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Editorial

A última edição de 2017 marca importantes transformações numa revista cinquentenária como a RAP: o periódico se consolidou como uma revista bilíngue publicada exclusivamente online.

Neste editorial, discuto o que as mudanças adotadas ao longo de 2017 significaram concretamente para a RAP e, principalmente, para a comunidade acadêmica que a revista catalisa na qualidade de potenciais colaboradores, avaliadores e leitores.

Em primeiro lugar, o número de artigos submetidos em outros idiomas e por autores internacionais aumentou substancialmente. Até dezembro de 2017, o quantitativo de artigos submetidos em inglês saltou para 60 trabalhos, e o número de artigos submetidos em espanhol, para 14 trabalhos, totalizando 21,7% do total de trabalhos submetidos à revista. O crescimento é expressivo quando comparado com o ano de 2011, ano em que a RAP recebeu apenas três trabalhos em inglês e espanhol (1% do total dos artigos submetidos).

Mais importante, a revista conseguiu atrair uma comunidade cada vez mais internacional de colaboradores: 48 artigos submetidos foram de autores localizados fora do Brasil, representando 17 países, conforme mostramos no gráfico 1. Os dados demonstram que a revista começa a se estabelecer como um importante periódico para algumas regiões esperadas: Portugal, assim como vários países da América Latina. Língua, mas acima de tudo, fatores institucionais e culturais explicam essa proximidade. Esperemos que eles se traduzam na consolidação de redes de pesquisa que contribuam para o fortalecimento da área de administração pública.

Para percebermos a natureza das mudanças institucionalizadas ao longo de 2017, minha análise deve ser comparada com a apresentada no artigo convidado neste número: Análise do perfil da produção científica da Revista de Administração Pública (RAP) no período 2003-16, de Felipe Smolski, Dionéia Dalcin, Monize Visentini, Joice Bamberg e Juliana Kern. A maioria das dimensões relacionadas com a internacionalização mudou ao longo de 2017, e o artigo também revela modificações relacionadas com outros fatores, como o aumento no número de autores por manuscrito e a maior participação de pesquisadoras do gênero feminino.

Um dado importante diz respeito a uma mudança qualitativa no grau de endogenia institucional dos autores que publicam na RAP. O artigo convidado mensura que a maior parte dos autores brasileiros que publicam na revista é proveniente de instituições públicas, revelando uma mudança substancial nos índices de representatividade institucional. De fato, trabalhos anteriores (ver, por exemplo, Peci e Fornazin, 2017PECI, Alketa; FORNAZIN, Marcelo. The knowledge-building process of public administration research: a comparative perspective between Brazil and North American contexts. International Review of Administrative Sciences, v. 1, p. 1-21, 2016.) indicavam o peso de instituições como a Fundação Getulio Vargas na publicação acadêmica nacional em administração pública e especificamente na RAP. As medidas internas adotadas pela Fundação Getulio Vargas visando diminuir a endogenia das publicações em revistas mantidas pela própria FGV influenciaram essa diminuição de publicações. Gostaria de destacar a importância dessa medida de combate da endogenia institucional, tão presente na nossa área, considerando que boa parte das nossas revistas acadêmicas são mantidas por instituições acadêmicas. Índices altos de endogenia institucional nos autores veiculados numa revista acadêmica indicam que outros trabalhos, talvez de melhor qualidade, fiquem de fora da pauta de publicações.

Gráfico 1
Número de artigos submetidos por país

Para refletirmos as mudanças adotadas ao longo de 2017, reunimos no último número da revista uma série de artigos que ilustram a internacionalização das contribuições. Neste editorial focarei mais a composição do corpo de autores e de instituições que contribuíram para o número, destacando algumas informações importantes.

Portugal emerge não apenas como contexto de origem de boa parte dos autores, mas também como um contexto de pesquisas de campo em trabalhos colaborativos de pesquisadores brasileiros e portugueses, ao exemplo do “Conflitos e ambiguidades de papéis no trabalho de juízes: as percepções de juízes portugueses”, de autoria de Tomas Aquino Guimarães e Adalmir Oliveira Gomes, ambos da Universidade de Brasília, Pedro Miguel Alves Ribeiro Correia, da Universidade de Lisboa, Ines Oliveira e Tânia Piazentin, do Ministério da Justiça de Portugal.

