Open-access Capacidade antioxidante e triagem farmacológica de extratos brutos de folhas de Byrsonima crassifolia e de Inga edulis

Antioxidant capacity and pharmacologic screening of crude extracts of Byrsonima crassifolia and Inga edulis leaves

Resumos

Com o objetivo de avaliar o efeito de duas espécies amazônicas em doenças relacionadas aos processos de oxidação, determinou-se a capacidade antioxidante (método Oxygen Radical Absorbance Capacity), o teor de polifenóis totais (método Folin-Ciocalteu - PT), bem como os efeitos farmacológicos in vitro (efeito antiproliferativo) e in vivo (antinociceptivo, antiinflamatório, antiulcerogênico) dos extratos hidroalcoólicos (65:35; v/v; etanol:água) das folhas de Byrsonima crassifolia (BC) e Inga edulis (IE). Os extratos de BC e IE apresentaram elevada capacidade antioxidante (1.422 e 694 µmol de Trolox Equivalente g-1 de folha seca - FS, respectivamente) e um valor relativamente alto de PT (35,93 e 24,50 mg Equivalente ácido gálico g-1 FS, respectivamente). Essa atividade antioxidante não teve relação direta com o teor de compostos fenólicos dos extratos, sugerindo a contribuição de outros grupos químicos nessa atividade. Em cultura de células tumorais humanas (nove linhagens), os extratos não apresentaram atividade antiproliferativa significante, com efeito citotóxico somente na concentração mais elevada. Em modelo de nocicepção induzida pelo calor (placa quente), o extrato de IE apresentou efeito antinociceptivo (P < 0,05) após 30 (250 e 500 mg kg-1) e 60 min (125 e 500 mg kg-1) de sua administração oral. Nos modelos de inflamação houve somente redução do edema para IE na concentração de 500 mg kg-1. Os extratos das duas espécies reduziram as lesões ulcerativas produzidas por etanol em até 84% (P < 0,05), sugerindo uma possível ligação com a atividade antioxidante observada e indicando a necessidade de estudos para a elucidação do mecanismo de ação envolvido.

Amazônia; Oxygen radical absorbance capacity; Polifenóis; Propriedades farmacológicas


In order to evaluate the effect of two Amazonian species on chronic diseases linked with the oxidative processes, we performed antioxidant capacity analyses (Oxygen Radical Absorbance Capacity - ORAC and Folin-Ciocalteu - PT assays) and pharmacological effects in vitro (antiproliferative effect) and in vivo (antinociceptive, antiinflammatory, antiulcerogenic effects) for ethanolic extracts (65:35; v/v; ethanol:water) from Byrsonima crassifolia (BC) and Inga edulis (IE) leaves. Both BC and IE extracts showed high ORAC values (1,422 and 694 mmol of Trolox equivalent/g of dry leaf, respectively) and high PT contents (35.93 and 24.50 mg gallic acid equivalent g-1 dry leaf, respectively). The ORAC values had no correlation with PT, suggesting the presence of other chemical groups in the antioxidant activity value. The two extracts did not present significant antiproliferative activity on nine lines of human tumor cells, and cytotoxic effect was detected only at the highest concentration. The antinociceptive effect was investigated using the hot plate test, and IE extract presented a longer latency (P < 0.05) 30 and 60 min after oral administration. The antiinflammatory activity was only observed at the highest concentration, suggesting that the antinociceptive effect observed was not due to the antiinflammatory effect. The extracts of both species reduced the ulcerative lesions produced by ethanol up to 84% (P < 0.05), suggesting a relation with the antioxidant capacity. More studies are necessary to elucidate the mechanisms of action involved on antiulcerative effects.

