Florianópolis: UFSC, 2017a.) traz para a concepção hegemônica de direitos humanos, construída em torno da ideia de universalidade, uma leitura amefricana, capaz de acrescentar novos elementos à noção de humanidade, que inclui os múltiplos corpos e as formas de vida colocadas na experiência da diáspora negra. Embora apresente críticas aos direitos humanos e identifique os seus limites por serem produzidos para o ser e não para aqueles que estão inscritos na zona do não ser, Thula Pires aposta como saída na tradução dos direitos humanos em pretuguês, ou seja, um campo de direitos humanos que possibilite outras leituras sobre o direito à liberdade, à propriedade, à saúde, à educação das mulheres negras e à memória, e promova o bem viver a partir das formas alternativas de ser e estar na natureza oferecidas pelos modos de vida dos povos amefricanos. A autora aposta, assim, no conhecimento da população como alternativa possível de elaborar um novo campo de direitos humanos.

No segundo texto (Pires, 2019PIRES, Thula Rafaela de Oliveira. Por um constitucionalismo ladino-amefricano. In: BERNARDINO-COSTA, Joaze; MALDONADO-TORRES, Nelson; GROSFOGUEL, Ramón (orgs.). Decolonialidade e pensamento afrodiaspórico. Belo Horizonte: Autêntica, 2019. p. 285-304.), a autora defende que o “constitucionalismo latino-americano” invisibilizou a questão do negro nos processos constituintes emancipatórios na região da América Latina e do Caribe. Embora tenha reforçado o heroísmo indígena, grande parte dos juristas especializados no constitucionalismo latino-americano deixaram negros e negras de modo subsidiário. Thula Pires vê na abordagem decolonial uma possibilidade adequada para entender a potência das novas Constituições da Bolívia, de 2009, do Equador, de 2008, e da Venezuela, de 1999 (Pires, 2019PIRES, Thula Rafaela de Oliveira. Por um constitucionalismo ladino-amefricano. In: BERNARDINO-COSTA, Joaze; MALDONADO-TORRES, Nelson; GROSFOGUEL, Ramón (orgs.). Decolonialidade e pensamento afrodiaspórico. Belo Horizonte: Autêntica, 2019. p. 285-304.; Lopes, 2020aLOPES, Juliana Araújo. Quem pariu Améfrica? Trabalho doméstico, constitucionalismo e memória em pretuguês. Revista Brasileira de Políticas Públicas, Brasília, v. 10, n. 2, p. 93-123, 2020b.).

Com esse diagnóstico do campo do direito constitucional, Pires propõe a categoria de amefricanidade de Lélia Gonzalez como alternativa para compreender esses processos constitucionais. Segundo a leitura de Juliana Lopes, Thula Pires vê na amefricanidade a oportunidade para repensar o direito constitucional porque ele “registra, numa linguagem de direitos fundamentais em pretuguês e pretunhol, as marcas dos povos africanos e indígenas sobre os idiomas coloniais, imprimindo não só sua sonoridade, mas suas cosmovisões e sensações” (Lopes, 2020aLOPES, Juliana Araújo. Constitucionalismo brasileiro em pretuguês: trabalhadoras domésticas e lutas por direitos. 2020. 329 f. Dissertação (Mestrado em Direito) - Universidade de Brasília, Brasília, 2020a., p. 296). A proposta de um constitucionalismo ladino-amefricano, segundo Pires (2018PIRES, Thula Rafaela de Oliveira. Cartas do cárcere: testemunhos políticos dos limites do Estado Democrático de Direito. In: PIRES, Thula; FREITAS, Felipe (orgs.). Vozes do cárcere: ecos da resistência política. Rio de Janeiro: Kitabu, 2018. p. 166-212., p. 34), “restitui a fala e a produção teórica e política de sujeitos até então infantilizados e destituídos da possibilidade de confrontar a hegemonia das perspectivas eurocêntricas sobre o fenômeno do constitucionalismo”.

Por fim, no terceiro trabalho ora mencionado, Pires propõe o uso da categoria pretuguês para construir uma criminologia crítica. Segundo a jurista carioca, o convite para pensar a criminologia em pretuguês significa considerar o racismo, o sexismo e outros marcadores sociais elementos constituintes do sistema de justiça criminal. Nas palavras da autora, uma crítica criminológica em pretuguês trata “de uma abordagem que racializa para politizar gênero, classe, sexualidade e deficiência como categoria empírica, analítica e normativa” (Pires, 2017bPIRES, Thula Rafaela de Oliveira. Criminologia crítica e pacto narcísico: por uma crítica criminológica apreensível em pretuguês. Revista Brasileira de Ciências Criminais: RBCCrim, São Paulo, v. 25, n. 135, p. 541-562, set. 2017b., p. 55).

Como é possível observar, a incorporação dos conceitos de “pretuguês” e “amefricanidade” no pensamento jurídico de Thula Pires abre caminhos para um conjunto de inovações metodológicas no campo do Direito, o que fica evidente nos autores mencionados a seguir.

