Open-access Acesso rápido à via aérea

Resumos

OBJETIVO: O artigo visa rever os passos da obtenção de uma via aérea segura no atendimento da criança criticamente enferma. FONTES DOS DADOS: Revisão de artigos a partir da busca na base de dados Medline até abril de 2003, utilizando os unitermos intubação, crianças e sedação. SÍNTESE DOS DADOS: O comprometimento da via aérea é incomum, porém quando ocorre, depende de profissionais treinados para a rápida obtenção da via aérea, de maneira segura, precoce e sem causar prejuízos para tais pacientes. O método preconizado para tal abordagem é a seqüência rápida de intubação que além de preparação, utiliza sedação e bloqueador neuromuscular. Observamos que não é possível a aplicação de um protocolo único de intubação, pois depende da indicação e condições do paciente. Definimos doses das medicações mais utilizadas em nosso meio, pois acreditamos que pouco se conhece do real efeito de drogas sedativas e analgésicas. Na maioria das situações, a associação de um analgésico opióide (fentanil na dose de 5 a 10 µg/kg) e um sedativo (midazolam 0,5 mg/kg) e um bloqueador neuromuscular são suficientes para a intubação traqueal. CONCLUSÕES: Treinamento, conhecimento, habilidade na obtenção da via aérea são fundamentais para o intensivista pediátrico e são vitais para o adequado atendimento de crianças gravemente enfermas. Apresentamos um texto objetivo e dinâmico, visando a oferecer subsídios para a geração de protocolos a serem implementados de acordo com facilidades e dificuldades de cada serviço.

Intubação; via aérea; sedativos; narcóticos


OBJECTIVE: To review the steps involved in safe airway management in critically ill children. SOURCES OF DATA: Review of articles selected through Medline until April 2003 using the following key words: intubation, children, sedation. SUMMARY OF THE FINDINGS: Airway compromise is rare, but whenever it occurs, the situation depends on professionals trained to carry out safe, early, and rapid airway management, with no harm to the patient. The method currently advocated for airway management is rapid sequence intubation, which requires preparation, sedation and neuromuscular block. We observed that it is not possible to apply one single intubation protocol to all cases, since the selection of the most adequate procedure depends on indication and patient conditions. We defined the drug doses most commonly used in our setting, since little is know so far about the real effect of sedatives and analgesics. In most situations, the association of an opioid (fentanyl at 5-10 µg/kg) with a sedative (midazolam at 0.5 mg/kg) and a neuromuscular blocking agent are sufficient for tracheal intubation. CONCLUSIONS: Training, knowledge, and skill in airway management are of fundamental importance for pediatric intensive caregivers and are vital for the adequate treatment of critically ill children. We present an objective and dynamic text aimed at offering a theoretical basis for the generation of new protocols, to be implemented according to the strengths and difficulties of each service.

Intubation; airway obstruction; sedatives; narcotics


ARTIGO DE REVISÃO

Acesso rápido à via aérea

Sérgio L. AmantéaI; Jefferson P. PivaII; Malba Inajá ZanellaIII; Francisco BrunoIV; Pedro Celiny R. GarciaV

IProfessor adjunto do Departamento de Pediatria da Fundação Faculdade Federal de Ciências Médicas de Porto Alegre. Chefe do Serviço da Emergência Pediátrica do Hospital da Criança Santo Antônio de Porto Alegre

IIProfessor adjunto dos Departamentos de Pediatria das Faculdades de Medicina da PUCRS e da UFRGS. Chefe Associado da UTI pediátrica do Hospital São Lucas da PUCRS

IIIMestranda do Curso de Pós-graduação em Pediatria da Faculdade de Medicina da PUCRS. Médica do Serviço da Emergência Pediátrica do Hospital da Criança Santo Antônio de Porto Alegre

IVProfessor assistente do Departamento de Pediatria da Faculdade de Medicina da PUCRS. Médico assistente da UTI pediátrica do Hospital São Lucas da PUCRS

VProfessor adjunto do Departamento de Pediatria da Faculdade de Medicina da PUCRS. Chefe da UTI pediátrica do Hospital São Lucas da PUCRS

Endereço para correspondência Endereço para correspondência Dr. Jefferson P. Piva UTI Pediátrica – Hospital São Lucas da PUCRS Av. Ipiranga, 6690 – 5º andar CEP 90610-000 – Porto Alegre – RS Tel./Fax: (51) 3315.2400 E-mail: jpiva@pucrs.br

RESUMO

OBJETIVO: O artigo visa rever os passos da obtenção de uma via aérea segura no atendimento da criança criticamente enferma.

FONTES DOS DADOS: Revisão de artigos a partir da busca na base de dados Medline até abril de 2003, utilizando os unitermos intubação, crianças e sedação.

SÍNTESE DOS DADOS: O comprometimento da via aérea é incomum, porém quando ocorre, depende de profissionais treinados para a rápida obtenção da via aérea, de maneira segura, precoce e sem causar prejuízos para tais pacientes. O método preconizado para tal abordagem é a seqüência rápida de intubação que além de preparação, utiliza sedação e bloqueador neuromuscular. Observamos que não é possível a aplicação de um protocolo único de intubação, pois depende da indicação e condições do paciente. Definimos doses das medicações mais utilizadas em nosso meio, pois acreditamos que pouco se conhece do real efeito de drogas sedativas e analgésicas. Na maioria das situações, a associação de um analgésico opióide (fentanil na dose de 5 a 10 µg/kg) e um sedativo (midazolam 0,5 mg/kg) e um bloqueador neuromuscular são suficientes para a intubação traqueal.

