Resumos
O artigo mostra como foi gestada uma teoria do direito natural que, ao mesmo tempo em que serviu para legitimar o Estado moderno sobre as noções de soberania e comunidade internacional, plantou o germe da sua contestação revolucionária pelos seus cidadãos. O texto mostra os primeiros registros dessa contestação interna do Estado moderno na Europa e na América.
Direito natural; Estado moderno ; bem comum
The article shows how the natural law theory at the same time legitimized the modern State, based on the notions of sovereignty and international community, and planted the seeds of his revolutionary contestation by its citizens. The text shows the first records of this internal challenge of the modern State in Europe and America.
Natural right ; modern State ; common good
A outra face da Lua
O politólogo Norberto Bobbio observa que,
(...) por uma longa tradição, que já vem desde o Político de Platão ao Príncipe de Maquiavel (...), os vários autores políticos têm tratado o problema do Estado principalmente do ponto de vista dos governantes (...)[;] a alteração radical, a descoberta da outra face da Lua, até aí escondida, surge no início da Idade Moderna, com a doutrina dos direitos naturais (...).1
De fato, sempre segundo Bobbio, "a outra perspectiva, a sociedade vista de baixo, do ponto de vista dos interesses, das necessidades, dos direitos, dos destinatários dos benefícios"2 do Estado, foi apenas ocasional, da Antiguidade até a Época Moderna.
Parafraseando Norberto Bobbio, visando torná-lo mais preciso e inteligível, sugiro que convém buscar o fundamento histórico da "alteração radical" que ele aponta. Pois a metáfora da "outra face da Lua" acaba por esconder os agentes históricos que desenvolveram a doutrina dos direitos naturais, bem como as suas motivações. A viragem a que se refere Bobbio, eu gostaria de propor aqui, deu-se com os processos de colonização da América e, mesmo, na América. Foi a invenção da América, a outra face do Orbis terrarum, que ensejou um amplo desenvolvimento da teoria medieval dos direitos naturais. A tensão dialética entre o conhecimento ontológico da nova realidade americana e a prática da conquista, que se estendeu por cerca de meio século antes de desembocar na formação histórica e reprodução sistêmica das sociedades coloniais, ensejou uma modificação profunda na maneira de teólogos e juristas europeus conceberem a relação entre Estado e sociedade, bem como entre os Estados. Assim, por exemplo, foi com base nas informações e nas primeiras elaborações teóricas formuladas por viajantes, missionários e administradores coloniais que, desde 1539, o dominicano Francisco de Vitoria desenvolveu as noções de soberania e de comunidade internacional, nas lições seminais que ele proferiu na Universidade de Salamanca sobre a guerra justa contra os índios.
Há uma cronologia que define e circunscreve a Época Moderna, portanto, da assimilação das novidades decorrentes da expansão ultramarina, feita fundamentalmente por meio do direito natural, até a era das revoluções - particularmente a do Haiti, mais significativa do que a da América do norte ou a da França do ponto de vista do governo para o povo, pois ela teve que equacionar a manutenção do direito natural à liberdade almejada por uma revolução de escravos, no contexto extremamente desfavorável do auge do tráfico negreiro.3 De fato, São Domingos representava dois terços do comércio exterior da França e era o maior mercado individual para o tráfico negreiro europeu. Conforme faz notar Cyril James, a partir de agosto de 1791, por meio de uma luta que se estendeu por doze anos, os escravos rebelados derrotaram os brancos locais, os soldados da monarquia francesa, uma invasão espanhola, uma expedição britânica com algo em torno de 60 mil homens e uma expedição francesa de proporções semelhantes, comandada pelo cunhado de Napoleão Bonaparte. Disso resultou o estabelecimento do Estado negro do Haiti em 1803, que permanece até os dias de hoje.4
Não cabe descrever aqui todo o movimento que levou desde a expansão ultramarina à era das revoluções. Limitar-me-ei a demonstrar o principal, isto é, como foi gestada uma teoria do direito natural que, ao mesmo tempo em que serviu para legitimar o Estado moderno sobre as noções de soberania e comunidade internacional, plantou o germe da sua contestação revolucionária pelos seus cidadãos. Para tanto, mostrarei os primeiros registros teóricos dessa contestação interna do Estado moderno desde baixo na América e na Europa.
A moderna teoria tomista do direito natural e suas consequências históricas e políticas
Antes de mais nada, convém precisar, portanto, como era definida a lei natural e, a partir dela, o direito natural e o direito de gentes.
Sintetizando as reelaborações modernas destes conceitos pelos teólogos da segunda escolástica, o jesuíta Francisco Suárez afirmou que a lei natural "é como uma propriedade da natureza", "imanente ao espírito humano, em vista de discernir o que é honesto do que é vergonhoso".5 Ou seja: a lei e o direito naturais são comuns a todos os homens, quaisquer que sejam as suas condições. Todos eles, por meio da razão e da fala, são capazes de inferir e de dizer o justo, diferenciando-o do injusto, e definindo assim o bem comum.6 Nesse sentido, o direito de gentes faz parte do direito natural e é igualmente compartilhado por todos os povos. Nesse sentido, também, a lei natural, inscrita no coração dos homens e reconhecida pela razão, está nitidamente separada da lei humana, pois esta é instaurada pela vontade do soberano.
Essa noção tomista de lei e de direito natural foi a resposta histórica dos teólogos da segunda escolástica para retirar legitimidade à prática predatória dos conquistadores, ao mesmo tempo em que validou juridicamente o processo de formação das sociedades coloniais americanas. Quando Francisco de Vitoria fundamentou no direito natural o "perfeito domínio" das sociedades ameríndias, isto é, a sua soberania, abriu-se a via para a Coroa de Castela contrapor-se aos conquistadores - os quais haviam sido úteis, num primeiro momento, para tomar posse das novas terras, mas em seguida se tornaram concorrentes da Monarquia, ao impedirem a pacificação da terra e se tornarem insubmissos (como foi notório no Peru, onde desencadearam uma guerra civil e mataram o primeiro vice-rei nomeado por Carlos V). Por outro lado, ao afirmar o "perfeito domínio" dos índios, Vitoria abriu igualmente a possibilidade de sua incorporação pacífica e legítima à Monarquia católica, porque voluntária, por meio do "consenso" - segundo a expressão que utiliza. Este último argumento se difundiu até tornar-se hegemônico entre os teólogos que influenciavam as cortes ibéricas: Domingo de Soto, por exemplo, discípulo e sucessor de Vitoria na cátedra de prima na Universidade de Salamanca, falou em "consentimento", enquanto o jesuíta Luís de Molina, professor na Universidade de Évora, usou a expressão "vontade e aprovação", e o jesuíta Francisco Suárez, da Universidade de Coimbra, "consentimento", "pacto e convenção".
Há uma mudança, todavia, entre esses autores, que eu devo fazer notar: todos esses teólogos-juristas mostravam-se estritamente aristotélicos quando insistiam sobre a naturalidade da autoridade política. Nos seu linguajar tomista, afirmavam que Deus não intervinha na instituição política a não ser como "causa remota".7 Para eles, a sociedade política tem como "causa eficiente a livre decisão dos cidadãos": diferentemente dos jusnaturalistas, mais tarde, o "contrato" ainda era compreendido como um ato moral e natural, que se encontra na origem da vida coletiva.8 Por isso, para todos eles, mesmo os ameríndios constituíam comunidades políticas perfeitas.
