Resumos
Três lotes de vacinas contra o sarampo, produzidos com a cepa de vírus Biken CAM-70, sob as formas liofilizada e reconstituída, pertencentes ao estoque da rede de vacinação da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo, Brasil, foram submetidos a testes de sensibilidade à luz, à temperatura de 2 a 8°C, e de termoestabilidade (protegidos da luz) às temperaturas de 28, 36,5 e 45°C, objetivando verificar por quanto tempo retinham sua potência, isto é, a concentração ideal recomendada para a cepa de vírus presente (3,70 log 10 DICT50 ou 5.000 doses infectantes de cultura de tecidos 50% por dose). A análise de retas de regressão ajustadas demonstrou que, de modo geral, tanto os lotes de vacinas liofilizados como os reconstituídos, mantidos às referidas temperaturas, expostos ou protegidos da luz, apresentaram queda de potência no decorrer do experimento, a qual foi mais acentuada para vacinas expostas à luz. Reconstituídos e mantidos a 2 a 8°C, os lotes não apresentaram homogeneidade no referente à sensibilidade à luz. Quando a fotossensibilidade de lotes de vacinas liofilizadas foi testada a 2 a 8°C eles mostraram-se mais sensíveis à degradação térmica quando expostos à luz do que quando protegidos dela. Entretanto, expostos ou protegidos, a potência foi inferior à minima aceita para a cepa Biken CAM-70. Às demais temperaturas, mesmo ao abrigo da luz, os dois lotes não retiveram potência mínima. Quanto às vacinas do lote 3, conservadas a 2 a 8°C, mantiveram-se de acordo com os requerimentos mínimos de potência durante 60 dias quando protegidas da luz, e durante 40 dias quando expostas a ela. A degradação térmica às demais temperaturas foi mais acentuada (28°C: 5 dias; 36,5°C: 2 dias; 45°C: 0,5 dia). Considerando a concentração viral mínima que vacinas produzidas com a cepa Biken CAM-70 devem conter para induzir efetiva resposta imunológica, os lotes de vacinas pesquisados (sob a forma liofilizada ou reconstituídos para administração) apresentaram, além de baixa estabilidade ao calor, pouca homogeneidade com relação a este parâmetro.
Vacina contra sarampo; Estudos de avaliação; Fotossensibilidade; Termoestabilidade
Three different lots of measles vaccines produced with the Biken CAM-70 virus strain were requested from the central cold store of the Public Health Department of the State of S. Paulo, Brazil, and assays on photosensitivity at 2-8° C, and on stability at 28, 36.5 and 45° C were carried out to find out for how long these vaccines would maintain their minimum potency, established as being 3.70 log10 or 5000 TCID50 (50% tissue culture infective dose ) per human dose. The analysis of the adjusted straight regression lines indicated that, with the passage of time, the potency of lyophilized or reconstituted vaccines, as well as of vaccines exposed to or protected from light decreased. Light-exposed vaccines, however, became less potent than vaccines protected from the light. None of the vaccine lots studied, reconstituted and stored at 2-8° C, exhibited homogeneity as to sensitivity to light. When freeze-dried vaccines had their photosensitivity studied at 2-8° C, lots 1 and 2 presented greater thermal degradation when exposed to light than when protected from it. However, in both instances, it was found that potency fell bellow that taken as minimum for the Biken CAM-70 virus strain. At all other temperatures considered, even when protected from light, lots 1 and 2 did not retain the minimum potency. Lot 3 kept the expected stability for 60 days at 2-8° C when protected from light and for 40 days when unprotected, but its thermal degradation at other temperatures was more intense (28° C: 5 days; 36.5° C: 2 days; 45° C: 0.5 day). Taking into account the potency that measles vaccines produced with the Biken CAM-70 virus strain are required to contain in order to induce effective immunity, the three vaccine lots studied were found to possess low thermal stability and to lack homogeneity both in the freeze-dried as well as in the reconstituted form.
