Open-access Fatores de risco cardiovascular em adolescentes com diferentes níveis de gasto energético

Resumos

FUNDAMENTO: A inatividade física na adolescência está relacionada com o acúmulo de gordura corporal, o que aparentemente pode aumentar a probabilidade do surgimento e desenvolvimento das alterações metabólicas. OBJETIVO: Verificar a predisposição dos fatores de risco para doenças cardiovasculares em adolescentes com diferentes níveis de gasto energético. MÉTODOS: Foram selecionados 108 rapazes e 132 moças, com idades entre 12 e 17 anos. O gasto energético diário foi obtido pelo questionário proposto por Bouchard e cols. Previamente dividiu-se amostra através dos quartis de gasto energético (kcal/kg/dia) para composição dos grupos: sedentário (GS), moderadamente ativo (GM) e ativo (GA). Para avaliar as concentrações de colesterol total (CT), HDL-C e triglicérides (TG), utilizou-se o método enzimático-colorimétrico. O LDL-C foi calculado pela fórmula de Friedewald e cols. Para análise estatística utilizou-se a análise de variância de um fator, adotando p<0,05. RESULTADOS: Para o sexo masculino, foram encontradas diferenças significativas entre os grupos na variável CT (mg/dl), sendo o GA (121,56±19,15) diferente do GM (142,70±27,65) e do GS (145,63±36,54), assim como o GM diferiu do GS (F=3,70 e p=0,03). Para a variável TG (mg/dl), o GA (65,69±18,95) diferiu-se do GM (82,25±33,73) e do GS (97,44±45,95), assim como o GM diferiu do GS (F=3,40 e p=0,04). Para o sexo feminino não foram encontradas diferenças significativas em razão do gasto energético diário. CONCLUSÃO: Os rapazes mais ativos apresentam menores concentrações de CT e TG quando comparados aos seus pares moderadamente ativos e sedentários.

Fatores de risco; gasto energético; adolescente


BACKGROUND: Physical inactivity in adolescence is related to body fat accumulation, which apparently can increase the probability of onset and development of metabolic changes. OBJECTIVE: To verify the predisposition to cardiovascular risk factors in adolescents with different levels of energy expenditure. METHODS: A total of 108 young men and 132 young women aged between 12 and 16 years were selected. Daily energy expenditure was obtained using the questionnaire proposed by Bouchard et al. The sample was previously divided according to the quartiles of energy expenditure (Kcal/kg/day) into three groups: sedentary (SG), moderately active (MG), and active (AG). The enzyme-colorimetric method was used to determine the total cholesterol (TC), HDL-C, and triglycerides (TG) levels. LDL-C was calculated using the Friedewald et al's formula. The one-factor analysis of variance was used for statistical analysis, considering p<0.05. RESULTS: For the male gender, significant differences were found between the groups for the TC variable (mg/dl); AG (121.56±19.15) was different from MG (142.70±27.65) and from SG (145.63±36.54). Likewise, MG was different from SG (F=3.70 and p=0.03). For the TG variable (mg/dl), AG (65.69±18.95) was different from MG (82.25±33.73) and from SG (97.44±45.95). Also, MG was different from SG (F=3.40 and p=0.04). For the female gender, no significant differences were found in relation to daily energy expenditure. CONCLUSION: More active young men show lower TC and TG levels in comparison with their moderately active and sedentary peers.

Risk factors; energy metabolism; adolescent


ARTIGO ORIGINAL

CARDIOLOGIA PEDIÁTRICA

Fatores de risco cardiovascular em adolescentes com diferentes níveis de gasto energético

Italo Quenni Araujo de Vasconcelos; Antonio Stabelini Neto; Luís Paulo Gomes Mascarenhas; Rodrigo Bozza; Anderson Zampier Ulbrich; Wagner de Campos; Renata Labronici Bertin

Universidade Federal do Paraná, Curitiba, PR - Brasil

Correspondência Correspondência: Italo Quenni Araujo de Vasconcelos Rua Lamartini Babo, 201 - Castelo Branco 86812-320 - Apucarana, PR - Brasil E-mail: italo@ufpr.br

RESUMO

FUNDAMENTO: A inatividade física na adolescência está relacionada com o acúmulo de gordura corporal, o que aparentemente pode aumentar a probabilidade do surgimento e desenvolvimento das alterações metabólicas.

OBJETIVO: Verificar a predisposição dos fatores de risco para doenças cardiovasculares em adolescentes com diferentes níveis de gasto energético.