Amazonia; Oxygen radical absorbance capacity; Polyphenols; Pharmacological proprieties


QUÍMICA, ALIMENTOS, MICROBIOLOGIA

Capacidade antioxidante e triagem farmacológica de extratos brutos de folhas de Byrsonima crassifolia e de Inga edulis

Antioxidant capacity and pharmacologic screening of crude extracts of Byrsonima crassifolia and Inga edulis leaves

Darly R. PompeuI; Hervé RogezII; Karin M.MonteiroIII; Sirlene V. TintiIV; João E. CarvalhoV

I Departamento de Tecnologia de Alimentos, Centro de Ciências Naturais e Tecnologia, Universidade do Estado do Pará e Centro de Valorização Agroalimentar de Compostos Bioativos da Amazônia. drpompeu@uepa.br

II Faculdade de Engenharia de Alimentos, Universidade Federal do Pará e Centro de Valorização Agroalimentar de Compostos Bioativos da Amazônia. frutas@amazon.com.br

III Centro Pluridisciplinar de Pesquisas Químicas, Biológicas e Agronômicas, Universidade Estadual de Campinas. karin@cpqba.unicamp.br

IV Centro Pluridisciplinar de Pesquisas Químicas, Biológicas e Agronômicas, Universidade Estadual de Campinas. tinti@cpqba.unicamp.br

V Centro de Pluridisciplinar de Pesquisas Químicas, Biológicas e Agronômicas e Departamento de Clínica Médica, Faculdade de Ciências Médicas, Universidade Estadual de Campinas. carvalho@cpqba.unicamp.br

RESUMO

Com o objetivo de avaliar o efeito de duas espécies amazônicas em doenças relacionadas aos processos de oxidação, determinou-se a capacidade antioxidante (método Oxygen Radical Absorbance Capacity), o teor de polifenóis totais (método Folin-Ciocalteu - PT), bem como os efeitos farmacológicos in vitro (efeito antiproliferativo) e in vivo (antinociceptivo, antiinflamatório, antiulcerogênico) dos extratos hidroalcoólicos (65:35; v/v; etanol:água) das folhas de Byrsonima crassifolia (BC) e Inga edulis (IE). Os extratos de BC e IE apresentaram elevada capacidade antioxidante (1.422 e 694 µmol de Trolox Equivalente g-1 de folha seca - FS, respectivamente) e um valor relativamente alto de PT (35,93 e 24,50 mg Equivalente ácido gálico g-1 FS, respectivamente). Essa atividade antioxidante não teve relação direta com o teor de compostos fenólicos dos extratos, sugerindo a contribuição de outros grupos químicos nessa atividade. Em cultura de células tumorais humanas (nove linhagens), os extratos não apresentaram atividade antiproliferativa significante, com efeito citotóxico somente na concentração mais elevada. Em modelo de nocicepção induzida pelo calor (placa quente), o extrato de IE apresentou efeito antinociceptivo (P < 0,05) após 30 (250 e 500 mg kg-1) e 60 min (125 e 500 mg kg-1) de sua administração oral. Nos modelos de inflamação houve somente redução do edema para IE na concentração de 500 mg kg-1. Os extratos das duas espécies reduziram as lesões ulcerativas produzidas por etanol em até 84% (P < 0,05), sugerindo uma possível ligação com a atividade antioxidante observada e indicando a necessidade de estudos para a elucidação do mecanismo de ação envolvido.

Palavras-chave: Amazônia; Oxygen radical absorbance capacity; Polifenóis; Propriedades farmacológicas.