CONCLUSÕES: Treinamento, conhecimento, habilidade na obtenção da via aérea são fundamentais para o intensivista pediátrico e são vitais para o adequado atendimento de crianças gravemente enfermas. Apresentamos um texto objetivo e dinâmico, visando a oferecer subsídios para a geração de protocolos a serem implementados de acordo com facilidades e dificuldades de cada serviço.

Palavras-chave: Intubação, via aérea, sedativos, narcóticos.

Introdução

Na avaliação da criança em qualquer situação de emergência, o manejo da via aérea é uma prioridade, e a intubação traqueal significa o ato definitivo de uma via aérea segura. A intubação é uma etapa crítica, pois deve ser obtida de forma rápida e segura em pacientes com limitada reserva cardiocirculatória, pulmonar ou cerebral1. A obtenção da via aérea de emergência pode representar a diferença entre um resultado satisfatório e a seqüela permanente ou morte, motivo pelo qual deve ser realizada por profissionais com treinamento adequado2.

Entre as indicações de intubação endotraqueal, além de apnéia e hipoventilação, encontra-se a insuficiência respiratória ou cardiovascular com necessidade de pressão positiva, o pós-operatório de grandes cirurgias, alterações da função da caixa torácica, a obstrução da via aérea superior e o controle da PaCO2 3-5.

Quando indicada a intubação, devemos estar cientes de que algumas vezes estaremos diante de uma via aérea de difícil obtenção, definida pela Sociedade Americana de Anestesiologistas como a demora superior a 10 minutos para inserir o tubo endotraqueal e/ou quando ocorre mais de três tentativas por um anestesista experiente. Outros definem como a dificuldade de intubação endotraqueal a despeito de uma perfeita laringoscopia6.

De acordo com a indicação e condição clínica do paciente, reconhecimento da via aérea difícil, experiência do profissional e disponibilidade de material, existem opções de diferentes técnicas para obtenção da via aérea. Por tratar-se de uma situação extrema, recomenda-se que cada hospital desenvolva seu próprio protocolo, incluindo alternativas de assegurar via aérea para o caso de um eventual fracasso na intubação.

Reconhecemos três técnicas de obtenção da via aérea em situações de emergência: intubação sem medicação, sedação sem bloqueio neuromuscular e seqüência rápida de intubação.

A intubação sem medicação é um método aceitável apenas no paciente inconsciente, como na parada cardiorrespiratória. Em qualquer outra situação, este procedimento deve ser realizado com auxílio de drogas relaxantes e sedativos.

Pode se usar sedação sem bloqueio neuromuscular em algumas situações, tais como: (a) quando é reconhecida a via aérea difícil e a patência da via aérea é dependente do tônus dos músculos da via aérea superior, ou da posição específica. Como exemplo dessa situação poderiam ser citados: abscesso em via aérea superior, obstrução da via aérea, micrognatia, queimadura de face, entre outras. A paralisia, nestes casos, pode levar à perda da habilidade de manter a via aérea pérvea; (b) quando há suficiente relaxamento muscular, que seja por comprometimento central (coma de qualquer etiologia) ou por alterações periféricas (Guillain Barre, por exemplo). Apesar dos dados conflitantes da literatura, não raras vezes a intubação sem bloqueio neuromuscular é utilizada em ambiente de UTI, sendo motivada por outras razões.

Acreditamos que essa prática ocorra em conseqüência de: (a) um melhor conhecimento farmacológico das drogas sedativas, o que tem propiciado uma maior sedação e, inclusive, relaxamento muscular, mesmo na ausência de droga bloqueadora neuromuscular. As doses recomendadas de midazolam (0,1 a 0,5 mg/kg), fentanil (1 a 5 µg/kg), cetamina (1 a 4 mg/kg) e tiopental (1-5 mg/kg) têm sido facilmente ultrapassadas2,7,8; (b) que pacientes em ambiente de UTI têm freqüentemente alterações ou comprometimento do sensório (sepse, asfixia, etc.) e, conseqüentemente, um tônus muscular diminuído.

A intubação com uso de sedativos sem paralisia tem sido defendida como uma alternativa segura (manteria a respiração espontânea do paciente), mas pode causar uma demora maior na intubação, levando a maiores riscos2,3, pois, para produzir adequada condição para intubação, a quantidade de sedativos utilizada geralmente excede a dose que preservaria o "gatilho" ventilatório, levando, freqüentemente, à apnéia. Doses maiores de sedativos ocasionam mais paraefeitos hemodinâmicos e exibem um tempo de ação farmacológica imprevisível. Aqui, novamente questionamos o conhecimento farmacológico de tais drogas, fato que prejudica a construção de protocolos rígidos de intubação traqueal. Estudos comparando a seqüência rápida de intubação (SRI) e a intubação com sedação sem relaxantes musculares demonstram que a SRI é uma técnica mais segura, com menores índices de complicações2,7-10.

Em um trabalho observacional multicêntrico, Sagarin e cols. encontraram que, das 156 intubações pediátricas, 81% foram através da seqüência rápida de intubação, 13% não utilizaram medicação, e 6% usaram sedação sem bloqueio neuromuscular11. Tais resultados surpreendem, pois não são os mesmos encontrados em nossos serviços (trabalho em andamento em duas UTIs pediátricas de Porto Alegre mostram o predomínio da sedação sem bloqueador neuromuscular).

Abaixo descreveremos uma forma de abordagem da via aérea no paciente crítico, conhecida como seqüência rápida de intubação.