Mas essa noção de contrato vai se modificando, de Francisco de Vitória, em 1539, até Francisco Suárez, em 1612-13, por meio de uma rearticulação entre direito natural e direito de gentes, que o dominicano ainda situava indistintamente no âmbito estrito da natureza, enquanto o jesuíta fez uma distinção, trazendo o direito de gentes para o âmbito dos costumes:
(...) se é introduzido pelos costumes de todos os povos e os obriga a todos, cremos então que se trata do jus gentium próprio, e que ele difere também do direito natural, porque não se baseia na natureza, mas nos costumes (...).9
Conforme aponta o filósofo e historiador Jean-François Courtine, essa modificação, de Vitoria a Suárez, "impõe repensar com novos esforços a própria ideia de mundo e de sua possível reunificação na escala de um direito de gentes essencialmente consuetudinário, historicizado, e, se se quiser, desnaturalizado".10 Eu acrescentaria ainda, sem hesitar, que ela prepara também a concepção jusnaturalista da fundação do Estado como um ato artificial e voluntário.
Aliás, é notório como os ameríndios serviram de base empírica para Thomas Hobbes e John Locke referenciarem sua especulação sobre o estado de natureza, antes da formação da sociedade e do Estado. Hobbes, por exemplo, referiu os Americani, no Leviathan, como a expressão histórica da máxima de Plauto, lupus est homo homini, non homo:11 "os povos selvagens de muitos lugares da América - escreveu Hobbes - [...] vivem em nossos dias daquela maneira embrutecida".12 Tal não era a interpretação de Francisco de Vitoria, quem afirmou: "vai contra o direito natural que um homem se enfrente, sem algum motivo, a outro homem. Pois o homem não é um lobo para o homem, como disse Plauto, mas um homem".13 Não importa, aqui, a qualificação do ameríndio como bom ou mau selvagem; importa observar que, num caso como no outro, a eles é reconhecido um direito natural. E isso foi fundamental nos desdobramentos da reflexão sobre a questão americana, não apenas no que concerne à ideia de soberania, mas também ao direito de guerra numa comunidade internacional de Estados soberanos.
A resposta do mundo moderno à questão americana apoiou-se extensivamente na teoria tomista sobre um direito natural compartilhado por todos os homens, quaisquer que fossem as suas condições políticas ou religiosas. Ao concederem que os ameríndios possuíam direitos naturais, os teólogos-juristas do século XVI definiram, ao mesmo tempo, os casos em que podia haver guerra justa entre os povos, por desrespeito àqueles direitos - engendrando uma nova ordem espacial global, baseada num direito internacional de gentes que vigorou até o início do século XX.14
Para Vitoria, os sete títulos legítimos para uma guerra justa contra os ameríndios eram o direito de livre comércio, o direito de propagação da fé, o mandato pontifício dado aos espanhóis, o direito de proteção dos índios convertidos ao cristianismo, o direito de livre eleição da soberania espanhola por parte dos índios, o direito de proteção dos aliados e o direito de intervenção contra os tiranos. Com base nos mesmos princípios e direitos, os teólogos-juristas ibéricos legitimaram, igualmente, a conquista de Angola, que se tornou o principal fornecedor de escravos para a América. Nas demais regiões da África, esse direito natural de gentes, que colocava em pé de igualdade cristãos e não cristãos, legitimou também a escravidão tal como ela era praticada entre os africanos, a qual abastecia o tráfico transatlântico.15
Mas, cabe observar ainda, outros dois aspectos da incidência da teoria do direito natural na legitimação do Estado moderno na Europa, quais sejam, os seus desdobramentos na polêmica contra a teoria protestante do príncipe devoto e na legitimação do tiranicídio.
Na sua polêmica contra Jaime I da Inglaterra, Francisco Suárez escreveu que
(...) o povo transferiu seu poder ao príncipe com a condição e obrigação, para ele, de cuidar do Estado e de administrar justiça, e que o príncipe aceitou tanto esse poder quanto sua condição: por esse pacto ficou firme e estável a lei real, ou seja, a lei acerca do poder real. Por conseguinte, os reis recebem este poder não imediatamente de Deus [como afirmavam Lutero e Jaime I], mas do povo.16
Isto é, conforme interpreta Luís Reis Torgal, "(...) o rei recebeu o poder para governar com justiça no sentido do bem-estar social e, por isso, terá de o fazer, sob pena de quebrar o pacto e assim atentar contra o direito natural".17
No contexto subsequente à conspiração da pólvora, imputada aos jesuítas, o livro de Suárez foi condenado e queimado em Londres, por causa da sua legitimação do tiranicídio. Mas, apesar de ser um ataque em regra à teoria luterana da obediência civil irrestrita à autoridade divina do príncipe, o livro de Suárez foi queimado em Paris também por ordem dos teólogos da Sorbonne. Pois o jesuíta acabou atingindo, igualmente, a outra concepção de Estado absoluto, elaborada na França por Jean Bodin.
O jurista francês havia recuperado teses tomadas à tradição regaliana e à polêmica protestante, procurando conciliá-las com a concepção escolástica. Assim, Bodin afirmou que
a autoridade é absoluta e suprema porque não tem outra condição senão obedecer ao que a lei de Deus e a natural mandam (...) [pois,] todos os príncipes da terra estão sujeitos às leis de Deus, e às naturais, e a muitas leis humanas comuns a todos os povos.18
Nesta citação, um simples pronome - "muitas", "muitas leis humanas" - indica, contudo, uma profunda divergência entre Bodin e os teólogos-juristas da segunda escolástica: no contexto das guerras de religião francesas, a teoria da guerra justa derivada do direito natural de gentes assume, em Bodin, um contorno excepcional: "o príncipe não está obrigado ao direito de gentes mais do que aos seus próprios editos".19 Ou seja, para Bodin, o príncipe pode declarar a guerra segundo as razões de Estado e independentemente do direito natural - justamente o que se criticava, particularmente em França, na conquista espanhola da América. Ora, para os autores da segunda escolástica, não poderia haver exceção ao direito natural.
A reflexão sobre a relação entre Estado e sociedade centrada nos direitos naturais fazia assim o seu caminho desde a América até as universidades e cortes ibéricas e, logo em seguida, por meio dos seus teólogos-juristas, opunha-se tanto aos luteranos da Europa do norte como aos galicanos - encontrando a sua expressão mais radical na legitimação do tiranicídio por uma assembleia popular, em Sobre o rei e a instituição real, livro publicado em 1599 pelo jesuíta Juan de Mariana (igualmente condenado pela Sorbonne e queimado em praça pública pelo Parlamento de Paris). Ou seja, com Juan de Mariana, já encontramos "a outra face da Lua" de que falava Norberto Bobbio, isto é, "a outra perspectiva, a sociedade vista de baixo", sempre com base na doutrina dos direitos naturais, mesmo que justificada, ainda, por motivos fundamentalmente religiosos.
Ciceroniano na forma e na doutrina, Mariana entregou-se inteiramente ao seu pendor humanista nesta obra, incorporando ademais o ponto de vista pedagógico que deu origem ao livro e, particularmente, o anátema clássico do tirano. De fato, para o jesuíta, o príncipe encontra limites categóricos a sua vontade pessoal e não pode subtrair-se às leis, pois responde aos três poderes que lhe são superiores: a autoridade divina, o pudor e a honestidade que regram os atos humanos (i. e., a lei moral), e a opinião dos cidadãos, cuja autoridade imperativa e proibitiva deve sempre prevalecer. Vê-se, no entanto, como Mariana encontra o mesmo limite que se manifesta em todos os demais autores da segunda escolástica, até mesmo no Las Casas do De Regia Potestate: ele não concede a tolerância religiosa e faz mesmo da religião um critério de participação na comunidade política. Conforme demonstrarei mais adiante, este limite será ultrapassado na América, recolhendo e redinamizando a tradição humanista republicana que não podia se desenvolver nem em ambiente católico nem em ambiente calvinista. Na América, o imperativo natural será suficiente para fazer a crítica da tirania do monarca, bem como dos seus agentes intermediários e, inclusive, dos religiosos. Na América, bastará o discurso moral sobre as virtudes, que é do âmbito das leis naturais.
