Psicoses de involução. Estudo clínico de 50 casos, com vistas ao prognóstico e terapêutica
Nelson PiresI; A. Rubim de PinhoII; George AlakijaIII; Gabriel NeryIV
ILivre-docente de Psiquiatria na Fac. Fluminense de Medicina (Rio de Janeiro). Diretor Clínico do Sanatório Bahia
IIPsiquiatra do Hospital Juliano Moreira e do Sanatório Bahia
IIIPsiquiatra do Sanatório Bahia
IVAcadêmico de Medicina, interno do Sanatório Bahia
RESUMO E CONCLUSÕES
1. As psicoses de involução incidem mais no sexo feminino (60%), mas o prognóstico é o mesmo num e noutro sexo.
2. Em 50 casos tratados de psicose de involução, houve 22% de remissões completas, 50% de remissões parciais, 26% de casos sem remissão e 2% de falecimentos.
3. As psicoses de involução, nas mulheres, predominam entre os 45 e 55 anos e, nos homens, dos 55 aos 65 anos. O prognóstico, a partir dos 61 anos, é tanto pior quanto mais avançada a idade. Antes dos 61 anos esta proporcionalidade não é regular.
4. Do ponto de vista da incidência das psicoses de involução, o estado de solteiro é mais nocivo à mulher que ao homem. O estado de casado parece ser mais nocivo ao homem involutivo, ou antes, o casamento preserva mais a mulher do que o homem. Os estados de solteiro, separado e viúvo são incomparavelmente mais nocivos à mulher que ao homem. O prognóstico mais favorável sobreveio nos solteiros, depois nos casados, enfim nos viúvos, isto se avistarmos o material em conjunto. Separando homens e mulheres, verificamos: as mulheres solteiras e casadas têm melhor prognóstico que as viúvas; os homens solteiros têm melhor prognóstico que os casados.
5. Em nosso material predominaram os leptossomáticos na proporção de 26 para o total de 50. Havia 13 pícnicos. Os leptossomáticos tiveram melhor desfecho que os pícnicos, conclusão contrária ao que habitualmente se diz. Nossos 3 atléticos remitiram totalmente.
6. Nos 18 casos em que pudemos sopesar a herança, verificamos sobretudo neuróticos, timopatas, suicidas. Os nossos doentes que não tinham ou negavam tara, tiveram evolução mais desfavorável. A tara neurótica foi a de pior prognóstico; a variedade de tara não influiu no prognóstico.
7. De 48 portadores de psicose de involução, 31 eram personalidades psicopáticas comprovadas. Sobrelevam os timopatas (deprimidos e lábeis de humor) e os histéricos. Seguem-se os astênicos, paranoides e inseguros. Há, todavia, 17 indivíduos sem antecedentes anormais, o que mostra que a involução enseja, pela primeira vez na vida, oportunidade para uma psicose. É talvez por esse motivo que se tem, aprioris-ticamente, a involução como patogenética- Em muitos dos casos nessas condições - distúrbios mentais surgidos pela primeira vez na involução - a involução entrava como fator patoplástico. A personalidade anterior normal teve prognóstico melhor que a anormal. Os anormais com reações histéricas no passado tiveram desfecho particularmente desfavorável.
8. De 44 psicóticos involutivos, 25 tiveram episódio mental anterior ao atual (12 histéricos, 7 depressivos, 2 maníacos, 2 compulsivos, etc.) Os que não tiveram episódio anterior conseguiram melhor desfecho. Entre os que já haviam apresentado episódios, os de melhor prognóstico foram os depressivos e os de pior, os histéricos.
9. Os fatôres desencadeantes psicógenos (apresentaram-se 29 vezes em 50 casos) devem sua freqüência ao fato de que, na involução, estímulos psicógenos mínimos tornam-se patogênicos; 12 vezes houve desencadeamento exógeno. Em 9 vêzes não se percebeu nenhum dêsses dois fatôres; seriam, pois, endógenos. Para o prognóstico, não importou a natureza do fator desencadeante, se psicógeno, exógeno, ou inexistente. Percebemos que, quando fator causal, a hipertensão arterial foi o agente exógeno mais desfavorável. Quando a hipertensão apareceu no curso duma psicose, nada indicou quanto ao prognóstico; quando havia sinais de arteriosclerose, não havia remissão total.
10. Síndromes mentais involutivas apareceram em nosso material durante ou após a menopausa, em freqüências iguais. As aparecidas durante a menopausa tiveram melhor prognóstico.
11. Um quinto de nossos doentes tinha desordens do aparêlho circulatório; um décimo era de arterioscleróticos prováveis e um sétimo, de hipertensos. Os hipertensos com distúrbios mentais raramente se comportaram como doentes exógenos puros. A hipertensão arterial é sempre fator desfavorável, quando for a responsável pelos distúrbios mentais.
12. Em nossos 50 casos, 25 vêzes a forma clínica foi depressiva. Estas, as histéricas, paranoides e esquizofreniformes, não tiveram bom prognóstico; melhores, a êste respeito, foram as maníacas e as confu-sionais. Os involutivos deprimidos com episódio anterior também depressivo, sobretudo se astênicos, têm melhor prognóstico que aquêles que jamais tiveram episódio depressivo anterior. A forma depressiva mais favorável foi a "síndrome de Cotard".
13. Quanto mais precoce o tratamento, melhor o prognóstico.
14. Os doentes accessíveis ao tratamento melhoraram logo ao primeiro dêles que foi empregado - fôsse eletrochoque ou insulina.
15. O eletrochoque proporcionou melhores resultados nos casos de início exógeno, depois nos de início psicógeno. As síndromes irrompidas "sem fator desencadeante" foram pouco accessíveis ao eletrochoque.
16. Considerados apenas os casos tratados com eletrochoque, não se percebe a vantagem do tratamento precoce, que se observa no conjunto do material (conclusão 13). É conveniente, portanto, ensaiar tal tratamento mesmo em casos antigos.
Até há poucos anos atrás as psicoses de involução não tinham precisão na nosologia psiquiátrica. Isso decorria do critério nosológico-clínico, em si mesmo inseguro e pretensioso. Inseguro, porque, numa época em que quase nada se sabia da etiologia das doenças mentais, os "nosoiogistas" se obrigavam a criar quadros sindrômicos com algum outro critério extra-etiológico; serviam-Se do sintomático e evolutivo, sobretudo; pretensioso porque, sem a base correta indispensável, lançavam-se a doutrinar sôbre entidades nosológicas, com pretensões a exatidão minuciosa. As aquisições psiquiátricas do presente vêm solapando todo esse edifício da corrente nosológico-clínica.
No capítulo das psicoses de involução, talvez mais do que noutros setôres, pressentia-se que havia coisas heterogêneas. Criado a princípio com os quadros depressivos (melancolia involutiva), ajuntaram-se-lhe o delírio pré-senil de prejuízo e a "demência senil". Estas últimas foram aumentadas com as formas de Alzheimer, Pick e a presbiofrenia de Wernicke e, reunidas, passaram para o capítulo das "demências senis", excluídas as "psicoses involutivas". Apareceram as "paranóias involutivas" (Kleist), e tôdas as síndromes paranóides na idade involutiva começaram a ser aferidas; pensa-se que muita parafrenia e "demência paranóide" pode caber aí. As psicoses arterioscleróticas, ora se incluíam nas psicoses de involução, ora concedia-se-lhes uma autonomia talvez constestável. Menopausa e "pré-senium" incluíam-se num só todo cronológico e com isto tinha-se conquistado um denominador comum para todos os quadros de involução. Ùltimamente, alinharam-se novos conhecimentos: antes de tudo, as "catatonias tardias" foram arroladas como quadros involutivos possìvelmente esquizofrênicos; afinal surgiram as pesquisas sôbre "psicoses hipertensivas" a lançar, não só luzes, como novas incógnitas para o centro desse capítulo psiquiátrico.
Assim se foi constituindo um setor psiquiátrico, onde só se subentende que há, de certo, uma psicose que aparece depois dos quarenta anos. O título só pode ser utilizado no plural - psicoses de involução - porque dentro dêle existem quadros os mais diversos, a ser individualizados pelo estudo de cada doente de per si. O diagnóstico de psicoses de involução não diz coisa alguma sôbre a natureza da síndrome, nem sôbre seu prognóstico; a avaliação psiquiátrica não é sequer iniciada por êsse rótulo. Com êle apenas se indica que devemos procurar aprofundar determinados aspectos dos doentes. A característica inicial do grupo ficou vinculada aos esforços de Kraepelin. Não lhe foi possível demarcar nítidas fronteiras dentro dêsse capítulo, mas deu-lhes impulso inicial, cujas grandes linhas foram aumentadas aos poucos. O critério famoso de Paul Samt: "igual etiologia corresponde a igual sintomatologia e igual evolução" não era verdadeiro, afinal. Era mesmo impossível que desse grandes frutos, inclusive nas mãos de Kraepelin, porque não era critério procedente. Mas o capítulo que Kraepelin criou, iria crescer sem que se perdesse de vista muito do que êle disse.
Parece-nos que tôdas as aquisições ulteriores dêste setor são devidas a outras escolas. A escola de Hoche conseguiu, com Bumke, fixar novos conhecimentos que se vêm revelando exatos; opondo-se à rigidez da corrente nosológico-clínica, Hoche contestava as delimitações excessivas e mutáveis de Kraepelin, apregoando a proeminência das "síndromes", impugnando que determinada etiologia produzisse necessariamente determinado cortejo sintomático. Outro grande psiquiatra, Heilbronner, chegou a estatuir que "o desencadeamento das psicoses tem muito mais importância que o decurso e desfêcho", ousando ferir, assim, a incolu-midade do critério evolutivo, tão caro a Kraepelin. Coube a Bonhoeffer abalar definitivamente, onde parecia êle mais sólido - psicoses orgânicas - os alicerces do edifício kraepeliniano, quando trouxe os "tipos de reação exógena" (exogenen Reaktionstypen) provando que, em lugar de síndromes características (psicose urêmica, palúdica) o que havia eram uns poucos tipos de reação a qualquer acometimento exógeno; a sindrome não dependia da natureza específica do agente, mas da natureza exógena geral e não particularizada. Muitos outros autores desenvolveram os conceitos de Bonhoeffer atualmente vitoriosos e o próprio Kraepelin, aceitando muitas das corrigendas, incorporou-as, a partir da 8.a edição, em seu "Lehrbuch der Psychiatrie".