Measles vaccine; Evaluation studies; Photosensitivity; Thermal stability
ARTIGO ORIGINAL
Fotossensibilidade e termoestabilidade de vacinas contra o sarampo (cepa Biken CAM-70) liofilizadas e/ou reconstituídas para administração
Photosensitivity and stability of freeze-dried and reconstituted (Biken CAM-70) strain measles vaccines
Edda de RizzoI; Carlos Alberto de Bragança PereiraII; Francisco Liauw Woe FangI; Célia Sayoko TakataI; Elisabeth Christina Nunes TenórioI; Michel Marie PralI; Inácio França MendesI; Neuza Maria Frazati GallinaI
ISeção de Cultura de Tecidos e Controle do Serviço de Virologia do Instituto Butantan. Av. Vital Brasil, 1.500 05504 São Paulo, SP Brasil
IIDepartamento de Estatística do Instituto de Matemática e Estatística da Universidade de São Paulo. Av. do Matão, 1.010 Cidade Universitária 05508 São Paulo, SP Brasil
RESUMO
Três lotes de vacinas contra o sarampo, produzidos com a cepa de vírus Biken CAM-70, sob as formas liofilizada e reconstituída, pertencentes ao estoque da rede de vacinação da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo, Brasil, foram submetidos a testes de sensibilidade à luz, à temperatura de 2 a 8°C, e de termoestabilidade (protegidos da luz) às temperaturas de 28, 36,5 e 45°C, objetivando verificar por quanto tempo retinham sua potência, isto é, a concentração ideal recomendada para a cepa de vírus presente (3,70 log 10 DICT50 ou 5.000 doses infectantes de cultura de tecidos 50% por dose). A análise de retas de regressão ajustadas demonstrou que, de modo geral, tanto os lotes de vacinas liofilizados como os reconstituídos, mantidos às referidas temperaturas, expostos ou protegidos da luz, apresentaram queda de potência no decorrer do experimento, a qual foi mais acentuada para vacinas expostas à luz. Reconstituídos e mantidos a 2 a 8°C, os lotes não apresentaram homogeneidade no referente à sensibilidade à luz. Quando a fotossensibilidade de lotes de vacinas liofilizadas foi testada a 2 a 8°C eles mostraram-se mais sensíveis à degradação térmica quando expostos à luz do que quando protegidos dela. Entretanto, expostos ou protegidos, a potência foi inferior à minima aceita para a cepa Biken CAM-70. Às demais temperaturas, mesmo ao abrigo da luz, os dois lotes não retiveram potência mínima. Quanto às vacinas do lote 3, conservadas a 2 a 8°C, mantiveram-se de acordo com os requerimentos mínimos de potência durante 60 dias quando protegidas da luz, e durante 40 dias quando expostas a ela. A degradação térmica às demais temperaturas foi mais acentuada (28°C: 5 dias; 36,5°C: 2 dias; 45°C: 0,5 dia). Considerando a concentração viral mínima que vacinas produzidas com a cepa Biken CAM-70 devem conter para induzir efetiva resposta imunológica, os lotes de vacinas pesquisados (sob a forma liofilizada ou reconstituídos para administração) apresentaram, além de baixa estabilidade ao calor, pouca homogeneidade com relação a este parâmetro.
Descritores: Vacina contra sarampo, normas. Estudos de avaliação. Fotossensibilidade. Termoestabilidade
ABSTRACT
Three different lots of measles vaccines produced with the Biken CAM-70 virus strain were requested from the central cold store of the Public Health Department of the State of S. Paulo, Brazil, and assays on photosensitivity at 2-8° C, and on stability at 28, 36.5 and 45° C were carried out to find out for how long these vaccines would maintain their minimum potency, established as being 3.70 log10 or 5000 TCID50 (50% tissue culture infective dose ) per human dose. The analysis of the adjusted straight regression lines indicated that, with the passage of time, the potency of lyophilized or reconstituted vaccines, as well as of vaccines exposed to or protected from light decreased. Light-exposed vaccines, however, became less potent than vaccines protected from the light. None of the vaccine lots studied, reconstituted and stored at 2-8° C, exhibited homogeneity as to sensitivity to light. When freeze-dried vaccines had their photosensitivity studied at 2-8° C, lots 1 and 2 presented greater thermal degradation when exposed to light than when protected from it. However, in both instances, it was found that potency fell bellow that taken as minimum for the Biken CAM-70 virus strain. At all other temperatures considered, even when protected from light, lots 1 and 2 did not retain the minimum potency. Lot 3 kept the expected stability for 60 days at 2-8° C when protected from light and for 40 days when unprotected, but its thermal degradation at other temperatures was more intense (28° C: 5 days; 36.5° C: 2 days; 45° C: 0.5 day). Taking into account the potency that measles vaccines produced with the Biken CAM-70 virus strain are required to contain in order to induce effective immunity, the three vaccine lots studied were found to possess low thermal stability and to lack homogeneity both in the freeze-dried as well as in the reconstituted form.