Incorporar "aqueles"
Até aqui, mostrei como a noção tomista de direito natural foi mobilizada para explicar os fundamentos jurídicos da formação e reprodução das sociedades, aplicando-a desde a América até as Europas católica e protestante, passando pela África, onde a escravidão - por guerra justa ou resgate - e o tráfico negreiro eram justificados e legitimados também com base no direito natural de gentes. Mencionei, igualmente, a abrangência temporal em que vigorou a noção moderna de direito natural, desde a conquista da América até a era das revoluções. Cabe, agora, precisar a causa e o momento primeiros em que irrompeu o conceito de direito natural como categoria explicativa daqueles processos históricos na Época Moderna, tornando-se hegemônico a ponto de servir de fundamento jurídico para a formação das sociedades coloniais americanas - que é o ponto específico que interessa neste artigo.
A primeira manifestação da grande ruptura catalisada pela questão americana pode ser percebida na xilografia Zenit Nostro e Zenit di Quelli, atribuída a Johann Froschauer, que ilustra a Lettera, carta de Amerigo Vespucci a Piero Soderini também conhecida como Mundus Novus, na edição de Augsburg, 1505c. É notável, na imagem, como o zênite - que define o lugar dos homens no mundo e define o mundo a partir dos homens - tornou-se relativo.
Conforme escreveu Vespucci:
de Lisboa, de onde partimos, a uma distância de 39 graus e meio da linha equinocial, nós navegamos cinquenta graus para além dessa linha; os quais, somados, fazem cerca de 90 graus, número que representa a quarta parte do grande círculo, segundo a judiciosa maneira de contar que nos legaram os antigos: é manifesto, portanto, que nossa viagem cobriu um quarto do mundo. (...) para que se compreenda melhor, a linha vertical que, quando estamos em pé, desce desde um ponto do céu situado no zênite de nossa cabeça até ela, desce, para eles, de flanco. Assim, nós fazemos uma linha direita e eles uma linha oblíqua, e então surge a figura de um triângulo retângulo, de cujas linhas nós temos a vertical e eles a linha de base, enquanto a hipotenusa vai da nossa cabeça à deles, como se vê na figura.20
Vespucci ainda resistia, atribuindo aos europeus a linha vertical e direita. Mas, assim como teve que admitir que, inegavelmente, existia um Novo Mundo além do Orbis terrarum - "eu vi, nesse hemisfério, coisas que contradizem as razões dos filósofos",21 podemos ler na mesma carta -, ele admitiu também, consequentemente, que havia outro zênite. São, portanto, duas linhas, dois eixos: o "nosso" e o "daqueles".
A xilogravura Zenit Nostro e Zenit di Quelli contrasta fortemente com as imagens que integram o incunábulo Ymago mundi, do cardeal Pierre d'Ailly - e eu empresto-as propositadamente de um exemplar que pertenceu a Cristóvão Colombo.22
Nas três imagens que apresento, é evidente a existência de um único eixo. A primeira "figura" - como a chama Pierre d'Ailly - representa as nove esferas celestes, com a Terra fixa ao centro, a qual define o referido eixo a partir dos seus polos, ártico e antártico. A segunda "representa a órbita da Lua".23 Aqui, sempre segundo Pierre d'Ailly, "uma parte da terra que é menos pesada que as outras se eleva e, em uma grande porção, não está coberta de água, para que seja habitável".24 Esta parte emersa é o Orbis terrarum. A terceira figura, enfim, representa "a divisão da terra em três partes"25 - Europa, Ásia e África.
Essa representação do mundo foi definitivamente desequilibrada a partir das expedições de Colombo (mesmo que ele acreditasse ter chegado à Ásia, no outro lado do Orbis terrarum) e, em seguida, Ojeda, Guerra e Niño, Yáñez Pinzón, Lepe, Vélez de Mendoza, Amerigo Vespucci e Rodrigo Bastidas: o conjunto dessas expedições, realizadas na virada do século XV para o XVI, revelou "uma nova realidade natural e moral", como se disse à época, isto é, uma nova realidade física e humana, que rompia a antiga simetria do mundo, pois havia outra terra emersa, e ela se encontrava fora do eixo.
O Novo Mundo interrogava ainda os europeus sobre a origem dos seus habitantes. Da genealogia bíblica às teorias raciais do século XVIII, um amplo arsenal de teorias e hipóteses foi mobilizado, ao longo da época moderna, no debate sobre a unidade da humanidade: os índios seriam também descendentes de Adão? De Cam? Dos hebreus? Dos tártaros? Teriam vindo eles de Atlântida? De Ofir? De Cartago? Ou a humanidade não seria una, tendo várias origens? Ou, ainda, os índios nem seriam homens, mas animais com aspecto semelhante ao dos homens? Todas essas teorias foram seriamente consideradas e defendidas.26
Em suma: o desafio colocado aos europeus, por eles mesmos, foi o de tentar incorporar o Novo Mundo e seus habitantes a sua antiga ordem religiosa e política. O que se fez por meio da conjunção entre missão e colonização, justificada no âmbito da segunda escolástica por meio de um desenvolvimento da teoria do direito natural.
Foi somente com a decadência dos impérios ibéricos que franceses e ingleses conseguiram contrapor outro direito, fundamentalmente eurocêntrico, baseado nos conceitos de descoberta e ocupação - os quais pressupunham a negação dos direitos naturais antes concedidos aos ameríndios.27 Até lá, tudo o que se conjecturou em termos jurídicos, incluindo a teoria do mare liberumdesenvolvida por Hugo Grotius em favor dos Países Baixos, remeteu à teoria do direito natural. Portugal e Espanha, respaldados pela Igreja romana, tinham de fato se adiantado às demais nações, não apenas nas navegações, conquistas e consequentes empreendimentos coloniais, mas também na definição dos fundamentos jurídicos da incorporação dos ameríndios no processo de formação das sociedades coloniais americanas.
Eu insisto nesta palavra, incorporar, porque este era o princípio de organização da República na península ibérica. Segundo as Partidas - corpo normativo redigido no reino de Castela em meados do século XIII, e logo traduzido para o português, tendo sido mais tarde introduzido na América espanhola e portuguesa28 - "chama-se Povo à reunião de todos os homens em comum, os grandes, os medíocres e os pequenos" através do princípio da "incorporação dos corpos constituídos". Cada corpo é uma universitas, ou, nos termos empregados mais tarde por Francisco Suárez, uma comunidade perfeita ordenada segundo o direito e autossuficiente. Na Recopilação de leis das Índias Ocidentais,29 em 1680, tais corpos são explicitamente discriminados: são confrarias, ordens religiosas, hospitais, magistrados municipais, guildas profissionais, colégios e universidades, cada uma com suas regras próprias, as quais definem suas missões e seus modos de governo específicos. Ao Estado monárquico, cabeça deste corpo compósito, cabia harmonizar cada universitas através do direito civil, com vistas ao bem comum e à salvação dos homens.30
Na Recopilação das leis dos reinos de Índias, encontramos igualmente discriminadas as diferentes formas de incorporação dos ameríndios: pueblos, encomiendas, repartimientos, corregimientos, reducciones etc. Entre todas elas, havia, entretanto, um elemento comum: a regulamentação de formas variadas de trabalho compulsório, mesmo o índio sendo declarado livre.
A justificativa jurídica do trabalho compulsório de índios livres sobrevém após os fracassos notórios das missões franciscanas e dominicanas na América de colonização espanhola e dos primeiros experimentos missionários empreendidos pelos jesuítas na América portuguesa, igualmente infrutíferos. Em dois escritos fundamentais de autoria do jesuíta Manoel da Nóbrega, o Diálogo sobre a conversão do gentio e uma carta redigida em maio de 1558, encontramos o mesmo argumento que será retomado, em seguida, pelo seu correligionário José de Acosta, no Peru e, a partir dali, difundido no México e demais regiões do Império espanhol: para aqueles povos bárbaros seria preciso primeiramente discipliná-los por meio do trabalho; o trabalho seria o meio para incutir neles a disciplina e, por meio dela, as noções básicas de civilidade que constituíam, por sua vez, a condição necessária para tornar perene o trabalho catequético que até então não tinha rendido frutos.31
A instituição das formas reguladoras da atividade econômica dos indígenas incorporados à sociedade colonial suscitou uma abundante literatura na América espanhola e na Espanha, a qual girou em torno de alguns conceitos centrais: principalmente a distinção entre "tutela, servidão natural e servidão civil", entre "domínio direto e domínio útil", ou, entre "faculdade e direito sobre algo, em benefício próprio, e a mera posse, com direito ao uso e usufruto".