Seguindo os passos dos caminhos pavimentados por Thula Pires com os construtos de Gonzalez, temos os trabalhos de Juliana Lopes (2020aLOPES, Juliana Araújo. Constitucionalismo brasileiro em pretuguês: trabalhadoras domésticas e lutas por direitos. 2020. 329 f. Dissertação (Mestrado em Direito) - Universidade de Brasília, Brasília, 2020a., 2020bLOPES, Juliana Araújo. Quem pariu Améfrica? Trabalho doméstico, constitucionalismo e memória em pretuguês. Revista Brasileira de Políticas Públicas, Brasília, v. 10, n. 2, p. 93-123, 2020b.), que, tomando como ponto de partida a experiência de mulheres negras na Assembleia Nacional Constituinte de 1987/1988, caracterizada pelo silenciamento de suas demandas de direitos fundamentais por serem consideradas “como se fossem da família”, propõe uma leitura do constitucionalismo a partir de uma visão do pretuguês e da amefricanidade. Partindo do pressuposto de que há uma exploração do trabalho das mulheres negras na sociedade brasileira, a autora questiona alguns conceitos da história constitucional, como trabalho, família, democracia, contrato patriarcal e sujeito constitucional.

A autora, a partir do processo constituinte, e utilizando-se de entrevistas com mulheres negras e de arquivos documentais dos períodos analisados, chega à conclusão de que as associações e os sindicatos de trabalhadoras domésticas no Brasil são entendidos como um movimento constitucional, que, mesmo denegado, constrói o Estado e disputa os sentidos da democracia, ao mesmo tempo dentro e fora dela (Lopes, 2020aLOPES, Juliana Araújo. Quem pariu Améfrica? Trabalho doméstico, constitucionalismo e memória em pretuguês. Revista Brasileira de Políticas Públicas, Brasília, v. 10, n. 2, p. 93-123, 2020b.).

Ainda nas trilhas do pensamento da socióloga brasileira, Laysi Zacarias (2021ZACARIAS, Laysi da Silva. Amefricanizando o amor: diálogos entre bell hooks e Lélia Gonzalez. 2021. 148 f. Dissertação (Mestrado em Direitos Humanos e Cidadania) - Programa de Pós-Graduação em Direitos Humanos e Cidadania, Universidade de Brasília, Brasília, 2021.) estabelece um diálogo entre bell hooks e Lélia Gonzalez por meio do que chama de “amefricanização do amor”. Assim, mobiliza a categoria da amefricanidade para propor uma abordagem política do amor que serve de ferramenta para a ampliação do vocabulário político da teoria crítica dos direitos humanos, em oposição ao “ódio que na modernidade resulta em políticas de morte” (Zacarias, 2021ZACARIAS, Laysi da Silva. Amefricanizando o amor: diálogos entre bell hooks e Lélia Gonzalez. 2021. 148 f. Dissertação (Mestrado em Direitos Humanos e Cidadania) - Programa de Pós-Graduação em Direitos Humanos e Cidadania, Universidade de Brasília, Brasília, 2021., p. 133).

Dessa forma, a proposição teórica da autora, a partir de uma ideia de amor hooksiano, isto é, como categoria política, convoca uma “produção teórica e prática de direitos humanos que se politize e que auxilie na construção de novas formas de nos relacionarmos e novos mundos, a partir da ética do amor revolucionário amefricano produzido pelo imaginário político” (Zacarias, 2021ZACARIAS, Laysi da Silva. Amefricanizando o amor: diálogos entre bell hooks e Lélia Gonzalez. 2021. 148 f. Dissertação (Mestrado em Direitos Humanos e Cidadania) - Programa de Pós-Graduação em Direitos Humanos e Cidadania, Universidade de Brasília, Brasília, 2021., p. 113). Desse modo, da mesma forma que Pires, Zacarias propõe uma rasura na ideia de direitos humanos.

Por fim, o pretuguês é pensado como uma “juridicidade preta”, isto é, o que Diego Aragão (2022ARAGÃO, Diego Miranda. Direito e transmodernidade: entre reformas curriculares e práticas alternativas. Anãnsi: Revista de Filosofia, Salvador, v. 3, n. 2, p. 255-265, 2022.) chama de direito transmoderno, formado a partir do rompimento com as ideias do direito moderno de normas e sujeitos gerais e abstratos, e um compromisso com um currículo que leve em conta a realidade concreta do país, em que as pessoas sentem os efeitos das políticas coloniais.

Percebemos, dessa forma, o diálogo travado entre os autores e as principais ideias do pensamento social negro, na medida em que estabelecem conexões entre os contextos internacionais e brasileiro. Esse conjunto de ideias racializa o sistema jurídico hegemônico ao alterar o que se entende por direito constitucional e direitos humanos.

4.2. O que fazemos com o Direito então?

Vimos que o pensamento social negro influencia as abordagens teóricas da produção de conhecimento jurídico, rejeitando o mito da democracia racial, redefinindo o lugar do Brasil no contexto regional e centralizando as pessoas negras no debate. Essa lente sobre o país tem desdobramentos práticos, que levam os autores a se perguntar: afinal, o que fazer com o Direito?