ABSTRACT

In order to evaluate the effect of two Amazonian species on chronic diseases linked with the oxidative processes, we performed antioxidant capacity analyses (Oxygen Radical Absorbance Capacity - ORAC and Folin-Ciocalteu - PT assays) and pharmacological effects in vitro (antiproliferative effect) and in vivo (antinociceptive, antiinflammatory, antiulcerogenic effects) for ethanolic extracts (65:35; v/v; ethanol:water) from Byrsonima crassifolia (BC) and Inga edulis (IE) leaves. Both BC and IE extracts showed high ORAC values (1,422 and 694 mmol of Trolox equivalent/g of dry leaf, respectively) and high PT contents (35.93 and 24.50 mg gallic acid equivalent g-1 dry leaf, respectively). The ORAC values had no correlation with PT, suggesting the presence of other chemical groups in the antioxidant activity value. The two extracts did not present significant antiproliferative activity on nine lines of human tumor cells, and cytotoxic effect was detected only at the highest concentration. The antinociceptive effect was investigated using the hot plate test, and IE extract presented a longer latency (P < 0.05) 30 and 60 min after oral administration. The antiinflammatory activity was only observed at the highest concentration, suggesting that the antinociceptive effect observed was not due to the antiinflammatory effect. The extracts of both species reduced the ulcerative lesions produced by ethanol up to 84% (P < 0.05), suggesting a relation with the antioxidant capacity. More studies are necessary to elucidate the mechanisms of action involved on antiulcerative effects.

Keywords: Amazonia; Oxygen radical absorbance capacity; Polyphenols; Pharmacological proprieties.

INTRODUÇÃO

A biodiversidade amazônica é fonte de espécies vegetais potencialmente úteis para o desenvolvimento de medicamentos, alimentos funcionais e cosméticos. Diversas espécies são utilizadas popularmente para o tratamento das mais variadas afecções, necessitando de estudos aprofundados para comprovar suas indicações. A exploração racional destas espécies poderia contribuir para o desenvolvimento sustentável da região (Souza et al. 2008). Entre estas espécies pode-se citar o murucizeiro, Byrsonima crassifolia (L) H.B. & K., e o ingazeiro, Inga edulis Mart. (Silva et al. 2007b).

Byrsonima crassifolia (BC) é uma árvore tropical da família das Malpighiaceae amplamente distribuída nas Américas Central e do Sul (Martínez-Vázquez et al. 1999). Suas folhas e casca tem sido utilizadas na medicina tradicional para tratar tosses, desordens gastrointestinais, infecções ginecológicas e da pele (Heinrich et al. 1992) e picadas de cobra (Rastrelli et al. 1997). Estudos experimentais com folhas e casca desta espécie apontaram alta capacidade antioxidante do extrato hidroalcoólico (Silva et al. 2007a), efeitos espasmogênicos (Bejar e Malone 1993), atividade antiprotozoária (Peraza-Sánchez et al. 2007) e antiinflamatória (Maldini et al. 2009).

Inga edulis (IE) é da família das Leguminosae: Mimosoideae e é amplamente distribuída nas florestas secundárias tropicais das Américas Central e do Sul. Suas folhas são utilizadas na medicina tradicional como antiinflamatório e antidiarréico (Silva et al. 2007b). Silva et al. (2007a; 2007b) apontaram elevada capacidade antioxidante do seu extrato hidroalcoólico. Souza et al. (2008) apontaram alta capacidade antioxidante empregando diversos métodos químicos e bioquímicos, avaliando a proteção de lipoproteínas e de eritrócitos contra a oxidação induzida de diferentes formas. Estudos fitoquímicos identificaram parte dos compostos fenólicos presentes nos extratos de folhas de I. edulis (Souza et al. 2007; Dias et al. 2010).

Em virtude do seu uso medicinal tradicional e dos resultados publicados sobre estas espécies até o momento, este trabalho teve como objetivo relacionar a capacidade antioxidante dos extratos obtidos de folhas de B. crassifolia e I. edulis com o potencial farmacológico, por meio de uma triagem de atividades farmacológicas.

MATERIAL E MÉTODOS

Material vegetal

As folhas de B. crassifolia e I. edulis foram identificadas por um especialista em farmacognosia do Museu Botânico Emílio Goeldi (Belém - PA, Brasil). As mesmas espécies foram comparadas com exsicatas depositadas no Herbário do referido museu (MG 122249 e MG 0153192, respectivamente). As folhas das espécies foram coletadas no município de Belém (PA) e imediatamente transportadas ao Laboratório.