MÉTODOS: Foram selecionados 108 rapazes e 132 moças, com idades entre 12 e 17 anos. O gasto energético diário foi obtido pelo questionário proposto por Bouchard e cols. Previamente dividiu-se amostra através dos quartis de gasto energético (kcal/kg/dia) para composição dos grupos: sedentário (GS), moderadamente ativo (GM) e ativo (GA). Para avaliar as concentrações de colesterol total (CT), HDL-C e triglicérides (TG), utilizou-se o método enzimático-colorimétrico. O LDL-C foi calculado pela fórmula de Friedewald e cols. Para análise estatística utilizou-se a análise de variância de um fator, adotando p<0,05.

RESULTADOS: Para o sexo masculino, foram encontradas diferenças significativas entre os grupos na variável CT (mg/dl), sendo o GA (121,56±19,15) diferente do GM (142,70±27,65) e do GS (145,63±36,54), assim como o GM diferiu do GS (F=3,70 e p=0,03). Para a variável TG (mg/dl), o GA (65,69±18,95) diferiu-se do GM (82,25±33,73) e do GS (97,44±45,95), assim como o GM diferiu do GS (F=3,40 e p=0,04). Para o sexo feminino não foram encontradas diferenças significativas em razão do gasto energético diário.

CONCLUSÃO: Os rapazes mais ativos apresentam menores concentrações de CT e TG quando comparados aos seus pares moderadamente ativos e sedentários.

Palavras-chave: Fatores de risco, gasto energético, adolescente.

Introdução

Atualmente, pesquisadores da área da saúde, como médicos, nutricionistas e educadores físicos, têm investigado sobre os diversos fatores que compõe um estilo de vida desejável para a população pediátrica. Estabelecendo-se a saúde como um dos componentes mais importantes, essa é definida como um estado de completo bem-estar físico, mental e social, e não apenas a ausência de doenças1.

Nesse sentido, partindo da premissa de que os hábitos adotados pelos adolescentes nessa fase podem ser mantidos futuramente em sua vida adulta, há de preocupar com os elementos principais do estilo de vida, principalmente quando são analisados os fatores comportamentais como a atividade física.

Dessa forma, a inatividade física na adolescência está relacionada com o acúmulo de gordura corporal, que aparentemente pode aumentar a probabilidade do surgimento e desenvolvimento das alterações metabólicas como a hipercolesterolemia, hipertrigliceridemia e hipertensão arterial2-4, constituindo um importante fator de preocupação de saúde pública5.

Em adultos, existe um substancial corpo de evidência de que a inatividade física está diretamente associada com o desenvolvimento de doenças cardiovasculares e diabete tipo 26,7, demonstrando associação inversa entre atividade física e alterações metabólicas8, mas em indivíduos jovens essa relação permanece contraditória9.

Considerando que a adolescência é uma fase de extrema facilidade para a incorporação de novos hábitos no estilo de vida, a detecção precoce dos fatores de risco para saúde torna-se importante, no sentido de aplicar uma eficiente estratégia de intervenção10,11. Em vista desses aspectos, estabeleceu-se como objetivo deste estudo analisar a predisposição dos fatores de risco para doenças cardiovasculares em adolescentes de 12 a 17 anos, com diferentes níveis de gasto energético.

Métodos

Amostra

A amostra aleatória foi composta por 240 adolescentes (108 rapazes e 132 moças), com faixa etária entre 12 e 16 anos, da cidade de São Mateus do Sul, Paraná, extraídos do banco de dados do projeto de pesquisa "Análise dos fatores de risco para doenças cardiovasculares e deficiência do sistema imunológico em adolescentes das escolas públicas de São Mateus do Sul, PR", que está sendo desenvolvido pelo Centro de Pesquisa em Exercício e Esporte da UFPR.

O tamanho amostral foi calculado de acordo com os seguintes critérios: a) número total de rapazes e moças matriculados na rede pública de ensino; b) intervalo de confiança de 95%; c) erro amostral de 5% e prevalência de 20%12. A estimativa de prevalência de 20% foi adotada considerando que a distribuição dos fatores de risco encontrada em outros estudos com indivíduos jovens apresenta valores inferiores a 20%2,13,14.