Os trabalhos inscritos nesse grupo acionam tanto as categorias de amefricanidade e pretuguês, de Lélia Gonzalez, quanto a díade “negro-tema” e “negro-vida”, de Guerreiro Ramos, para propor reinterpretações de conceitos jurídicos, do papel das instituições e do lugar dos pesquisadores negros na academia, além de refletir sobre as formas de conduzir e pensar pesquisas em Direito como um todo.

Ao considerar o Brasil um país amefricano, por exemplo, reinterpretamos a realidade e, portanto, os desdobramentos das políticas públicas adotadas no país (Severi, 2017SEVERI, Fabiana Cristina. Enfrentamento à violência contra as mulheres e à domesticação da Lei Maria da Penha: elementos do projeto jurídico feminista no Brasil. 2017. 240 f. Tese (Livre-Docência em Direito Público) - Faculdade de Direito, Universidade de São Paulo, Ribeirão Preto, 2017.). Ainda, a categoria é utilizada para dar novos sentidos a conceitos como o de tortura. Se silenciar sobre as resistências antiescravistas é uma forma de moldar imagens de passividade sobre a população negra brasileira (Bertulio, 1989BERTULIO, Dora Lucia de Lima. Direito e relações raciais: uma introdução crítica ao racismo. Dissertação (Mestrado em Direito) - Centro de Ciências Jurídicas, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 1989.), expor os processos de revolta sob as lentes da amefricanidade pode ser uma maneira de interpretarmos o que entendemos, hoje, por tortura (Stanchi; Pires, 2022STANCHI, Malu; PIRES, Thula Rafaela de Oliveira. Memórias abolicionistas sobre a tortura no Brasil. Revista de Direito Público, Brasília, v. 19, n. 101, p. 200-252, jan./mar. 2022.).

Nessa linha, observamos o trabalho de Marcos Queiroz e Jonhatan Guimarães (2017GUIMARÃES, Jonhatan Razen Ferreira; QUEIROZ, Marcos Vinícius Lustosa. Frantz Fanon e criminologia crítica: pensar o Estado, o Direito e a punição desde a colonialidade. Revista Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo, v. 25, n. 135, p. 307-341, 2017.), voltado para refletir sobre o campo da criminologia crítica a partir dos aportes teóricos de Frantz Fanon e Guerreiro Ramos. Os autores elaboram alguns apontamentos metodológicos para pesquisas no campo da criminologia antirracista, apostando em produções do conhecimento que vão de encontro às estruturas colonialistas da academia.

Outra forma de olhar para o Direito pelas lentes de Gonzalez é por meio da linguagem jurídica - o “juridiquês” - e a sua tradução para o pretuguês, não apenas no sentido de tornar o texto mais amplamente compreensível, mas também levando em consideração as demandas da população negra na construção de políticas públicas. É assim que Melo et al. (2022MELO, Leonardo Dourado et al. Desburocratizando o juridiquês: encruzilhadas da educação jurídica popular no enfrentamento ao racismo. InSURgência: Revista de Direitos e Movimentos Sociais, v. 8, n. 2, p. 223-248, 2022.) se posicionam ao tratar da atuação do Núcleo de Extensão Popular Flor de Mandacaru da Universidade Federal da Paraíba. Ao agir em defesa dos artistas sob a égide de um prêmio cultural financiado pela Lei Aldir Blanc4 4 Lei n. 14.017, de 29 de junho de 2020, que dispõe sobre ações emergenciais destinadas ao setor cultural a serem adotadas durante o estado de calamidade pública reconhecido pelo Decreto Legislativo n. 6, de 20 de março de 2020 (Brasil, 2020a, 2020b). na cidade de João Pessoa, os membros do grupo de educação popular se depararam com um edital com linguagem rebuscada, ausência de ações afirmativas para artistas negros e exigências técnicas excludentes para esse grupo (Melo et al., 2022MELO, Leonardo Dourado et al. Desburocratizando o juridiquês: encruzilhadas da educação jurídica popular no enfrentamento ao racismo. InSURgência: Revista de Direitos e Movimentos Sociais, v. 8, n. 2, p. 223-248, 2022., p. 229). Assim, defendem não apenas a reversão dos problemas encontrados, mas também a consolidação de editais permanentes voltados às manifestações culturais negras e periféricas que compõem a identidade cultural da cidade de João Pessoa.

A leitura do Direito em pretuguês também é uma forma de interpretar o conceito de trabalho doméstico, expandindo-o para incluir o trabalho de cuidado remunerado em domicílio (Santana, 2020SANTANA, Raquel Leite da Silva. O trabalho de cuidado remunerado em domicílio como espécie jurídica do trabalho doméstico no Brasil: uma abordagem justrabalhista à luz da trilogia literária de Carolina Maria de Jesus. 2020. 255 f. Dissertação (Mestrado em Direito) - Programa de Pós-Graduação em Direito, Universidade de Brasília, Brasília, 2020.). A pesquisa de Santana utiliza a categoria como um modo de investigação no Direito. Assim, para que se chegue aos caminhos ou às respostas da pergunta de pesquisa, é necessário investigar, em pretuguês, a história social do trabalho de cuidado, como forma de subsidiar uma análise crítica sobre as características desse trabalho na contemporaneidade, a partir do controle (e sua ausência) no campo.