Animais

Foram utilizados ratos machos adultos (Rattus norvegicus), variedade Wistar albino, pesando entre 180 e 250 g e camundongos machos adultos (Mus musculus), variedade Swiss, pesando entre 25 e 30 g. Os animais foram fornecidos pelo Centro Multidisciplinar para Investigação Biológica na Área da Ciência em Animais de Laboratório (CEMIB) da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e utilizados nos experimentos após o período mínimo de sete dias de adaptação ao biotério, com ciclo de claro-escuro de 12 horas, temperatura ambiente (20 ± 2 ºC), com água e ração ad libitum.

Preparação do extrato

As folhas de B. crassifolia e I. edulis foram lavadas e cortadas em pequenos pedaços (aproximadamente 2 cm por 2 cm). Em seguida foram secas a 55 ºC por 2 h30 min conforme otimizado por Silva et al. (2011) e moídas. Fez-se uma extração com solução hidroalcóolica (65:35; v/v; etanol:água) em quatro ciclos de 1 h a 60 °C e na razão soluto:solvente de 1:20 (m/v) (Silva et al. 2007a). O extrato foi filtrado, centrifugado a 27.000 g por 15 min a 4 °C. O sobrenadante foi coletado e concentrado sob baixa pressão a 45 °C e ao abrigo da luz e, em seguida, liofilizado. O pó obtido foi estocado a -20 ºC sob atmosfera de N2 até a realização das análises.

Determinação dos compostos fenólicos totais e da capacidade antioxidante

Compostos fenólicos totais

Utilizou-se o método espectrofotométrico de Folin-Ciocalteu (Singleton e Rossi 1965) descrito por Silva et al. (2007a). Os resultados foram expressos em miligrama de equivalente ácido gálico por grama de folha seca (mg EAG g-1 de FS).

Capacidade antioxidante

A capacidade antioxidante foi avaliada pelo método Oxygen Radical Absorbance Capacity (ORAC) em fluorímetro de microplaca (Microplate Fluorescence Reader, Bio-Tek Instruments, Winoosk, USA), utilizando-se a fluoresceína como molécula flourescente e previamente descrito por Silva et al. (2007b). A atividade antioxidante ORAC foi expressa em μmole de equivalente Trolox por grama de folha seca (μmol ET g-1 de FS).

Testes farmacológicos

Atividade antiproliferativa

Para a realização da triagem in vitro foram selecionadas as seguintes linhagens de células cancerígenas cedidas ao Centro de Pesquisas Químicas, Biológicas e Agrícolas da Universidade Estadual de Campinas pelo ‘National Cancer Institute' (USA): UACC-62 (melanoma), MCF-7 (mama), NCI-ADR (mama com fenótipo de resistência a múltiplas drogas), 786-O (rim), NCI-460 (pulmão), PCO-3 (próstata), OVCAR-03 (ovário), HT-29 (cólon) e K-562 (leucemia linfóide). A avaliação da atividade antiproliferativa dos extratos brutos de B. crassifolia e I. edulis foi realizada segundo metodologia descrita por Monks et al. (1991) utilizando-se doxorrubicina como controle positivo. Para o teste de atividade, foram plaqueados 100 μL de células em meio RPMI/SFB/gentamicina, em placas de 96 poços. As placas foram incubadas por 24 h a 37 ºC em atmosfera contendo 5% de CO2. Depois desse período uma placa controle foi fixada por meio da adição de ácido tricloroacético para determinação da quantidade de células no momento da adição das drogas. Os extratos foram ensaiados nas concentrações de 0,25; 2,5; 25 e 250 μg ES mL-1 e incubados por 48 h. Em seguida, as placas foram coradas pela adição de 50 μL do corante protéico sulforrodamina B (SRB) a 0,4% (peso/volume), dissolvido em ácido acético a 1%, e incubadas a 4 ºC, durante 30 min. O corante ligado às proteínas celulares foi solubilizado com uma solução de Trizma Base na concentração de 10 μM e pH 10,5 por 5 min em ultra-som. A leitura espectrofotométrica da absorbância foi realizada em 560 nm em um leitor de microplacas Versa Max (Molecular Devices, Sunnyvale, CA, USA).