Também a análise estrutural, inaugurada com precisão por Birnbaum sob forte influência de preceitos de Kraepelin - múltiplas causas de psicoses: causas principais, ao lado de "momentos adjuvantes" e "momentos preparadores" - acabou, nas mãos de Kretschmer, por esfacelar a solidez do diagnóstico avaliado pela sintomatologia pura, unidimensional. Fatôres etiológicos vários produzem a psicose e êles podem impregnar diretamente a sintomatologia. Se tais fatôres são vários, e constantemente diferentes nos doentes em estudo, várias e diferentes são as "inclusões" verificadas na sintomatologia. Isto significaria uma etiologia individualizada em cada doente.
Os heredologistas e constitucionalistas e os psicanalistas pulverizaram, enfim, os últimos preconceitos e esperanças da pura corrente nosológico-clínica. Radicais genotípicos que se somam e impurificam por "anfimixis", por mixovariação, que se encobrem por "epistasia" mas que se revelam, tardiamente, "inclusões" de novas unidades hereditárias, fazem com que, a cada passo, um quadro que deveria ser "típico" - o de demência precoce, por exemplo - comporte peculiaridades de outra doença: demência precoce com evolução em ciclos, seguidos de remissão completa, por exemplo, o que seria característico da psicose maníaco-depressiva. Enfim, da abstração "quadro clínico", passava-se ao estudo do doente em si mesmo.
Os psicanalistas mostraram que, na fisionomia sintomática dum quadro psicopatológico, muita coisa não é própria "daquela" entidade clínica e sim de conflitos, fixações, resistência, complexos e recalcamentos, coisas que, sendo absolutamente individuais e também reversíveis, não pertencem propriamente ao quadro clínico geral e sim ao individual. Enfim, dava-se imensa precisão aos fatores patoplásticos que Birnbaum estabelecera na análise estrutural e que agora Kretschmer fixava em definitivo, somando-os aos patogênicos, e chamando a este inventário analítico, diagnóstico polidimensional.
Bumke serviu-se das asserções iniciais de Hoche - existência inconcussa de sìndromes, em vez de entidades nosológicas, síndromes que aparecem graças à soma de "momentos" exógenos, pskógenos e hereditários, êstes dois últimos chamados "funcionais" - e aplicou-as às psicoses de involução, verificando que são elas as que melhor se prestam à demonstração do que disse Hoche: em vez de quadros típicos, uniformes, gerados por uma causa limitada e nítida, existiam quadros variáveis, predominantemente endógenos, psicógenos e exógenos. Com tal critério foram sendo apuradas as psicoses de involução e saindo à luz muitos dados e minúcias: freqüentemente, trata-se de doentes do sexo feminino, portadores de personalidade psicopática, que apresentaram episódios neuróticos ou psicopáticos anteriormente, mulheres oneradas por situação de isolamento, estado de solteira, mulheres casadas e separadas ou viúvas, cujo único filho casou-se e se afastou do convívio materno.
Isto Bumke estabeleceu sòlidamente. Nosso material vai mostrar outras oportunidades psicógenas que inauguram a psicose de involução: velhos desajustamentos conjugais incrementados agora, dificuldades financeiras e morte de parentes. Depois de Krapf, a hipertensão arterial apareceu como parcela não desprezível a levar em conta na etiologia das psicoses de involução. Aferimo-la também. Procuramos, conforme aprendemos com cardiologistas, distinguir hipertensões não arterioscleróticas, das arterioscleróticas, mediante valores tensionais. Nossos resultados, sob esse aspecto, foram bem interessantes, parece-nos.
Não nos negamos a admitir que fatôres exógenos possam influir nas psicoses de involução; podem fazê-lo com sentido patogênico, ou com sentido patoplástico, ou com ambos. Os fatôres exógenos teriam papel patogênico naqueles casos em que alterações orgânicas, suspeitadas durante a vida, foram reveladas após a morte. Conta-nos Fünfgeld (da escola de Kleist) ter achado alterações histológicas nas depressões da involução (citado por Leonhard1). Êsses fatôres teriam papel patoplástico em casos, como num dos nossos em que surgiu colorido episódio - turvações de consciência em plena psicose de involução; durante êsse episódio, demonstrou-se alto teor urêico no sangue do doente. Remitiram, depois, a uremia e a turváção de consciência mas a psicose involutiva prosseguiu. Teriam os fatores exógenos papel patogênico e patoplástico, em muitos casos, entre os quais os daqueles hipertensos onde, num só quadro clínico, há produções psicopatológicas em que, indissociavelmente, se estruturam sintomas de ordem psicógena e exógena: tivemos hipertenso forçado à abstinência sexual que apresentava encefalopatia hipertensiva com delírio de ciúmes e episódios alucinatórios. Aqui, fatôres exógenos e psicógenos se interrelacionam, sem ser possível discriminar o que corre por conta do orgânico e o que corre por conta do psíquico. São reações exopsicógenas, como um de nós traduziu as "Hintergrundreaktionen" de Kurt Schneider, isto é, reações psicógenas em terreno orgânicamente alterado2.
Parece que a resistência aos fatôres psicógenos nocivos está solapada pela devastação orgânica fundamental; isso explicaria o advento de reações histéricas e depressivas em debilitados, convalescentes, recém-operados e mesmo em involutivos.
O papel da hereditariedade mórbida é, nas psicoses de involução, capitulo inteiramente novo. Vem sendo estudada, sistematicamente, com alguns resultados, há pouco mais de 10 anos. Como se procurou filiar algumas das psicoses de involução às psicoses maníaco-depressivas (sobretudo as melancolias de involução) e outras psicoses de involução, mais tarde, às esquizofrenias (o que diz respeito às catatonias tardias e às esquizofrenias tardias), naturalmente as atenções foram levadas para o seguinte: comparar a herança destas duas síndromes com a das psicoses de involução. A primeira pesquisa foi levada a efeito por Brockhausen, comparando a tara hereditária dos portadores de psicose maniaco-depressiva com a dos de depressão involutiva. Encontrou, nestes últimos, uma tara menor (geringere Belastung) do que nos outros. Hoffmann, em vez disso, achou, nos seus depressivos da involução, freqüente tara esquizofrênica.
As pesquisas de Leonhard (cuja metodologia, sendo boa, discrepa, entretanto, dos rigores uniformes de Luxenburger e Rüdin) levam a conclusões muito interessantes. Leonhard insiste na existência de uma psicose de angústia que velhos autores proclamavam mas que vinha caindo em descrédito; entre outros característicos, ela apresenta o fato de ser periódica, podendo aparecer pela primeira vez na idade juvenil. Teria parentesco com as depressões que aparecem pela primeira vez na involução. Tal parentesco se mostra pela observação heredológica: umas e outras aparecem no mesmo tronco familial, sem notável predomínio. Ao contrário disso, as psicoses de angústia não se podem incluir nas maníaco-depressivas, como se poderá provar por via metodológica hereditária. Comum a ambas é, entretanto, o característico de serem hereditárias e episódicas. Afora as psicoses de angústia, haveria outras síndromes predominantemente involutivas, como as depressões climatéricas em sentido estreito, caracterizadas por agitação ansiosa, inibição e, freqüentemente, um cunho catatônico. Leonhard não conseguiu alcançar informações de ordem heredobiológica nesses doentes. Os achados de Leonhard reduzem-se de importância em vista de ter êsse autor conceitos pessoais a orientar essas pesquisas.
Quanto às relações entre esquizofrenia e psicoses involutivas, nada de muito c'aro encontramos na bibliografia compulsada. A maioria dos autores que se ocupa de herança, aceita uma "catatonia tardia", mas muitos dêles querem uma posição especial para tal síndrome, explicando que, na involução, incidências arterioscleróticas e exógenas em geral também podem imprimir traços catatônicos à síndrome. E como também muita síndrome paranoide da involução tem relações com a esquizofrenia, e ainda mais, como existem entrecruzamentos indubitáveis de esquizofrenias com psicoses maníaco-depressivas, tudo isso lança certa confusão no problema. Devemos, então, não fazer "um diagnóstico escolhido autonomamente mas procurar, na personalidade anterior, na qualidade da herança psicopatológica e no decurso, a decisão diagnóstica"3. Veremos que estão por esclarecer as relações entre esquizofrenia e psicoses de involução, mesmo abordadas com ponto de vista heredobiológico.
Além disso, quanto à posição nosológica, os fatores exógenos estão constantemente em jôgo nas psicoses de involução. Não se pode ter certeza absoluta de excluir, como fatôres patogênicos, a arteriosclerose cerebral, a hipertensão, a involução sexual e suas conseqüências. Por isso tudo podemos aceitar o que diz Bumke: "pelo menos no que diz respeito às perturbações mentais do climatério, temos de renunciar, sem dúvida para sempre, ao estabelecimento de entidades mórbidas bem individualizadas e contentarmo-nos em analisar, em cada caso, a relativa importância da participação patogênica e patoplástica". Verifica-se. é necessário insistir, que tudo o que diz respeito à herança da esquizofrenia - por exemplo, suas relações com as psicoses de involução - toma, por vezes, uma evidente insegurança, porque não há clara delimitação clínica de qualquer das duas síndromes. Não tendo seguros limites, como estudá-las seguramente na ascendência já falecida, como particularizar detalhes, se nem o todo está sòlidamente estabelecido? Os heredologistas exigem, para suas pesquisas, uma precisão que os clínicos não podem dar, a menos que os heredologistas pudessem orientá-los. E desse impasse resultou que Luxemburger não acredita mais que a psico-natologia possa orientar pesquisas hereditárias em matéria de esquizofrenia. Espera êle orientações patofisiológicas.
PROGNÓSTICO
No estudo das psicoses de involução, parece-nos ser o prognóstico um dos capítulos mais dignos de revisão.
Ao estabelecer a individualidade da melancolia de involução, Kraepelin referia que o prognóstico da mesma era sempre reservado. Sua estatística apresenta 32% de curas completas, 23% de melhoras que permitiam o retorno aos ambientes familial e profissional. 26% que não curavam e 19% cuja morte ocorria cerca de 2 anos após o início da moléstia. Um embotamento afetivo, aparecido em certa fase da evolução da doença, costumava ser indício de prognóstico desfavorável4.
Tal noção de mau prognóstico no que refere às depressões, estendeu-se, ao que parece, às demais formas de psicose do climatério, ao menos até o advento da terapêutica convulsionante. A inexistência de um meio eficiente de tratamento restringia à quimioterapia e, particularmente, à opoterapia, tôda a terapêutica dos distúrbios mentais da menopausa. Tais métodos, entretanto, em verdade não poderiam ter influência direta sobre o curso das psicoses.
