Open-access Exercício resistido na avaliação da disfunção endotelial na insuficiência cardíaca

Resumos

OBJETIVO: Avaliar o uso de exercício físico resistido no estudo da disfunção endotelial na insuficiência cardíaca comparativamente à hiperemia reativa (HR). MÉTODOS: Dezoito portadores de insuficiência cardíaca (IC) e 15 voluntários realizaram esforço físico manual de preensão intermitente em bolsa pneumática com intensidade correspondente a 75% da carga máxima previamente avaliada. Foram avaliados por ultra-sonografia vascular de alta resolução para análise dos diâmetros da artéria braquial e fluxos bem como determinação do débito cardíaco em repouso, após HR e após exercício. Foram calculados o índice de fluxo sistólico na artéria braquial e o índice cardíaco. RESULTADOS: Houve aumento do índice de fluxo sistólico na artéria braquial nas condições HR e exercício físico sendo maior nessa última. Houve aumento do índice cardíaco nas condições de estudo comparativamente ao repouso. CONCLUSÃO: O exercício físico resistido, na carga avaliada, aumenta o fluxo sanguíneo local de forma mais intensa que a HR, constituindo-se numa opção fisiológica à avaliação da disfunção endotelial na IC .

Disfunção endotelial; insuficiência cardíaca; exercício


OBJECTIVE: To evaluate the use of resistive exercise in the study of endothelial dysfunction in heart failure (HF) comparatively to reactive hyperemia (RH). METHODS: Eighteen patients with heart failure and 15 normal volunteers were submitted to intermittent handgrip exercise in a pneumatic bag, at an intensity that corresponds to 75% of the previously assessed maximum load. Patients underwent high-resolution vascular ultrasonography for brachial artery diameter and flow evaluation as well as cardiac output determination at rest, RH and after exercise. The systolic flow index in the brachial artery and cardiac index were calculated. RESULTS: Systolic flow index increase in the brachial artery was observed after RH and physical exercise, with the latter presenting the highest increase. There was an increase in the cardiac index after the study conditions in comparison to resting conditions. CONCLUSION: Resistive exercise, performed at the assessed load, increases blood flow more intensively than RH, constituting a physiological option for the evaluation of endothelial function in HF.

Endothelial dysfunction; heart failure; exercise


ARTIGOS ORIGINAIS

INSUFICIÊNCIA CARDÍACA

Exercício resistido na avaliação da disfunção endotelial na insuficiência cardíaca

Ricardo Tavares de Carvalho; Marcelo Luis Campos Vieira; Ângela Romano; Liliane Kopel; Silvia G. Lage

Instituto do Coração do Hospital das Clínicas – FMUSP - São Paulo, SP

Correspondência Correspondência: Ricardo Tavares de Carvalho Av. Dr. Enéas de Carvalho Aguiar, 44 05403-900 – São Paulo, SP E-mail: ricardo.carvalho@incor.usp.br

RESUMO

OBJETIVO: Avaliar o uso de exercício físico resistido no estudo da disfunção endotelial na insuficiência cardíaca comparativamente à hiperemia reativa (HR).

MÉTODOS: Dezoito portadores de insuficiência cardíaca (IC) e 15 voluntários realizaram esforço físico manual de preensão intermitente em bolsa pneumática com intensidade correspondente a 75% da carga máxima previamente avaliada. Foram avaliados por ultra-sonografia vascular de alta resolução para análise dos diâmetros da artéria braquial e fluxos bem como determinação do débito cardíaco em repouso, após HR e após exercício. Foram calculados o índice de fluxo sistólico na artéria braquial e o índice cardíaco.

RESULTADOS: Houve aumento do índice de fluxo sistólico na artéria braquial nas condições HR e exercício físico sendo maior nessa última. Houve aumento do índice cardíaco nas condições de estudo comparativamente ao repouso.

CONCLUSÃO: O exercício físico resistido, na carga avaliada, aumenta o fluxo sanguíneo local de forma mais intensa que a HR, constituindo-se numa opção fisiológica à avaliação da disfunção endotelial na IC .

Palavras-chave: Disfunção endotelial, insuficiência cardíaca, exercício.

A insuficiência cardíaca (IC) caracteriza-se pelo comprometimento do desempenho ventricular com limitação física progressiva dos indivíduos acometidos à medida que a doença evolui. Entretanto, um dos dados mais interessantes dessa síndrome é que o grau de disfunção ventricular não está relacionado com a capacidade funcional avaliada pela tolerância ao esforço físico1-3. Embora as alterações centrais (cardíacas) iniciem e perpetuem a IC, a maior limitação ao exercício é periférica, envolvendo alterações no transporte e consumo de oxigênio4.