Seqüência rápida de intubação (SRI)

A SRI tem por objetivo realizar a intubação sob anestesia e bloqueio neuromuscular, tornando o procedimento mais fácil, rápido e menos traumático2,7-9.

Pacientes candidatos à SRI são todos aqueles que necessitarem de intubação e que estejam com consciência plena ou parcial, com suspeita de estômago cheio, convulsões, hipertensão intracraniana, intoxicação medicamentosa ou traumatismo7.

Os procedimentos básicos da seqüência de intubação rápida podem ser lembrados pelos "6 p": preparação, pré-oxigenação, pré-medicação, paralisia, posicionamento (introdução) do tubo endotraqueal, e pós-intubação (Figura 1)2,4,7,8,12.


Preparação

Em pacientes com potencial aumento da pressão intracraniana (PIC), a SRI minimiza o aumento causado pela laringoscopia ou tosse durante a intubação endotraqueal4,7-9. Os pacientes com disfunção respiratória (asma, pneumonia e insuficiência cardíaca congestiva), com intoxicação exógena, com diminuição dos reflexos protetores da via aérea e alteração do estado mental são rapidamente intubados, com poucas complicações, com uso da SRI7. O manejo da via aérea de vítimas de trauma também são facilitados pela SRI 9,13.

A SRI também é importante no controle da via aérea no paciente agitado que requer sedação profunda antes do tratamento e da avaliação diagnóstica. Pacientes não colaborativos e agitados podem estar hipoxêmicos, hipoperfundidos, com distúrbios metabólicos ou lesões expansivas do sistema nervoso central7,8.

O uso de SRI em pacientes com respiração espontânea em iminente insuficiência respiratória permite obter a via aérea enquanto os pacientes ainda têm uma reserva fisiológica, e toleram melhor o período de apnéia durante a passagem do tubo endotraqueal7.

Mesmo na situação de urgência, uma anamnese rápida e dirigida pode ser realizada (história de alergia, uso de medicações, história médica pregressa, principalmente de doenças neuromusculares, e últimas refeições). É essencial avaliar a abertura da cavidade oral, o tamanho da língua, a extensão e a flexão do pescoço e a distância da mandíbula ao osso hióide6,7,14,15.

Para predizer a dificuldade de intubação, Mallampati criou um escore baseado na habilidade de visualizar o palato mole, os pilares e a úvula quando o paciente abre a boca e protrai sua língua. Por outro lado, Cormack e Lehane basearam-se no grau de dificuldade de visualização da glote na laringoscopia5,6,14,15 (Figura 2). Na laringoscopia, o espaço mandibular é limitado pelo arco da mandíbula. Quando o espaço mandibular é grande, permite uma maior compressão da língua pela lâmina do laringoscópio, e, conseqüentemente, uma boa visualização da laringe anterior6,14.


Dependendo da idade, utilizam-se diferentes técnicas para alinhar os eixos faríngeo, oral e laríngeo. Crianças menores têm um crânio proporcionalmente maior em relação ao corpo, e necessitam utilizar um coxim na região subescapular, enquanto que crianças maiores necessitarão colocar o coxim na região occipital para melhor alinhamento dos três eixos e visualização da via aérea na laringoscopia3,5,14.

Os pacientes instáveis e criticamente doentes têm risco maior de aspiração gástrica durante a intubação, pois o esvaziamento gástrico pode estar retardado em função da doença ou pelo uso de medicações9,14. A presença de sangramento gastrintestinal, de sonda de alimentação enteral ou alimentação recente podem aumentar o volume gástrico e a chance de aspiração14, sendo os lactentes e crianças pequenas mais suscetíveis, devido à maior deglutição de ar durante o choro, pelo padrão de respiração diafragmática e por possuírem um esôfago curto9. Os pacientes com risco de aspiração pré-intubação devem receber tratamento para diminuir o volume gástrico e para neutralizar a secreção gástrica, se o tempo permitir. O uso da seqüência rápida de intubação pode prevenir o refluxo passivo do conteúdo gástrico para a faringe9,14.

Equipamentos e medicações

O material necessário para a intubação deve estar preparado e organizado com antecedência6,7. A SRI somente deve ser iniciada quando todo equipamento e material estejam disponíveis e funcionando adequadamente – aspiradores, oxigênio, laringoscópio, tubo endotraqueal, guias e bolsa auto-inflável, medicações devidamente preparadas, monitor cardíaco, de saturação de oxigênio, de pressão sangüínea e de CO2 expirado, assim como equipamentos para acesso alternativo à via aérea em caso de falha na intubação (máscara laríngea, intubação transtraqueal em jato e cricotiroidotomia)2,7-9.

Os tubos endotraqueais sem balonete são recomendados para crianças menores de oito anos de idade, pois entre oito e nove anos de idade, a via aérea é semelhante à do adulto, exceto pelo tamanho. O fator limitante para inserção do tubo endotraqueal em crianças é a forma de funil da via aérea criada pelo estreitamento localizado na altura da cartilagem cricóide. A utilização de tubos sem balonetes reduz os riscos de complicações relacionadas à permeabilidade da via aérea como edema e estenose subglótica3,7-9,15-19.

Várias são as fórmulas para selecionar o tubo adequado para intubação endotraqueal em crianças. Uma alternativa para escolha do tubo apropriado em pacientes pediátricos (a partir de 2 anos) é através de seu diâmetro interno, podendo ser estimado pela fórmula: Diâmetro do tubo = idade (anos) / 4 + 4. Sempre manter disponíveis tubos de tamanhos imediatos (maior e menor) do que o estimado por cálculo, já que a escolha final do tubo a ser empregado se dará por ocasião da laringoscopia. A consulta a tabelas também pode facilitar nossa escolha do tubo endotraqueal a ser utilizado (ver Tabela 1)8,9,17. Outra forma prática, rápida e simples de selecionar o tubo endotraqueal é a comparação da falange média do quinto dedo da mão com o diâmetro interno do tubo17.