Atividade antinociceptiva

A atividade antinociceptiva foi determinada por meio do teste de placa quente utilizando-se grupos de seis a oito camundongos Swiss. Os animais foram tratados por via oral com solução de NaCl (0,90%; 10 mL kg-1), controle negativo, com morfina (30 mg kg-1), controle positivo, ou com extratos de B. crassifolia e I. edulis (125, 250 e 500 mg ES kg-1). Após 30, 60, 90 e 120 min da administração os animais foram submetidos ao estímulo álgico em placa quente (56,5 ± 0,1 °C), até que apresentassem reflexos dolorosos característicos de acordo com o método descrito por Woolfe e McDonald (1944).

Atividade antiinflamatória

Para determinação da atividade antiinflamatória foram utilizados os métodos de dermatite induzida por óleo de cróton (Tubaro et al. 1985) e edema de pata induzido por carragenina (Winter et al. 1962). Para a dermatite induzida por óleo de cróton foram utilizados grupos de seis camundongos Swiss tratados por via oral com solução de NaCl (0,90%; 10 mL kg-1), controle negativo, com dexametasona (1 mg kg-1), controle positivo, ou com extratos de B. crassifolia e I. edulis (125, 250 e 500 mg ES kg-1). Para o edema de pata utilizaram-se grupos de seis ratos Wistar tratados por via oral com solução de NaCl (0,90%; 10 mL kg-1), controle negativo, com indometacina (10 mg kg-1), controle positivo ou com extratos de BC e IE (125, 250 e 500 mg ES kg-1).

Atividade antiulcerogênica

Utilizou-se o modelo de indução de úlcera por etanol absoluto de acordo com a metodologia descrita por Robert (1979). Os animais estavam em jejum de 24 h com livre acesso à agua. Os grupos de seis ratos Wistar foram tratados por via oral com solução de NaCl (0,90%; 10 mL kg-1), controle negativo, carbenoxolona (200 mg kg-1), controle positivo, ou com extratos de B. crassifolia e I. edulis (125, 250 e 500 mg ES kg-1) e após 60 min todos os animais receberam 1 mL de etanol absoluto por via oral. Após 60 min da administração os animais foram sacrificados por deslocamento cervical. A contagem das lesões e o cálculo do índice de lesão ulcerativa (ILU) foi feito de acordo com o método descrito por Bighetti et al. (2005).

Análises estatísticas

Os dados obtidos experimentalmente foram tratados por meio de análise de variância (ANOVA) utilizando-se o software STATISTIC for Windows 7.1 (STAT-SOFT), considerando-se os níveis de significância de 95% (P < 0,05), 99% (P < 0,01) e 99,9% (P < 0,001). Em seguida fez-se a comparação pelo Teste de Duncan utilizando-se o mesmo nível de significância.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Capacidade antioxidante