Keywords: Measles vaccine, standards. Evaluation studies. Photosensitivity. Thermal stability.
INTRODUÇÃO
Vacinações contra o sarampo tornam-se eficazes quando realizam a cobertura da faixa etária alvo pela administração de vacinas que apresentam a potência mínima requerida, isto é, uma concentração de vírus vacinal suficiente para estabelecer infeccão nos indivíduos suscetíveis, desencadeando uma resposta imune. Da averiguação do título ou potência das vacinas antes de sua administração em nível local, pela Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo, incumbiu-se o Instituto Butantan, que passou a monitorar a potência do imunobiológico destinado ao Estado, desde 197619.
A preservação da vacina contra o sarampo depende de estocagem em baixas temperaturas e demanda a existência de uma cadeia de frio confiável para sua conservação16, pois o vírus é termolábil2,9. A vacina é mantida sob refrigeração, tanto quando está sob a forma liofilizada, como quando reconstituída para uso, a fim de evitar a inativação pelo calor, que é atribuída ao rompimento de configurações atômicas específicas que determinam a perda da atividade biológica12. Além disso, considerando que podem ocorrer problemas de transporte, erros humanos, falhas de sistemas mecânicos, falta parcial, total, ou deficiência na cadeia de frio durante o transporte e a estocagem, é importante que o estabilizador usado na preservação do vírus da vacina realmente proporcione estabilidade ao produto15.
Devido à fotossensibilidade do vírus do sarampo, a vacina também deve ser mantida ao abrigo da luz4,14. Enquanto liofilizada, os centros de vacinação a mantêm protegida da luz, à temperatura de 2 a 8o18 ou 4 a 8°C17. Após a reconstituição, o frasco é envolvido em papel alumínio, permanecendo na geladeira durante o período de trabalho diário dos centros (7 a 8h). O fato de a luz .interna do equipamento e/ou do meio ambiente incidirem sobre a vacina reconstituída toda vez que a geladeira é aberta ou que o frasco é retirado dela para administração, sempre suscitou dúvidas quanto à inativação de partículas virais, da qual poderia resultar a perda de sua eficácia. Como referências relativas à quantificação deste efeito são raras ou de caráter geral, na literatura, decidiu-se estudar este assunto, objeto do presente artigo. Assim, utilizando vacinas contra o sarampo produzidas com a cepa de vírus Biken CAM-70, foram quantificadas: a) a fotoinativação determinada pela incidência da luz de uma lâmpada de iluminação interna de geladeira sobre vacinas contra o sarampo reconstituídas para uso, mantidas a 2 a 8°C, visando a estabelecer as condições necessárias para que a fotoinativação as coloque fora do padrão de potência recomendado pelo laboratório produtor; b) a termoestabilidade apresentada por vacinas reconstituídas para uso, conservadas a 28, 36,5 e 45°C, protegidas da luz; c) a fotossensibilidade apresentada por vacinas liofilizadas, estocadas às temperaturas de 2 a 8°C (protegidas e expostas à luz), e sua termoestabilidade a 28,36,5 e 45°C (protegidas da luz).
MATERIAL E MÉTODOS
Vacinas contra o sarampo Foram testados três lotes de vacinas vivas, atenuadas contra o sarampo, produzidos com a cepa de vírus Biken CAM-70, com prazos de validade respectivamente de abril/ 86, junho/87 e junho/87, cedidas pela Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo e pertencentes ao estoque de uso normal de sua rede de vacinação. As vacinas (5 doses), envasadas em frascos tipo ampola, brancos, apresentavam um ano de validade e sua conservação fora feita a -20°C. No laboratório, os lotes foram codificados como 1, 2 e 3, e tiveram sua potência inicial determinada.