A distância adequada (profundidade) de inserção em centímetros, para crianças maiores de dois anos, pode ser calculada somando doze à metade da idade do paciente: idade (anos) / 2 + 12. Outra possibilidade para estimar a distância de inserção (em centímetros) pode ser calculada multiplicando-se o diâmetro interno do tubo por três5,17.

Existem dois tipos de lâminas de laringoscópio disponíveis para o paciente pediátrico: a lâmina reta (Miller) e a curva (Macintosh). As lâminas retas são utilizadas nos pacientes pediátricos, principalmente nos menores de três anos, em função da situação anatômica mais anterior e cefálica da laringe. As lâminas curvas são utilizadas nas crianças maiores e em adultos, porque sua base é mais larga, facilitando o afastamento da língua e a visualização das cordas vocais (posicionam-se atrás da epiglote) 2,5,17,18.

Um auxílio na intubação difícil é o uso da guia metálica, um estilete maleável, porém rígido, que pode ser inserido no tubo endotraqueal antes da intubação para dar ao tubo a configuração desejada. Para evitar trauma durante a intubação, a ponta do estilete não pode ultrapassar a porção distal do tubo endotraqueal, devendo ficar posicionada a um centímetro da extremidade distal da cânula traqueal. Mesmo com este cuidado, há maior risco de trauma (sangramento, laceração), devendo ser utilizada com cautela5,9,17.

Pode-se manter a ventilação e oxigenação de forma efetiva e segura através de máscaras conectadas a bolsas auto-infláveis, equipadas com uma bolsa reservatório e ligadas a uma fonte de oxigênio (fluxo de15 l/min)2,5,9,17,18.

A aspiração de secreções, sangue ou vômito da orofaringe, nasofaringe ou traquéia geralmente é necessária para que se possa visualizar a via aérea, podendo-se utilizar sistema de sucção a vácuo ou aparelhos de aspiração portáteis. Os cateteres de sucção flexíveis são úteis para aspiração de secreções finas da boca, nasofaringe e traquéia. As cânulas de sucção rígidas e grossas são mais eficazes na aspiração da faringe e são úteis na remoção de secreções espessas e com partículas. Para sucção, deve-se dar preferência a sondas maleáveis de aspiração com diâmetros de n° 4 a 10. A pressão de sucção deve ser efetiva e não causar dano à mucosa, não ultrapassando 120 mmHg em lactentes e crianças. As aspirações não devem passar de 5 segundos e devem ser precedidas por uma pré-oxigenação a 100% para reduzir a ocorrência de hipoxemia. A freqüência cardíaca e a saturação devem ser monitorizadas durante a aspiração2,9,17.

Monitorização

Idealmente toda criança grave deveria ter monitorização cardíaca, oximetria de pulso e medidas de pressão arterial antes e durante a SRI, entretanto, em situações de emergência, o procedimento não deve ser retardado na dependência da monitorização eletrônica. Ficar atento à taquicardia, pois é a primeira manifestação de hipoxemia e hipóxia, enquanto que a bradicardia é um sinal tardio, exigindo medidas imediatas visando à melhora na oxigenação (p.ex.: suspender a laringoscopia e reiniciar a ventilação com bolsa e oxigênio)2,7,8,21.

Pré-oxigenação

A pré-oxigenação visa a aumentar a saturação de oxigênio da hemoglobina, realizada com o fornecimento de oxigênio a 100% através de máscara, com o paciente respirando espontaneamente, por um período de 3 minutos. A pré-oxigenação causa eliminação do nitrogênio, criando um reservatório de oxigênio nos pulmões. Este reservatório permite 3 a 4 minutos de apnéia, eliminando a necessidade de ventilação com pressão positiva, associada ao aumento do risco de aspiração antes da intubação endotraqueal 2,7,8,9,15.

Se a respiração espontânea for inadequada ou ocorrer apnéia, os pacientes devem ser pré-oxigenados manualmente, através da utilização de ventilação com pressão positiva por 1 a 2 minutos. Este procedimento pode levar à distensão gástrica e deve ser realizado somente com pressão cricóide (manobra de Sellick) 2,7-9,15 (Figura 3).


Pré-medicação

A laringoscopia e o tubo endotraqueal podem desencadear várias respostas fisiológicas. A tosse e o reflexo do vômito podem levar à taquicardia, à hipertensão arterial sistêmica, à hipóxia tecidual e ao aumento da pressão intracraniana e intra-ocular. Algumas drogas administradas antes do procedimento podem minimizar e reduzir esses efeitos7,8,15. Aqui sugerimos a mnemônica LOAD (Lidocaína, Opióide, Atropina e droga para Defasciculação) 1.

A lidocaína atenua as respostas adrenérgicas durante a laringoscopia e a passagem do tubo endotraqueal. A administração intravenosa de lidocaína diminui a hipertensão e a taquicardia, também reduz o aumento da pressão intracraniana e intra-ocular associadas à intubação. A dose recomendada de lidocaína é de 1,5 a 3 mg/kg, IV, 2 a 5 minutos antes da laringoscopia. O efeito máximo é alcançado 3 a 5 minutos após injeção IV2,7-9. A lidocaína também produz um efeito anestésico tópico que pode ajudar a reduzir as respostas á intubação. Há dados conflitantes quanto ao uso de lidocaína intratraqueal ser efetivo em reduzir as reações causadas pela passagem do tubo endotraqueal. Entretanto, a instilação dessa substância na traquéia também pode produzir reação tipo corpo estranho2,7,8. Uma alternativa seria o uso de nebulização com lidocaína, porém ainda sem comprovação definida7.