Na Tabela 1 são apresentados os teores de compostos fenólicos totais e a capacidade antioxidante ORAC encontrados nos extratos em pó obtidos das folhas de B. crassifolia e I. edulis. Os teores em compostos fenólicos totais encontrados neste trabalho para a B. crassifolia ficaram abaixo do encontrado por outros autores, enquanto que o I. edulis ficou dentro da faixa. Estas diferenças possivelmente estão relacionadas com o método de extração, purificação e a forma de expressar os resultados pelos autores. Silva et al. (2007b) utilizaram uma mistura de solventes (metanol, etanol, água destilada e ácido clorídrico; 69:20:10:1, v:v:v:v) a temperatura ambiente (~ 28 ºC) durante 24 h, os autores expressaram seus resultados em massa de folha fresca (a umidade dessas folhas é de aproximadamente 50% segundo Silva et al. 2010). Silva et al. (2007a) otimizaram a extração de compostos fenólicos de folhas de I. edulis, com solução hidrolacóolica (86,8%) a 58,2 ºC por 46 min 48 seg. Souza et al. (2007) utilizaram solução hidrometanólica (50:50; v:v) durante 1 h a temperatura ambiente. Neste estudo, os autores identificaram o acido gálico, a catequina, a epicatequina, a miricetina-3-ramnopiranosídeo, a quercetina-3-glucopiranosídeo e a quercetina-3-ramnopiranosídeo. Souza et al. (2008) utilizaram solução hidrometanólica (80:20 v/v) durante 3 h a temperatura ambiente. Dias et al. (2010) utilizaram uma mistura de solventes (acetona:água:ácido acético; 70:28:2; v:v:v), durante 2 h sob agitação constante, à temperatura ambiente, um total de três ciclos de extração. Os autores identificaram e quantificaram neste trabalho os seguintes compostos fenólicos: ácido gálico, procianidina B1, catequina, procianidina B2, epicatequina, delfinidina, cianidina, miricetina-3-o-α-L-ramnopiranosídeo, quercetina-3-o-α-L-ramnopiranosídeo, miricetina e quercetina.

Efeitos farmacológicos

Atividade antiproliferativa

Os extratos brutos das folhas de B. crassifolia e de I. edulis foram submetidos à avaliação da atividade antiproliferativa em culturas de células tumorais humanas de nove tipos. Na Figura 1 pode-se observar que esses extratos brutos não possuem atividade antiproliferativa, pois foi observado efeito somente na concentração mais elevada. Os compostos fenólicos, em especial os flavonóides, podem ter efeito quimiopreventivo, neutralizando radicais livres com potencial mutagênico (Middleton et al. 2000; Yang et al. 2001). No entanto após o desenvolvimento do câncer são pouco eficazes, pois não atuam nos processos de proliferação e morte celular (Ferguson et al. 2004).


Atividade antinociceptiva

Para avaliar um possível efeito antinociceptivo dos extratos obtidos das folhas de B. crassifolia e I. edulis, foi realizado o teste de nocicepção induzida por calor (placa quente). O controle positivo, a morfina, aumentou significativamente o tempo de reação dos animais em todos os tempos testados. O extrato de B. crassifolia aumentou o tempo de reação ao estímulo nociceptivo após 120 min da administração oral somente na maior dose (500 mg kg-1) (Figura 2a). Para o extrato bruto de I. edulis (Figura 2b) observou-se aumento do tempo de reação dos animais para as diferentes doses utilizadas e nos tempos de 30 e 60 minutos, demonstrando indícios claros de atividade antinociceptiva de curta duração, pois em nenhum dos casos a atividade foi superior a 60 min. O efeito sobre o processo doloroso pode ser consequência de uma ação central, por bloqueio da condução do estímulo doloroso, como o produzido pela morfina ou por uma ação antiinflamatória. O método da placa quente tem maior especificidade para a atividade antinociceptiva de drogas que atuam no sistema nervoso central, como os analgésicos narcóticos. No entanto drogas com atividade antiinflamatória também podem reduzir a dor na presença de inflamação. Para um possível efeito antiinflamatório, os extratos foram avaliados em modelo de inflamação de pata induzida pela carragenina e no modelo de edema de orelha produzido por óleo de cróton (Fernandes 2002). Além disso, como o processo inflamatório gera muitos radicais livres os modelos de edema são muito úteis para avaliar in vivo a ação de antioxidantes.



Atividade antiinflamatória

No modelo de edema de pata induzido pela carragenina os extratos das duas espécies não produziram diminuição do edema nas doses utilizadas (125, 250 e 500 mg kg-1).

