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Uso de vaselina líquida na prevenção de laceração perineal durante o parto

Resumos

A maioria dos partos vaginais é acompanhada por lacerações do trato genital. Este estudo randomizado foi realizado em um centro de parto normal localizado na cidade de São Paulo, para avaliar a eficácia da vaselina líquida em reduzir o trauma perineal. A amostra foi composta de 38 nulíparas por grupo (experimental e controle). No grupo experimental utilizaram-se 30 ml de vaselina líquida na região perineal durante o período expulsivo. Todas as parturientes realizaram "puxos" espontâneos e permaneceram em posição lateral esquerda. A freqüência de laceração perineal foi semelhante em ambos os grupos (experimental 63,2% versus controle 60,5%). A região posterior do períneo apresentou maior freqüência de trauma (53,2%). Do total de casos de traumatismo perineal, 72,3% foi de laceração de primeiro-grau.

traumatismos do nascimento; períneo; vaselina; parto; ensaio clínico


Most of vaginal births are accompanied by lacerations in the genital tract. This was a randomized study carried out in a Birth Center located in São Paulo city to evaluate the efficacy of liquid petroleum jelly in reducing perineal laceration. The sample was composed of 38 nulliparous women per group (experimental and control). In the experimental group was used 30 ml of the petroleum jelly in the perineal region during the expulsive period. The parturient were allowed to push spontaneously during the delivery and remained in the left side position. The frequency of perineal laceration was similar in both groups (experimental 63.2% versus control 60.5%). The posterior perineum region presented the highest frequency of trauma (53.2%). Of the total cases of perineal trauma, 72.3% were first-degree lacerations. The use of liquid petroleum jelly of perineal protection does not reduce the frequency neither the degree of lacerations in childbirth.

birth injuries; perineum; petrolatum jelly; childbirth; randomized controlled trials


La mayor parte de los nacimientos por vía vaginal están acompañados por laceraciones perineales. Este es un estudio aleatorio realizado en una maternidad de la ciudad de San Pablo para evaluar la eficacia de la vaselina líquida en la reducción de laceraciones perineales. La muestra fue compuesta por 38 mujeres nulíparas organizadas en un grupo experimental y otro de control. En el grupo experimental fue aplicado 30 ml de vaselina en la región perineal durante el periodo expulsivo. Todas las parturientas realizaron "pujos" espontáneos y se mantuvieron en la posición lateral izquierda. La frecuencia de laceración perineal fue semejante en ambos grupos (experimental 63,2% y grupo control 60.5%). La región posterior del perineo presentó una alta frecuencia de trauma (53.2%). De los casos totales de trauma perineal, 72,3% fueron de laceración de primer grado. Se verificó que el uso de la vaselina en la región perineal no reduce la frecuencia o grado de las laceraciones durante el parto.

traumatismos del nacimiento; perineo; vaselina; parto; ensayo clínico


ARTIGO ORIGINAL

Uso de vaselina líquida na prevenção de laceração perineal durante o parto*

Natalúcia Matos AraújoI; Sonia Maria Junqueira Vasconcellos de OliveiraII

IEnfermeira Obstétrica, Especialista de Laboratório da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo, Brasil, e-mail: natalucia@usp.br

IIEnfermeira Obstétrica, Doutora, Professora da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo, Brasil, e-mail: soniaju@usp.br

RESUMO

A maioria dos partos vaginais é acompanhada por lacerações do trato genital. Este estudo randomizado foi realizado em um centro de parto normal localizado na cidade de São Paulo, para avaliar a eficácia da vaselina líquida em reduzir o trauma perineal. A amostra foi composta de 38 nulíparas por grupo (experimental e controle). No grupo experimental utilizaram-se 30 ml de vaselina líquida na região perineal durante o período expulsivo. Todas as parturientes realizaram "puxos" espontâneos e permaneceram em posição lateral esquerda. A freqüência de laceração perineal foi semelhante em ambos os grupos (experimental 63,2% versus controle 60,5%). A região posterior do períneo apresentou maior freqüência de trauma (53,2%). Do total de casos de traumatismo perineal, 72,3% foi de laceração de primeiro-grau.