Aceitas, em certa época, as melancolias de involução como episódios da psicose maníaco-depressiva, seria de supor que tivessem a mesma tendência à remissão espontânea habitualmente observada nos doentes do círculo timopático. No entanto, como diz Mira5, a melancolia involutiva "é de pior prognóstico, quanto à duração e complicações, que os acessos melancólicos observados nos demais períodos da vida". Bumke, em edição antiga6, referindo-se a estados depressivos da involução, afirma igualmente serem de pior prognóstico que os episódios de P.M.D., mas diz que nem sempre se poderia estabelecer uma previsão de "absoluta desfavorabilidade". Considera mais freqüente que, nos casos considerados de cura, permaneça "um estado de enfraquecimento mental e depressão com pusilanimidade hipocondríaca, capaz de piorar por motivos exteriores". E continua: "Esta terminação não significa que todos os casos pertençam à demência senil ou sejam seguidos desta. Com efeito, tanto a capacidade de fixação de estímulos como a conservação dêstes, a memória e o juízo podem permanecer relativamente intactos. O que resulta indiscutível, é que êstes casos terminam, às vêzes, por uma demência arteriosclerótica e, então, podemos duvidar se a depressão existente representa a primeira manifestação das alterações corticais arterioscleróticas ou se, pelo contrário, a arteriosclerose era a conseqüência da ação da psicose sôbre o sistema vascular". Bumke não acha verossímil que se trate apenas de uma relação de coincidência. E, em sua última edição7, insiste nas relações das psicoses de involução com a arteriosclerose, e agora, também com a hipertensão arterial.
Mauz8 não considera como psicoses de involução as depressões que, constituindo o 1.° ou o 2.° episódio do paciente, incidindo entre a 4.a e a 5.a década da vida, não se apresentem, entretanto, relacionadas com "os mecanismos psicótico-involucionais de ansiedade". E admite, em tais estados, que seriam puramente endógenas e teriam remissão espontânea, sendo esta rápida e bem delimitada nos pícnicos, mais demorada e pouco definida nos leptossomáticos.
De modo geral, as formas paranóides têm sido sempre consideradas como de mau prognóstico. Quando às catatonias, consideradas raras, também têm prognóstico duvidoso, ora podendo, como determinadas formas paranoides, evoluir para um quadro em que tôdas as características são de esquizofrenia, ora regredindo mais ou menos completamente. As formas maníacas de psicose de involução foram admitidas por Bumke6 que, entretanto, não as refere na sua última edição. Nada encontramos com especial referência ao seu prognóstico.
Também não encontramos comentário particular sôbre o desfêcho das psicoses involutivas com predomínio de traços histéricos. Tal fato interessou-nos vivamente porque, como nosso material vai mostrar, encontramos resultados pouco satisfatórios. Parece-nos que aquelas pessoas que já apresentaram várias reações histéricas, sempre passageiras, chegando à idade de involução, apresentam episódios de gravidade bem maior. Uma forma de evolução para a arteriosclerose, ou a partir dela, pôde ser evidenciada em 3 dos casos por nós estudados.
Um dêles foi o de um homem de 49 anos, cujo quadro psicótico paranóide tivera início em seguida a crises convulsivas. Era portador de hipertensão arterial considerada essencial. Começamos a observá-lo quando já havia decornao quase 1 ano de moléstia e pudemos acompanhar-lhe a evolução por mais de 16 meses. A diferencial da pressão acentuou-se cada vez mais, apresentou retinopatia arteriosclerótica, sintomas neurológicos focais e, nitidamente demenciado, veio a falecer depois de repetidos acidentes cardiovasculares. Outro caso é de uma mulher de 61 anos, em cujo quadro mental predominavam traços histéricos e que, no curso de 1 ano de observação, apresentou evolução progressiva para a demência. O terceiro, enfim, é homem de 61 anos, portador de delírio sistematizado de ciúmes e cuja pressão sangüínea apresenta grandes oscilações. Presentemente, tem sintomas psíquicos evidentes de arteriosclerose cerebral. É conveniente esclarecer-se que esses três doentes não se haviam submetido à convulsoterapia, a qual, se realizada, poderia ter contribuído para o estabelecimento da síndrome orgânica.
Em nossos demais casos, não se verificou tal evolução para a arteriosclerose cerebral, ao menos de forma nítida. Entretanto, cabe a referência ao fato de que, se nuns casos foi possível acompanhar o estado do paciente até 3 anos após o fim do tratamento, noutros o doente não mais foi visto por nós, passada a fase de aplicação das terapêuticas. Preferimos, por isto, adotar como critério para o estabelecimento do desfecho, o estado dos pacientes na ocasião da alta. Êste fato restringe, sem dúvida, o valor dos nossos resultados. Não leva em conta a possibilidade das remissões espontâneas e, de outra parte, revela remissões cuja duração consideramos, em muitos casos, duvidosa. Entretanto, valem as nossas conclusões, ao menos no que se refere à influenciabilidade das psicoses de involução pelos tratamentos.
É possível que o prognóstico das psicoses de involução se tenha modificado num sentido mais favorável, após o aparecimento da convulsoterapia e da insulinoterapia. Mas, talvez não seja essa modificação tão profunda quanto freqüentemente se tem afirmado. Segundo uma referência de Bumk7, Müller obteve, com eletrochoque, cêrca de 50% de curas nas psicoses de involução, percentagem que revela melhora apreciável nos resultados, mas ainda mantém duvidoso o prognóstico de tais psicoses. E é, provavelmente, a forma depressiva, uma daquelas em que a cerlettiterapia tem sido considerada mais brilhante.
A crescente prática das leucotomias veio, ao que se tem dito, colaborar para a resolução de casos em que a convulsoterapia se mostrasse incapaz. Nossa experiência a respeito é praticamente nula, pois, em nosso material, figura apenas uma doente leucotomizada. Tratava-se de uma psicose de involução de forma depressiva, em que a convulsoterapia elétrica e a cardiazólica não haviam produzido resultado. O tratamento cirúrgico permitiu uma remissão parcial. Não nos abalançamos a qualquer conclusão a respeito.
NOSSO MATERIAL
Nossos doentes, na quase totalidade, são internados no Sanatório Bahia; poucos são de ambulatório. Foram observados por prazos variáveis, mas não levaremos isso em conta, pois que a finalidade do trabalho diz respeito à terapêutica empreendida e aos resultados obtidos após sua aplicação. Remissões tardias, se as houve não foram registradas. Há, sem dúvida, doentes que nos apareceram depois de 5 a 7 anos de doença. Tratados, os resultados foram os que estão consignados nos quadros.
Raça - Em nosso material, composto sobretudo de baianos, não há um só preto, conquanto a população da Bahia comporte 42,45% de pretos. Possìvelmente o fato se explica por se tratar de sanatório particular economicamente inaccessível à população pobre (onde os pretos formam contingente apreciável). Sexo - Nêste sanatório há, entre os 515 doentes internados pela primeira vez, mais homens que mulheres. Entretanto, em nossa casuística, a proporção de mulheres é de 60%; surpreendêmo-nos, ao lermos, no tratado de Kraepelin, que é exatamente essa a proporção de mulheres que compõe o grupo de psicoses de involução. Sôbre a idade, a precisão é segura. Sôbre o estado civil, diremos que já não o é na mesma medida: mulheres amasiadas e separadas podem ter ocultado essa condição; mas se isso ocorreu, deve ter sido em raríssimos casos; aliás, entre o estado de amasiado e o de casado, para os nossos fins, há quase equivalência. A determinação do biótipo foi feita visualmente e com tendência a, apurada por exemplo a predominância leptossomática, embora não integral, classificar o indivíduo como leptossomático. Por isso os mixtos escasseiam: só dissemos mixtos, quando eram não classificáveis, por não existir predomínio de nenhum dos tipos clássicos. A herança foi colhida com imensa dificuldade. Não conseguimos a massa de dados que se torna indispensável para o estudo da herança. Como sempre, a incultura dos informantes, os preconceitos e o não conhecer parentes, bem como desconhecer o que sejam anomalias mentais, comprometiam qualquer anamnese precisa. O que pudemos obter, lançamos à apuração.
No estudo da personalidade anterior procuramos classificar de acordo, principalmente, com Schneider. Há, porém, reparos a fazer: "personalidades histéricas" não são da taxonomia dêsse autor; nossos "histéricos" estariam talvez esparsos nos tipos de Schneider: "necessitados de estima", "lábeis de ânimo" e "astênicos", sobretudo. Mas a vivacidade e freqüência das reações histéricas fêz com que déssemos destaque a esse "tipo" muito contestável, mas muito eloqüente. Os nossos "timopatas", que não são sempre pícnicos, referem-se a indivíduos assinalados por anomalias de afetividade no sentido dos deprimidos e hipomaníacos. "Hipertímicos e lábeis de humor" são tomados no sentido de Bumke e de Schneider, respectivamente- "Esquizóide", isso já é curial, é tipo de Kretschmer. Um dêles tem um irmão, esquizofrênico. Sabe-se que há hoje tendência a limitar o conceito de esquizóide, aos psicopatas com a caracterologia e temperamento dos homô- nimos de Kretschmer, mas exige-se, para afirmá-los "esquizóides", que haja parentes esquizofrênicos; o outro dêles não tem êsse parente esquizofrênico, ou não o registramos.
Quanto aos episódios anteriores, pensamos que nada há de especial a assinalar. Apenas saltou-nos aos olhos um fato gritante: a grande maioria dos nossos doentes tinha episódio mental anterior. Passamos a compreender que o material de "psicóticos de involução" é composto, sobretudo, de personalidades psicopáticas.
O estudo dos fatôres desencadeantes é dos mais interessantes e discutíveis: as psicoses de involução - disso hoje estamos absolutamente certos - exigem sempre um diagnóstico polidimensional. Esta tendência da psiquiatria aqui é mais do que nunca um imperativo. Deixamos a discussão para o tópico onde os fatores desencadeantes foram tabu1ados e analisados. O fator desencadeante não é, muitas vezes, o "estabilizante", nem o mais importante, para que a psicose se fixe. O mesmo se pode dizer das relações com a menopausa. Há um caso em que a psicose de involução precedeu a menopausa. Êsse fato - Bumke o registra - tem o seguinte significado: a doente freqüentemente tinha reações histéricas mas, imediatamente antes da menopausa e aparentemente por motivo de ciúme do genro, apareceram reações histéricas que se imbricaram com a menopausa, advinda um ano após. Agora o quadro agravou-se a ponto de exigir internamento. É por isso que, paradoxalmente, temos uma psicose de involução antes da menopausa.
