Open-access Evolução clínica pós-stent coronariano em pacientes submetidos a transplante de rim

Resumos

OBJETIVO: Avaliar a evolução clínica de pacientes submetidos a transplante de rim, portadores de doença arterial coronariana, que foram tratados com implante de stent coronariano (ATC-ST). MÉTODOS: Entre julho de 1998 e novembro de 2004, foram realizados, no total, 3.334 transplantes de rim em nossa Instituição (Hospital do Rim e Hipertensão). Desse total, 33 pacientes previamente submetidos a transplante de rim fizeram ATC-ST para o tratamento de 62 estenoses graves em 54 artérias coronárias, nos quais foi realizada análise retrospectiva. O registro dos eventos clínicos foi feito por meio de análise do prontuário médico, consulta médica e ligações telefônicas. RESULTADOS: No seguimento clínico de 30 meses, após a ATC-ST, observou-se que 67% dos pacientes permaneceram assintomáticos, 18% dos pacientes apresentaram quadro de angina estável, 6% apresentaram síndrome coronariana aguda sem supra de ST e 3% apresentaram síndrome coronariana aguda com supra de ST. Não houve pacientes com acidente vascular cerebral, insuficiência cardíaca congestiva ou morte cardíaca. Houve três mortes não-cardíacas. Foi observado índice de reestenose de 9%, que é comparável ao dos estudos de stent farmacológico. CONCLUSÃO: Concluímos que pacientes submetidos a transplante de rim que desenvolveram doença arterial coronariana e que foram tratados com stent coronariano tiveram baixo porcentual de reestenose clínica, provavelmente relacionado ao regime de imunossupressão administrado para evitar rejeição renal.

Transplante renal; angioplastia coronariana; reestenose intra-stent


OBJECTIVE: To assess the clinical outcome of renal transplant patients who developed coronary artery disease and were treated with coronary stenting (TCA-ST). METHODS: A total of 3,334 renal transplants were performed in our service - Hospital do Rim e Hipertensão - HRH (Kidney and Hypertension Hospital) from July, 1998 to November, 2004. During this period, 33 of the renal transplant patients underwent TCA-ST to treat 62 severe stenoses in 54 coronary arteries. A retrospective analysis was performed with renal transplant patients undergoing TCA-ST at HRH. The clinical events were registered using medical charts, medical visits and phone calls. RESULTS: During the 30-month clinical follow-up after TCA-ST, 67% of the patients remained asymptomatic, 18% presented stable angina, 6% presented acute coronary syndrome without ST-segment elevation (ACSWSTE), and 3% presented acute coronary syndrome with ST-segment elevation (ACSSTE). No strokes, CHF or cardiac deaths were observed. Three non-cardiac deaths occurred. A restenosis rate of 9% was observed, which is comparable to those found in studies on drug-eluting stents. CONCLUSION: In conclusion, renal transplant patients who developed CAD and were treated with coronary stenting had a low rate of in-stent restenosis, probably related to the immunosuppressive regimen given to prevent kidney rejection.

Renal transplant; coronary angioplasty; in-stent restenosis


ARTIGO ORIGINAL

Evolução clínica pós-stent coronariano em pacientes submetidos a transplante de rim

Fábio Monteiro Mota; Juliana Araújo; José Airton Arruda; Hélio T. S. Júnior; José O. M. Pestana; José Marconi A. de Sousa; Valter C. Lima

Hospital do Rim e Hipertensão – Universidade Federal de São Paulo – Escola Paulista de Medicina (UNIFESP – EPM) - São Paulo, SP

Correspondência Correspondência: Fábio Monteiro Mota Rua Napoleão de Barros, 715 – Térreo 04024-002 – São Paulo, SP E-mail: fby98@ig.com.br

RESUMO

OBJETIVO: Avaliar a evolução clínica de pacientes submetidos a transplante de rim, portadores de doença arterial coronariana, que foram tratados com implante de stent coronariano (ATC-ST).

MÉTODOS: Entre julho de 1998 e novembro de 2004, foram realizados, no total, 3.334 transplantes de rim em nossa Instituição (Hospital do Rim e Hipertensão). Desse total, 33 pacientes previamente submetidos a transplante de rim fizeram ATC-ST para o tratamento de 62 estenoses graves em 54 artérias coronárias, nos quais foi realizada análise retrospectiva. O registro dos eventos clínicos foi feito por meio de análise do prontuário médico, consulta médica e ligações telefônicas.

RESULTADOS: No seguimento clínico de 30 meses, após a ATC-ST, observou-se que 67% dos pacientes permaneceram assintomáticos, 18% dos pacientes apresentaram quadro de angina estável, 6% apresentaram síndrome coronariana aguda sem supra de ST e 3% apresentaram síndrome coronariana aguda com supra de ST. Não houve pacientes com acidente vascular cerebral, insuficiência cardíaca congestiva ou morte cardíaca. Houve três mortes não-cardíacas. Foi observado índice de reestenose de 9%, que é comparável ao dos estudos de stent farmacológico.