Fotoinativação de vacinas reconstituídas, durante estocagem a 2 a 8°C Frascos de vacinas reconstituídas com seu próprio diluente foram estocados em geladeira com temperatura regulada para 2 a 8°C, permanecendo por 7h sob a ação da luz branca emitida por uma lâmpada de 40 watts, localizada a 40cm de distância dos frascos. O tempo de exposição foi escolhido por corresponder ao turno de trabalho dos centros de vacinação do Estado. Como controle, número idêntico de frascos de vacinas reconstituídas foi mantido na mesma geladeira, mas protegido da luz da lâmpada. Imediatamente após a reconstituição, considerada como hora zero, e a intervalos regulares (1, 2, 3, 4, 5, 6 e 7h), alíquotas dos dois grupos de vacinas (submetidas à ação da luz e protegidas dela) foram retiradas (ocasião em que sobre elas também incidiu luz do ambiente) e tituladas.
Termoestabilidade de vacinas reconstituídas Embora algumas vezes sejam realizados testes de estabilidade a 2 a 8,20 a 25 e 36 a 38°C 15, os testes de que trata o presente artigo adotaram as temperaturas de 28, 36,5 e 45°C. A amostragem foi realizada à hora zero, aos 15 e aos 30 min, e de 1 a 7h 1,3 dependendo da temperatura considerada. Como a potência é mais afetada em temperaturas mais elevadas, os intervalos de tempo mais curtos (15 e 30 min) se referem aos testes a 45°C. A incubação aos níveis de temperatura mencionados foi possível pela utilização de banhos-maria providos de termostatos que apresentavam variação máxima de 0,5oC1.
Termoestabilidade de vacinas liofilizadas Vacinas liofilizadas pertencentes aos lotes 1, 2 e 3 foram estocadas a 2 a 8°C (continuamente expostas e/ou protegidas da luz), e a 28, 36,5 e 45°C (protegidas da luz). As vacinas foram reconstituídas e tituladas nos seguintes prazos: 2 a 8°C: 0-240 dias; 28°C: 0-32 dias; 36,5°C: 0-11 dias; 45°C: 0-48h.
Células Células Vero mantidas em Eagle MEM6 contendo 0,17% de NaHCO3,10% de soro de vitela22 e 25 µg de Neomicina/ml, foram utilizadas nos testes de potência, realizados pelo método de tubos múltiplos. Após a inoculação, o soro foi reduzido para 2% e a concentração de NaHCO3 aumentada para 0,22%.
Teste de potência Obedecendo aos intervalos de tempo já mencionados, a alíquota retirada de cada grupo de vacinas foi diluída ao décimo em Eagle MEM. Tubos confluentes de células Vero foram inoculados com 0,5 ml de cada diluição (oito tubos por diluição). Após permanecerem a 36,5°C por 60 min para adsorção do vírus, cada tubo recebeu 1,5 ml de Eagle MEM contendo 0,22% de NaHCO3/ 2% de soro de vitela e 25 µg de Neomicina/ml. Cada teste teve a duração de sete dias, com leituras do efeito citopático feitas no 4o e 7o dias. Todas as titulações foram feitas em duplicata. Os títulos foram calculados pelo método de Reed & Müench20 e expressos em DICT50 (doses infectantes de cultura de tecidos 50%) por dose de 0,5ml.
Vírus sarampo-padrão Em todas as titulações foi incluído um vírus sarampo-padrão, lote trabalho, para observação da constância da potência relativa do vírus.