No edema de orelha induzido pelo óleo de cróton, o extrato bruto da B. crassifolia também não produziu efeito (Figura 3a). Todavia o extrato bruto de I. edulis produziu diminuição significativa do edema (P < 0,05) somente na dose de 500 mg kg-1 (Figura 3b) quando comparada com o grupo controle (solução salina). Assim, em razão dos resultados nesses modelos de inflamação, é pouco provável que a atividade antinociceptiva observada em placa quente esteja relacionada a um efeito antiinflamatório, mas sim por atividade no sistema nervoso central. No entanto, é pouco provável que os polifenóis sejam os responsáveis por essa atividade antinociceptiva, pois em virtude de sua elevada polaridade dificilmente conseguiriam penetrar no sistema nervoso central para exercer essa atividade. Certamente as substâncias responsáveis pelo efeito antinociceptivo deverão ser identificadas nas frações com menor polaridade nesses extratos.



Braggio et al. (2002) utilizaram suco liofilizado de Sesbania virgata em concentrações maiores (1 e 2 g kg-1) que as utilizadas neste trabalho e diminuíram o edema de orelha em camundongos de 58 e 61%, respectivamente.

Atividade antiulcerogênica

O etanol é considerado um agente irritante da mucosa gástrica por destruir a camada de muco e o bicarbonato, que atuam na proteção da mucosa gástrica contra o ácido clorídrico e outros agentes agressores. O bloqueio da citoproteção gástrica é consequência da precipitação de proteínas, liberação de radicais livres e redução da concentração de compostos sulfidrilas nas células da mucosa (Pacheco et al. 2006), por isso é utilizado como um modelo de indução a úlcera. Na Figura 4 apresentam-se os efeitos dos extratos brutos de B. crassifolia (a) e I. edulis (b) neste modelo de indução de úlcera. Pode-se observar que as duas espécies produziram diminuição dos danos ulcerativos nos animais tratados, com dependência em relação às doses. No caso de B. crassifolia houve uma estabilização das lesões ulcerativas nas doses de 250 e 500 mg kg-1. Este mesmo extrato apresentou os melhores resultados de diminuição das lesões ulcerativas estudadas neste trabalho. Os resultados obtidos para a B. crassifolia neste modelo de lesão ulcerativa foram melhores que aqueles encontrados por Dias et al. (2000) utilizando extrato de Rosmarinus officinalis e Pacheco et al. (2006) utilizando hidrolisado de proteínas de soro de leite. Muitos polifenóis, especialmente os taninos, são frequentemente responsáveis pelos efeitos antiulcerogênicos de diversos extratos vegetais (Carvalho 2006). Portanto, é provável que os polifenóis presentes nessas espécies sejam pelo menos em parte responsáveis pelos efeitos antiulcerogênicos.


A próxima etapa desse projeto deverá estudar se o mecanismo de ação dessa atividade anitulcerogênica pode estar relacionado com a diminuição da produção de ácido ou com fatores citoprotores como aumento da produção de muco, radicais sulfodrilas, óxido nítrico e fatores relacionados com a cicatrização.

CONCLUSÕES

Com base nos resultados apresentados pelos extratos brutos de folhas de B. crassifolia e I. edulis demonstrou-se que as duas espécies possuem elevado teor de compostos fenólicos e alta capacidade antioxidante, com elevado potencial farmacológico com destaque para a atividade antiulcerogênica. Apesar de outros trabalhos apontarem para os flavonóides como os principais grupos responsáveis pela elevada capacidade antioxidante, e consequentemente dos efeitos farmacológicos, mais estudos são necessários a fim de esclarecer quais são os compostos responsáveis por estes efeitos.

AGRADECIMENTOS

Os autores são gratos ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, ao Instituto Internacional de Educação do Brasil, a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior e as equipes técnicas e científicas do Laboratório de Farmacologia e Toxicologia do Centro Pluridisciplinar de Pesquisas Químicas, Biológicas e Agrícolas (CPQBA) e da Usina de Alimentos da Universidade Federal do Pará (UFPA).

BIBLIOGRAFIA CITADA

Recebido em 18/10/2010

Aceito em 11/04/2011

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    09 Jan 2012
  • Data do Fascículo
    Mar 2012

Histórico

  • Recebido
    18 Out 2010
  • Aceito
    11 Abr 2011
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