Descritores: traumatismos do nascimento; períneo; vaselina; parto; ensaio clínico

INTRODUÇÃO

A maioria dos partos vaginais é acompanhada de trauma do trato genital decorrente de lacerações, episiotomia ou ambos, particularmente em mulheres primíparas. As lacerações de primeiro grau às vezes não necessitam de sutura, as de segundo grau podem ser facilmente suturadas sob anestesia local e, em geral, cicatrizam sem complicações. As lacerações de terceiro grau, por sua vez, podem ter conseqüências mais sérias, e devem ser suturadas por profissional experiente, a fim de evitar problemas de fístula ou incontinência fecal(1).

Apesar da diminuição na freqüência de realização da episiotomia em anos recentes, de modo geral, as taxas de traumatismo perineal permanecem altas(2). Estudo(3) sobre as taxas de episiotomia no mundo, revelou que o uso deste procedimento varia de 9,7% (norte da Europa - Suécia) para 96,2% (América do Sul - Equador), com taxas mais baixas em países de língua inglesa (América do Norte - Canadá: 23,8% e Estados Unidos: 32,7%) e em muitos países (América do Sul e Central - Brasil: 94,2%, África do Sul - 63,3% e Ásia - China: 82%) permanecem elevadas. Estudos clínicos indicam que mais da metade das mulheres com parto sem episiotomia têm lacerações que requerem sutura(2). É conhecido que o dano perineal associado a episiotomia, mesmo não envolvendo o esfíncter anal, algumas vezes causa dor perineal e incontinência após o parto(4). Além disso, estudos recentes têm documentado que a episiotomia causa maior dor, disfunção sexual, infecção, comparada com a laceração espontânea, tendo impacto negativo na saúde da mulher no pós-parto(5). Por outro lado, não há concordância em relação a quais fatores de risco aumentam ou diminuem o trauma perineal(5-8).

Considerando a magnitude da morbidade perineal, são desejadas intervenções que ajudem a reduzir o trauma perineal. Entre as práticas usadas para proteger o períneo estão: massagem perineal no final da gestação, puxo espontâneo, posições vertical e lateral no parto, técnica de proteção perineal no desprendimento cefálico, uso de compressa morna e de lubrificantes no períneo durante o período expulsivo(6,9-10). No entanto, uma revisão sistemática de técnicas usadas na prevenção do trauma perineal durante o nascimento não demonstrou medidas eficazes para evitar as lacerações perineais(8).

A vaselina é freqüentemente aplicada no períneo durante o período expulsivo no parto normal, para evitar lacerações ou até mesmo facilitar o parto, contudo, não existem trabalhos científicos que indiquem o seu benefício. Com a finalidade de diminuir as medidas intervencionistas e a medicalização no parto, é oportuno avaliar formas de minimizar as lacerações espontâneas do assoalho pélvico a fim de reduzir a morbidade durante o parto. Desta forma, os autores decidiram conduzir um ensaio clínico, uma vez que não há evidências que indiquem o benefício da vaselina líquida em reduzir o trauma perineal.

O objetivo deste estudo foi avaliar a eficácia da vaselina líquida em reduzir a laceração perineal.

MÉTODO

Trata-se de um ensaio clínico, randomizado, controlado, sobre o uso de vaselina líquida na região perineal durante o período expulsivo em parturientes sem parto vaginal anterior. Foi realizado no Centro de Parto Normal do Amparo Maternal, maternidade filantrópica, localizada na zona Sul do município de São Paulo, Brasil. Neste Centro de Parto, onde são atendidas mulheres de todas as regiões da cidade de São Paulo e realizados aproximadamente 900 partos por mês. Durante dois meses (agosto e setembro, 2001), ocorreram 1.458 (79%) partos normais, 379 (20,5%) cesáreas e 9 (0,5%) fórcipe, cerca de 45% destas mulheres eram nulíparas e quase um quarto delas tinha 19 anos ou menos (dados clínicos do serviço do Amparo Maternal).