Em relação ao papel das instituições, apontamos para o trabalho de Walkyria Chagas da Silva Santos (2022) sobre os caminhos de atuação da Defensoria Pública da União (DPU) para a construção de uma política de vida para a juventude negra. A autora busca pensar o Brasil de forma amefricanizada e em pretuguês para reconstruir o caminho dos direitos humanos, de modo a trazer humanidade aos sujeitos subalternizados no processo de implementação da agenda de direitos humanos e da atuação do Estado como um todo. Assim, a autora interpreta a missão constitucional da DPU a partir do que chama de biopolítica afirmativa, isto é, ações fundamentais para a construção de uma política de vida para a população negra, tais como o acesso assistencial à saúde, à educação, à alimentação e aos demais direitos sociais (Araújo; Santos, 2022ARAÚJO, Danielle Ferreira Medeiro da Silva de; SANTOS, Walkyria Chagas da Silva. Ciclo de morte e possibilidades de atuação da DPU: caminhos para a construção de uma política de vida para a juventude negra. Revista da Defensoria Pública da União, Brasília, n. 17, p. 1-212, jan./jun. 2022.).

Saulo de Mattos (2020MATTOS, Saulo Murilo de Oliveira. Ministério Público e domínio racial: poucas ilhas negras em um arquipélago não negro. Revista Brasileira de Políticas Públicas, Brasília, v. 10, n. 2, p. 266-294, 2020.) também utiliza a categoria da amefricanidade ao propor saídas para o enfrentamento das desigualdades raciais pelo sistema de justiça. Em seu artigo, com o objetivo de descrever o perfil racial do Ministério Público (MP), o autor discute a baixa presença negra nos quadros e nas questões debatidas pela instituição, utilizando-se teoricamente da categoria de amefricanidade para propor transformações no órgão.

Para amefricanizar o MP, impõe-se uma “cultura e hermenêutica constitucional que reconheçam a necessidade de interpretar normas jurídicas fundamentais, a partir do que a sociedade brasileira efetivamente é: antinegra e narcisisticamente branca” (Mattos, 2020MATTOS, Saulo Murilo de Oliveira. Ministério Público e domínio racial: poucas ilhas negras em um arquipélago não negro. Revista Brasileira de Políticas Públicas, Brasília, v. 10, n. 2, p. 266-294, 2020., p. 288).

Ainda, pretuguês, amefricanidade e negro-vida são mencionados como forma de os autores se colocarem na narrativa da pesquisa em primeira pessoa, retirando-se do lugar de objeto (Leal, 2020LEAL, Camila Garcez. Ministério Público: a caneta que puxa o gatilho - os homicídios decorrentes de oposição à intervenção policial e o caso Cláudia Silva Ferreira. 2020. 157 f. Dissertação (Mestrado em Direito) - Programa de Pós-Graduação em Direito, Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2020.; Pinheiro, 2020PINHEIRO, Luciano Santana. “A gente formiga e eles elefantes”: o direito nas narrativas de familiares-vítima da letalidade policial em Feira de Santana. (Monografia) - Faculdade de Direito, Universidade Estadual de Feira de Santana, Feira de Santana, 2020.), e como justificativa da importância da escolha do tema de pesquisa (Barbosa, 2022BARBOSA, Greyce Danielle Aves. Descolonizando a Academia: o fomento à representatividade feminina, negra e periférica pela educação popular - um estudo de caso sobre a experiência do PPGDC/UFF e o Pré-Pós Dr. Luz Gama. 2019. 238 f. Dissertação (Mestrado em Direito Constitucional) - Programa de Pós-Graduação em Direito Constitucional, Universidade Federal Fluminense, Niterói, 2022.).

Como materialização dessa aposta metodológica, temos a pesquisa empírica de Luciano Pinheiro (2020PINHEIRO, Luciano Santana. “A gente formiga e eles elefantes”: o direito nas narrativas de familiares-vítima da letalidade policial em Feira de Santana. (Monografia) - Faculdade de Direito, Universidade Estadual de Feira de Santana, Feira de Santana, 2020.).5 5 “Ao codificar a experiência do negro como uma mudança do negro-vida para o negro-tema, o autor oferece um aporte teórico que descreve a viragem epistemológica que aqui pretendo perseguir: a saída do status de pesquisado, de negro-tema, para o negro-vida, pesquisador, com os desafios que isso comporta. É nesse movimento de giro que esta abordagem está inscrita” (Pinheiro, 2020, p. 55). No trabalho, voltado para compreender como o Direito aparece nas reações e nas narrativas dos familiares das vítimas da letalidade policial na cidade de Feira de Santana, Bahia, ao apresentar o fundamento epistemológico de seu trabalho de campo, o pesquisador mobiliza a ideia de negro-tema e de negro-vida para produzir uma pesquisa empírica em primeira pessoa. Assim, retira-se do lugar de observador - objeto, portanto - e posiciona-se como condutor da pesquisa acadêmica.