Sôbre a tensão arterial, ouvimos cardiologistas a respeito. Dividimos nosso material em 4 categorias: 1 - Normotensos, nos quais a pressão máxima é de 15 ou menos e a mínima, de 9 cms de Hg ou menos; 2 - Hipertensos, com pressão máxima acima de 15 e mínima superior a 9, conservando-se a proporcionalidade habitual entre uma e outra; 3 - Grande diferencial quando há divergência com afastamento entre máxima e mínima, ultrapassando a proporcionalidade habitual; 4 - Hipertensão com grande diferencial, quando a máxima está acima de 15, a mínima acima de 9 e há divergência com acentuação da diferencial, que perde a proporcionalidade regular.
Realizamos em nossos observados as mais diversas formas dé tratamento, ora isoladas, ora, segundo as indicações, mais de uma, simultaneamente ou em épocas diferentes. Levando-se freqüentemente em conta as contribuições exógenas e psicógenas que o exame revelava com mais saliência, o tratamento orientava-se mais, ora no sentido dos fatôres orgânicos (hipertensão arterial, arteriosclerose, menopausa etc), ora no da penetração psicológica; ou restringiarse, em grande número, quase exclusivamente, à convulsoterapia e à insulinoterapia.
Passamos a analisar o material das psicoses de involução em face de vários fatôres.
1. Sexo - a) As psicoses de involução predominaram claramente no sexo feminino, b) A análise do quadro abaixo revela que, em nosso material não existe diferença apreciável entre os sexos, no que se refere ao desfêcho das psicoses de involução. É verdade que a proporção dos doentes masculinos que obtiveram remissão completa (5 em 20) é um pouco maior que a de doentes do sexo feminino que alcançaram idêntico resultado (6 em 30). Mas, somados todos os casos de algum modo influenciáveis pela terapêutica, verifica-se que o número de mulheres atinge proporção um pouco maior que a de homens.
2. Idade - No quadro abaixo, o número mais ponderável de doentes distribute entre o 10° e o 13° qüinqüênios, pelo que são os que mais se prestam para comparação. Nas idades que vão entre o 9° e o 12° qüinqüênio, não há diferenças acentuadas quanto à percentagem de curas, embora apareça como o mais favorável o 11°. No 13°, o curso torna-se evidentemente mais desfavorável, visto que, de 13 doentes, apenas 1 remitiu completamente. Daí em diante, não mais se observa qualquer caso com remissão completa. É possível que isto se dê, ao menos em parte, por causa da soma de componentes psíquicos de origem orgânica mas, conforme já acentuamos, tais sintomas só foram evidentes em 3 pacientes (um de 49 anos e dois de 61).
3. Idade e sexo - a) A curva de incidência mostra de notável: nas mulheres adensam-se as psicoses de involução nos 10° e 11° qüinqüênios. A partir do 12°, modifica-se a predominância, que agora é masculina, mesmo em números absolutos e essa predominância mantém-se nos 12° e 13° qüinqüênios. Daí em diante nosso material é muito escasso para permitir conclusões. A modificação sofrida na curva de freqüência mostra que as psicoses de involução aparecem mais tardiamente no homem, ao mesmo tempo que nelas a distribuição é mais regular, menos compacta que a das mulheres, cujo acúmulo se faz sobretudo nos anos da menopausa ou nos imediatamente após. b) Enquanto nos 9o, 10° e 11° qüinqüênios as psicoses de involução mostraram-se mais freqüentes no sexo feminino, nos 12° e 13° é maior a incidência nos homens. O quadro permite comparar, dentro de cada qüinqüênio, o desfecho segundo o sexo e, de outra parte, para cada sexo, qual a idade mais favorável ao prognóstico. O 10° qüinqüênio mostrou-se mais favorável no sexo feminino, enquanto o 11° foi mais feliz para os homens. De referência aos demais, a desproporção do número de um e outro sexo impede a comparação, salvo no 13° qüinqüênio, em que não há diferença apreciável. Estudado, no conjunto do quadro, o sexo feminino, observa-se que, no 10° qüinqüênio, há a melhor proporção de curas. O 9.°, com menor material, apresenta proporção um pouco menor de remissões completas, mas não revela nenhum caso sem melhora. Depois do 10° qüinqüênio o prognóstico piora gradativamente, ao menos em nosso material. Isto significa que ocorre nas mulheres, e com maior evidência, a mesma coisa verificada no quadro do desfecho em relação exclusiva com a idade. De referência aos homens, nosso material não permite concluir o mesmo, aparecendo como mais desfavoráveis os qüinqüênios 10.° e 13.°, não existindo aquela relação progressiva com o avanço da idade.
4. Estado civil - A análise do papel do estado civil demonstra que os solteiros se apresentaram com evolução mais favorável (4 remissões completas num total de 12), seguindo-se os casados e aparecendo como o de menor número de remissões completas, o grupo dos viúvos (1 em 9). Apesar disto, não foi grande a quantidade de viúvos sem remissão, tendo ficado a maioria na coluna intermediária, a das remissões parciais. Os doentes casados, mas vivendo separados dos respectivos cônjuges (todos 3 do sexo feminino), não apresentaram predomínio de nenhum tipo de desfêcho.
5. Estado civil e sexo - a) Percebe-se que apenas a metade de nosso material é composta de indivíduos vivendo sob regime de casado. Na idade das psicoses de involução - sem estatísticas isso será pura presunção - predominariam os casados sôbre o total dos viúvos, solteiros e separados. Entretanto, na involução com psicose o que vimos é o contrário: homens e mulheres vivendo solitários, equiparam-se aos não solitários. Destacamos o papel dêsse fato nas psicoses de involução, já assinalado por Bumke. b) Levando em conta agora o sexo e estado civil, vamos verificar a influência detalhada do estado civil nas psicoses de involução de homens e mulheres; o estado de casado praticamente não imuniza o homem da psicose de involução, ou mesmo a favorece. Com efeito, 75% dos homens são casados. Nas mulheres, o estado de casado parece atenuar a probabilidade do evento da psicose de involução; só 30% de mulheres com psicose de involução são casadas. No estado de solteira, a freqüência proporcional de psicoses de involução é, nas mulheres, uma vez e meia a dos homens. E os homens casados têm, proporcionalmente, duas vêzes mais psicose de involução que as mulheres, c) Verifica-se logo a ausência quase total de homens viúvos (apenas 1) e total de separados, em contraste com as 8 mulheres viúvas e as 3 separadas. Isto mostra a considerável importância que essas condições de estado conjugai têm para as mulheres, em fortíssimo contraste com a sua inocuidade para o homem. Não procuraremos interpretar êsses curiosos dados, pelo menos no momento, d) O estudo do sexo em relação com o estado civil mostra algumas curiosidades. Assim, as mulheres solteiras e casadas não apresentam diferença digna de registro, tanto no que se refere às remissões completas, ccmo à porporção dos casos não remitidos. Entre as viúvas, entretanto, os resultados são menos felizes, visto que, de um número de 8, não foi obtida sequer uma remissão completa. A maior parte das doentes viúvas manteve-se no grupo das remissões parciais (6 em 8). e) Entre os homens, é o de casado o estado que, em nosso material, se revelou mais desfavorável. Apenas 2 (em 15) apresentaram remissão completa. Pelo contrário, o estado de solteiro coincidiu com boa proporção dos desfechos felizes (2 remissões ccmpletas e 1 parcial em 4 casos). No único caso de homem viúvo, houve total desaparecimento dos sintomas. f) Se, em vez de sexo, analisarmos o quadro a partir do estado civil, a verificação clara é a de que, entre solteiros e viúvos, nosso material apresenta resultados mais favoráveis para o sexo masculino que para o feminino. Pelo contrário, os homens casados têm evolução satisfatória em número bem menor que as mulheres do mesmo estado.
6. Biótipo - a) Ignoramos distribuição des biótipos pela população brasileira. A metade de nessos doentes é leptossomática. Há poucas esquizofrenias em nosso material, de modo que não se pode estabelecer relação entre biótipo e esquizofrenia; mas podemos reforçar aquela tendência geral que consiste em dizer que o leptossomático, aqui como em tôda a psiquiatria, tem maior morbilidade que os demais tipes. Isto, entretanto, só será verdade se a proporção de leptossomáticos portadores de psicose de involução fôr maior do que a proporção dos leptossomáticos existentes na média da população, o que não nos parece ser verdade, b) O biótipo pícnico foi verificado na 25% de nosso material. Como dissemos, existem muitas depressões e algumas "formas maníacas" e, também, biótipo pícnico; não será difícil concluir que haverá correlação entre êstes fatos. O estudo individual de cada caso confirma tais fatos. Ignoramos se a freqüência de pícnicos portadores de psicose de involução ultrapassa a freqüência de pícnicos da média da população. Nosso material è composto,, em sua maioria, de mulheres. Sabe-se como é difícil, muitas vezes, excluir o tipo pícnico, quando se estuda biotipologia feminina com o critério visual,, que foi o nosso, c) O biótipo atlético foi raramente observado. Se é difícil caracterizar uma mulher como atlética, isso ainda é mais difícil na mulher envelhecida. É possível que a escassez de atléticos derive dessa dificuldade, já que nosso material é composto sobretudo de mulheres. Sem dúvida, temos muito menor índice de atléticos que o existente na média da população brasileira. d) Analisados os tipos extremos, observa-se que a evolução das psicoses involutivas em pacientes atlt-ticos foi a mais favorável, conclusão que tem um. valor relativo, dado o número pequeno de casos. Os leptossomáticos apreseni-taram-se mais influenciáveis pelos tratamentos que os pícnicos, visto que apareceram no quadro com número proporcionalmente maior, tanto de remissões completas, como parciais. Esta verificação opõe-se às conclusões a que têm chegado os diversos autores sôbre psicoses várias, mas também às de Mauz sobre as depressões das 4a e 5a décadas da vida. Entretanto, cabe lembrar que o trabalho de Mauz8 é anterior ao aparecimento das terapêuticas convulsivantes. No único caso de paciente displástico (um anão), houve desaparecimento completo da sindrome mental, c) Os doentes de depressão involutiva que não haviam tido episódios anteriores foram em número de 13, entre os quais ocorreu uma única remissão completa. Os 9 doentes que já haviam tido-um episódio depressivo incluem 3 remissões completas. Assim sendo, as depressões involutivas surgidas em pessoas que já apresentaram um episódio com a mesma forma clínica, são de melhor prognóstico que aquelas que constituem o 1.° episódio. Os pícnicos sem episódios anteriores não apresentam nenhuma remissão completa (2 com remissão parcial e 2 sem melhora). Entre os 7 leptossomáticos, houve 1 remissão completa e 3 parciais. Dado o número de casos, não se pode afirmar que os pícnicos sejam de pior prognóstico que os astê-nicos. Mas nosso material não permite concluir, como o de Mauz, que exista melhor evolução ncs pícnicos. Entre aquêles doentes cuja depressão foi a segunda na vida, os de estrutura corporal astênica revelaram-se de bom prognóstico (2 remissões completas e 2 parciais num total de 4). Niste grupo não tivemos nenhum doente de tipo pícnico. A comparação das depressões em leptossomáticos revela evolução mais favorável no que tem episódio anterior que nos que não o têm. f) Tôdas as comparações que tentámos estabelecer com as conclusões de Mauz não se baseiam em material rigorosamente igualr visto que, da casuística daquele autor, não constam os doentes em que êle considerava a menopausa como patogênica. Êstes eram por Mauz postos de parte, para que fôsse apresentado material exclusivo de depressões que o autor considerava endógenas.