A base fisiopatológica desse dado consiste na presença de modificações histológicas e metabólicas nas fibras musculares esqueléticas5,6, bem como na capacidade dos vasos distribuírem o fluxo sangüíneo aos músculos em atividade.

As características funcionais dos vasos periféricos são importantes determinantes do desempenho do ventrículo esquerdo na IC e estão sujeitas a ação de substâncias liberadas pelo endotélio em resposta ao fluxo local7. Entre elas destaca-se o óxido nítrico (NO). Além disso, a resposta vascular não dependente do endotélio pode também estar alterada nesses pacientes8-10.

A disfunção endotelial é um fenômeno sistêmico. Ela pode ser avaliada por métodos celulares e moleculares11,12 em animais. Em seres humanos destaca-se a avaliação da vasodilatação mediada por fluxo em território periférico13.

Com a descrição do uso da HR como método de avaliação da disfunção endotelial dependente de fluxo14, passou-se a utilizar amplamente esse recurso. Entretanto, apenas recentemente houve padronização dessa técnica15.

O exercício físico também pode ser utilizado na avaliação da função endotelial. A base dessa observação está no aumento do fluxo sangüíneo nos territórios em atividade16,17.

Sessões diárias de exercícios têm se mostrado benéficas em aumentar a expressão de NO em indivíduos normais e aumentar a vasodilatação dependente do endotélio nos pacientes com IC18,19. Uma revisão de estudos randomizados e controlados corrobora o efeito benéfico do exercício físico na IC20. O aumento do débito cardíaco que ocorre durante o exercício aumentaria a força de cisalhamento sobre o endotélio e, assim, a expressão de NO. Não é consenso que a isquemia relativa produzida durante a atividade muscular localizada seja um estímulo suficiente para causar vasodilatação.

Dessa forma, testamos a hipótese de que o exercício resistido possa ser eficaz na avaliação da disfunção endotelial na IC e seja comparável à hiperemia reativa (HR).

MÉTODOS

Foram estudados 33 indivíduos com idade entre 18 e 65 anos, divididos em dois grupos: 18 pacientes portadores de insuficiência cardíaca congestiva (grupo ICC) e 15 voluntários normais (grupo NL) (tab.1).

No grupo ICC, a fração de ejeção do ventrículo esquerdo ao ecocardiograma, para inclusão no estudo, foi menor do que 40%.

Foram excluídos do estudo pacientes portadores de insuficiência coronária, hipertensão arterial sistêmica, marcapasso definitivo, arritmias cardíacas incluindo extra-sístoles supraventriculares e ventriculares freqüentes, flutter e fibrilação atriais, bloqueio atrioventricular do II e III grau. Além disso, foram excluídos pacientes portadores de doença pulmonar obstrutiva crônica, diabete melito, insuficiência renal, insuficiência hepática, gestantes, dislipidêmicos e tabagistas.

A medicação habitual foi suspensa em todos os pacientes antes do estudo em intervalo mínimo de doze horas.

Os pacientes estavam clinicamente compensados e sem edema periférico.

A causa da insuficiência cardíaca foi cardiomiopatia dilatada em sete casos, cardiomiopatia chagásica em nove casos, cardiomiopatia alcoólica em um caso e cardiomiopatia secundária ao uso de quimioterápicos em um caso.

A fração de ejeção média do ventrículo esquerdo avaliada pelo ecocardiograma em repouso foi de 0,31 ± 0,05.

Baseado na classificação funcional da NYHA, nove pacientes encontravam-se em classe funcional II, cinco em classe funcional III, e quatro pacientes em classe funcional IV.

Protocolo de estudo - O estudo foi realizado com os pacientes em posição supina e iniciado após pelo menos vinte minutos de repouso em ambiente silencioso, pouco iluminado e com temperatura controlada (21ºC).

Antes do início do estudo, foi avaliada a capacidade máxima de preensão com a mão esquerda por meio de dinamômetro manual com escala em quilogramas (kg) e, depois, em uma bolsa pneumática acoplada a uma escala de pressão em milímetros de mercúrio (mmHg). Foi solicitado a cada indivíduo que realizasse três preensões máximas. O valor considerado como força máxima foi a média aritmética da força nas três preensões realizadas na bolsa pneumática21. Esse dado foi usado para o cálculo da carga de exercício a ser aplicada.