CONCLUSÃO: Concluímos que pacientes submetidos a transplante de rim que desenvolveram doença arterial coronariana e que foram tratados com stent coronariano tiveram baixo porcentual de reestenose clínica, provavelmente relacionado ao regime de imunossupressão administrado para evitar rejeição renal.

Palavras-chave: Transplante renal, angioplastia coronariana, reestenose intra-stent.

Introdução

Nos Estados Unidos, no período entre 1997 e 1999, foram registrados 275 mil pacientes com insuficiência renal crônica (IRC) em programa de diálise, com 239 mortes/1.000 pacientes/ano, sendo 44% dos óbitos decorrentes de doença cardiovascular. Nesse mesmo período, 107 mil pacientes foram submetidos a transplante de rim, com 34 mortes/1.000 pacientes/ano, sendo 41% dos óbitos decorrentes de doença cardiovascular. A menor mortalidade nos pacientes submetidos a transplante está relacionada a fatores como seleção de pacientes de menor risco para o transplante e redução do risco pelo próprio transplante. É importante observar que, a despeito da menor mortalidade dos pacientes submetidos a transplante comparativamente à dos pacientes em programa de diálise, a doença cardiovascular mantém-se como principal causa de morte1-5.

Portadores de IRC associada a diabete melito apresentam risco maior de morte (70%) em sete anos5-7. É importante ressaltar que a maior parte dos portadores de IRC apresenta diabete melito associado.

Portadores de IRC tratados com angioplastia com stent têm necessidade 2,2 vezes maior de nova revascularização da lesão-alvo comparativamente aos não-portadores de IRC (35% vs. 16%)8,9.

A IRC é um preditor de reestenose intra-stent, apresentando taxa de reestenose angiográfica após angioplastia com balão de cerca de 60% a 81%10,11 e taxa de reestenose clínica após implante de stent de cerca de 10% a 50%12-14.

O uso de ciclosporina em estudos experimentais tem demonstrado inibição da proliferação da célula muscular lisa em resposta a injúria vascular15,16. O uso de prednisona em pacientes submetidos a angioplastia e que tinham níveis altos de proteína C-reativa titulada (PCR-t) demonstrou redução tanto dos eventos clínicos como da reestenose angiográfica17.

Demonstramos previamente, por meio de ultra-som intracoronariano, que há mínima hiperplasia intimal intra-stent no grupo de pacientes submetidos a transplante de rim que fazem uso rotineiro de regime de imunossupressão18.

Não existem, na literatura, dados a respeito de como seria a evolução clínica e as taxas de reestenose clínica e de progressão de doença arterial coronariana (DAC) nessa população de pacientes submetidos a transplante de rim que fizeram angioplastia coronariana com implante de stent (ATC-ST).

O objetivo deste estudo foi avaliar a evolução clínica de pacientes submetidos a transplante de rim, portadores de DAC e tratados com ATC-ST, sendo considerados na evolução clínica todos os eventos cardiovasculares: reestenose clínica, síndrome coronariana aguda com supra de ST (SCACSST) e síndrome coronariana aguda sem supra de ST (SCASSST), acidente vascular cerebral (AVC), insuficiência cardíaca congestiva (ICC) e morte.

Métodos

Entre julho de 1998 e novembro de 2004, foram realizados, no total, 3.334 transplantes de rim em nossa Instituição (Hospital do Rim e Hipertensão - HRH) (fig. 1). Desse total, 33 pacientes previamente submetidos a transplante de rim fizeram ATC-ST para o tratamento de 62 estenoses graves em 54 artérias coronárias, tendo sido realizada análise retrospectiva dos pacientes submetidos a transplante de rim, em uso rotineiro de imunossupressão convencional (ciclosporina, azatioprina, prednisona, micofenolato de mofetil ou tacrolimus) e que fizeram ATC-ST. Não foram incluídos, nessa análise, pacientes em uso de rapamicina oral, pacientes que usaram stent farmacológico, pacientes que fizeram ATC-ST antes do transplante de rim e aqueles sem seguimento clínico disponível.


O registro dos eventos clínicos foi feito por meio de análise do prontuário médico, de consulta médica e de ligações telefônicas.

Foram analisadas as características demográficas, os fatores de risco para doença cardiovascular, as drogas imunossupressoras em uso, as drogas cardiovasculares em uso no período da angioplastia, o tempo de diálise antes do transplante, o tipo de doador, quantas artérias coronárias foram submetidas a angioplastia, o número de stents implantados e a evolução clínica por um período mínimo de seis meses após ATC-ST.

Os pacientes foram submetidos a novo cateterismo cardíaco quando apresentavam sintomas de DAC ou quando tinham exame não-invasivo positivo para isquemia miocárdica.