O uso de agentes opiódes é útil na sedação consciente em paciente com respiração espontânea. Promovem sedação e analgesia, produzindo apnéia apenas quando as doses são altas. Durante a SRI, não somente produzem analgesia e sedação, como também estabilização hemodinâmica na presença ou na ausência de estímulos nocivos7. O fentanil é um analgésico opióide sintético de curta ação e reversível, sendo útil para sedação na SRI. Produz rápida analgesia e inconsciência, na dose 5-10 µg/kg intravenoso, com uma duração de ação de 30 minutos. Causa bloqueio das respostas adrenosimpaticomiméticas durante a intubação, e há mínimo efeito no sistema cardiovascular. Neonatos e lactentes parecem ser mais sensíveis a essa droga, doses menores devem ser utilizadas nesses pacientes, e a administração deve ser lenta, principalmente quando a dose for maior que 5 µg/kg. Há descrição de efeitos variáveis na pressão intracraniana e no fluxo sangüíneo cerebral2,7,8,12.

Nas crianças, a resposta vagal é mais pronunciada que nos adultos, e pode ser causada por hipóxia, pela laringoscopia ou pela succinilcolina. Essas respostas podem ser minimizadas com o pré-tratamento com atropina. A atropina também diminui a produção de secreções na via aérea, permitindo a sua visualização durante a intubação7-9. Indica-se atropina em crianças menores de um ano (desde que não taquicárdicos), em crianças entre 1 a 5 anos que receberam succinilcolina, adolescentes e adultos que recebem a segunda dose de succinilcolina, e nos pacientes com bradicardia antes da intubação. A dose da atropina é 0,02 mg/kg (máximo 1 mg, dose mínima inicial 0,1 mg) 1 a 2 minutos antes da intubação2,3,7-9.

A succinilcolina é um miorrelaxante comumente usado na SRI, que produz fasciculações musculares e paralisia neuromuscular. Para prevenir a fasciculação, que pode ser responsável pelo aumento da pressão intracraniana, utilizar 10% da dose normal de um relaxante muscular não despolarizante, como o pancurônio (0,01 mg/kg), rocurônio (0,01 mg/kg) ou vencurônio (0,01 mg/kg), administrados 1 a 3 minutos antes da dose paralítica da succinilcolina7,22. Recomenda-se administrar esses agentes defasciculantes em pacientes com maior risco de apresentar fasciculações (p.ex.: crianças maiores de cinco anos) 2,7-9.

Compressão cricóidea (manobra de Sellick)

A manobra de Sellick ou o deslocamento posterior da laringe é produzido por uma contínua pressão na cartilagem cricóide. Essa pressão tem dupla função, primeira, o movimento posterior da laringe, permitindo a visualização das cordas vocais e a passagem do tubo endotraqueal, e, segunda, esta pressão obstruiria o esôfago (efeito este que não foi suficientemente demonstrado), prevenindo o refluxo do conteúdo do estômago para a orofaringe. Teoricamente, a oclusão do esôfago reduziria a entrada de ar para o estômago, diminuindo a distensão gástrica, permitindo que mais ar entre na laringe e nos pulmões durante a ventilação com pressão positiva; entretanto, regurgitação passiva e a aspiração podem ocorrer2,7,8.

Outras drogas úteis na pré-medicação

A SRI pressupõe o uso de sedação suficiente para eliminar a sensação de paralisia e diminuir o tônus simpático. Os sedativos devem ser administrados poucos minutos antes do agente paralítico. O sedativo ideal é aquele que induz rapidamente à inconsciência, tem curta duração e efeitos colaterais mínimos. A seleção do sedativo deve ser realizada para cada paciente, levando-se em conta a presença da morbidade associada (hipovolemia, hipotensão, ou hipertensão intracraniana), da idade e das doenças subjacentes5,7,15.

O midazolam, um benzodiazepínico de ação rápida tem potente propriedade amnésica (anterógrada). Quando comparado com outros sedativos na SRI, tem um início de ação relativamente lento. O efeito sedativo está relacionado com a dose (0,3 a 0,5 mg/kg), com a velocidade de infusão, presença de outras drogas sedativas e com a idade. O midazolam produz redução moderada no fluxo sangüíneo cerebral7,9,23. Apesar de ser bem reconhecido, é freqüentemente utilizado em subdoses (média de 0,08 mg/kg ± 0,04), segundo Sagarin e cols.24. Temos utilizado o midazolam na indução da sedação por suas propriedades amnésticas e sedativas. Porém, em pacientes conscientes, sugere-se que um sedativo mais potente seja associado (fentanil, cetamina ou tiopental).

O tiopental é um barbitúrico de curta duração, com rápido início de ação, que reduz a pressão intracraniana e a demanda metabólica e de oxigênio, produzindo um efeito protetor ao sistema nervoso central (importante no paciente com trauma cranioencefálico, estado convulsivo e meningite). Tem a desvantagem de induzir à hipotensão por vasodilatação e à depressão miocárdica. Esses efeitos dependem da dose e da velocidade da infusão, podendo ser fracionados (1 a 3 mg?kg) e utilizados em infusão lenta. Em pacientes conscientes, a dose total oscila entre 2 e 5 mg/kg. Na presença de hipotensão, hipovolemia ou suspeita de choque, o tiopental deve ser evitado ou usado em dose reduzida7,9,12.