Toda essa discussão não foi estranha aos processos vividos na América portuguesa. Ao contrário: a redução jesuíta, que encontrou sua maior expressão no Paraguai, no início do século XVIII, foi fruto de experimentos bem-sucedidos no Peru, diretamente inspirados no aldeamento jesuíta português, desenvolvido por Manuel da Nóbrega em São Paulo desde meados do século XVI. Mesmo em Baçaim e Chorão, na Índia, desenvolveu-se um sistema semelhante ao aldeamento paulista.32 Por sua vez, o aldeamento jesuíta português sintetizava uma série de aspectos das formas de incorporação adotadas anteriormente na América espanhola: como na encomienda, o indígena encontrava-se sob tutela com vistas à sua catequização; como no repartimiento, o trabalho do indígena era compulsório; como nos pueblos, o aldeamento gozava de uma jurisdição própria.
Mais ainda: do ponto de vista do programa arquitetônico das reduções, um modelo também se reproduziu amplamente nos impérios português e espanhol. Nele, podemos distinguir claramente os espaços dedicados ao culto, ao trabalho e à moradia. O microcosmo que compreendia a missão continha percursos comuns a todos os índios, mas também percursos iniciáticos restritos ou mesmo interditos - conforme o sexo, a idade, a posição social do indivíduo e a sua formação religiosa. O programa arquitetônico previa etapas sucessivas de incorporação que deveriam ser cumpridas pelo indígena: do trabalho disciplinado nos campos à conduta moral dentro das moradias e à conversão, que culminava no acesso à igreja e demais espaços restritos. O partido arquitetônico das reduções separou espacialmente aquelas esferas da atividade humana (trabalho, moradia e culto), reintegrando-as numa ordem sacramental, diferente, portanto, daquela praticada pelo índio antes do contato com os missionários. Do aba guaipí, como era designado em guarani o homem mandado, ao aprendiz de um ofício e ao coroinha; do pagão ao neófito e ao convertido, há uma escala e mesmo um trajeto, ordenado a partir do eixo que estrutura o espaço do aldeamento ou redução, desde os campos, no entorno da missão, atravessando a avenida principal que dá acesso às residências, até atingir a praça e a igreja.
O modelo adota, de fato, uma configuração axial, com a igreja, colégio, residência dos padres e demais espaços restritos ao fundo de uma avenida de entrada, ápice da hierarquia definida por este mesmo eixo - conforme podemos observar nessas três imagens produzidas no século XVIII, representando respectivamente as missões de São João Batista, São Miguel e Candelária.
As variações que podemos encontrar, conforme também se pode ver nessas imagens, nunca interferem na estrutura da trama urbana; de modo que o partido arquitetônico pôde ser sintetizado pelo padre José Cardiel numa planta modelar.
O núcleo frontal, que reúne as funções religiosas, tem sempre a igreja ao centro. Aqui, o que pode variar é a disposição espacial dos demais elementos situados em torno da igreja, quais sejam o colégio, a residência dos jesuítas e o cemitério. Já as residências de índios só variavam em quantidade, conforme o tamanho da população da redução, crescendo ou diminuindo nas outras três direções, apenas.33
Na transição do índio selvagem ao índio civilizado e cristão, as normas jurídicas que ordenavam as práticas sociais no espaço da redução não eram propriamente leis civis, mas leis canônicas e, sobretudo, leis naturais. Como determinava Manoel da Nóbrega, aliás, desde 1558:
A lei que lhes hão de dar é defender-lhes comer carne humana e guerrear sem licença do Governador; fazer-lhes ter uma só mulher; vestirem-se, pois têm muito algodão, ao menos depois de cristãos; tirar-lhes os feiticeiros; mantê-los em justiça entre si e para com os cristãos; fazê-los viver quietos sem se mudarem para outra parte, se não for para entre cristãos, tendo terras repartidas que lhes bastem e com estes Padres da Companhia para os doutrinarem.34
Esse eixo jurídico, é fundamental notar, teve validade durante todo o período colonial, incluindo as reformas pombalinas e bourbônicas. Pois a Igreja, como o Estado, repôs incessantemente a distância entre o índio e o vassalo cristão durante todo o período colonial,35 à semelhança do paradoxo de Zenão sobre a corrida entre Aquiles e a tartaruga.
Quanto àqueles índios que resistiram à missão e à colonização, eles não deixaram de ser incorporados, ainda que a sua revelia, pois se tornavam alvos de guerras justas determinadas pelo direito natural de gentes: toda a margem dos impérios ibéricos na América tornou-se assim um imenso repositório de mão-de-obra escrava legítima, recrutada entre caribes, araucanos, mindanaos, chichimecas, apaches, aimorés etc.
A complementaridade entre esses dois espaços - os aldeamentos de índios e as zonas de guerra justa - os reduz a um único espaço colonial, hierarquizado e em expansão. Assim deve ser interpretada a política indigenista portuguesa, desde a primeira lei promulgada por dom Sebastião em 1570, que discriminava os índios livres dos que podiam ser reduzidos legitimamente à escravidão a partir de uma linha traçada com base no direito natural:
(...) hei por bem e quero que aqueles contra quem eu não mandar fazer guerra vivam em qualquer das ditas partes em que estiverem em sua liberdade natural, como homens livres que são, sem poderem ser como cativos constrangidos a coisa alguma, e querendo os moradores das ditas partes do Brasil servir-se deles, lhes pagarão seu serviço e trabalho como a homens livres (...).36
O resultado dessa política foi que o Brasil não se tornou "um novo Portugal",37 como pretendia o jesuíta Fernão Cardim, no final do século XVI. A sociedade colonial era uma "sociedade nova", porquanto tinha características distintas da sociedade metropolitana: abaixo dos lavradores pobres, incorporavam-se novas camadas de índios livres, porém tutelados, e de escravos, indistintamente chamados "negros", fossem eles ameríndios ou africanos. Dessa maneira, essa sociedade deveria governar-se por meio de leis peculiares, porque peculiar também era a própria noção de bem comum, no contexto colonial e escravista.38
As tensões geradas entre os agentes colonizadores para definir a linha que deveria separar o índio livre do índio escravo motivou os jesuítas a intervirem diretamente no governo da colônia, após desqualificarem os moradores e muitos administradores como "maus cristãos" movidos pela cobiça. Por um lado, respaldados pelos teólogos das universidades de Coimbra e Évora e pela sua proximidade com os reis de Portugal, de quem seguidamente foram confessores, eles influenciaram diretamente a definição da política indigenista, fazendo adotar o direito natural como eixo discriminador das situações de guerra justa e resgate de escravos. Por outro lado, provocaram a reunião de uma junta no Brasil, composta pelo governador geral, o bispo e os principais jesuítas, em 1584, na qual se determinou que os missionários assumissem o governo espiritual e temporal dos aldeamentos reais.39 Essa decisão foi confirmada por uma lei real três anos mais tarde e, em seguida, por sucessivas outras leis até o final do século XVII - isto é, até a época da descoberta de metais preciosos. Isso significou que, por cerca de quase um século e meio, os jesuítas tiveram o controle exclusivo dos índios incorporados nos aldeamentos reais (sem mencionar aqueles de suas fazendas, bastante numerosos). E cabe notar que essa população indígena era expressiva, no final do século XVII: em torno de 200 mil indivíduos, no total, quando a população negra ainda somava apenas 150 mil.40
Em resumo: uma legislação indigenista baseada num único eixo definido pelo direito natural e aplicada, por um lado, a um espaço colonial em expansão, distinguindo índios livres e escravos, e, por outro lado, ao espaço reducional, associada a um programa arquitetônico, foi o meio encontrado para reduzir a um só a multiplicidade de eixos e de realidades morais identificada inicialmente por Vespucci.