5. De onde viemos e para onde estamos indo

As citações a Lélia Gonzalez parecem sair de um lugar de contraponto ao feminismo hegemônico (Franklin, 2016FRANKLIN, Naila Ingrid Chaves. Raça e gênero na obra de Nina Rodrigues: a dimensão racializada do feminino na criminologia positivista do final do século XIX. Cadernos do CEAS: Revista Crítica de Humanidades, Salvador, n. 238, p. 641-658, 2016.; Severi, 2017SEVERI, Fabiana Cristina. Enfrentamento à violência contra as mulheres e à domesticação da Lei Maria da Penha: elementos do projeto jurídico feminista no Brasil. 2017. 240 f. Tese (Livre-Docência em Direito Público) - Faculdade de Direito, Universidade de São Paulo, Ribeirão Preto, 2017.; Piovesan, 2021PIOVESAN, Betina Fontana. Insurgências jurídicas no Movimento de Mulheres Camponesas: o feminismo camponês e popular e a reprodução social. 2021. 144 f. Dissertação (Mestrado em Direito) - Programa de Pós-Graduação em Direito, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2021.) para dar lugar a uma nova premissa de Brasil e, portanto, de como devemos interpretar políticas públicas e leis, e seus efeitos sobre a população brasileira, em especial sobre as pessoas negras (Lopes, 2017LOPES, Juliana Araújo. Mulheres negras moldando o Direito Constitucional do Trabalho brasileiro: a doméstica, o feminismo negro e o Estado Democrático de Direito. 2017. 118 f. Trabalho de Conclusão de Curso (Bacharelado em Direito) - Universidade de Brasília, Brasília, 2017.; Santana, 2020SANTANA, Raquel Leite da Silva. O trabalho de cuidado remunerado em domicílio como espécie jurídica do trabalho doméstico no Brasil: uma abordagem justrabalhista à luz da trilogia literária de Carolina Maria de Jesus. 2020. 255 f. Dissertação (Mestrado em Direito) - Programa de Pós-Graduação em Direito, Universidade de Brasília, Brasília, 2020.; Wenceslau, 2020WENCESLAU, Ethiene Vanila de Souza. Elementos das desigualdades raciais nas políticas públicas habitacionais brasileiras: estudo da centralidade urbana à luz da execução do programa federal de habitação popular Minha Casa, Minha Vida na cidade do Rio de Janeiro no período de 2010 a 2017. 2020. 179 f. Dissertação (Mestrado em Direito) - Faculdade de Direito, Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2020.; Stanchi; Pires, 2022STANCHI, Malu; PIRES, Thula Rafaela de Oliveira. Memórias abolicionistas sobre a tortura no Brasil. Revista de Direito Público, Brasília, v. 19, n. 101, p. 200-252, jan./mar. 2022.). Essas novas interpretações consideram o país parte da Améfrica Ladina, o que pressupõe reconhecer a persistência de um racismo que se propõe velado, mas que concede status de cidadania apenas àqueles incluídos no que Pires (2018PIRES, Thula Rafaela de Oliveira. Cartas do cárcere: testemunhos políticos dos limites do Estado Democrático de Direito. In: PIRES, Thula; FREITAS, Felipe (orgs.). Vozes do cárcere: ecos da resistência política. Rio de Janeiro: Kitabu, 2018. p. 166-212.), citando Fanon, chama de “zona do ser”. Nesse sentido, o racismo se volta contra aqueles que são o testemunho vivo de nossa ladinoamefricanidade (Pires, 2018PIRES, Thula Rafaela de Oliveira. Cartas do cárcere: testemunhos políticos dos limites do Estado Democrático de Direito. In: PIRES, Thula; FREITAS, Felipe (orgs.). Vozes do cárcere: ecos da resistência política. Rio de Janeiro: Kitabu, 2018. p. 166-212.).