Neste serviço, uma equipe de médicos obstetras é a responsável pela admissão de mulheres em trabalho de parto, cabendo à enfermeira obstétrica assisti-las no trabalho de parto e parto normal. O uso da vaselina líquida na região perineal durante o período expulsivo é uma prática comum entre as enfermeiras obstétricas dessa maternidade.

Participantes da amostra

Foram incluídas no estudo as parturientes observando-se os seguintes critérios: não ter tido parto vaginal prévio; idade igual ou maior a 15 anos (neste serviço, existe um número elevado de adolescentes); idade gestacional entre 37 e 41 semanas e 6 dias; com feto único e vivo em apresentação cefálica fletida; ter altura uterina de até 36cm no momento da internação; estar com cérvico-dilatação de até 5cm na internação; não ter feito preparo do períneo durante a gestação (informação dada pela parturiente); não apresentar processo infeccioso na região da vulva, vagina e períneo e concordar em ter o parto na posição lateral esquerda (esta posição é mais confortável, pode aumentar a sensação de controle da mulher e também diminuir as taxas de episiotomias - RR= 0,84; 95% IC=0,79 - 0,91)(11).

Os critérios de exclusão foram: administração de ocitocina ou outras drogas que tivessem interferência no trabalho de parto; apresentarem intercorrências clínicas ou obstétricas no decorrer do trabalho de parto e parto que necessitassem de intervenções como episiotomia, fórcipe ou cesárea. Foram, também, excluídas as mulheres que optaram por ter o parto na posição litotômica.

Segundo os critérios de elegibilidade foram selecionadas 106 mulheres, destas uma não consentiu a sua participação e 29 foram excluídas do estudo - 27 por necessitarem de episiotomia e 2 de cesárea (Fig. 1). A amostra final foi composta por 76 parturientes, sendo 38 no grupo experimental (fez uso de vaselina líquida na região perineal no período expulsivo) e 38 no grupo controle (receberam cuidados de rotina). A randomização foi efetuada por meio de uma tabela gerada por computador e aplicada às mulheres que atendiam aos critérios de inclusão no momento do parto.


Um estudo prévio(12) efetuado no mesmo local desta pesquisa relatou a ocorrência de lacerações perineais em 50% de mulheres nulíparas sem episiotomia, 37% dessas mulheres tiveram lacerações de primeiro grau e 13% tiveram lacerações de segundo grau.

O tamanho da amostra foi calculado utilizando a fórmula proposta por Lwanga; Lemeshow

Coleta de dados

Os dados foram coletados de fevereiro a junho de 2003 pela pesquisadora, enfermeira obstétrica, que atendeu 74 partos (97,4%) e por duas enfermeiras obstétricas da instituição. As enfermeiras obstétricas foram informadas pela pesquisadora sobre em qual grupo (controle ou experimental) a parturiente seria alocada quando estivesse no período expulsivo. No período expulsivo, a mulher foi transferida para a sala de parto, ficando em posição lateral esquerda. No momento da expulsão fetal, o pé direito foi colocado sobre o arco da mesa de parto com a cabeça apoiada no travesseiro.

A anti-sepsia da região perineal foi feita com o uso de sabão líquido e a seguir, colocaram-se os campos estéreis, para ambos os grupos. No grupo experimental, foi aplicada a vaselina líquida em toda a área do períneo com auxílio de dois dedos, usando um movimento de varredura. O clitóris, grandes lábios, pequenos lábios, vestíbulo, fúrcula e corpo perineal foram cobertos com 30 ml deste lubrificante sem qualquer estiramento ou massagem do períneo. Tal procedimento foi executado repetidamente, desde a dilatação total do colo uterino até o início do desprendimento do pólo cefálico. Foi permitido a todas as parturientes conduzir o parto com puxos espontâneos, sem nenhuma orientação para realizar o puxo dirigido.

Nos dois grupos as mulheres receberam os cuidados de rotina do Centro de Parto Normal. O grupo controle não recebeu a aplicação de vaselina líquida.