"A sociedade vista de baixo"
As políticas indigenistas portuguesa e espanhola e os privilégios outorgados aos espaços missionários foram constantemente contestados pelos colonos. É interessante observar que eles aceitaram, contudo, as suas premissas teóricas. De modo que, quando procuraram redefinir o bem comum, fizeram-no sempre com base no direito natural. Como em São Paulo em 1612, quando afirmaram "que eram homens pobres" que necessitavam do trabalho dos índios "para fazerem seus mantimentos para comer", mas que os índios aldeados "não reconheciam senão os padres [da Companhia de Jesus] por seus superiores. E os ditos padres, dizendo publicamente que as ditas Aldeias eram suas, porque eram Senhores no temporal e no espiritual", desordenavam a República e a hierarquia social, impedindo a realização do "bem comum". Nesse sentido, aos oficiais da Câmara e ao povo ali reunido, "lhes parecia justo que recobrassem sua antiga posse e bom governo, pondo capitães nas aldeias".41
Não pretendo aprofundar a posição dos moradores sobre este problema, que já tratei em outro lugar.42 Prefiro mostrar a contestação do Estado desde mais baixo, do ponto de vista dos índios. Pois, para além dos arcabuzes e dos cavalos, os ameríndios tiveram que aprender a manipular também as categorias jurídicas em vigor na sociedade colonial para poder enfrentar um oponente que lhes aparecia nitidamente superior.
Na América espanhola, cabe citar Felipe Guamán Poma de Ayala. Este membro da nobreza incaica redefiniu o bem comum numa longa carta dirigida a Felipe III de Espanha, redigida em castelhano, quéchua e aymara, entre 1600 e 1615.43 Intitulada Nova crônica e bom governo, ela divide-se em duas partes: na primeira parte, a "crônica", Guamán Poma faz muitas denúncias, a partir da narrativa dos eventos ocorridos desde o governo de Francisco de Toledo (1569-1581) e o Terceiro Concilio de Lima (1582-1583) - o que corresponde ao período de formação da sociedade colonial peruana após a conquista. Na segunda parte, sobre o "bom governo", faz propostas visando ao bem comum. Aqui, seu argumento central concerne à restituição das terras e da soberania aos senhores naturais dos Andes. Pois, segundo Guamán Poma, os encomenderos não tinham direito algum sobre os índios, nem às suas posses, pois eles não haviam sido conquistados em uma guerra justa. O que ele concedia, reescrevendo o episódio de Tumbes em 1532, é que Martin Malque de Ayala, embaixador do imperador inca Huáscar, oferecera voluntariamente a soberania do Peru ao embaixador de Carlos V, Francisco Pizarro. Portanto, não teria havido conquista militar.
Quando Guamán Poma pediu a restituição do Império incaico, sua posição era semelhante à do inca Garcilaso de La Vega:
Eu quero confiar mais em nossa razão e direito do que em nossas armas e potência. (...) Vamos lá armados do justo pedido; esperamos mais na retidão dos que temos por deuses do que em nossas diligências, que se são verdadeiros filhos do Sol, como acreditamos, farão como os Incas: devolverão nosso Império, pois nossos pais, os Reis passados, nunca usurparam os domínios que conquistaram, por mais rebeldes que fossem seus curacas. Nós não o temos sido; pelo contrário, todo o Império se rendeu sinceramente.44
Vê-se como Guamán Poma e Garcilaso incorporaram o discurso tomista sobre a razão e o direito naturais, bem como os conceitos derivados de bem comum, soberania, guerra justa e restituição.
Para eles, ademais, a cristianização dos índios era necessária para a sua completa incorporação à Monarquia espanhola. Mas essa incorporação era pensada em termos diferentes, comparativamente aos teólogos-juristas ibéricos. O modelo de monarquia proposto por Guamán Poma e Garcilaso era o Tahuantinsuyo, o Império inca: quatro regiões governadas pelo imperador por meio de subalternos - nomeadamente, para Guamán Poma: um filho seu na América, um príncipe negro na Guiné, o rei dos cristãos em Roma, e o rei dos mouros no Oriente. "Todo mundo é de Deus - ele escreveu -, Castela dos espanhóis, as Índias dos índios e Guiné dos negros".45
Guamán Poma e Garcilaso não concebiam o império como uma soberania única e indivisa, portanto, à maneira de Jean Bodin - cuja obra, aliás, Garcilaso conhecia bem.46 Ao contrário: eles pensavam-no a partir do princípio da complementaridade entre as partes, que constituiu o fundamento da autoridade inca, isto é a reciprocidade entre as regiões e etnias do império e o próprio Estado, por meio da redistribuição dos bens.47 A partir de Coricancha - o templo do Sol e centro cerimonial de Cuzco que organizava o espaço político e religioso de todo o império inca - ele se dividia em duas metades: a noroeste, na região chamada hannan, localizavam-se as origens e funções estatais; a sudeste, na região chamada hurin, as origens e funções familiares; no centro, a criação, a procriação e a regeneração.
Conforme Garcilaso de la Vega,
Esta divisão da cidade não foi para que os de uma metade se avantajassem sobre os da outra metade em exceções e preeminências, senão para que todos fossem iguais como irmãos, filhos de um pai e de uma mãe.48
Tal divisão de espaço também organizava o Mapa-múndi do reino das Índias desenhado por Guamán Poma.
Aqui, não há um eixo único; ao contrário, são vários eixos, e nenhum deles é vertical:
-
há um esquema organizacional principal baseado na dualidade hanan/hurin, definido pela diagonal que separa noroeste e sudeste;
-
outra diagonal completa a divisão do império em quatro regiões (Chinchaysuyo, Antisuyo, Collasuyo e Cuntisuyo);
-
finalmente, a partir do centro - que não é Roma, nem Jerusalém, nem mesmo Lima, mas Cuzco - a quadripartição do império se completa na divisão em cinco partes;
-
As linhas verticais e horizontais apenas simulam latitudes e longitudes, sem nenhuma precisão cartográfica.
Mesmo na escala universal, Guamán Poma transformou a convenção geográfica europeia e cartografou o mundo a partir do mesmo esquema quadripartido a partir de um núcleo central: o reino de Castela no centro, Roma a oeste, a Turquia ao norte, as Índias a leste e a Guiné ao sul49 - uma disposição das partes no espaço bastante estranha, denotando a desordem que justificava, afinal, a sua carta.
Em Guamán Poma, também a ordem temporal andina reinterpreta a europeia: as cinco idades da cosmogonia inca (Huari Viracocha, Huari, Purun, Auca, Inca) são assimiladas a cinco eras bíblicas (Adão, Noé, Abraão, Davi, Jesus Cristo), mas incorporando o conceito de pachacuti - isto é, a noção de derrocada ou revolução, tanto do mundo quanto do tempo. "Com umaesperança quase messiânica, [Guamán Poma] esperava uma revolução final (uma outra pachacuti) pela qual o rei da Espanha - garante, como o Inca, da ordem universal - endireitaria novamente o mundo".50
Mesmo considerando sua cosmogonia fundamentalmente andina, Guamán Poma aspirou, contudo, a uma pachacuti que teria como resultado - aspecto extremamente significativo para o meu argumento - o império da lei e do direito natural!