Foi feita a correlação entre as duas medidas (r = 0,90, p < 0,01 n = 33). Foram utilizadas, no estudo, apenas as medidas feitas com a bolsa pneumática, pois somente dessa forma era possível que o indivíduo conseguisse adequar a força realizada pela visualização da coluna na qual se encontrava marcado o ponto até onde deveria elevar o mercúrio.

O ritmo cardíaco foi monitorado com eletrocardiograma para realização da ecocardiografia.

Ultra-sonografia vascular de alta resolução foi realizada para a captação de imagens das curvas de velocidade de fluxo sangüíneo, por Doppler, na artéria braquial, bem como imagens em corte longitudinal desse vaso, simultaneamente ao registro de eletrocardiograma, para medida do diâmetro arterial.

Dentro do protocolo de estudo foram avaliados inicialmente, em repouso, o diâmetro arterial e a curva de velocidade de fluxo (condição B1). Em seguida, foi avaliada a resposta vascular pela HR após cinco minutos de oclusão com manguito em antebraço esquerdo, insuflado com pressão de 200 mmHg (condição HR). Após trinta minutos de repouso, os parâmetros de diâmetro e velocidade de fluxo na artéria braquial foram reavaliados como uma nova condição basal (condição B2). Em seguida, foi fornecida a cada indivíduo a mesma bolsa pneumática com a qual realizaram a avaliação da força de preensão máxima, e foi solicitado que efetuassem movimentos repetidos de preensão e relaxamento, com a mão esquerda, com 75% da carga máxima (condição EX75), em adaptação de protocolo desenvolvido para esse fim21. Após o primeiro minuto de exercício foram avaliados os parâmetros já descritos em território braquial.

O débito cardíaco foi avaliado pelo ecocardiograma, modo bidimensional, durante cada fase do estudo imediatamente após a análise dos parâmetros periféricos. Isso foi feito para avaliar se existia relação entre o aumento de fluxo local e o aumento de débito que poderia ocorrer com o exercício.

Aquisição dos diâmetros arteriais - Equipamento de ultra-sonografia (Apogee 800 plus, ATL Inc., Bothell WA, USA) com transdutor plano de alta resolução vascular de 5-10MHz, foco automático, foi utilizado para aquisição da imagem bidimensional, em corte longitudinal, da artéria braquial, a aproximadamente 5 cm distal à prega do cotovelo. O transdutor foi posicionado a 90 graus do vaso, de tal forma que se pudesse ver as paredes do vaso. A aquisição das imagens do diâmetro vascular na condição HR foi feita ao término do primeiro minuto após a liberação do manguito de pressão e, nas condições de exercício, ao término do primeiro minuto após o início do exercício. A obtenção das imagens arteriais foi realizada sempre pelo mesmo observador, acoplada ao registro simultâneo do sinal eletrocardiográfico. Foram gravadas em fitas de videocassete para posterior determinação do diâmetro arterial.

A gravação em videocassete foi utilizada para que, baseado no registro eletrocardiográfico, as imagens fossem selecionadas no momento da expansão sistólica, correspondente aos primeiros 60 milissegundos da onda T. Para a determinação do diâmetro arterial foi utilizado um programa de computador especialmente desenvolvido para essa finalidade22 (fig.1).


Fluxo arterial periférico - Um equipamento de ultra-sonografia (Apogee -800 plus, ATL Inc., Bothell Wa, USA), com transdutor plano de alta resolução vascular de 5,0–10,0 MHz, foi empregado para avaliação da velocidade de fluxo na artéria braquial, utilizando-se o Doppler pulsado.

As imagens das curvas de velocidade de fluxo arterial, acopladas ao registro simultâneo do eletrocardiograma, foram adquiridas sempre pelo mesmo observador e gravadas em fitas de videocassete. Cinco imagens foram selecionadas e gravadas em computador equipado com videoframe grabber (Willow PublishersVGA, Willow Peripherals, Inc., Bronx, NY, USA), para posterior análise. A seguir, assinalava-se o ponto da curva referente a velocidade sistólica máxima (*) (fig.2). A quantificação da velocidade sistólica máxima de fluxo arterial foi realizada empregando-se um programa de computador desenvolvido para essa finalidade.


Na condição HR foi analisada sempre a curva de velocidade de fluxo do primeiro batimento após a liberação do manguito de pressão (fig.3). Na condição de exercício foram analisadas sempre as curvas de velocidade do quinto batimento da fase de relaxamento muscular (fig. 4).



Uma vez mensuradas as velocidades de fluxo e os diâmetros arteriais em sístole, calculou-se o índice de fluxo sistólico (IFS) pela fórmula:

onde: AST (área da seção transversa do vaso)= p.raio2, Vsi: velocidade de pico sistólico (m/s), SC: superfície corpórea (m2) e 0,06 é o fator de correção necessário para conversão das unidades para l/min.