No que se refere ao pensamento de Guerreiro Ramos, diferentemente da suposição inicial de pesquisa, foi identificada uma mobilização limitada de sua obra em comparação com a de Lélia Gonzalez. Além disso, percebe-se que a forma como o texto clássico do autor é citado nas pesquisas em sua maioria se restringe ao uso do termo “negro-vida” para denunciar a abordagem das pesquisas que entendem o negro como problema (Freitas, 2020FREITAS, Felipe da Silva. Racismo e polícia: uma discussão sobre mandato policial. 2020. 264 f. Tese (Doutorado em Direito) - Universidade de Brasília, Brasília, 2020.; Vicente, 2017VICENTE, Larissa Maria da Silva. Racismo institucional no Brasil e Poder Judiciário: um olhar sobre os casos de intolerância religiosa contra as religiões de matriz africana no estado do Rio de Janeiro. 2017. 58 f. Monografia (Bacharelado em Direito) - Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2017.; Rabelo e Sposato, 2021RABELO, Danilo dos Santos; SPOSATO, Karyna Batista. A importância das narrativas na construção do ensino jurídico antirracista. Revista Contemporânea de Educação, Rio de Janeiro, v. 16, n. 37, p. 46-64, 2021.; Ramos, 2019RAMOS, Luciana de Souza. O Direito achado na encruza: territórios de luta, (re)construção da justiça e reconhecimento de uma epistemologia jurídica afro-diaspórica. 2019. 412 f. Tese (Doutorado em Direito) - Faculdade de Direito, Universidade de Brasília, Brasília, 2019.; Alves, 2019ALVES, Adriana Avelar. Onde estão os(as) juízes(as) negros(as) no Brasil?: recorte racial na magistratura brasileira: perspectivas sociais e políticas. 2019. 182 f. Dissertação (Mestrado em Ciências Jurídicas e Sociais) - Programa de Pós-Graduação em Sociologia e Direito, Universidade Federal Fluminense, Niterói, 2019.). Ou seja, não há uma diversidade de abordagem. Uma hipótese possível para explicar isso é que, embora a obra do sociólogo baiano seja relevante para o campo do pensamento social negro, seus trabalhos não estão sistematizados o suficiente, o que limita sua apropriação por parte dos pesquisadores no campo do Direito. No entanto, existem pesquisas, principalmente nas ciências criminais, que utilizam o pensamento de Ramos para repensar os lugares dos sujeitos produtores de conhecimento e propor maneiras diferentes de aplicá-lo. Isso foi evidenciado nos trabalhos de Guimarães e Queiroz (2017GUIMARÃES, Jonhatan Razen Ferreira; QUEIROZ, Marcos Vinícius Lustosa. Frantz Fanon e criminologia crítica: pensar o Estado, o Direito e a punição desde a colonialidade. Revista Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo, v. 25, n. 135, p. 307-341, 2017.), Pinheiro (2020PINHEIRO, Luciano Santana. “A gente formiga e eles elefantes”: o direito nas narrativas de familiares-vítima da letalidade policial em Feira de Santana. (Monografia) - Faculdade de Direito, Universidade Estadual de Feira de Santana, Feira de Santana, 2020.) e Prando (2018PRANDO, Camila Cardoso de Mello. A Criminologia Crítica no Brasil e os estudos críticos sobre branquidade. Revista Direito e Práxis, Rio de Janeiro, v. 9, n. 1, p. 70-84, 2018. Disponível em: Disponível em: https://www.e-publicacoes.uerj.br/index.php/revistaceaju/article/view/25378 . Acesso em: 11 jan. 2024.
https://www.e-publicacoes.uerj.br/index....
). Além disso, é possível observar uma oportunidade para novas agendas de pesquisa a partir da abordagem da branquidade, conforme propõe Camila Prando, já que a obra de Ramos é uma das primeiras no campo das Ciências Sociais a pensar a questão racial a partir da centralidade de um problema causado por pessoas brancas.

O que todos os trabalhos encontrados parecem ter em comum são a sua atualidade, dado o período de publicação entre os anos de 2016 e 2022, e a divulgação científica por meio, principalmente, de artigos científicos e dissertações de mestrado.

As publicações aqui encontradas olham para o Direito por meio de uma lente que protagoniza a experiência de sujeitos subalternizados da população brasileira, refletindo sobre o campo criticamente sem, contudo, limitar-se às críticas. Desse modo, autores e autoras contemporâneos no campo dos direitos e das relações raciais se colocam propositivamente em seus trabalhos, o que se manifesta até mesmo em trabalhos de conclusão de curso e iniciações científicas (Lopes, 2017LOPES, Juliana Araújo. Mulheres negras moldando o Direito Constitucional do Trabalho brasileiro: a doméstica, o feminismo negro e o Estado Democrático de Direito. 2017. 118 f. Trabalho de Conclusão de Curso (Bacharelado em Direito) - Universidade de Brasília, Brasília, 2017.; Vicente, 2017VICENTE, Larissa Maria da Silva. Racismo institucional no Brasil e Poder Judiciário: um olhar sobre os casos de intolerância religiosa contra as religiões de matriz africana no estado do Rio de Janeiro. 2017. 58 f. Monografia (Bacharelado em Direito) - Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2017.; Goulart, 2018GOULART, Domenique Assis. Mãe é mãe: o estereótipo da maternidade na criminalização de mulheres por aborto e por crimes comissivos por omissão. 2018. Trabalho de Conclusão de Curso (Bacharelado em Ciências Jurídicas e Sociais) - Faculdade de Direito, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2018.; Costa, 2020COSTA, Flávia Fernanda dos Santos. A práxis democrática no espelho constitucional sob o paradigma da raça: por um constitucionalismo ladino-amefricano. 2020. 34 f. Trabalho de Conclusão de Curso (Bacharelado em Direito) - Faculdade de Ciências Jurídicas e Sociais, Centro Universitário de Brasília, Brasília, 2020.; Pinheiro, 2020PINHEIRO, Luciano Santana. “A gente formiga e eles elefantes”: o direito nas narrativas de familiares-vítima da letalidade policial em Feira de Santana. (Monografia) - Faculdade de Direito, Universidade Estadual de Feira de Santana, Feira de Santana, 2020.; Barbosa, 2021BARBOSA, Mariana Costa. Criminologia negra em três atos: o pensamento de mulheres negras refundando o campo analítico. 2021. 63 f. Trabalho de Conclusão de Curso (Bacharelado em Direito) - Universidade de Brasília, Brasília, 2021.). Vemos os autores em níveis acadêmicos iniciais se referenciando não apenas aos cânones do pensamento social brasileiro negro, mas também a professores com titulação de doutorado obtida nos últimos 20 anos, tais como Thula Pires, Ana FlauzinaFLAUZINA, Ana Luiza Pinheiro; PIRES, Thula Rafaela de Oliveira. Supremo Tribunal Federal e a naturalização da barbárie. Revista Direito e Práxis, Rio de Janeiro, v. 11, n. 2, p. 1211-1237, 2020. e Felipe FreitasFREITAS, Felipe da Silva. Racismo e polícia: uma discussão sobre mandato policial. 2020. 264 f. Tese (Doutorado em Direito) - Universidade de Brasília, Brasília, 2020..