Conforme ele historia, todos, espanhóis e índios, foram idólatras e gentios.51 Mas os índios souberam guardar os mandamentos e boas obras de misericórdia de Deus, e os espanhóis não.52 Os índios eram verdadeiros cristãos, enquanto os espanhóis se tornaram bárbaros.53 Há uma retórica de vícios e virtudes que estrutura toda a sua crônica e que contradiz o projeto político espanhol de realização do bem comum na América. A lógica dos direitos naturais leva-o a exigir a restituição das terras e da soberania dos índios, que se tornariam apenas vassalos tributários do rei de Castela. Os dois reinos deveriam ser estritamente segregados, a ligação entre as duas sociedades sendo garantida exclusivamente pelos curacas. Pois, o pior subproduto da colonização, segundo Guamán Poma, era a mestiçagem - da qual, do ponto de vista ideológico, ele próprio era, no entanto, uma expressão evidente, conforme transparece nas suas reivindicações, inteiramente baseadas numa retórica das virtudes cristãs e nos direitos naturais, de acordo com os preceitos tomistas.
A reivindicação de restituição da liberdade natural e da autonomia política dos senhores naturais indígenas feita por Guamán Poma, em contraposição à tirania dos agentes intermediários da administração espanhola, demonstra ainda outro ponto central do meu argumento, qual seja, como a teoria dos direitos naturais, tal como foi recebida na América, redinamizou a tradição republicana humanista. Pois a liberdade ou autogoverno político das cidades do reino das Índias reivindicada por Guamán Poma pode ser legitimamente equiparada àquela das behetrías na Espanha e das demais cidades livres da Europa.
Para a área tupi-guarani, de colonização predominantemente portuguesa, faltam fontes, pois a voz daqueles índios sempre foi traduzida e colocada por escrito, sobretudo pelos missionários jesuítas. É preciso, portanto, lê-los muito cuidadosamente.
Proponho, aqui, o discurso do "índio apóstata" Potiravá - reproduzido pelo padre Juan Bautista Ferrufino numa "informação jurídica" sobre a morte do padre Roque González e seus companheiros - em que aquele índio teria incitado o cacique Ñezú a matar os padres jesuítas da missão de Yjuí com os seguintes argumentos:
Por ventura foi outro o patrimônio que nos deixaram [nossos pais] senão nossa liberdade? A mesma natureza que nos eximiu do agravo da servidão alheia, não nos fez livres ainda de servir vinculados a um sítio por mais que o escolha nosso livre-arbítrio? (...) Por que consentes (...) [com] este dissimulado cativeiro das reduções [jesuíticas] de que nos desobrigou a natureza? Não teme que esses que se chamam pais dissimulem por esse título a sua ambição e logo façam escravos vis os que agora chamam filhos queridos? (...) Quem duvida que os que agora introduzem divindades desconhecidas, amanhã, com o império secreto que dá o ensinamento dos homens, introduzam novas leis ou nos vendam infamemente onde seja castigo de nossa incredulidade um intolerável cativeiro? (...) e que, com uma lei estrangeira e horrível, derroguem as que recebemos de nossos antepassados? E que se deixem, em favor dos vãos ritos cristãos, os de nossos oráculos divinos, e pela adoração de um pedaço de pau, a de nossos verdadeiros deuses? (...) se agora não o desvias com a morte desses traiçoeiros tiranos, forjarás tuas prisões do ferro de tua própria tolerância.54
Potiravá, personagem provavelmente fictícia construída como "índio apóstata", tem assim uma liberdade que o seu próprio criador, o padre Ferrufino, não poderia ter (e, como apontei antes, tampouco tinha Juan de Mariana): isto é, reivindicar os direitos naturais sem os limites impostos pela lei divina cristã. Com mais liberdade até que Guamán Poma e Garcilaso, Potiravá podia exigir a restituição da liberdade dos índios e da soberania das suas nações, com base exclusivamente no seu direito natural e nos seus costumes. Todos os três americanos, diretamente influenciados pelo pensamento da segunda escolástica e especificamente pela noção de direito natural, encontram assim as formulações mais radicais dos dominicanos Melchor Cano e Juan de La Peña (ambos sucessores de Vitoria e Soto na cátedra de prima em Salamanca), e de Bartolomé de Las Casas e Francisco Suárez que, a seu tempo, criticaram a conquista e proclamaram os direitos de guerra justa dos pagãos contra os cristãos.
Conclusão
A esta altura, e para concluir, cabe voltar a Norberto Bobbio, com quem iniciei essa reflexão sobre os fundamentos jurídicos da formação das sociedades coloniais americanas e seu impacto no pensamento político ocidental:
Em toda a reflexão política, pelo menos desde a Revolução Francesa, a mudança mais significativa foi a que teve a ver com a ideia de "transformação", no sentido do livro V da Política aristotélica, isto é, da passagem de uma forma de governo para outra. Considerada geralmente essa passagem como um mal (conclusão lógica de uma doutrina política que durante séculos pregou e exaltou a estabilidade e considerou a guerra civil como o pior dos males), [ela] acaba por conquistar um valor positivo, por parte dos movimentos revolucionários, que veem na transformação o início de uma nova era. Mas, justamente, a guerra civil representava a crise do Estado vista ex parte principis, e a revolução, interpretada positivamente, representou a crise do Estado, vista ex parte populis.55
Na primeira Época Moderna, período que abordei neste artigo, a valorização da estabilidade ainda era hegemônica. Como podemos ler, por exemplo, na peça Sir Thomas More, em que colaborou William Shakespeare. Numa das passagens comprovadamente escrita com a sua letra, pode-se ler o seguinte discurso atribuído a Thomas More:
Ensinastes que a insolência e a intransigência devem prevalecer, que a ordem pode ser desafiada - e desse modo nenhum de vós vivereis até a velhice, porque outros brutos, segundo seus próprios caprichos, suas próprias mãos, suas próprias razões e seu próprio direito vos farão de vítimas, e homens como peixes vorazes se devorarão uns aos outros.56
Qual seja o fundamento onde se assenta esta "ordem", Shakespeare designou-o com muita precisão numa fala de Ulisses, dirigindo-se a Agamenon, em Tróilo e Créssida:
[...] quando em nociva mistura os astros andam, desordenadamente, que de pragas, portentos, que desordens, terremotos, que agitações dos ventos e das ondas, transmutações, catástrofes, horrores, fendem, abalam, desarreigam, tiram, quase, dos próprios gonzos a unidade e a calma consorciada dos Estados! Quando abalada fica a hierarquia, que é a própria escada para os altos planos, periclita a obra toda. Como podem ter estabilidade duradoura os degraus das escolas, os Estados, os membros das corporações, o tráfico pacífico entre praias afastadas, os direitos do berço e nascimento, de primogenitura, os privilégios da idade, louros, cetros e coroas, se a desfazer-se viesse a hierarquia? Tirai a hierarquia; dissonante deixai só essa corda, e vede a grande discórdia que se segue! As coisas todas cairão logo em conflito; as fortes ondas, contidas até então em seus limites, o seio elevarão além das praias, a papa reduzindo a terra firme; sobre a fraqueza dominará a força; o rude filho ao pai tirará a vida; a força será direito; o justo e o injusto - cuja tensão contínua, equilibrada sempre é pela justiça - acabariam perdendo o nome, como também esta. Todas as coisas no poder se abrigam; o poder, na vontade, que se abriga, por sua vez, na cobiça. Ora, a cobiça, esse lobo de todos, tendo o apoio redobrado da força e da vontade, transforma logo em presa o mundo todo, para a si mesmo devorar por último. Grande Agamenon, sufocada que seja a hierarquia, segue-se o caos ao seu abafamento.57
Na América, essa concepção da ordenação hierárquica da sociedade se traduziu de maneira mais crua e violenta, por meio da defesa e imposição do trabalho compulsório dos ameríndios. Para o dominicano Domingos de Betanzos, por exemplo, "é necessário que na República, para ser bem ordenada e sustentada, haja nela pessoas valorosas e poderosas e ricas, e cavaleiros e nobres, porque estes são os ossos sobre os quais se sustenta a República (...)". Tal é também o parecer dos demais dominicanos, no México, em 1544:
Na República bem ordenada, deve haver homens ricos, para resistir aos inimigos e para que os pobres da terra possam viver sob a sua proteção (...) é um grande erro pensar que todas as pessoas devam ser iguais (...).58
Na Europa, como na América, a hierarquia é o eixo que estrutura a sociedade. Porque, conforme justifica o princípio aristotélico retomado pelos teólogos da segunda escolástica, a ordem natural é hierárquica. Nem Guamán Poma, nem Garcilaso de La Vega, educados nessa tradição, negavam isso.