7. Herança - a) Nosso material mostra herança psicopática neurótica em 81% dos casos. Sabe-se que 66% dos normais têm também tal modalidade de herança (Diem). Tomando por base os dados de Diem, percebe-se que, nas psicoses de involução, há ligeiro acréscimo de tara hereditária. Nós próprios reconhecemos que esta conclusão tem muito pouco valor porque não discriminamos a modalidade da herança anormal, única informativa e valiosa, b) Conseguimos discriminar a modalidade anormal hereditária de 28 doentes nossos. Encontramos sobretudo neuróticos, timopatas e suicidas. O que salta à vista, entretanto, é a variedade de distúrbios funcionais na ascendência psicopática. Evidentemente, o número dos timopatas cresceria se nêles entrassem - o que não é permitido fazer sem melhores informes - os suicidas, os inseguros e os dois alcoolistas. c) Não foram, evidentemente, todos os casos, os que permitiram a identificação das doenças nervosas e mentais existentes no círculo familial. Isto só foi possível com referência a 18 dos nossos observados. Os sintomas e moléstias que ficaram bem caracterizados figuram no quadro abaixo. Os números correspondem ao total dos nossos doentes de psicose de involução que possuíam parentes com tais anomalias. Exemplificando: as neuroses apareciam na herança de 7 dos nossos observados, dos quais um teve remissão completa, 3 parcial e 3 não remitiram. d) Considerando o 1.° quadro, isto é, aquêle que, na base das informações da família, indica a existência ou não de distúrbios neuromentais em parentes do paciente, sem especificação de quais distúrbios, não se conclui a existência de pior prognóstico pela informação de existirem casos de anormalidades nos parentes. Pelo contrário, os que negam ter ligações familiais com doentes mentais apresentam um número de remissões completas relativamente inferior ao verificado entre os que confessam a tara. Além disso, o número de casos sem remissão aparece em proporção maior no grupo dos que não revelam ascendência anormal. Isto significa que, em nosso material, é precisamente o grupo de doentes com herança neuromental aquêle que se apresentou mais curável. Tal verificação, aparentemente paradoxal, coincide, entretanto, cem o que, a respeito da esquizofrenia, concluíram Arnesen, Bleuler e Leonhard, citados por Langfeldt9. Para os referidos autores, a herança mórbida " é um fator prognòsticamente favorável". e) O número de nossos pacientes em cujas famílias há anormalidades bem identificadas é, como já se disse, de 18. Como divesos dêles tinham, muitas vêzes, dentro da mesma linha genealógica, psicoses de tipos diversos, não coincide o total que figura no quadro (28), com o nútnTo dos pacientes. Dos 18 que permitiram melhor conhecimento das doenças des parentes, 5 tiveram remissão completa (correspondendo a 7 tipos de anomalias na família). 8 apresentaram remissão parcial (16 diagnósticos diverses ou distúrbios de conduta) e 5 permaneceram sem melhora (5 variedades de doença mental correspondem à herança dos mesmos). Assim sendo, cada um dos pacientes sem remissão só apresentou um tipo de alteração mental na família, o que não se deu com cs demais, particularmente os de psicose parcialmente remitida (média de duas anormalidades diversas por família de cada doente). Não houve, portanto, considerando nosso material, piora de prognóstico das psicoses de involução, em vista da soma de anormalidade diferentes na família. A pequenez dos núrrercs impede conclusões apreciáveis sôbre a influência de uma hcança específica no desfecho das psicoses de involução por nós observadas. Entretanto, é digno do registro o fato de que a identificação de neuroses no círculo familial de nossos pacientes coincidiu com resultados pouco satisfatórios (uma única remissão completa num total de 7 dos nossos casos). O único dos nossos doentes, em cuja família pôde ser perfeitamente diagnosticado um caso de esquizofrenia, não teve remissão da psicose involutiva. De outra parte, convém acentuar que a existência de parentes com psicose maníaco-depressiva, psicose senil, oligofrema, etc, foi bem estabelecida em casos de psicose de involução que remitiram completamente.
8. Personalidade anterior - a) É digno de menção o notável predomínio de 31 anormais sôbre 17 normais. Isto significa que a maioria dos portadores de psicose de involução já era anormal muito antes de se instalar a psicose; a involução seria "um pretexto" de ordem biológica que a êsses indivíduos é servido para concretizarem mais as velhas anomalias; b) Entre os portadores de psicose de involução, o que mais se vê é o indivíduo que já teve reações histéricas no passado e que volta a tê-las nessa época biológica. Mais uma vez confirma-se o que um de nós já disse: as reações histéricas são facilitadas por fatores exógenos (que, entretanto, não são indispensáveis para elas) pois que, em nossa casuística, há reações histéricas com "detonadores" exógenos; c) Depois dos histéricos aparecem timopatas; aí incluímos os deprimidos, os lábeis de humor (sentido de Bumke). Os dois outros lábeis de humor pertencem ao conceito de Schneider, bem como os dois hipertímicos (os hipertímicos de Bumke são também diversos de Schneider e são do círculo dos timopatas; aí estariam também muitos "instáveis" com reações histéricas, a quem nós demos autonomia); d) Excluídos 2 pacientes cuja anamnese não pôde determinar com segurança as características da personalidade anterior, entre os nossos 48 casos, 17 apresentavam personalidade que consideramos normal e 31 eram anteriormente anormais. Comparados, de uma parte os pacientes de personalidade anterior normal e, de outra parte, todos os anormais reunidos, observa-se que as remissões completas nos primeiros (5 num total de 17) são em número proporcionalmente bem maior que as obtidas no outro grupo (6 em 31). Entretanto, é também entre os anteriormente normais que se encontra, relativamente, maior número de casos em que as psicoses de involução não são curadas. Dentre os pacientes de personalidade anterior anormal, observa-se que um grande número (17 em 31) comparece no quadro com remissão parcial. Tal fato é compreensível, pois, se anteriormente já existiam anormalidades, não seria mesmo provável um- desaparecimento total dos sintomas, e) Passando-se a estudar o prognóstico nos vários tipos de personalidade anormal, observa-se que as psicoses involutivas que nêles incidem não apresentam grande diversidade quanto ao desfêcho. É verdade que a multiplicidade dos tipos dissolve o material, de maneira a tornar mínimos os números constantes do quadro. Mas, o que domina em quase todos os tipos é a quantidade de remissões parciais. Apenas os de personalidade anterior astênica (2 remissões completas num total de 3), o classificado como personalidade ostentativa e o fanático, tiveram resultados mais felizes. Nos pacientes anteriormente habituados a reagir de forma histérica (êstes os que figuram no quadro com a rubrica de personalidade histérica, embora aceitemos a afirmação de Bumke10, de que não existe uma constituição homogênea que se possa chamar histérica) foi evidente o mau prognóstico, visto que, de 11, só 1 teve remissão completa e 4 não apresentaram qualquer melhora. Entre os timopatas, dominaram as remissões parciais.
9. Episódios anteriores - a) Das 31 personalidades anormais, 25 tiveram caracterizados episódios anteriores. De novo predominaram os episódios histéricos e os timopatas. Verifique-se que existem dois maníacos e dois compulsivos no passado; muitos autores dizem raras ou inexistentes as "manias" na involução. Os dois doentes voltaram a tê-la na involução. b) Dos 6 anormais restantes ignora-se, num único dêles, se houve episódio anterior, c) Digno áe nota é que existem doentes que tiveram em tôda a sua vida reações histéricas. Pelo menos 2 vêzes pareceu-nos deparar com o famoso e contestado "caráter histérico". d) Vários depressivos tiveram 2 episódios de depressões durante a vida, na juventude e na involução. Mauz e Leonhard assinalaram já o fato. O 1.° autor inclui êstes doentes no círculo dos pícnico-timopatas. Leonhard aproxima êstes casos dos da depressão agitada e pensa que eles não sejam do círculo da psicose maníaco-depressiva. Leonhard pensa ainda em conceder-lhes certa autonomia; são " psicoses de angústia", e) Ao todo, 27 tiveram episódios anteriores, 18 não tiveram e em 5 não foi possível apurar o fato. Comparado o número de remissões completas das psicoses de involução em pacientes que já apresentaram episódios psicóticos, com o dos que nunca haviam sido psicóticos, nota-se pequena diferença no sentido de uma evolução mais favorável nos pacientes que negam episódios anteriores (5 em 18 e 6 em 27). Também o número de remissões parciais é proporcionalmente maior no grupo dos que nunca estiveram psicóticos. f) De referência aos pacientes que já haviam tido depressões, houve boa proporção de curas completas (3 em 7). Aquêles de forma histérica nos episódios anteriores não se apresentaram com evolução favorável (apenas 2 remissões completas e 5 parciais, num total de 12). Um dos casos é o de uma senhora que, tendo apresentado ininterruptamente reações histéricas desde a adolescência, paralelamente à menopausa revelou sintomas mentais do mesmo tipo, que não mais regrediram (há 2 anos). Quando às demais formas incidentes nos episódios anteriores, o material não permite a conclusão de qualquer influência no desfêcho das psicoses de involução. g) Procuramos, também, relacionar o número de episódios anteriores com o desfêcho das psicoses de involução, mas dessa investigação nada concluímos de interessante. Entre os de episódios anteriores histéricos, como nos de episódios anteriores depressivos, encontram-se casos de remissão completa e sem remissão, em que o episódio anterior referido fôra só um. Apenas uma das pacientes de episódio anterior depressivo tivera mais de um e esta ficou no grupo das remissões parciais. Também sucedeu, em histéricos de várias reações anteriores, observar-se desfechos completamente diversos no quadro de involução, de maneira a impedir a conclusão de uma influência do número de tais reações para o estabelecimento do prognóstico.