Variáveis do estudo

O uso de vaselina líquida e os cuidados de rotina na região perineal durante o parto foram considerados como variável independente. As variáveis dependentes foram: condições do períneo - freqüência, grau e localização da laceração perineal - e resultado do recém-nascido - avaliado pelo boletim de Apgar. Para este estudo, a duração do período expulsivo foi definida como o tempo (minutos) entre o diagnóstico da dilatação cervical completa até a expulsão fetal(13). Os esforços expulsivos e as contrações uterinas foram utilizados como um indicativo na execução do exame vaginal verificando assim a dilatação cervical.

Considerações éticas

Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo e a coleta de dados autorizada pelo diretor clínico da maternidade, local da pesquisa. Após a admissão no Centro de Parto Normal, as mulheres foram convidadas a participar do estudo. Cada participante recebeu esclarecimentos acerca do método e dos objetivos, e, após assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, foi-lhes assegurado o direito de deixar de participar da pesquisa em qualquer momento.

Análise dos dados

As características das mulheres foram descritas usando médias para variáveis quantitativas e proporções para variáveis qualitativas. Na análise estatística foi utilizado o programa SPSS for Windows versão 10,0. Todos os testes (Qui-quadrado, t-Student, Pearson e exato de Fisher) utilizados foram bicaudais e os valores de p < 0,05, considerados significantes.

RESULTADOS

A amostra final foi composta por 76 nulíparas, distribuídas em dois grupos (38 no grupo experimental e 38 no grupo controle). Os grupos foram homogêneos quanto à estatura (160,0 ± 0,06 cm), idade (grupo experimental 21,6 ± 3,8 anos e grupo controle 20,5 ± 3,9 ), 32 (42,1%) participantes eram brancas e 50 (65,8%) não tinham ocupação remunerada. Em 97,4% (74) dos partos o desprendimento cefálico ocorreu em occipto-púbica.

Os resultados neonatais foram bons em ambos os grupos, com média do Boletim de Apgar de 9 e 10 no primeiro e quinto minutos, respectivamente, nos dois grupos.

O tempo de permanência da vaselina na região do períneo do início da aplicação até o desprendimento do pólo cefálico oscilou de 3 a 40 minutos, com média de 16,4 ± 9,9 minutos.

Em termos gerais de resultado perineal, 38,2% tiveram períneo íntegro e 61,8% tiveram laceração perineal. A proporção de parturientes com laceração nos dois grupos foi semelhante (experimental 63,2% vs controle 60,5%), sem diferença estatística (p=0,813).

Do total dos casos de trauma perineal (n=47), 72,3% (n=34) foram de laceração de primeiro grau (experimental 66,7% vs controle 78,3%). A laceração de segundo grau apresentou freqüência maior no grupo experimental (n=8; 33,3%), sem diferença estatística (p=0,347). A região posterior do períneo foi a que apresentou maior freqüência de traumatismo (n=25; 53,2%).

A média de peso dos recém-nascidos do grupo experimental (3.240g) foi maior do que a do grupo controle (3.090g). Os dados demonstram que não houve relação entre o grau de laceração perineal e o peso do recém-nascido, o peso materno e a duração do período expulsivo.

Foi observada grande variação na duração do segundo estágio do parto (8-115 minutos), com a média de períneo íntegro (33,0 minutos) vs com trauma (37,7 minutos) no grupo experimental; no grupo controle a média períneo íntegro (38,7 minutos) vs laceração (31,5 minutos).

DISCUSSÃO

Inicialmente, são feitas considerações sobre as limitações do estudo. A falta de cegar o estudo poderia ter afetado a avaliação dos resultados perineais. No entanto, não houve qualquer possibilidade de o pesquisador não ter identificado uma laceração que exigisse sutura. Neste caso, o viés introduzido pelo investigador seria minimizar o trauma perineal no grupo experimental. O padrão de excelência para avaliar uma intervenção está assegurado quando o julgamento é pelo cegamento duplo e aleatorização do estudo. No entanto, em geral, o cegamento é impossível quando a intervenção é um componente altamente visível no cuidado.