Na Europa, como na América, mas também na ilha de Utopia, situada por Thomas More entre esses dois continentes, refletindo diretamente a sua realidade histórica concreta, mas também servindo de modelo para ambos (tanto é que o bispo de Michoacán e ouvidor da Real Audiência do México, Vasco de Quiroga, tentou colocar o modelo utopiano em prática na América). Em Utopia, as leis civis prescindiam da função mediadora da lei natural e impunham diretamente a escravidão para quem negasse a existência da divina providência; dessa maneira, os cidadãos de Utopia excluíam da comunidade os descrentes, considerados inaptos para participar da política. Na Utopia, como na América, os cristãos que viviam como gentios (como foram seguidamente retratados os paulistas, por exemplo), e os gentios que recusavam a ordem colonial e cristã, eram agentes do caos, causadores da falta de ordem resultante da insubmissão à hierarquia cujo eixo era determinado pelas leis das monarquias católicas: as leis civis que discriminavam o delito e as leis canônicas que discriminavam o pecado; e, de fato, ambos os códigos legais previam a pena de exclusão da comunidade política.
Aqui reside o limite do pensamento escolástico que pretendeu incorporar os ameríndios à ordem civil e religiosa europeia: os ameríndios foram formalmente declarados "verdadeiros homens" na bula Veritas ipsa 59 e, menos de dois anos mais tarde, na Lição sobre os índios que Francisco de Vitoria pronunciou em Salamanca. Todavia, a bula foi suspensa no ano seguinte, ao passo que, para Vitoria, nenhum índio atingia plenamente a condição de zoon politikon. Para Manuel da Nóbrega, que foi aluno de Vitoria, os índios possuíam as três potencialidades da alma - memória, entendimento e vontade - e isto confirmava sua condição humana. Mas estas faculdades encontravam-se corrompidas por seus usos e costumes ancestrais que impediam que a luz natural da razão os conduzisse a adotar um comportamento constante, civilizado e condizente com as leis naturais. Desde as suas primeiras cartas, estes índios passaram rapidamente de pardos a negros, de inocentes a adversários, de convertíveis a rebeldes, e esta desqualificação jamais foi revista.
Observe-se, nesse sentido, que, para Aristóteles "o homem é um animal social e político" (pois, segundo Norberto Bobbio, "em politikon estava incluído, sem diferenciação, o atual duplo significado de 'social' e político'").60 Também para são Tomás de Aquino "o homem é por natureza um animal social e político".61 Mas, para Vitoria e os demais teólogos da segunda escolástica, "o homem é um animal social"62 que só se torna político ao fundar a comunidade política ou o Estado. A tutela que a Coroa e os religiosos pretenderam exercer sobre os ameríndios na América espanhola e portuguesa advinha desta avaliação, conforme a opinião de Vitoria, segundo a qual eles "não são capazes de fundar ou administrar uma República legítima e ordenada dentro de limites humanos e políticos".
É esta desqualificação que Guamán Poma e Garcilaso de La Vega recusaram e, mais ainda, supostamente, Potiravá. A recusa desta hierarquia poderia causar uma "transformação", em sentido aristotélico. As transformações que vieram, bem mais tarde, contudo, não lhes trouxeram ainda nem a restituição da soberania que lhes seria justa, nem tampouco a restituição da antiga ordem. O que pode explicar que tenham renascido, desde então, às vezes com muita força, as aspirações por uma pachacuti, no espaço andino, ou pela Terra sem mal, entre os descendentes tupi-guarani.
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-
1
BOBBIO, Norberto. Estado. In: Enciclopédia Einaudi. Lisboa: Imprensa Nacional / Casa da Moeda, 1989, vol. 14, p. 222, itálicos meus.
-
2
Idem.
-
3
Segundo Cyril James, esta foi "a única revolta de escravos bem sucedida da História". JAMES, Cyril. Os jacobinos negros. Toussaint L'Ouverture e a Revolução de São Domingos. São Paulo: Boitempo Editorial, 2000, p. 15 (Por coincidência, foi no Haiti que ocorreu a primeira denúncia contra a escravização de índios em 1511 pelo dominicano António de Montesinos).
-
4
Idem, p. 15.
-
5
SUÁREZ, Francisco. De legibus, 1612, I, III, 9.
-
6
ARISTÓTELES. Política, 1253a.
-
7
SUÁREZ, Francisco. Defensio fidei, 1613, III, 2, 2.
-
8
COURTINE, Jean-François. Nature et empire de la loi. Études suaréziennes. Paris: Vrin/ EHESS, 1999, p. 60.
-
9
SUÁREZ, Francisco. De legibus. 1612, II, XIX, 6.
-
10
COURTINE, Jean-François, op. cit., p. 161.
-
11
Asinaria, II, 4, v. 495.
-
12
HOBBES, Thomas. Leviatã. São Paulo: Abril, 1974 [1651], p. 80. John Locke escreveu, semelhantemente que "no princípio, o mundo inteiro era a América", referindo-se a um tempo em que não havia um "consentimento dos homens" quanto ao "uso e o valor do dinheiro" como regulador das relações sociais. LOCKE, John. Segundo tratado sobre o governo. In: Dois tratados sobre o governo. São Paulo: Martins Fontes, 1998 [1690], § 49, p. 427.
-
13
VITORIA, Francisco de. Relectio de Indis, III: "Contra ius naturale est, ut homo hominem sine aliqua causa aversetur, non enim 'homini homo lupus est', ut ait Ovidius, sed homo". Vitoria troca Plauto por Ovídio. Em sentido semelhante escreve Michel de Montaigne (Les Essais, I, 31, Des cannibales): "Esses povos não me parecem, pois, merecer o qualificativo de selvagens somente por não terem sido senão muito pouco modificados pela ingerência do espírito humano e não haverem quase nada perdido de sua simplicidade primitiva. As leis da natureza, não ainda pervertida pela imisção dos nossos, regem-nos até agora e mantiveram-se tão puras que lamento por vezes não as tenha o nosso mundo conhecido antes, quando havia homens capazes de apreciá-las". MONTAIGNE, Michel de. Dos canibais. In: Ensaios, I, 31. Tradução de Sérgio Milliet. São Paulo: Abril Cultural, 1972, p. 106. (Coleção Os Pensadores, vol. XI)
-
14
SCHMITT, Carl. Le nomos de la Terre dans le droit des gens du Jus Publicum Europaeum. Paris: PUF, 2001, p. 102-126.
-
15
ZERON, Carlos. Linha de fé. A Companhia de Jesus e a escravidão no processo de formação da sociedade colonial (Brasil, séculos XVI e XVII). São Paulo: Edusp, 2011.
-
16
SUÁREZ, Francisco. Defensio fidei, 1613, III, II, 12.
-
17
TORGAL, Luís Reis. Ideologia política e teoria do Estado na Restauração. Coimbra: Biblioteca Geral da Universidade, 1982, vol. II, p. 17.