A cetamina, um derivado da fenciclidina, é um anestésico dissociativo, caracterizado por produzir rápida sedação, amnésia, analgesia, mantendo os reflexos e a estabilidade cardiorrespiratória. A dose é de 2-4 mg/kg IV e 5-10 mg/kg intramuscular. Melhora a ventilação e diminui o broncoespasmo nos pacientes com asma grave, provavelmente por liberação de catecolaminas. Pode causar depressão miocárdica em pacientes com doença crônica com depleção de catacolaminas. É relativamente contra-indicada em pacientes com hipertensão, lesão cerebral, problemas psiquiátricos, glaucoma. Produz excessiva secreção da via aérea e deve ser usado com o pré-tratamento com atropina1,2,7-9.

O propofol é um indutor anestésico e sedativo, altamente lipofílico, que se distribui rapidamente pelo cérebro, tem início de ação rápida e curta duração (10-15 minutos), sendo uma boa opção para pacientes submetidos à SRI. O propofol diminui a pressão intracraniana e reduz o metabolismo cerebral. Como o tiopental, reduz significativamente a pressão arterial média. Em indução anestésica de pacientes conscientes, visando intubação, a dose tem oscilado entre 1,5 a 3,5 mg/kg, sendo recomendado para crianças maiores que 3 anos7,8.

O etomidato é um sedativo hipnótico não barbitúrico de curta duração. A dose é de 0,2-0,4 mg/kg. Causa menos depressão cardiovascular que os barbitúricos ou o propofol. Há poucos estudos demonstrando a eficácia e a efetividade na intubação endotraqueal, tendo sido aprovado para crianças maiores de dez anos. Assim como outros agentes indutores, o etomidato reduz a pressão intracraniana, diminui o fluxo sangüíneo cerebral e o metabolismo cerebral. Tem efeito mínimo na pressão arterial, e há estudos demonstrando supressão transitória da síntese de cortisol e de aldosterona1,2,7,8.

Como podemos observar, não existe um sedativo ideal aplicável em todas a situações de SRI, devendo as drogas serem selecionadas caso a caso. Após a intubação, sedativos de longa ação devem ser escolhidos (bolos de lorazepam, diazepam e fenobarbital podem ser usados) 2,7.

Paralisia: relaxantes musculares

A paralisia muscular geralmente permite intubação e ventilação mais facilmente. O agente paralítico ideal deve ter um início rápido, duração curta e efeitos colaterais mínimos, e ser reversível; infelizmente, nenhum dos relaxantes disponíveis satisfaz todos estes critérios. Podem ser divididos em duas categorias: despolarizantes e os não despolarizantes2,7,8.

Os relaxantes despolarizantes, representados pela succinilcolina, ligam-se aos receptores pós-sinápticos, resultando em despolarização, levando a um período de excitação repetitiva, resultando em fasciculações musculares transitórias. Estas são seguidas de bloqueio da transmissão neuromuscular e paralisia flácida2,3. Clinicamente, a succinilcolina produz fasciculações com contrações assincrônicas das fibras musculares, que cessam com início da paralisia. A hipercalemia e aumento da pressão intracraniana são dois efeitos adversos secundários ao aumento da atividade muscular. O aumento de potássio é geralmente insignificante, a não ser em crianças que tenham alterações renais pré-existentes2,7-9. A bradicardia também pode ser causada pela succinilcolina, é prevenível pela atropina, e deve ser considerada em todas as crianças abaixo de 5 anos que recebem aquela medicação2,7,8.

A succinilcolina, relaxante muscular preferível na seqüência rápida de intubação, tem início de ação extremamente rápido (paralisia em menos de 1 minuto) e duração de 5 a 10 minutos. A dose utilizada é de 1 a 2 mg/kg/dose1,2,4,20.

A hipertermia maligna é uma reação metabólica potencialmente fatal descrita com uso da succinilcolina e outros agentes anestésicos. Caracterizada por aumento da temperatura acima de 43º C, coagulação intravascular disseminada, acidose metabólica, rabdomiólise e outros problemas fisiológicos relacionados com o calor. A terapia é baseada em medidas agressivas para diminuir temperatura e o uso de dantrolene. É importante verificar a temperatura em crianças submetidas à SRI aproximadamente 10 minutos após a administração de succinilcolina2,7,9.

Os bloqueadores neuromusculares não despolarizantes competem com a acetilcolina pelos receptores pós-sinápticos, porém sem ativá-los, de forma que não induzem a fasciculações. Costumam ter um início mais lento e duração de ação mais longa do que a succinilcolina. Destacamos três bloqueadores neuromusculares não despolarizantes para uso na intubação: rocurônio, atracurium e vecurônio2,7,8.

O rocurônio, relaxante de duração intermediária, é tão efetivo quanto a succinilcolina, e deve ser usado quando há contra-indicações ao uso desta. Produz relaxamento muscular em 30-45 s na dose de 0,6-1,2 mg/kg intravenoso (pode ser usado intramuscular), porém tem duração de 30 a 45 minutos (mais lento em menores que 10 meses). Pode causar taquicardia, e é antagonizada pelo neostigmine e a atropina1,2,7-9,25.

O atracurium é um bloqueador neuromuscular também de duração intermediária, com a vantagem de que a duração do bloqueio neuromuscular não é prolongada por grandes ou repetidas doses, entretanto o atracurium é associado com liberação de histamina. A dose é de 0,4-0,6 mg/kg7,8,20.