Resultados

Foram incluídos 33 pacientes, com mediana de tempo entre o transplante de rim e o implante do stent coronariano de 37 meses (variando de 3 dias a 121 meses). As características clínicas desses pacientes estão descritas na tabela 1.

Todos os pacientes faziam uso rotineiro, ao menos três dias antes do implante do stent, de aspirina e tienopiridínico. A aspirina foi mantida ininterruptamente e o tienopiridínico foi mantido por pelo menos 30 dias após a ATC-ST (tab. 2).

A mediana de tempo de diálise até o transplante de rim foi de 12 meses, variando de pacientes que não fizeram diálise até aqueles que fizeram diálise por 84 meses.

Cinqüenta e cinco por cento dos pacientes submetidos a transplante renal receberam o órgão de doador vivo.

O regime de imunossupressão foi distribuído da seguinte forma: 90%, prednisona; 70%, ciclosporina; 64%, azatioprina; 33%, micofenolato de mofetil; e 12%, tacrolimus.

As indicações de angioplastia coronariana foram por SCASSST em 67%, por SCACSST em 18%, e por angina estável em 15%. Os stents foram implantados com sucesso e todos os pacientes receberam alta sem complicações dentro das 48 horas do procedimento, tendo sido implantado 1,88 ± 1,11 stent por paciente.

A mediana de seguimento clínico foi de 30 meses (variando de 6 meses a 82 meses). Foi observada boa evolução clínica, com 64% dos pacientes permanecendo assintomáticos, 18% mantendo quadro de angina estável, 6% apresentando quadro de SCASSST e 3% apresentando quadro de SCACSST. Não houve registro de pacientes com AVC ou de pacientes com ICC após o procedimento. Não houve registro de morte cardíaca, e foram registradas três mortes não-cardíacas: duas por sepse urinária e uma por adenocarcinoma de cólon sigmóide. Os dados sobre a evolução clínica após implante de stent estão apresentados na tabela 3.

Três pacientes apresentaram reestenose clínica, definida como estenose intra-stent maior que 50% em paciente submetido a nova cineangiocoronariografia, obtendo índice de 9%. Se analisada a reestenose por stent implantado, foram registrados 5 stents com reestenose em 62 stents implantados, obtendo índice de 8%. Dez pacientes apresentaram progressão da DAC, definida como estenose > 50% em outro sítio não abordado por angioplastia coronariana, obtendo índice de 30%. Os índices de reestenose clínica e de progressão de DAC estão demonstrados na figura 2.


Discussão

Foi observado baixo índice de reestenose clínica (9%) nessa população de alto risco para reestenose: 45% dos pacientes submetidos a transplante de rim eram portadores de diabete melito, a maioria deles em uso de insulina, e alta média de implante de stents (1,88 ± 1,11 stent por paciente). Esses números se equiparam às taxas de reestenose clínica de estudos com stents farmacológicos em pacientes diabéticos19. O uso de grande número de stents por paciente equipara-se ao uso de aproximadamente dois stents por paciente demonstrado nos novos estudos com stents farmacológicos em pacientes multiarteriais20.

A maioria dos pacientes submetidos a ATC-ST manteve-se sem sintomas, com poucos registros de eventos cardiovasculares maiores. Houve baixo porcentual de progressão da DAC, provavelmente em decorrência de acompanhamento clínico por curto período de alguns pacientes nessa série de 33 pacientes.

A seguir estão destacados alguns pontos indicados como de limitação deste estudo: nem todos os pacientes foram submetidos a cineangiocoronariografia, porque não seria ético submeter os assintomáticos a novo exame invasivo; não dispomos dos níveis séricos dos imunossupressores de todos os pacientes para tentarmos correlacioná-los às taxas de reestenose; não há poder estatístico, pelo pequeno número de pacientes, para saber qual imunossupressor teve maior impacto na redução da reestenose clínica; e, finalmente, por se tratar de estudo observacional e retrospectivo, que teve por objetivo a análise clínica de seus pacientes, não foram analisadas outras variáveis mecanicísticas e substitutivas, como diâmetros de referência dos vasos, extensão da estenose, extensão de stent por paciente, diâmetro luminal mínimo, ganho agudo ou perda luminal tardia.

Conclusão

Pacientes submetidos a transplante de rim que desenvolveram DAC e que foram tratados com stent apresentam baixo porcentual de reestenose clínica, provavelmente relacionado ao regime de imunossupressão usado para evitar a rejeição renal.

Artigo recebido em 29/07/06; revisado recebido em 14/09/06; aceito em 14/09/06.

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  • Correspondência:
    Fábio Monteiro Mota
    Rua Napoleão de Barros, 715 – Térreo
    04024-002 – São Paulo, SP
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      15 Jun 2007
    • Data do Fascículo
      Maio 2007

    Histórico

    • Aceito
      14 Set 2006
    • Revisado
      14 Set 2006
    • Recebido
      29 Jul 2006
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