10. Fatores desencadeantes - a) A distribuição dos quadros relativos aos fatôres desencadeantes mostra que as psicoses de involução puramente endógenas seriam forte minoria. Os fatôres psicógenos, ao que parece, nessa idade podem fàcilmente alcançar forte poder patogênico. Verificamos também que episódios francamente exógenos podem abrir a cena e, mesmo depois da remissão do fator exógeno, a psicose evolve, ora sustentada psicògenamente - ruminações hipocondríacas, por exemplo - ora ela evolve condicionada endògenamente, autôno-mamente. Particularmente difícil é dosar a contribuição da disposição endógena, porque com freqüência ela está mascarada por uma superestrutura psicógena ou é convocada pela irrupção aparentemente exógena da psicose. Os quadros hipocondríacos e depressivos prestam-se muito a tais discussões. As reações histéricas, tão freqüentes na involução, já o dissemos, poderiam ser facilitadas pela acentuação da disposição endógena anormal, acentuação que o pré-senium proporciona. Em nenhum outro capítulo da psiquiatria aparecem tão nítidos o entrelaçamento, a interdependência, a conjugação dos fatores exógenos, psicógenos e endógenos, quanto nas psicoses de involução. Êste entrelaçamento dos fatôres vai a tal ponto que, com muita freqüência, só poderemos falar em predominância de um ou de dois dêles e só raramente poderíamos afirmar p. etiologia única. Ê por isso, com certeza, que escassearam, isoladamente consideradas, as causas endógenas " em nosso material. É fácil ou possível enumerar ou discriminar perfeitamente os fatôres exógenos e psicógenos, mas é muito mais difícil exumar os endógenos, quando vicejam sobre êles os outros dois que, por natureza, são muito mais palpáveis, ainda que realmente sejam menos patogênicos, b) As causas psicógenas mais numerosas foram aquelas que habitualmente geram depressões; constituem elas esmagadora maioria e trazem, não raro. o conteúdo de temor pela própria vida ou saúde, preocupações com parentes próximos (filhos e marido ou espôsa), decadência econômica. Êstes conteúdos, aliás, são inerentes e contigentes até ao homem normal que vê rarefazer-se pela morte o círculo de parentes e amigos, ou ainda que não se consolidou economicamente e se apercebe que será difícil conseguí-lo nessa idade. Todos êsses motivos são integralmente compreensíveis nesta quadra da vida. A outra série de motivos é dada pelos conflitos interfamiliais conjugais e entre sogra e nora ou genro. É a luta pelo predomínio, ou o incremento da libido, c) As causas exóge-nas foram sobretudo de ordem humoral, fisiopatológica: menopausa, hipertensão e arteriosclerose. Duas destas causas - menopausa e arteriosclerose - são inerentes à involução; quanto à hipertensão, ela tem papel bem mais difícil de avaliar pela concorrência dos novos motivos que ela gera: preocupações hipocondríacas, lesões vasocerebrais, desnudamento das predisposições mórbidas encobertas. Quanto à menopausa em si mesma, é bem conhecido agente psicopatogênico, mesmo em mulheres sem psicose propriamente dita. A arteriosclerose cerebral goza de individuabilidade, para certos autores. Pensamos - em muito boa companhia - que ela está presente mais vêzes do que se diagnostica. As " psicoses arterios-cleróticas ", a nosso ver, referem-se a quadros mentais já muito graves, d) Dominam, no desfêcho das psicoses de involução, as remissões parciais, seja exó-geno ou psicógeno o fator desencadeante, ou inexista causa imediata conhecida. É verdade que a labilidade das anamneses permite sempre a suspeita de que, em alguns casos, o fator desencadeante houvesse existido e não tenha sido revelado. Entretanto, dado o cuidado cem que foram colhidas as informações, podemos confiar, até certo ponto, nos quadros abaixo. Os números indicam a existência de diferença apreciável do prognóstico das psicoses de involução a depender do fator desencadeante. Os casos de início exógeno são os que condicionam menor número de remissões completas e entre eles se inclui o caso de morte. A diferença de remissões completas entre as psicoses de início psicógeno, e aquelas sem fator (íesencadeante conhecido, foi pràticamente nula (pequena diferença a favor das de início sem fator desencadeante). O número de casos não melhorados é menor nes doentes de início psicógeno. e) O estudo analítico da influência dos fatôres exógenos revela mau prognóstico das psicoses de involução iniciadas paralelamente à exteriorização dos sintomas hipertensivos. De 4 dêstes casos, 1 terminou pelo falecimento e 2 sem melhora, obtendo o restante uma remissão parcial. f) Os doentes cujos sintomas mentais corresponderam, cronològicamente, ao aparecimento de indícios clínicos de arteriosclerose, permaneceram no grupo das remissões parciais. E 6 de notar, mesmo posteriormente, não foram evidenciados sinfonias psíquicos e neurológicos da arteriosclerose cerebral, g) A menopausa só foi considerada cetno fator desencadeante quando coincidiu o início dos seus sintomas com o comêço da psicose. É digno de registro que, dos 3 casos em tais condições, nenhum ficou sem melhora, h) As doenças infecciosas em seguida às quais se instalaram quadros psicóticos, sem as características das síndromes infecciosas habituais, foram gripe e malária. Dos 2 casos um remitiu completamente e outro apresentou boas melhoras. Observou-se remissão parcial no caso de desencadeamento por uma crise urêrnica. i) O quadro dos fatôres desencadeantes psicógenos não revela fatos dignos de registro muito particular. Entretanto, deve-se acentuar que, apesar da aparente psicogenia do início, os resultados favoráveis ou desfavoráveis não corresponderam sempre às soluções obtidas na vida privada para os acontecimentos desencadeantes. Entre os de remissão completa, existem casos sem nenhuma possibilidade de solução para as questões desencadeantes, como o de um anão, impotente sexual, abandonado pela mulher. Entre os de psicose não remitida e de remissão parcial, há os que tiveram seus conflitos plenamente resolvidos, fôssem familiais ou de natureza econômica. Isto faz supor que o acontecimento apenas houvesse pôsto em marcha uma psicose para a qual aquêles fatôres endógenos deram grande contribuição, só posteriormente tornada nítida. A morte de pessoa querida e o estabelecimento de conflitos no ambiente familial, parecem, pelo quadro, piorar o prognóstico. Não houve mal desfêcho em casos de desajustamento conjugal, mesmo permanecendo a situação anterior do casal.
11. Menopausa - a) Verifica-se ser mais freqüente que os distúrbios mentais apareçam, não no início da menopausa, mas já no decurso avançado dela ou quando ela já estava vencida e passada. Das 24 psicoses de involução femininas cujas relações cronológicas com a menopausa são conhecidas, praticamente metade pertence a essa época; 11 outras seriam "climatéricas". se subsistissem as veleidades distintivas de diagnosticá-las pelo período estritamento genital ou sexual, b) Percebe-se que êste quadro discorda do anterior, que aponta apenas 3 vêzes a menopausa como fator desencadeante. Quisemos, a propósito de nossos 3 casos, dizer que nêles a menopausa foi o único ou mais destacado fator causai. Em muitos outros casos (em 8, portanto) a menopausa era mais um fato cronológico que talvez desse o "terreno alterado". Mas advieram fatôres extraordinários psicógenos ou endógenos que, somados, lançaram a psicose ao exterior. Como dissemos no item precedente, procuramos fazer diagnóstico polidimensional; ali arrolamos as causas sobretudo psicógenas e exógenas mais fortes, mais predominantes. A menopausa estava presente 8 vêzes, sem que fôsse mencionada. É que, no computo relatado, só figuram as causas mais patentes. Mas como a menopausa constitui fator tido como fundamental, agora êle foi estudado isoladamente, verificando-se a relação cronológica dos distúrbios mentais cem a menopausa. O papel da menopausa é, pois, mais freqüente mente patoplástico e menos freqüentemente patogênico, c) Das 30 mulheres incluídas em nossa casuística, somente em i4 toi possível precisar a relação cronológica com a menopausa. No único caso em que os sintomas mentais precederam a menopausa, houve agravamento ao aparecerem os sintomas da mesma e, com o tratamento, ocorreu remissão parcial. As psicoses iniciadas durante a menopausa apresentaram maior proporção de remissões completas (3 em 11) que as posteriores a essa fase (1 em 12). Naquelas, foram também mais freqüentes que nas últimas os casos sem remissão. Nos casos de psicose posterior à menopausa, dominam grandemente as remissões parciais (9 em 12).
12. Tensão arterial - a) Podemos presumir que muitos internistas atendem a doentes portadores de hipertensão, sem se dar conta que se trata de doentes portadores de psicoses de involução. As relações entre uma e outra são muito íntimas e é difícil conceder autonomia às "psicoses hipertensivas". Elas só não fariam parte das psicoses de involução, quando incidissem em indivíduos fora da involução; mas quando ambas as coisas existem concomitantemente, só um consumado esfôrço de apaixonado pela nosografia poderia pretender autonomia para as "psicoses hipertensivas". É raro que elas se portem, na involução, como puras reações exógenas. b) Quanto às "psicoses arterioscleróticas", também elas, a nosso ver, só são nítidas em casos avançados. Pelo menos, muitas vêzes, doentes com quadros mentais próprios da involução mostram grande diferencial no manô-metro aferidor da pressão arterial. Isto significa que se presume neles arteriosclerose que seria a causa única, nêstes nossos casos concretos, da grande diferencial. Estará ou não presente a arteriosclerose cerebral? O quadro mental não a acusa, mas isto será suficiente para excluí-la? Somos dos que pensam que não. Sabemos como não é nada raro que fatôres orgânicos lesionais cerebrais passem irreconhecidos durante grandes lapsos de tempo. Algumas vêzes, são achados de autópsia, c) Adotado o critério que usamos de considerar como hipertensão arterial apenas o aumento paralelo das pressões sistólica (mais de 150) e diastólica (mais de 90), foram em número de 7 os hipertensos de nossa casuística. Entretanto, enquanto, em 6 dêles, a diferencial era satisfatória, num havia nítido aumento da diferencial (alcançou 260 x 120). Êste fato pareceu-nos justificar a separação do caso para constituir, só êle, um item àparte, tanto mais justificável pelo fato de ser o único que faleceu, aliás em seguida a vários acidentes vasculares encefálicos. De referência aos demais casos de hipertensão arterial de nossa casuística, o quadro não permite qualquer conclusão digna de interêsse. Isto não exclui, é evidente, aquela outra verificação de mau prognóstico quando os sintomas hipertensivos marcam o início da psicose. Os pacientes portadores de grande diferencial em conseqüência do aumento exclusivo da pressão sistólica c, assim sendo, com quadro pléssico de arteriosclerose, não remitem completamente, ficando, em sua maior parte, no grupo dos parcialmente curados. É possível que um estudo catamnéstico demonstrasse o mau prognóstico dos mesmos, inclusive quanto à vida.