Os resultados parecem se coadunar com o que Fernanda Lima e Delton Felipe chamam de “insurgências e insubordinações negras no ensino superior a partir da implementação das cotas raciais nas universidades” (Lima; Felipe, 2021LIMA, Fernanda da Silva; FELIPE, Delton Aparecido. Insurgências e insubordinações negras no ensino superior: as cotas raciais e o tensionamento dos currículos nas universidades. Revista Culturas Jurídicas, [s.l.], v. 8, n. 20, p. 877-904, maio./ago. 2021.). Essas manifestações consistem em um duplo movimento de (i) crítica ao caráter eurocêntrico e colonizador dos currículos acadêmicos, e (ii) de introdução de epistemologias negras, que passam a tensionar a produção de conhecimento hegemônica. Todavia, as origens desse movimento no Direito merecem uma investigação aprofundada que não foi objeto deste artigo. O quadro encontrado pode servir de inspiração para futuras pesquisas que buscam investigar os efeitos de ações afirmativas e eventuais outras explicações sobre a produção teórica crítica racial em Direito no Brasil.

Considerações finais

Buscamos apresentar neste artigo como o pensamento social negro na figura de Lélia Gonzalez e Guerreiro Ramos abriu novas possibilidades na pesquisa jurídica. Acreditamos que os aportes metodológicos e teóricos dos intelectuais não só proporcionam uma abordagem das relações raciais marcada pela dinamicidade para o Direito, mas também são fissuras no silenciamento acadêmico e no soterramento das produções de intelectuais negros.

Primeiro, apresentamos alguns aspectos da abordagem de raça no chamado pensamento social brasileiro clássico, a fim de identificar a partir de que premissas os seus críticos partiram. Em seguida, constatamos a peculiaridade do pensamento social negro em relação ao pensamento social dos cânones, com base nas ideias de amefricanidade e de pretuguês construídas por Lélia Gonzalez, e de negro-vida elaborada por Guerreiro Ramos.

Na sequência, apresentamos algumas ideias encontradas nos trabalhos, cujo conteúdo centraliza a raça no Direito ao propor inovações metodológicas nas pesquisas no campo, interpretações normativas e de políticas públicas em consonância com a experiência concreta dos sujeitos e a reflexão sobre o papel das instituições do Direito.

Concluímos que, nos últimos seis anos, o pensamento social brasileiro negro tem sido utilizado para atualizar as pesquisas acadêmicas no campo do Direito e das relações raciais, principalmente por meio de artigos científicos e dissertações de mestrado, sendo fundamental para a racialização do debate jurídico.

Para além desse papel, que já sinaliza como as pesquisas empíricas contribuem para o questionamento da forma tradicional de fazer e pensar o Direito, este artigo, por meio de um resgate do pensamento de autores negros, permite a construção e a sustentação de uma perspectiva antirracista. Assim, o pensamento social negro torna-se ainda mais necessário para (re)pensar a pesquisa empírica, pois, além de propor o enfrentamento das desigualdades raciais, tem potencial para refinar e atualizar a literatura, aventando uma modalidade de Estado comprometido com a população negra.

Sem dúvidas, os trabalhos encontrados evidenciam, ainda, a persistência de um nicho de debate sobre as questões raciais no Direito, que, pelos desafios enfrentados por seus pesquisadores, tende a ser ostracizado e reduzido a um campo que não necessariamente dialoga com os demais departamentos jurídicos. Cabe aos pesquisadores críticos em Direito avançar o debate para que o epistemicídio e o apagamento de autores negros deixem de ser a regra e passem a fazer parte apenas da história.