-
18
BODIN, Jean. Los seis libros de la República. Madri: Centro de Estudios Constitucionales, 1992 [1576], p. 273-4 (itálico meu). A justiça é o fim da lei, conforme ao direito natural. Mas, "não é correto confundir a lei e o contrato, porque a lei depende do que tem a suprema autoridade, que pode obrigar a todos os súditos, mas não pode obrigar a si mesmo; ao passo que o contrato é natural entre o Príncipe e os súditos, obrigando às duas partes reciprocamente e uma não pode transgredir com prejuízo e sem consentimento da outra". Idem, p. 278.
-
19
Ibidem, p. 301.
-
20
VESPUCCI, Amerigo. Le Nouveau Monde. In: VESPUCCI, Amerigo; ANGHIERA, Pierre Martyr d'; COLOMB, Christophe. Le Monde Nouveau. Paris: Les Belles Lettres, 1992, p. 81-82.
-
21
Idem, p. 73.
-
22
Editado em Louvain, em 1483; conservado, atualmente, na Biblioteca Colombina de Sevilla.
-
23
AILLY, Pierre d'. Ymago mundi y otros opúsculos. Madri: Servicio de Publicaciones de la Universidad de Sevilla; Sociedad Quinto Centenario; Alianza editorial, 1992, p. 10-11.
-
24
Idem, p. 10.
-
25
Ibidem, p. 16-17.
-
26
GLIOZZI, Giuliano. Adamo e il Nuovo Mondo. La nascita dell'antropologia come ideologia coloniale: dalle genealogie bibliche alle teorie razziali (1500-1700). Florença: Nuova Italia editrice, 1977.
-
27
SCHMITT, Carl. Le nomos de la Terre, op. cit.
-
28
SERRÃO, Joel (dir.). Dicionário de história de Portugal. Lisboa: Iniciativas editoriais, s.d., vol. 1, p. 49.
-
29
http://www.congreso.gob.pe/ntley/LeyIndiaP.htm.
-
30
LEMPÉRIÈRE, Annick. Entre Dieu et le roi, la République. México, XVIe-XIXe siècles. Paris: Les Belles Lettres, 2004, p. 12.
-
31
ZERON, Carlos. Linha de fé, op. cit.
-
32
MARCOCCI, Giuseppe. L'invenzione di un impero. Politica e cultura nel mondo portoghese (1450-1600). Roma: Carocci editore, 2011, p. 119. XAVIER, Ângela Barreto. A invenção de Goa. Poder imperial e conversões culturais nos séculos XVI-XVII. Lisboa: Imprensa de Ciências Sociais, 2008, p. 299.
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33
GUTIERREZ, Ramón. As missões jesuíticas dos Guaranis. Rio de Janeiro: Unesco, 1987, p. 24.
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34
Carta de Manuel da Nóbrega a Miguel de Torres (Bahia, 8 de maio de 1558). In: Monumenta Brasiliae. Roma: Monumenta Historica Societatis Iesu, 1957-1968, vol. 2, p. 450.
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35
ESTENSSORO FUCHS, Juan Carlos. O símio de Deus. In: NOVAES, Adauto. A outra margem do Ocidente. São Paulo: Companhia da Letras & Minc-Funarte, 1999, p. 181-200.
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36
Lei sobre se não poderem cativar os gentios das partes do Brasil, e viverem em sua liberdade, salvo no caso declarado na dita lei (11 de novembro de 1595). Apud THOMAS, Georg. Política indigenista dos portugueses no Brasil: 1500-1640. São Paulo: Loyola, 1982, p. 224.
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37
CARDIM, Fernão. Tratados da terra e gente do Brasil. Belo Horizonte: Itatiaia; São Paulo: Edusp, 1980, p. 174.
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38
ZERON, Carlos. A construção de uma ordem colonial nas margens americanas do Império português: discussões sobre o "bem comum" na disputa de moradores e jesuítas pela administração dos índios (séculos XVI-XVIII). Tese de livre-docência, FFLCH, São Paulo, 2010.
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39
Archivum Romanum Socitatis Iesu, lus. 68, f. 343 e bras. 15, f. 388r-v, § 40.
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40
MARCÍLIO, Maria Luíza. A população do Brasil colonial. In: BETHELL, Leslie. História da América Latina, vol II: América Latina colonial. 2ª edição. Tradução de Maria Clara Cescato. São Paulo: Edusp; Brasília: Fundação Alexandre Gusmão, 1998, p. 311-338.
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41
Actas da Câmara da Villa de São Paulo. São Paulo: Archivo Municipal de São Paulo, 1915, vol. 2. Publicado igualmente em RIHGB, t. 12, p. 8-33.
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42
ZERON, Carlos. A construção de uma ordem colonial nas margens americanas do Império português, op. cit.
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43
O manuscrito, aparentemente, nunca chegou às mãos do monarca espanhol, tendo sido conservado na Real Biblioteca da Dinamarca desde a década de 1660, e só tornada pública em 1908.
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44
GARCILASO DE LA VEGA, El Inca. Historia general del Perú. Córdoba: por la viuda de Andres Barrera, 1617, lib. II, cap. XI, p. 138.
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45
GUAMÁN POMA DE AYALA, Felipe. Nueva crónica y buen gobierno (1615-1616). México: Fondo de Cultura Económica, 2005, p. 755 (f. 915/929).
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46
CHOY, Emilio. Antropología e Historia . Lima: U.N.M.S.M., 1985, vol. 2, p. 20-21.
-
47
MURRA, John. El mundo andino. Población, medio ambiente y economía. Lima: IEP/Pontificia Universidad Católica del Perú, 2002.
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48
GARCILASO DE LA VEGA, El Inca. Comentarios reales. México: Porrúa, 2006, lib. I, cap. XVI, p. 39.
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49
WACHTEL, Nathan. Os índios e a conquista espanhola. In: BETHELL, Leslie. História da América Latina. São Paulo: Edusp/ Brasília: Fundação Alexandre Gusmão, 1998, vol. 1, p. 226-227.
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50
Idem, p. 227.
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51
GUAMÁN POMA DE AYALA, Felipe. Nueva crónica y buen gobierno, op. cit., p. 750-1.
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52
Idem, p.753.
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53
Ibidem, p.758.
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54
Relación del P. [Juan Bautista] Ferrufino al rey (1629). In: Testimonios, cartas y manifiestos indígenas (desde la conquista hasta comienzos del siglo XX). Selección, prólogo, notas, glosario y bibliografía de Martin Lienhard. Caracas: Biblioteca Ayacucho, 1992, p. 328.
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55
BOBBIO, Norberto. Estado, op. cit, p. 223.
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56
Apud. GREENBLATT, Stephen. Como Shakespeare se tornou Shakespeare. São Paulo: Companhia das Letras, 2012, p. 268.
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57
SHAKESPEARE, William. The complete works of William Shakespeare. The Cambridge text established by John Dover Wilson. Cambridge: Cambridge University Press, 1966. Ato I, cena 3. "Degree", no original, foi traduzido como hierarquia.
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58
ZAVALA, Silvio. Ensayos sobre la colonización española en América. México: Porrúa, 1978, p. 95 e 96, respectivamente.
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59
America pontificia. Primi sæculi evangelizationis, 1493-1592. Documenta pontificia ex registris et minutis præsertim in Archivo Secreto Vaticano existentibus. Edição de Josef Metzler. Vaticano: Libreria editrice Vaticana, 1991, p. 364-366.
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60
ARISTÓTELES. Política, 1253a. BOBBIO, Noberto, op. cit., p. 220.
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61
TOMÁS DE AQUINO. De regno sive de regimine principum ad Regem Cypri.In: Petite somme politique. Anthologie de textes politiques. Paris: Pierre Téqui éditeur, 1997, p. 43.
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62
MARIANA, Juan de. De rege et regis institutione (1599). Madri: Centro de Estudios Constitucionales, 1981, p. 24 e 25.
Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
Jan-Jun 2014
Histórico
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Recebido
27 Set 2013 -
Aceito
19 Fev 2014