13. Formas clínicas - Evitamos a classificação habitual - formas depressivas, paranóides, histéricas e catatônicas - para destacar mais nìtidamente as síndromes. Logo avultam as depressivas (total de 25, isto é, 50% do total) e as histéricas. A subdivisão da depressiva foi autorizada pela inespecificidade do que se chama em geral "depressivo". Depressão nada subentende pois há as do círculo maníaco-depressivo, há as depressões reativas, esquizofrênicas, neuróticas, orgânicas, etc. Com a subdivisão que fizemos, a especificação é muito maior e vemos então as astênicas hipocondríacas, as obsessivas, etc. e a conhecida sindrome de Cotard dos franceses (não sabemos ao certo a que círculo hereditário ela pertence ou se pertence a algum dêles especificamente).
Empreenderam-se tentativas de compreender as depressões, e de dividi-las nosològicamente. As mais conhecidas são as de Kraepelin, Dreyfus, Mauz e, ultimamente, as de Schneider (Kurt). Sôbre depressões involutivas temos um trabalho de Leonhard1. Temos para nós que a mais interessante, mais extensa e mais universal foi a tentativa de Mauz8. Procurou, nas banalíssimas síndromes depressivas, traços capazes de conferir-lhes individualidade diferencial. Estribou-se na "curva vital", na herança e no biótipo. Distinguiu as depressões aparecidas uma só vez, as aparecidas duas vêzes e as aparecidas várias vêzes na vida. Nas duas primeiras eventualidades, o que dá individualidade à depressão e a seu desfecho, é a constelação biotipológica, a curva vital e a herança. Depressões com início "corporal", não psicógenas endógenas mas suceptíveis de ser influídas psicologicamente, cem personalidade anterior sinfônica, alegre, vivaz, herança sem complicações, raros ascendentes com psicoses endógenas, curva vital ascendente - tudo isso é próprio dos pícnicos. Seu prognóstico é bom e a depressão cai nítida e objetivamente aos olhos do observador. As depressões assim evoluídas e que aparecem pela primeira vez na involução. predominam no sexo masculino. A depressão advinda pela primeira vez na vica e em mulheres, é caracterizada pelo oposto: biótipo leptossomático, personalidade anterior "parada"; são pessoas pensativas, tímidas, regulares nos hábitos e sem louçania no humor, sexualmente frias, religiosas, estacionárias e sem brilho na curva vital, herança sem tara maníaco-depressiva. Eram, numa palavra, "psicastênicas". Mas essa classe de depressões não é involutiva, aparece ao redor dos 20 anos após o casamento, em regra. Tais mulheres " assexuadas" atravessam a menopausa, sem tropeços.
As depressões aparecidas duas vêzes na vida, o fazem na juventude e na involução. Predominam francamente nas mulheres. Têm posição especial frente às depressões repetidas varias vezes. Compondo-se de mulheres, as características são as seguintes: são pícnicas que, antes do episódio, eram alegres, vibrantes, ativas, práticas, diligentes, estimadas, resolutas, sensíveis, têm na ascendência tara "circular". A primeira depressão, aos vinte anos, é reativa e motiva-a um noivado, um casamento desfeito, o primeiro parto, a morte do parente. A segunda depressão - a "grande" depressão - é involutiva: idéias de pobreza, culpa, ansiedade e sintomatologia corporal (opressão precordial, prisão de ventre, mesclas histéricas). Completa-lhes o desfêcho, o desajustamento conjugai: marido desatento à sua feminilidade ainda viçosa, maridos excessivamente ocupados.
Essa é a contribuição de Mauz. Êsse autor, quando estabeleceu seu "prognóstico em psicoses endógenas", observou seus doentes por longo tempo e sem utilizar as atuais terapêuticas. Nós só afirmamos o prognóstico de nosso material frente aos tratamentos. Não temos catamneses de todos os casos, ou antes, só de uma minoria dêles. Talvez por isso, nossos resultados não se superpõem aos de Mauz. Mas isso será discutido no capítulo do "prognóstico". Interessa-nos aqui dizer que os fatos por Mauz apontados - existência de episódios depressivos que se apresentam na involução pela primeira vez ou pela segunda (a primeira irrompendo na juventude, ao redor dos 20 anos) - são absolutamente exatas.
No seu depoimento, Leonhard cogita também das depressões surgidas pela. primeira e segunda vez na involução. Ficou consignado, no prólogo dêste trabalho, o que pensa êsse autor, e aqui não o repetiremos. O fato é que ambos, Mauz e Leonhard, pensam, como já o fizeram Kraepelin e Dreyfus, que as depressões da involução têm uma posição especial diante do círculo da psicose maníaco-depressiva. Muitas delas entram aí e as outras, que seriam "espúrias", têm mau prognóstico para certos autores.
As depressões consignadas no trabalho estão, pois, distribuídas nas "pícnico-timopáticas", e nas "espúrias" (mais numerosas). Quanto às "depressões agitadas" e demais formas, não tiveram bom prognóstico. Registramos que a agitação e a ansiedade são síndromes que todo autor encarece como freqüentes na involução. Não sabemos se têm ou pretendem ter individualidade nosológica precisa. "Melancolia ansiosa", "melancolia agitada", "psicoses de angústia" etc, são talvez sinônimas duma mesma forma clínica. O que foi dito sobre Mauzr Leonhard e outros cabe "para estas formas. Cumpre saber se as características aferidas por Mauz, se verificam ou não nestas formas. Neste trabalho isso ainda não foi feito. Possivelmente, o faremos no futuro. As "depressivas-obsessivas" entraram com esse nome porque prevalecia aí a fenomenologia compulsiva. Sabe-se como esta síndrome - a compulsiva - comporta radicais psicopáticos diversos: esquizofrênicos, depressivos, psicógenos e até orgânicos (compulsões dos pós-encefalíticos). Não pudemos estabelecer o tronco heredclógico desses nossos doentes. Sabemos, porém, que duas dessas doentes tiveram episódios compulsivos no passado.
Quanto à tonalidade histérica, essa não individualiza quadro algum, porque traços histéricos existem em tôdas eu quase tôdas as psicoses e neuroses, sobretudo nas "psicoses funcionais". Não se conseguiu firmar uma " personalidade psicopática histérica "na tipologia de Schneider. Isso não impede que, em dado momento, as reações histéricas - que se enxertam numa personalidade por exemplo "lábil de humor" - assumam o primeiro plano na fisionomia clínica. Por isso, essa modalidade reativa vem expressamente consignada como "forma clínica" no nosso trabalho. Veremos que, ao contrário do que é hábito, nossos histéricos não tiveram bom prognóstico.
Sôbre as formas paranoides encontramos pouca coisa. Com as depressivas e as histéricas, elas são muito amplas para se agruparem em uma só rubrica. Se, por um lado vemos as formas predominantemente reativas cujo protótipo é a sensitiva, por outro lado há as que são aparentadas com a esquizofrenia. Nas psicoses de involução, vemos reeditados o velho parentesco entre paranoia e esquizofrenia; apenas tornam-se mais freqüentes as mesclas paranoides com a histérica e depressiva.
a) Considerado, no quadro abaixo, o desfêcho das psicoses de involução de forma depressiva, a conclusão lógica é a de ser mau o prognóstico das mesmas. Mais da metade dos casos teve remissão parcial (13 em 25) e o número dos doentes não melhorados é o dôbro do número de remissões completas, b) Os quadros involutivos de forma histérica também se revelaram de mau prognóstico. Dois terços dos pacientes apresentaram remissão parcial (8 em 12) e 1 único teve desaparecimento completo dos sintomas, c) As formas paranoides (num total de 5) também não se mostraram com evolução feliz, visto que 1 doente faleceu, 2 não remitiram e houve 1 remissão parcial, d) Nos 2 casos de psicoses de involução cem sintomatologia esquizofreniforme, o desfêcho foi a remissão parcial, e) Revelaram-se as mais felizes as formas maníacas e confusionais, sendo de notar que foi incluído como forma confusional (é claro que com base apenas nos sintomas psicopatológicos) um caso de 7 anos de doença.
Tendo em vista as descrições de Mauz de depressões ocorridas uma ou duas vêzes na vida, sendo o único ou o último episódio na quarta e quinta década, nas quais aquele autor encontrou diferenças de evolução a depender do biótipo, procuramos investigar o que nosso material demonstra a respeito. Não comparecem no quadro abaixo, os casos de depressões com vários episódios anteriores, assim como aquêles de episódios anteriores depressivos e psicoses de involução cem outra forma clínica.
a) As formas hipocondríacas, que incluímos em número de 5, demonstraram ínfluenciabilidade apenas relativa à terapêutica, visto que, em sua maioria, permanecem em remissão parcial, b) Entre as formas que chamamos depressivas puras, precisamente naquelas, do ponto de vista psicopatológico, mais identificáveis com as crises depressivas da P. M. D., houve um têrço de remissões completas e dois terços de parciais, c) As depressões com predomínio de traços obsessivos, não se revelaram de bom prognóstico, sabido que, em 4, não se pôde verificar uma só remissão completa, havendo apenas duas parciais, d) Revelou-se ainda pior o prognóstico das depressões agitadas, em que, além de não haver remissão completa, foi maior o número de psicoses inalteradas pelo tratamento, que o de casos de remissão parcial, e) As formas depressivas, em que a sintomatologia tomou o aspecto clàssicamente descrito como síndrome de Cotard, permitiram, num total de 3, 2 remissões completas, embora o outro caso não se alterasse sob a ação da terapêutica.