Avaliação cardíaca - A avaliação cardíaca foi feita utilizando-se equipamento de ultra-sonografia (Apogee-800 plus, ATL Inc., Bothell Wa, USA), com transdutor setorial mecânico de 3 MHz. Foram realizados, sempre pelo mesmo observador, o ecocardiograma modo M e o bidimensional, além do estudo dos fluxos intracardíacos com Doppler pulsátil. O ecocardiograma Doppler foi gravado em fitas de videocassete. Todas as quantificações foram realizadas a partir das imagens gravadas em três a cinco batimentos, sendo o valor médio dessas medidas considerado para a análise.

As imagens do ecocardiograma bidimensional foram adquiridas segundo as normas da Sociedade Americana de Ecocardiografia23.

O corte longitudinal paraesternal esquerdo ao modo bidimensional foi utilizado para a mensuração do diâmetro do anel aórtico, necessária para o cálculo do volume sistólico. O fluxo sistólico da via de saída do ventrículo esquerdo foi obtido a partir do corte apical, sendo a integral de velocidade de fluxo determinada por software próprio do equipamento de ultra-som. O volume sistólico (VS) foi então calculado com a seguinte fórmula:

VS = IVF . AST

onde: IVT: integral da velocidade de fluxo e AST: área da secção transversa do anel aórtico.

A freqüência cardíaca foi obtida com base no intervalo RR do eletrocardiograma. O débito cardíaco foi calculado como produto do volume sistólico pela freqüência cardíaca. Dividindo-se o débito cardíaco pela superfície corpórea obteve-se o índice cardíaco.

Análise estatística - Para averiguar o comportamento dos grupos consi-derando as condições estudadas fez-se uso da técnica de análise de variância com medidas repetidas (TIMM, 1975). A técnica de análise de variância com medidas repetidas pressupõe distribuição normal dos dados. O nível de significância utilizado para os testes foi de 5%. Os cálculos foram realizados pelo sistema SAS (Statistical Analysis System) (SAS, 1989).

RESULTADOS

Para o grupo normal, os valores das médias dos índices de fluxo sistólico na artéria braquial foram, para as condições basais (B1e B2) e para as condições pós-HR e esforço com 75% da carga máxima (EX75), respectivamente: 0,25 ± 0,08 l/min/m2; 0,20 ± 0,06 l/min/m2; 0,48 ± 0,17 l/min/m2 e 0,60 ± 0,24 l/mim/m2.

Para o grupo ICC, as médias dos índices do fluxo sistólico na artéria braquial nas condições basais (B1, B2) foram, respectivamente: 0,19 ± 0,08 l/min/m2 e 0,21 ± 0,09 l/min/m2. Nas condições HR e exercício com 75% da carga máxima (EX75), as médias dos índices de fluxo sistólico em território braquial foram, respectivamente: 0,43 ± 0,14 l/min/m2 e 0,45 ± 0,18 l/min/m2 .

Houve correlação positiva e significante entre os índices de fluxo sistólico nas condições HR e EX75 (r = 0,66, p = 0,005)

Os grupos não apresentaram diferença significante de comportamento ao longo das avaliações realizadas (p = NS). Os grupos não apresentaram diferença significante entre suas médias em cada um dos momentos avaliados (p = NS). Houve alteração desse parâmetro ao longo das avaliações (p < 0,001) para os dois grupos.

Analisando as médias dos índices de fluxo sistólico nas condições de estímulo (HR, EX75) observamos que não houve diferença significante entre elas (p = NS).

Na comparação entre os basais e as condições que os sucederam (B1xHR e B2xEX75) houve diferença significante em todas as avaliações realizadas, para os dois grupos (p < 0,001) (fig.5).


Para o grupo ICC, as médias dos índices cardíacos nas condições basal e após exercício com 75% da carga máxima foram, respectivamente, 1,93 ± 0,35 L/min/m2 e 2,01 ± 0,39 L/min/m2 (p < 0,001).

A análise das variações percentuais dos parâmetros foi feita avaliando-se o dado em uma condição pós-estímulo, considerado-o relativamente ao seu respectivo basal. Dessa forma, chamamos de delta 1 (D1) aquele observado entre as condições B1 e HR, e delta 2 (D2) aquele observado entre as condições B2 e EX75.