Análise estatística O método estatístico utilizado foi o da análise de retas de regressão. O modelo considerado foi o de ajuste de retas de regressão com diferentes inclinações para diferentes tratamentos, e iguais interceptos, quando se tratava do mesmo lote de vacina 5. As conclusões sugeridas são baseadas em retas ajustadas que, na verdade, representam a expectativa para lotes de vacinas do mesmo tipo e não somente para um lote específico. Daí a razão do aparecimento nas tabelas, algumas vezes, de valores iniciais superiores aos encontrados nas figuras.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Os lotes de vacinas contra o sarampo, sobre os quais versam o presente artigo, apresentaram os seguintes títulos iniciais (hora zero do teste), expressos em log10 DICT50 por dose de 0,5 ml: lote 1: 3,90; lote 2:3,84; lote 3:4,35.
Fotossensibilidade de Vacinas Reconstituídas A potência apresentada pelos lotes de vacinas que após a reconstituição ficaram sob a ação da luz durante sete horas, à temperatura de 2 a 8°C, é apresentada na Fig. 1, assim como a das vacinas controle, que permaneceram protegidas da luz pelo mesmo período de tempo. Ô experimento visou estabelecer o tempo de retenção da potência mínima pelas vacinas reconstituídas e refrigeradas à temperatura de 2 a 8°C.
As retas de regressão ajustadas, dessa Figura, indicam que os lotes reconstituídos apresentaram potência inicial próxima daquela que é considerada mínima para a cepa Biken 10,17 (exceto o lote 3), e que esta potência decresceu com o decorrer das horas21, quer estivessem mantidos expostos ou protegidos da luz.
O comportamento dos três lotes não foi uniforme quando, após a reconstituição, foram estocados a 2 a 8°C, expostos e/ou protegidos da luz. O lote 1 foi o que apresentou maior fotossensibilidade, pois, exposto à luz, teve desempenho insatisfatório, deixando de apresentar a potência mínima após 1,5h. Os lotes 2 e 3 foram pouco afetados por ela, só atingindo a concentração mínima após 7h e 6h de reconstituição, respectivamente, períodos estes que praticamente, correspondem ao expediente dos centros de vacinação. No caso do lote 3, talvez também tenha contribuído o fato de ele ser, dentre os lotes pesquisados, o que apresentou potência inicial mais elevada. O lote 2 exibiu comportamento particular, retendo potência por mais tempo (7h) quando exposto à luz, e perdendo-a mais rapidamente (3,5h) quando protegido dela.
Os lotes 1 e 2, mesmo quando protegidos da luz, atingiram a potência viral mínima (3,70 log10 DICT50) após 3h e 3,5h de reconstituição, respectivamente, tornando-se impróprios para uso. Se vacinas pertencentes a estes mesmos lotes foram administradas de acordo com a bula, isto é, até 8h após sua reconstituição, poder-se-ia inferir que certa parcela da população infantil vacinada com eles teria recebido vacinas que já não continham a concentração viral considerada necessária para desencadear uma resposta imune capaz de conferir-lhe proteção contra o sarampo.
Termoestabilidade de Vacinas Reconstituídas
Pelo fato de a liofilização, por si só, não preservar a potência da vacina contra o sarampo durante uma longa estocagem, pois vários outros fatores (cepa de vírus utilizada, tipo de estabilizador, técnica de liofilização, umidade residual) é que vão determinar até que ponto a potência será afetada 18, testes de estabilidade realizados em temperaturas elevadas fornecem informações valiosas preliminarmente às campanhas de vacinação programadas para países de clima quente, cujas cadeias de frio podem não ser satisfatórias, permitindo prever a perda de potência que pode ocorrer às temperaturas selecionadas 3,9,23,24.
Nos testes de termoestabilidade a que foram submetidas as vacinas dos lotes 1, 2 e 3, elas permaneceram continuamente ao abrigo da luz após a reconstituição, referindo-se a variável às temperaturas em que foram estocadas, isto é, 28, 36,5 e 45°C
As retas de regressão ajustadas da Figura 2 indicam que, dos três lotes, apenas o lote 3 manteve potência mínima a 28°C (2,5h), sendo os demais inativados antes de uma hora. A 36,5°C, os lotes 1 e 2 foram inativados antes de uma hora, enquanto o lote 3 reteve a potência de 3,70 log10 / dose por uma hora. A 45°C todos os lotes foram inativados em menos de 15 min. Assim, verificou-se que os lotes 1 e 2 foram inativados a 28,36,5 e 45°C, sendo o lote 3 o único que, apesar de apresentar certa estabilidade térmica a 28°C (2,5h) e a 36,5°C (1h), foi, porém, inativado em cerca de 15 min a 45°C.