Este é o primeiro ensaio clínico randomizado que avalia o uso de vaselina líquida no períneo durante o parto. Os resultados apontam que o uso da vaselina não protegeu a região perineal do trauma, pois, a taxa de ocorrência de laceração no períneo foi semelhante nos dois grupos (63,2% no experimental contra 60,5% no controle). Das 76 mulheres investigadas, 38,2% apresentaram períneo íntegro, confirmando que as lacerações são extremamente freqüentes no parto vaginal espontâneo (Tabela 1). Taxas semelhantes de trauma perineal foram encontradas em um estudo(4) com parto vaginal, sendo que 73,3% das primíparas adotaram o parto na posição lateral, semi-reclinada ou de joelhos. Outro estudo(10) que avaliou o efeito da massagem perineal utilizando gel lubrificante solúvel em água no período expulsivo constatou taxas semelhantes de laceração espontânea (60,9% grupo da massagem vs 63,6% controle) sem diferença estatística.

Por outro lado, o estudo(6) prospectivo não randomizado que avaliou 1.211 partos vaginais espontâneos assistidos por enfermeiras obstétricas, concluiu que o uso de compressa quente e a lubrificação perineal durante o período expulsivo estavam associados com o aumento das taxas de lacerações perineais. A proporção de lacerações foi estatisticamente maior nas mulheres que fizeram uso de lubrificante à base de água (50% vs 26%; p< 0,001).

Um estudo(2) envolvendo 3.049 partos realizados por enfermeiras obstétricas e estudantes avaliou os fatores relacionados ao traumatismo perineal no nascimento. A posição lateral no parto e o uso de compressa quente foram associadas com a redução do trauma, em razão do aumento do suprimento de sangue que facilita o relaxamento dos tecidos. No modelo de regressão logística, o uso de óleo ou lubrificante no períneo, durante o período expulsivo, elevou o risco de laceração no grupo de multíparas (OR=1,7).

Em um recente estudo randomizado(14), com 1.211 partos assistidos por obstetrizes, houve um número elevado de trauma no trato genital em mulheres às quais foi oferecida uma das três intervenções usadas no período expulsivo - compressas mornas, massagem com lubrificante solúvel em água, ou técnica de proteção perineal. A freqüência de laceração foi igual nos três grupos de intervenção com 77%; sendo que 40% de todas as participantes do estudo eram nulíparas e em aproximadamente 80% delas o parto ocorreu na posição de cócoras.

A análise de regressão múltipla revelou associação estatisticamente significante entre a posição do parto e o resultado perineal, com a posição lateral associada à alta taxa de períneo intacto (66,6%)(15).

Mais recentemente, entre 19 ensaios clínicos incluídos em uma revisão da Cochrane sobre a posição da mulher no período expulsivo, o uso de qualquer posição vertical ou lateral, quando comparado com a posição supina ou litotômica, foi associado com: menor duração do período expulsivo; redução de episiotomia e aumento de laceração perineal de segundo grau(11).

No presente estudo, em relação ao trauma perineal, 72,3% apresentaram lacerações de primeiro grau considerando as mulheres que necessitaram de sutura e 27,7% de segundo grau. A laceração de primeiro grau foi mais freqüente no grupo controle com 78,3% contra 66,7% no experimental, sem diferença estatística (p=0,347) (Tabela 1). Não foram constatadas lacerações de terceiro e quarto graus, que trazem maior morbidade em relação à incontinência anal, dor no pós-parto, infecção e disfunção sexual.

Dados semelhantes foram observados no estudo com massagem no período expulsivo, com 35,7% de laceração de segundo grau no grupo de massagem e 35,5% no grupo controle. Os autores concluíram que a massagem perineal usada no parto não aumenta a ocorrência de períneo integro(10).

Um estudo prospectivo observacional(4) encontrou em nulíparas, assistidas por obstetrizes, baixa freqüência de laceração de primeiro grau (34,8%) e maior freqüência de laceração de segundo grau (38,5%), quando comparado com o atual estudo.