As variações percentuais das médias dos índices de fluxo sistólico da artéria braquial (D1 e D2) para o grupo ICC foram, respectivamente: 134,1 ± 48,5% e 208,3 ± 96,5%. Para o grupo normal os mesmos parâmetros foram, respectivamente: 94,5 ± 56,8% e 193,3 ± 90,1%. Os grupos não apresentaram diferença de comportamento (p = NS) e nem entre as médias, tanto no D1 como no D2 (p = NS). Houve diferença entre as condições 1 (B1 e HR) e 2 (B2 e EX75) para os dois grupos (p < 0,001). O D1 apresentou diferença significante com o D2 (p < 0,001) (fig.6).


DISCUSSÃO

Este estudo traz a proposta de uma nova metodologia na avaliação da reatividade vascular dependente de endotélio.

A prática de exercícios físicos tem sido cada vez mais difundida na IC24,25. Apesar disso, são poucos os estudos que associam essa prática à resposta hemodinâmica periférica nesses pacientes18,26.

Estudamos pacientes clinicamente compensados, principalmente no que diz respeito à presença de edema periférico. Esse fator pode interferir na resposta vasodilatadora em razão do aumento da rigidez vascular27, relacionada ao aumento da taxa de sódio na parede do vaso. Além disso, o edema pode levar a aumento de pressão tecidual com compressão mecânica dos capilares da microcirculação28.

Na condição EX75, a escolha do quinto batimento na fase de relaxamento foi feita de forma a facilitar a padronização da análise das curvas de velocidade de fluxo, já que esta apresenta decaimento rápido e progressivo até a sua normalização, no decorrer do tempo (fig. 4).

A escolha do esforço manual envolvendo pequena massa muscular, em vez de exercício utilizando os membros inferiores, pareceu-nos uma intervenção fisiologicamente mais interessante. A avaliação da resposta vascular a um esforço submáximo estaria mais compatível com a realidade dos pacientes limitados para atividade física e que desempenhem tarefas domésticas que exijam maior resistência muscular do que condicionamento aeróbio.

No estudo em questão não foi possível observar diferença no fluxo sangüíneo local, mesmo sob carga elevada, entre a HR e o exercício localizado. Entretanto, em termos porcentuais, a variação de fluxo pós-exercício foi mais intensa que pós-HR, principalmente levando-se em conta que a análise pós-exercício foi feita no quinto batimento após interrupção desse, e não no primeiro batimento como na condição HR.

Na avaliação do fluxo em panturrilha e em antebraço, após cinco minutos de isquemia local, em pacientes com IC compensados, sem edemas, e em indivíduos normais de idade semelhante observou-se diminuição do fluxo, comparativamente aos voluntários normais, apenas na panturrilha29. Neste estudo também não ocorreu diferença do fluxo em antebraço entre os dois grupos.

Assim, sugere-se que as anormalidades vasculares na ICC sejam regionalmente específicas não só pelas diferenças de fluxo observadas em territórios distintos, mas também pela distribuição do fluxo dentro do próprio músculo, favorecendo fibras oxidativas30.

Além disso, é possível que, hierarquicamente, à medida que a ICC progrida, as alterações inicialmente evidentes em membros inferiores passem a ocorrer também em membros superiores. Dessa forma, parece que a disparidade entre os estudos que avaliam reatividade vascular na insuficiência cardíaca diante de exercício se deve à diferenciação quanto à gravidade, ao estado de compensação clínica da população estudada e ao tipo de estímulo empregado (aeróbio, exercício contra resistência, cargas distintas e do território muscular avaliado).

Salientamos que, do ponto de vista metodológico, os estudos não-invasivos utilizando ultra-som arterial são mais apropriados e acurados para a análise em membros superiores do que para os inferiores.

Concluímos que o estudo de um território muscular menor, que mimetiza as atividades diárias tanto pelo tipo de trabalho como pela carga, demonstrou que o exercício com 75% da carga máxima aumentou o fluxo periférico de forma mais intensa que a HR, em termos porcentuais. Assim, é possível afirmar que a avaliação da reatividade vascular utilizando exercício resistido seja uma opção fisiológica, mais confortável, de fácil realização e comparável à HR no estudo da vasodilatação mediada pelo endotélio.

Potencial Conflito de Interesses

Declaro não haver conflitos de interesses pertinentes.

Recebido em 10/03/05

Aceito em 08/12/05

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  • Correspondência:
    Ricardo Tavares de Carvalho
    Av. Dr. Enéas de Carvalho Aguiar, 44
    05403-900 – São Paulo, SP
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      26 Jun 2006
    • Data do Fascículo
      Jun 2006

    Histórico

    • Aceito
      03 Dez 2005
    • Recebido
      10 Mar 2005
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