O vecurônio também tem sido usado como uma alternativa a succinilcolina na SRI, pois apresenta mínimos efeitos cardiovasculares e não produz liberação de histamina. A dose é de 0,15-0,2 mg/kg, o início de ação é de 30-90 s, porém dura de 90-120 minutos. Tem sido considerado eficaz e sem contra-indicações em pacientes pediátricos. Estudos recentes têm demonstrado a associação entre o uso do vecurônio e miopatia de crianças graves que recebem altas doses de esteróides, mas o mecanismo ainda não está estabelecido. Deve-se usar com cautela em crianças que recebam terapia com esteróides2,7-9.

O pancurônio, um relaxante muscular que apresenta um tempo de duração longo (ao redor de uma hora), é utilizado freqüentemente em terapia intensiva pediátrica, especialmente durante a manutenção em ventilação mecânica e durante o transporte e realização de exames20. Não será discutido neste momento, por ser usado raramente durante a intubação rápida.

Na Tabela 2, apresentamos as drogas mais comumente utilizadas em nosso meio para a intubação de crianças em UTI pediátrica e emergência.

Técnicas de intubação

A via orotraqueal é a via de mais rápida obtenção e requer menor habilidade17, entretanto a escolha da rota a ser utilizada (nasotraqueal ou orotraqueal) é uma escolha individual do médico responsável pelo procedimento. Na literatura, apesar da preferência pela intubação orotraqueal recomendada no Pediatric Advanced Life Support18, não existem provas que demonstrem a superioridade de uma via sobre a outra, que respaldem de maneira fundamentada a escolha. Portanto, um intensivista/emergencista habilitado deve ter conhecimento e prática para a realização de ambas as técnicas, ficando a escolha determinada por situações individuais.

Orotraqueal (Figura 3)

1. Seleção do material apropriado em função das características anatômicas e da doença de base do paciente.

2. Posicionamento adequado (alinhamento do eixo orofaringolaríngeo).

3. Pré-oxigenação a 100% (3-5 minutos).

4. Administração de sedativos/relaxantes musculares.

5. Abertura da cavidade oral e introdução do laringoscópio pelo lado direito da boca.

6. Deslocamento da língua para a esquerda.

7. Se lâmina reta: após a introdução, retirá-la gradualmente até que as cordas vocais tornem-se visíveis (elevação da epiglote pela lâmina).

8. Se lâmina curva: introdução gradual até que a epiglote seja visível e a lâmina inserida na valécula (tração da epiglote pela lâmina).

9. Suave pressão ao nível da cricóide pode ser necessária (Manobra de Sellick), para facilitar a visualização e diminuir o risco de aspiração.

10. Importante manter uma tração ao longo do eixo do corpo do laringoscópio (sem movimentação do punho e apoio no lábio superior).

11. Inserção do tubo à direita da lâmina (não obstruir a concavidade da lâmina).

12. Posicionamento adequado.

13. Fixação.

Complicações: maior dificuldade de fixação (extubação acidental), maior dificuldade na toalete de secreções de orofaringe, obstrução da ventilação por oclusão dentária.

Contra-indicações: oclusão de articulação temporomandibular, processo obstrutivo em cavidade oral.

Nasotraqueal

1. Seleção do material apropriado em função das características anatômicas e da doença de base do paciente.

2. Posicionamento adequado.

3. Toalete e aspiração nasal.

4. Pré-oxigenação a 100% (3-5 minutos).

5. Administração de sedativos/relaxantes musculares.

6. Lubrificação do tubo.

7. Passagem através da narina até a faringe posterior.

8. Abertura da boca e introdução do laringoscópio pelo lado direito da boca.

9. Deslocamento da língua para a esquerda.

10. Se lâmina reta: após a introdução, retirá-la gradualmente até que as cordas vocais tornem-se visíveis (elevação da epiglote pela lâmina).

11. Se lâmina curva: introdução gradual até que a epiglote seja visível e a lâmina inserida na valécula (tração da epiglote pela lâmina).

12. Suave pressão ao nível da cricóide pode ser necessária (Manobra de Sellick) para facilitar a visualização e diminuir o risco de aspiração.

13. Com o laringoscópio posicionado e a laringe visualizada, a ponta do tubo na faringe é conduzida com o auxílio de uma pinça de Magill.

14. A inserção pode ser facilitada, por um assistente, pela narina, após o direcionamento adequado.

15. Posicionamento adequado da cânula.

16. Fixação.

17. Algumas variações da técnica podem ser utilizadas, fazendo uso de uma intubação orotraqueal prévia para assegurar a via aérea, com posterior troca da cânula, assim que o tubo inserido por via nasal seja visualizado na faringe posterior.

Complicações: epistaxe, necrose de asa do nariz, otite média aguda, sinusites.

Contra-indicações: fratura de placa cribiforme, distúrbios de coagulação, obstrução à passagem do tubo por deformidade nasal ou compressão.

Pós-intubação: confirmação da intubação traqueal

A visualização direta do tubo passando pela laringe é a melhor forma de confirmar a intubação. Cuidado com a mobilização da região cervical após a intubação, pois pode deslocar o tubo em até 2,5 cm 2.

Após a intubação, a localização do tubo endotraqueal deve ser confirmada por medidas do exame físico (simetria na expansão e ausculta torácica na linha hemiaxilar), oximetria de pulso e a monitorização do ETCO2. A capnometria contínua é sensível e precoce na indicação de extubação acidental e também pode ser usada para determinar o débito cardíaco e predizer o retorno à circulação espontânea. Em muitos pacientes, a ETCO2 tem correlação com a PaCO2, dispensando análises gasométricas seriadas2,14,21. Por último, é confirmada através da realização do raio X de tórax2,16.