Fotossensibilidade e termoestabilidade de vacinas liofilizadas
Os resultados dos testes realizados com vacinas do lote 1, liofilizadas: fotossensibilidade (as vacinas estocadas a 2 a 8°C estiveram expostas e/ ou ao abrigo da luz) e termoestabilidade (as vacinas estocadas a 28, 36,5 e 45°C estiveram sempre protegidas da luz) estão representados na Fig. 3.
A 2 a 8°C e com exposição à luz, verifica-se que o lote 1 apresentou degradação térmica mais acentuada do que quando protegido dela. Nos dois casos, entretanto, sua potência foi inferior à estabelecida como concentração ideal para as vacinas produzidas com vírus da cepa Biken CAM-7010,17. As outras temperaturas do teste, esse lote também apresentou baixa estabilidade, sem retenção da potência mínima.
Pela Figura 4 pode-se observar os resultados dos testes de fotossensibilidade (2 a 8°C) e de termoestabilidade (28, 36,5 e 45°C) a que foram submetidas vacinas do lote 2, liofilizadas. Verifica-se que as retas ajustadas das vacinas liofilizadas do lote 2, mantidas a 2 a 8°C e expostas à luz, apresentaram quedas de título mais acentuadas do que as retas das protegidas. Entretanto, expostas à luz ou protegidas dela, apresentaram potência inferior à concentração viral mínima. A 28, 36,5 e 45°C também ocorreram quedas de título, que foram mais acentuadas para as temperaturas mais elevadas.
A reta correspondente a 28°C não termina dentro dos limites da Figura, o que foi feito para indicar que ela deveria prosseguir além do limite da mesma, que é de 50 dias. A decisão de restringir a Figura a estes limites prendeu-se ao objetivo proposto, que era comparar a reta de 28°C, cujo término ocorre em 50 dias, com as duas outras, que são de menor duração.
Submetido às mesmas condições do teste anterior, o lote 3, liofilizado, foi titulado, e os resultados foram representados gráficamente por meio de retas de regressão com valores ajustados, constituindo a Figura 5. Este lote, que dentre os três apresentava potência inicial mais elevada, exibiu as mesmas características dos lotes 1 e 2, isto é, queda de potência mais acentuada quando exposto à luz. Quando refrigeradas a 2 a 8° C, as vacinas protegidas da luz enquadraram-se nos requerimentos mínimos de potência durante cerca de 60 dias. A degradação térmica foi bem mais acentuada nas demais temperaturas, limitando do tempo de vida útil das vacinas.
Complementando as Figuras 1 e 2, a Figura 6 permite avaliar, em conjunto, o comportamento dos três lotes reconstituídos e protegidos da luz. Dentre eles, o lote 3 foi o que apresentou o melhor desempenho: foi o mais estável a 2 a 8°C, mantendo a potência mínima durante 7h do teste, tendo os dois outros (lotes 1 e 2) se tornado inadequados para administração após 3h e 3,5h, respectivamente; também foi o único a manter potência a 28°C, embora por pouco mais de 2h, e a 36,5°C, por mais de lh, enquanto que os lotes 1 e 2 retiveram potência por menos de 30 min; a 45° C tornou-se impróprio para uso em menos de 10 min.
Vacinas contra o sarampo são submetidas a testes de potência após estocagem em diferentes temperaturas pois, à medida que este referencial se eleva, distanciando-se de 2 a 8° C, a potência do imunobiológico passa a ser afetada por ele, embora outros fatores, tais como: cepa de vírus utilizada, composição do estabilizador, técnica de liofilização e umidade residual, também tenham influência nesse processo.