Outro estudo prospectivo que incluiu 1.068 partos assistidos por enfermeiras obstétricas, constatou que as lacerações de primeiro grau estiveram presentes em 22,2% das nulíparas e em 11,7% das multíparas. As lacerações de segundo grau ocorreram em 31,5% das nulíparas e em 10,5% das multíparas. Os autores concluíram que nas nulíparas o fator associado ao traumatismo perineal foi devido à massagem no parto(16).

Quanto à localização da laceração, os resultados demonstraram que não houve diferença estatística entre os grupos, contudo, a região posterior do períneo apresentou maior freqüência de trauma em ambos os grupos - 54,2% no experimental e 52,2% no controle, com predomínio na região mediana (Tabela 1). A justificativa para a maior presença do trauma na região posterior poderia ser a pressão exercida por uma das mãos sobre a cabeça fetal que impede o seu movimento de extensão, afastando-a do arco púbico em direção à região posterior do períneo, facilitando assim a ocorrência da laceração(1).

Estudo(4) que avaliou o trauma perineal no parto de 1.296 nulíparas com e sem episiotomia observou laceração de primeiro grau na região anterior do períneo no grupo de episiotomia - 38,9%, semelhante aos dados do presente estudo (30,3%). Nessa pesquisa, também verificou-se que 66,1% das lacerações de primeiro e segundo graus ocorreram na região posterior do períneo, semelhantes aos resultados do (60,6%).

Neste estudo não foi encontrada interfência entre a condição perineal e a duração do período expulsivo. Resultados diferentes foram observados no estudo(17) que encontrou maiores taxas de períneo íntegro nas mulheres com período expulsivo maior (83,5 vs 39,8 minutos) (p=0,001). Outro trabalho(4) demonstrou que a análise de regressão logística relacionou a duração do segundo estágio do parto acima de 60 minutos à laceração de segundo grau (OR=1,307; 95% IC= 1,027 - 1,663).

Uma pesquisa(7) sobre os fatores de risco para laceração de terceiro grau no parto encontrou aumento significante do risco de trauma (OR=1,12) quando a duração do período expulsivo foi maior que 15 minutos. Os autores concluíram que o estiramento da musculatura do períneo, por maior tempo, pode levar à isquemia local, ocasionando o aumento de roturas.

Os dados apontam que os grupos foram homogêneos em relação ao peso do recém-nascido. No entanto, os maiores valores da média ocorreram no grupo experimental (Tabela 2). O peso do recém-nascido não foi associado com o trauma perineal quando os dados foram ajustados para paridade e outras variáveis relacionadas no estudo(2). Em outra pesquisa(4) , a análise de regressão logística revelou que o maior peso do recém-nascido foi associado com laceração de segundo grau (OR=1,801; 95% IC=1,529 - 2,123).

CONCLUSÃO

A lesão perineal é uma ocorrência comum durante o parto vaginal, independente da paridade da mulher. A dor é uma queixa constante das puérperas e interfere em suas atividades diárias, assim como na interação com o recém-nascido e com os familiares. Este estudo abordou a eficácia da vaselina em proteger o períneo durante o parto. Com base nos resultados encontrados, é possível afirmar que o uso de vaselina líquida no períneo durante o período expulsivo não diminui a ocorrência e o grau de laceração perineal. É muito importante reduzir a morbidade relacionada ao trauma perineal após o parto. Manter a integridade da região perineal é um grande desafio para os profissionais que assistem a parturiente.

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  • **,
    usada para comparar proporções de populações finitas. O número de participantes considerado necessário foi 76 (n = 38 por grupo). O poder do teste indicou que uma amostra de 38 mulheres por grupo permitiria em 80% dos casos detectar uma diferença de 30% de laceração perineal entre os grupos, com um a = 0,05.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      30 Jul 2008
    • Data do Fascículo
      Jun 2008

    Histórico

    • Aceito
      13 Mar 2008
    • Recebido
      17 Maio 2007
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