14. Tempo de doença - É nítida a demonstração de que as probabilidades de remissão completa são tanto maiores quanto mais precoce a intervenção da terapêutica. A proporção de curas é mais satisfatória e a de casos incuráveis é menor precisamente no primeiro semestre, desde que não se tenham em conta as remissões completas, passíveis de ocorrer em casos mais antigos, como os do 4.° semestre e, até, um caso de 7 anos. Êstes últimos demonstraram, entretanto, que, apesar de diminuídas as probabilidades de cura em doentes antigos, a terapêutica sempre deve ser experimentada e pôde dar resultado feliz. De outra parte, o quadro também demonstra existirem alguns casos em que mesmo o tratamento precoce não oferece melhoras.
15. Terapêutica - Os quadros abaixo enumeram os tratamentos feitos isolada, simultânea e sucessivamente em nossos doentes, indicando o desfecho que apresentaram os mesmos. Não referem, portanto, o resultado terapêutico obtido com cada método. É isto que passamos a apresentar. Os totais, referindo-se aos desfechos obtidos com cada terapêutica, naturalmente não coincidem com o número dos nossos pacientes, salvo na coluna das remissões completas. Como um determinado doente submetido a 2 tratamentos teve, por exemplo, com ambos, remissão-parcial, tem de figurar duplamente na coluna, das remissões parciais. Dá-se o mesmo com os casos sem remissão.
a) O primeiro ensinamento a ser tirado da análise do material, do ponto de vista da terapêutica, é o de que tôdas as remissões completas foram obtidas com os chamados tratamentos de choque, isto é, a convulsoterapia e a insulinoterapia. Isto significa que cs tratamentos químicos e os métodos psicológicos (psicoterapia com ou sem narcose) não se revelaram capazes de produzir uma cura total. Sòmente num dos casos de remissão completa chegou-se a usar dois métodos de tratamento (caso em que falhou o eletrochoque e houve cura pelo método de Sakel). Nos demais, a primeira terapêutica executada, quase sempre o eletrochcque, era bastante para produzir a cessação, b) O uso do método de Cerletti revelou 24% de remissões completas, 43% de remissões parciais e 32% sem remissão, resultado que corresponde à maior proporção de remissões completas que figura no quadro, se pôsto de parte o método de Giorgy, que foi aplicado apenas uma vez. c) O pequeno número de casos em que foi aplicado o método de Sakel não permite, como o de qualquer dos outros, uma comparação com a quantidade de doentes tratados pelo eletrochoque. Apesar disso, são dignos de nota certos fatos. Salvo um único caso, em que de início foi feita a insulinoterapia, os demais eram de doentes nos quais outras terapêuticas haviam falhado, o que quer dizer, pouco influenciáveis pelos demais métodos. O caso em que foi usado inicialmente o método de Sakel apresentou remissão parcial. Mas, num total de 6 observações, registrou-se uma remissão completa e nenhum dos doentes submetidos ao método deixou de se beneficiar (nenhum caso sem remissão). Isto faz pensar que, embora o número de remissões completas (1 em 6) seja porcionalmente menor que o verificado com o método de Cerletti, o de Sakel é o processo de escolha, sempre que os resultados hajam sido insuficientes ou nulos com o uso de eletrochoque. d) A respeito da cardiazolterapia, restrições idênticas devem ser feitas ao nosso material. Os casos a ela submetidos não haviam apresentado resultado satisfatório com outros tratamentos. Assim sendo, eram provàvelmente, em si mesmos casos pouco favoráveis. Em 6, houve apenas 1 que não melhorou. O material não permite, entretanto, demonstrar, como para o método de Sakel, a possibilidade de produzir remissões completas em casos não curados pelo eletrochoque. e) O pequeno material existente não autoriza a suspeita de melhora do desfêcho pela adição de psicoterapia ou tratamento químico ao uso do eletrochoque. O tratamento químico não se revelou satisfatório, visto que, em 4 casos, houve um falecimento, 2 sem melhora e apenas 1 remissão parcial. A leucotomia produziu remissão parcial em um caso não melhorado pelos tratamentos convulsivantes. f) A maior proporção de remissões completas ocorreu no grupo das psicoses de involução de início exógeno. Segue-se o grupo dos casos de desencadeamento psicógeno, sendo aquelas iniciadas sem causa imediata precisamente as de menos remissões completas pelo eletrochoque. Estas últimas, provàvelmente as de maior contribuição endógena, terminam, em maioria, pela remissão parcial, quando tratadas por êste método, g) A ação do eletrochoque nas formas hipocondríacas de psicose de involução condiciona habitualmente (4 em 5) uma remissão parcial, havendo, entretanto, uma possibilidade de que nenhuma melhora se observe. Nos casos de forma depressiva pura, êste método terapêutico revelou-se satisfatório, pois houve, em 4, 2 remissões completas e 2 remissões parciais. As depressões com traços obsessivos predominantes e as depressões agitadas mostraram-se pouco favoráveis (2 sem remissão em 3, e 4 em 5, respectivamente). Os casos de sindrome de Cotard submetidos ao eletrochoque, em número de dois apresentaram remissão completa. Esta forma apresenta-se assim, entre as depressões, como aquela em que o método de Cerletti revelou maior eficiência nos resultados. A análise do efeito do eletrochoque sobre as depressões involutivas tomadas em conjunto, revela apenas 4 remissões comple'.as, num total de 19. Assim sendo, mesmo contando-se com esta terapêutica, o prognóstico das depressões de involução permanece muito duvidoso, h) A maioria das formas histéricas permitiu remissão parcial (5 em 9) à cerlettiterapia, obtendo-se apenas um caso de cura completa. Nas formas maníacas, como nas paranoides, foram registrados os tipos de desfêcho mais diversos, sem predomínio de nenhum. A convulsoterapia elétrica produziu boas melhoras numa forma esquizofreniforme e remissão completa nas 2 confusionais. i) O quadro que registra o efeito do eletrochoque, relacionando-o com o tempo de doença ao início do tratamento, não revela, ao menos de forma nítida, aquela piora progressiva cb prognóstico à medida que o caso se torna mais antigo e que foi evidenciada no quadro do capítulo 14. Aqui, também se observa que os casos mais antigos, salvo exceção, não remitem completamente. Mas a diferença nos resultados do tratamento não é acentuada entre os doentes dos 4 primeiros semestres. Ainda assim, entretanto, é digno de no'.a que o método de Cerletti foi o que permitiu uma remissão completa numa mulher doente há 7 anos. j) Os doentes tratados pelo método de Sakel, assim se distribuíram, quanto ao início: 2 sem causa desen-cadeante, 3 de comêço psicógeno e 1 exógeno. As formas clínicas eram as seguintes: hipocondríaca (1), depressiva-obsessiva (2), depressiva agitada (1) e maníaca (2). Quatro dêsses pacientes não tinham mais que um semestre de doença e 2 estavam pelo 4.° semestre. O caso de remissão completa ocorreu em uma mulher de desencadeamento psicógeno, forma maníaca, aos 2 meses. A cr'rdiazolterapia também foi aplicada em 6 pacientes. Eram 2 sem fator desen-cadeante identificado, 2 de instalação psicógena e 2 exógenos. Suas formas clínicas assim se distribuíram: histérica (2), hipocondríaca (1), depressiva-obsessiva (1), maníaca (1) e paranóide (1). Quanto ao tempo de doença, incluíam-se 2 no 1.° semestre, 1 no 2.°, 2 no 4.° e 1 no 6.° ano. O caso não melhorado teve início psicógeno, forma histérica e era precisamente o incluído no 2.° semestre de doença. O método de Giorgy foi aplicado num único caso, de início psicógeno, forma maníaca, doente há 30 dias. Houve remissão completa. Os processos quimioterápicos foram os únicos usados em 2 casos de início exógeno e 2 de fator desencadeante psicógeno. As formas clínicas eram: histérica paranóide, depressiva-obsessiva e depressiva pura. Tinham 1 semestre, 2 semestres, 3 anos e 5 anos de doença. Um faleceu (início exógeno, forma paranóide, segundo semestre), 2 não remitiram (1 de início psicógeno, forma histérica, 1 ano de doença) havendo evolução para arteriosclerose cerebral no curso do fatamento, outro com desencadeamento psicógeno, quadro depressivo-obsessivo e 3 anos de moléstia. Obteve melhoras parciais uma mulher cujos sintomas mentais se haviam iniciado há 1 mês em seguimento a sinais clínicos de arterioscle"ose e com quadro depressivo puro. Os métodos psicoterápicos, com ou sem narcose, feitos isoladamente em 4 doentes, produziram 2 remissões parciais e não melhoraram os outros casos. Eram 2 de início psicógeno e 2 sem fator desencadeante. As formas clínicas eram: histérica, depressiva-obsessiva (2) e sindrome de Cotard. Tempo de doença: 2 de 2 semestres, 1 de 4 semestres e 1 de 3 anos. Seguem-se os resultados: Remissão parcial - 1 de início psicógeno, forma histérica, no 2.° semestre de doença; outro sem fator desencadeante, depressivo-obsessivo, no 4.° semestre. Sem remissão - 1 sem fator desencadeante, com sindrome de Cotard, no 2.° remertre; out'o psicógeno, com forma depressivo- obsessiva, no 3.° ano de doença. Como se vê, os resultados da terapêutica psicológica não correspondem à natureza do fator desencadeante. Isto é. obteve melhoras um doente sem causa desencadeante, não melhorou outro em que era patente a psicogenia do início. A associação de psicoterapia sistematizada ao eletrochoque, em paralelo, foi feita num caso que andava pelo 2.° semestre de doença, forma histérica, desencadeamento pela menopausa. A quimioterapia e a psicoterapia associadas produziram remissão completa num doente de depressão agitada, sem fator desencadeante, no 4.° semestre de moléstia. Não melhoraram um outro de forma paranoide, início exógeno (hipertensão arterial e 1 ano de doença). A quimioterapia associada ao eletrochoque permitiu remissão parcial em paciente de forma esquizofrenóide, início psicógeno e 6 meses de doença. A doente leucotomizada melhorou. Tinha forma histérica, início psicógeno, 1 ano de doença e não melhorara pela convulsoterapia.
Trabalho apresentado ao V Congresso Brasileiro de Psiquiatria, Neurologia e Medicina Legal, reunido no Rio de Janeiro e em São Paulo, em outubro-novembro de 1948.
Sanatório Bahia - Largo da Lapinha, 27 - Salvador, Bahia - Brasil
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Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
11 Fev 2015 -
Data do Fascículo
Jun 1949