Estudo divulgado pela Organização Mundial de Saúde24 demonstrou a existência de variabilidade no que se refere à termoestabilidade de vacinas contra o sarampo liofilizadas, produzidas com a cepa Schwarz, para as quais a potência mínima deve ser de cerca de 1.000 DICT50 por dose7,8. Para reduzir, ao nível referido, a potência de duas vacinas que no estudo da OMS apresentaram a melhor estabilidade, conservando, entretanto, sua capacidade de induzir imunidade, foram necessários 15 a 30 dias a 37° C, e 4 a 8 dias a 45° C.
As várias cepas de vírus existentes, para desencadearem resposta imune eficiente, devem estar presentes numa concentração tal que determine uma taxa de conversão de anticorpos igual ou superior a 90%, avaliada através de testes de campo.
Vacinas contra o sarampo de outras procedências, também produzidas com cepa Schwarz, são capazes de reter sua potência por cerca de 2 anos a 2 a 8° C; por mais de 12 semanas a 25° C; por mais de 6 semanas a 37° C; ao menos por 7 dias a 41° C 11,18.
A concentração de vírus para vacinas contendo a cepa Biken CAM-70, semelhantes às que foram estudadas na presente pesquisa, deve ser 5.000 ou 3,70 log10 DICT50 por dose, conforme consta na bula do imunobiológico e em instruções do Ministério da Saúde10,17. Tendo em vista este fato, os resultados obtidos foram discutidos considerando o título de 5.000 DICT50 e não o de 1.000 DICT50 por dose, aplicável a outras cepas de vírus do sarampo, que não a cepa Biken CAM-70.
Embora usualmente não se extrapolem dados obtidos com a vacina de um produtor para vacinas similares de outros, mesmo que contenham a mesma cepa de vírus, os resultados apresentados, no presente artigo, indicaram que a termoestabilidade de vacinas liofilízadas produzidas com a cepa Biken CAM-70, codificadas como 1, 2 e 3, se apresentou baixa.
A Figura 7 complementa os dados individuais dos lotes constantes nas Figuras 3, 4 e 5, permitindo comparar a termoestabilidade exibida pelos lotes liofilizados 1, 2 e 3, às várias temperaturas e ao abrigo da luz. Os lotes 1 e 2 titularam abaixo de 3,70 1og10 DICT50 por dose, que é a potencia recomendada para vacinas produzidas com a cepa Biken CAM-70, em todas as temperaturas consideradas. Apenas o lote 3 apresentou potência mínima durante 66 dias a 2 a 8° C; a 28° C, durante 5 dias; a 36,5° C, por menos de um dia; a 45° C, por apenas poucas horas.
A baixa estabilidade apresentada pelos lotes de vacinas pesquisados no presente estudo poderia ser atribuída, por exemplo, à baixa concentração viral da vacina a granel, à composição do estabilizador utilizado que poderia não estar protegendo adequadamente a massa viral, ao ciclo de liofilização adotado para a sua secagem, etc. Consta, entretanto, que na produção dos lotes 1 e 2 foi obedecido o requerimento de potência mínima de 103,0ou 1.000 DICT50 por dose, enquanto que na do lote 3, realizada posteriormente, já vigorava novo requerimento de 103,7 ou 5.000 DICT50 por dose, o que explica o melhor desempenho do lote 3, face à sua maior concentração viral, frente aos outros lotes pesquisados.
Os resultados obtidos não puderam confirmar dados indicativos de que vacinas produzidas com a cepa em questão, ao serem submetidas às temperaturas de 27 e de 37° C, apresentaram estabilidade média de 34 dias a 27° C, e de 18 dias de 37° C13. No estudo da avaliação desta estabilidade foi adotada como referência uma dose padrão infectante semelhante à da cepa Schwarz (3,0 log10 DICT50), quando considerá-la igual a 3,70 log10 DICT50, dose estabelecida para a cepa Biken CAM-7010,17, teria sido mais correto, tendo em vista os requerimentos mínimos de potência estabelecidos para cepas virais do sarampo mais atenuadas, como é o caso desta cepa.
Recebido para publicação em 19/5/1989
Reapresentado em 29/9/1989
Aprovado para publicação em 5/10/1989
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Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
06 Out 2004 -
Data do Fascículo
Fev 1990
Histórico
-
Aceito
05 Out 1989 -
Revisado
29 Set 1989 -
Recebido
19 Maio 1989