Técnicas especiais de intubação

Existem outras técnicas de intubação traqueal, como a intubação com fibra óptica, guiada por fonte luminosa, retrógrada, entretanto salientaremos duas delas, pela aplicabilidade na sala de emergência e nas UTIs pediátricas.

Máscara laríngea

Consiste de um tubo plástico de silicone, conectado com um ângulo de trinta graus a uma máscara de forma ovalada com um balonete inflável de borracha (Figura 4)2,8,26,27. Após a colocação, a máscara é inflada através de um balão piloto, providenciando uma vedação acima da abertura laríngea. A máscara elíptica ficará com sua extremidade distal obliterando o esfíncter esofágico superior, o dorso em contato com a parede posterior do hipofaringe, os lados de face com a fossa piriforme e a borda superior contra a língua2,8,18,26,28,29. Forma-se, então, uma câmara que tem como teto a máscara laríngea e como única abertura o orifício da laringe.


É indicada em situações de dificuldade da obtenção da via aérea conhecida previamente ou não (material indispensável na sala de emergência), em parada cardiorrespiratória atendida por assistentes de saúde sem habilidade da intubação17, em procedimentos cirúrgicos, tais como da cavidade oral, procedimentos diagnósticos de imagem e fibrobroncoscopia. É utilizada em UTI para controle temporário da via aérea até que se consiga uma via segura. Recentes estudos têm demonstrado que, em pessoas treinadas, sua passagem pode ser mais rápida que o tubo por laringoscopia6,9,14,26,29. O ensino desta técnica deve fazer parte do treinamento médico de emergência5,6,8,27.

A máscara laríngea pode ser colocada utilizando previamente agentes de indução, como o midazolam, o fentanil, o propofol e o thiopental27. A máscara deve ser completamente desinsuflada antes da colocação, aplicar a lubrificação apenas na superfície posterior da máscara, pelo risco de inalação causando obstrução aérea ou tosse. O paciente deve ser colocado na "posição de cheirar", devendo ser mantida esta posição no momento da inserção da máscara. A mandíbula é tracionada para baixo, e a máscara é introduzida na cavidade oral de encontro ao palato duro com o dedo indicador da mão direita. A máscara deve ser guiada ao redor da curvatura da faringe posterior e dentro da hipofaringe mantendo a pressão para cima até a resistência característica ser sentida na ponta da máscara, correspondendo ao esfíncter esofágico superior. O balonete é insuflado com volume de ar adequado segundo cada tamanho (Tabela 3). Com o balonete insuflado, a máscara pode avançar para fora da boca ao redor de 1 cm. A linha preta que percorre toda a extensão do tubo deve estar alinhada com o meio do lábio superior e o espaço entre os dois incisivos centrais2,8,28,30,31.

As causas mais comuns de difícil inserção são: anestesia insuficiente, relaxamento muscular inadequado (espasmo do músculo faríngeo e ou laringoespasmo), falha na flexão adequada do pescoço ou escolha inadequada no tamanho da máscara. Um protetor para mordida normalmente é utilizado para evitar dano ao equipamento ou obstrução da via aérea8,26,28,29.

É contra-indicado principalmente naqueles pacientes com alto risco de aspiração (após ventilação manual, hemorragia digestiva, obesidade) e também quando é necessário pressão inspiratória alta18,27,29.

As complicações são raras (0,15% numa série de 11.000 pacientes), e incluem aspiração gástrica, irritação local, trauma de estruturas da via aérea superior e broncoconstrição27.

Ventilação transtraqueal a jato

Consiste na punção da membrana cricotireóide e inserção de cateter venoso de grande calibre em direção à traquéia, para permitir fornecimento de oxigênio temporariamente, até que se consiga via aérea definitiva2,17,18 (Figura 5). Técnica que também deve ser ensinada para médicos que atuam em emergência e UTIs pediátricas, utilizada quando não se consegue intubar ou ventilar o paciente. Pode ser realizada mais rapidamente que a traqueostomia, e geralmente promove adequada oxigenação e ventilação até que uma via aérea definitiva cirúrgica seja estabelecida14,18.


Insere-se um abocath nº 14 ou 16, através da membrana cricotireóidea, e avançamos até a traquéia. Cuidado ao realizar a ventilação com alta pressão, se o cateter estiver localizado extratraqueal pode resultar em enfisema subcutâneo cervical, promovendo distorção da anatomia cervical. Após a passagem e fixação do cateter, assegurada a conecção com uma fonte de oxigênio, a ventilação pode ser iniciada. A ventilação é efetiva, e a oxigenação ocorre somente se há fornecimento de oxigênio com alta pressão. Também pode ser conectado a uma bolsa auto-inflável8,14. Há relatos de 30% de complicações8,14.

Por fim, gostaríamos de salientar que pode ser mantida a via aérea na maioria das vezes com bolsa-válvula-máscara quando as condições forem adversas32, entretanto, em hospitais, deve ser exigido ambiente propício e profissional habilitado para obter a via aérea de maneira menos traumática e mais efetiva possível.

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  • Endereço para correspondência
    Dr. Jefferson P. Piva
    UTI Pediátrica – Hospital São Lucas da PUCRS
    Av. Ipiranga, 6690 – 5º andar
    CEP 90610-000 – Porto Alegre – RS
    Tel./Fax: (51) 3315.2400
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      29 Mar 2005
    • Data do Fascículo
      Nov 2003
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