A área de comportamento organizacional no setor público é foco de pesquisa de dois trabalhos de pesquisadores portugueses: “Uso de informações de desempenho por políticos locais: um estudo de campo no contexto português”, de Patrícia Gomes, Maria José Fernandes e João B. Carvalho, e “Diferenças nas percepções dos valores organizacionais dos gestores públicos em Portugal”, de Pedro Miguel Alves Ribeiro Correia e João Abreu de Faria Bilhim. A área de comportamento organizacional também reúne trabalhos de pesquisadores brasileiros, ao exemplo de “Relação do comprometimento organizacional e da satisfação no trabalho de funcionários públicos municipais”, de Suzete Antonieta Lizote, Miguel Angel Verdinelli e Sabrina do Nascimento, e de redes colaborativas de pesquisadores brasileiros e estrangeiros, ao exemplo de “O trabalho e seus sentidos: um estudo com peritos criminais da Polícia Federal”, de autoria de Andrea Leite Rodrigues, Alcides Barrichello, Hélio Arthur Reis Irigaray, Donaldson Resende Soares e Estelle M. Morin, da École des Hautes Études Commerciales, Canadá.

A região da América Latina se faz presente com dois trabalhos representativos de importantes instituições acadêmicas no Uruguai e na Colômbia: “¿Reforma silenciosa del Estado?: proceso político de la ley de Participación Público-Privada en Uruguay”, de Guillermo Fuentes, e “Estrategias de apropiación y desviación de recursos en el Sistema Municipal de Planeación de Santiago de Cali”, de Leonardo Solarte Pasos, Álvaro Pío Gómez Olaya e Luis Felipe Sánchez Arias.

Por fim, pesquisadores brasileiros também contribuem nesta edição com dois trabalhos dedicados a área de saúde pública: “Polarização federativa do SUS nos anos 1990: uma interpretação histórico-institucionalista”, de Assis Mafort Ouverney e Sonia Fleury, e “Implementação da política de saúde pública e seus desafios na era digital”, de Vera Lúcia Peixoto Santos Mendes e Fábio Campos Aguiar.

O trabalho “Ideologias partidárias em 140 caracteres: uso do Twitter pelos parlamentares brasileiros”, de Marcelo Santos Amaral e José Antonio Gomes de Pinho, foi objeto de matéria da BBC Brasil disponível em: <www.bbc.com/portuguese/brasil-39203682>), indicando a relevância do estudo além da academia.

Por fim, Mattia Casula, da Libera Università Internazionale degli Studi Sociali Guido Carli, da Itália, discute atores políticos que determinam políticas públicas e a influência política da novas arenas decisórias no trabalho “Quem governa na governança (local)? Reflexões teóricas e evidências empíricas”. O contexto italiano serve de inspiração empírica aos argumentos teóricos desenvolvidos no decorrer do trabalho.

Além do trabalho anteriormente citado, outro artigo convidado neste número foi elaborado por professor Richard Stillman II, ex-editor da Public Administration Review. O manuscrito foi apresentado no seminário dos 50 anos da RAP “Desafios no campo da administração pública: ensino, profissionalização e pesquisa” e versa sobre o profissionalismo no setor público: um tema transversal que diz respeito à legitimidade do servidor público, mas que se encontra em crise e demanda redefinições no mundo contemporâneo.

Terminamos o ano com mais um workshop, “Trends in Public Administration Research and the Editorial Process”, do professor Bradley Wright, editor da Journal of Public Administration Research and Theory (JPART), School of Public and International Affairs/University of Georgia, realizado na FGV EBAPE no dia 7 de dezembro de 2017.

Finalizo este número desejando boas festas à comunidade da RAP! Conto com a colaboração de cada um de vocês para continuarmos a construir uma comunidade sólida de pesquisas em administração pública ao longo do próximo ano!

Editora-chefe

Alketa Peci

Referência

  • PECI, Alketa; FORNAZIN, Marcelo. The knowledge-building process of public administration research: a comparative perspective between Brazil and North American contexts. International Review of Administrative Sciences, v. 1, p. 1-21, 2016.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Nov-Dec 2017
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