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  • 1
    Os autores agradecem ao professor Silvio Luiz de Almeida por suas contribuições dadas a partir da disciplina ministrada no Curso de Pós-Graduação em Direito e Desenvolvimento na Escola de Direito de São Paulo da Fundação Getulio Vargas (FGV DIREITO SP) denominada “Estado e Direito no Pensamento Social Brasileiro”. Este artigo é fruto das reflexões obtidas ao longo das aulas e das referências indicadas pelo professor. Agradecem também à Fulbright Brasil, ao Fulbright Scholarship Board e ao Bureau of the Educational and Cultural Affairs do Departamento de Estado dos Estados Unidos pela bolsa concedida a Julia dos Santos como parte do programa Doctoral Dissertation Research Award. Ainda, agradecem à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) pela concessão da bolsa de estudo do mestrado (Processo n. 2021/03918-5) a Luciano Santana PinheiroPINHEIRO, Luciano Santana. “A gente formiga e eles elefantes”: o direito nas narrativas de familiares de vítimas da letalidade policial em Feira de Santana-BA. Relatório do Programa de Iniciação Científica da FGV DIREITO SP. São Paulo: FGV DIREITO SP, 2019..
  • 2
    De acordo com Sérgio Buarque de Holanda, sobre o conceito de “sobranceria” (2014CANDIDO, Antonio. Prefácio. In: HOLANDA, Sérgio Buarque de. Raízes do Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 2014., p. 37): “Essa concepção espelha-se fielmente em uma palavra bem hispânica - ‘sobranceria’ -, palavra que indica inicialmente a ideia de superação. Mas a luta e emulação que ela implica eram tacitamente admitidas e admiradas, engrandecidas pelos poetas, recomendadas pelos moralistas e sancionadas pelos governos. É dela que resulta largamente a singular tibieza das formas de organização, de todas as associações que impliquem solidariedade e ordenação entre esses povos. Em terra onde todos são barões não é possível acordo coletivo durável, a não ser por uma força exterior respeitável e temida”.
  • 3
    “Há o tema do negro e há a vida do negro. Como tema, o negro tem sido, entre nós, objeto de escalpelação perpetrada por literatos e pelos chamados ‘antropólogos’ e ‘sociólogos’. Como vida ou realidade efetiva, o negro vem assumindo o seu destino, vem se fazendo a si próprio, segundo lhe têm permitido as condições particulares da sociedade brasileira. Mas uma coisa é o negro-tema; outra, o negro-vida. O negro-tema é uma coisa examinada, olhada, vista, ora como ser mumificado, ora como ser curioso, ou de qualquer modo como um risco, um traço da realidade nacional que chama a atenção. O negro-vida é, entretanto, algo que não se deixa imobilizar; é despistador, profético, multiforme, do qual, na verdade, não se pode dar versão definitiva, pois é hoje o que não era ontem e será amanhã o que não é hoje” (Ramos, 1995RAMOS, Alberto Guerreiro. Patologia social do branco brasileiro. In: RAMOS, Alberto Guerreiro. Introdução crítica à sociologia brasileira. 2. ed. Rio de Janeiro: UFRJ, 1995. p. 171-192., p. 215).
  • 4
    Lei n. 14.017, de 29 de junho de 2020, que dispõe sobre ações emergenciais destinadas ao setor cultural a serem adotadas durante o estado de calamidade pública reconhecido pelo Decreto Legislativo n. 6, de 20 de março de 2020 (Brasil, 2020aBRASIL. Lei n. 14.017, de 29 de junho de 2020. Dispõe sobre ações emergenciais destinadas ao setor cultural a serem adotadas durante o estado de calamidade pública reconhecido pelo Decreto Legislativo n. 6, de 20 de março de 2020. Brasília: Presidência da República, 2020a. Disponível em: Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2020/lei/l14017.htm#:~:text=LEI%20N%C2%BA%2014.017%2C%20DE%2029%20DE%20JUNHO%20DE%202020&text=Disp%C3%B5e%20sobre%20a%C3%A7%C3%B5es%20emergenciais%20destinadas,20%20de%20mar%C3%A7o%20de%202020 . Acesso em: 11 mar. 2024.
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    , 2020bBRASIL. Decreto Legislativo n. 6, de 2020. Reconhece, para os fins do art. 65 da Lei Complementar n. 101, de 4 de maio de 2000, a ocorrência do estado de calamidade pública, nos termos da solicitação do Presidente da República encaminhada por meio da Mensagem n. 93, de 18 de março de 2020. Brasília: Senado Federal, 2020b. Disponível em: Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/portaria/dlg6-2020.htm . Acesso em: 11 mar. 2024.
    https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/po...
    ).
  • 5
    “Ao codificar a experiência do negro como uma mudança do negro-vida para o negro-tema, o autor oferece um aporte teórico que descreve a viragem epistemológica que aqui pretendo perseguir: a saída do status de pesquisado, de negro-tema, para o negro-vida, pesquisador, com os desafios que isso comporta. É nesse movimento de giro que esta abordagem está inscrita” (Pinheiro, 2020PINHEIRO, Luciano Santana. “A gente formiga e eles elefantes”: o direito nas narrativas de familiares-vítima da letalidade policial em Feira de Santana. (Monografia) - Faculdade de Direito, Universidade Estadual de Feira de Santana, Feira de Santana, 2020., p. 55).
  • Como citar este artigo

    DRUMMOND, Julia dos Santos; PINHEIRO, Luciano Santana. Do negro-vida ao pretuguês: contribuições do pensamento social brasileiro negro para o Direito. Revista Direito GV, São Paulo, v. 20, e2409, 2024. https://doi.org/10.1590/2317-6172202409

Editora responsável

Catarina Helena Cortada Barbieri (Editora-chefe)

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    15 Abr 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    12 Maio 2022
  • Aceito
    21 Ago 2023
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