Inicialmente, foi enviada uma "carta convite" para cada escola com informações pertinentes ao estudo, contendo breve explicação sobre os objetivos da pesquisa e as avaliações a serem realizadas. Assim, os adolescentes sorteados que aceitaram participar das avaliações receberam um "termo de consentimento" livre e esclarecido que foi preenchido pelos pais ou respectivos responsáveis, autorizando a participação nas avaliações.

O Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal do Paraná aprovou a realização deste estudo, conforme resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde envolvendo pesquisas em seres humanos, processo nº 018-06.

Instrumentos e procedimentos

Estágio maturacional

Para determinação do estágio de maturação sexual foi utilizado o método proposto por Tanner15, em que os estágios maturacionais se dividem de um a cinco, sendo o estágio um quando a criança se encontra no nível considerado pré-púbere, e o outro extremo, o estágio cinco, quando o processo maturacional está finalizado.

O teste foi aplicado em forma de auto-avaliação do desenvolvimento da pilosidade pubiana, conforme sugerido por Martin e cols.16 e Bojikian e cols.17, que identificaram satisfatória concordância desse método com a avaliação médica de k = 0,61 e k = 0,53 para o sexo masculino e feminino respectivamente.

Gasto energético diário

Utilizou-se o questionário auto-recordatório desenvolvido por Bouchard e cols.18. Esse consiste em uma ficha para registro das atividades realizadas em dois dias da semana e um dia do final de semana, sendo esses divididos em partes de 15 minutos. As atividades são classificadas em um continuum envolvendo nove categorias, que representam o gasto energético médio das atividades realizadas. Essas categorias são classificadas de um a nove, e a categoria um se caracteriza pelas atividades de menor gasto calórico (sono e repouso na cama), e a categoria nove, com atividades de elevado gasto calórico (trabalho manual intenso e esporte competitivo).

De posse dessas informações, foi possível estimar o gasto energético diário (GED) dividido por quilograma de peso corporal por dia (kcal/kg/dia), bem como o GED pela média dos três dias do recordativo. O questionário apresenta reprodutibilidade de r=0,91 em indivíduos a partir de 10 anos de idade18.

A fim de classificar os indivíduos quanto ao GED, a amostragem foi dividida em quartis (Q) de acordo com o sexo8. A discriminação da formação dos grupos de acordo com o GED (kcal/kg/dia) e os pontos de corte estabelecidos é apresentada na tabela 1.

Antropometria

Para avaliar a estatura total foi utilizado um estadiômetro portátil da marca WCS com resolução de 0,1 cm. A massa corporal foi mensurada utilizando-se uma balança digital portátil, marca PLENNA, com resolução de 100 g. Os sujeitos no momento da avaliação permaneceram descalços e vestindo somente trajes leves19.

Para obtenção dos valores do índice de massa corporal (IMC), utilizou-se à relação peso (kg), dividido pela estatura (m) elevada ao quadrado20. O estado nutricional dos adolescentes foi classificado utilizando as tabelas de referência proposta por Anjos e cols.21: adequado > percentil 5º e < percentil 85º; sobrepeso > percentil 85º e < percentil 95º; obesidade > percentil 95º.

O perímetro da cintura (PC) foi mensurado no ponto médio entre o último arco costal e a crista ilíaca, no momento de respiração mínima, utilizando-se uma fita antropométrica metálica flexível da marca SANNY, com escala de 0,1 cm22. O perímetro da cintura foi classificado de acordo com as tabelas propostas por Fernandez e cols.23, adotando valores de percentil < 75º como estado adequado e valores de percentil > 75º como valor aumentado.

Pressão arterial

A pressão arterial sistólica (PAS) e diastólica (PAD) foram aferidas no braço esquerdo do avaliado com um esfigmomanômetro de coluna de mercúrio com capacidade de 300 mmHg e variação de 2 mmHg, postado ao nível do coração acompanhado de estetoscópio. A mensuração foi realizada após o indivíduo permanecer sentado em repouso por um período de no mínimo cinco minutos.

Os adolescentes foram inicialmente classificados pela estatura de acordo com a proposta do Centers for Disease Control24, e os valores obtidos juntamente com a idade cronológica foram considerados para a classificação das pressões arteriais em estado desejável (<90º) e estado indesejável (>90º) de acordo com o consenso do The Fourth Report on the Diagnosis, Evaluation, and Treatment of High Blood Pressure in Children and Adolescents 25.

Variáveis bioquímicas

Conforme as Diretrizes da Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC)5, os adolescentes foram orientados a estar em jejum prévio de no mínimo 12h, evitar o consumo excessivo de gordura e não ingerir bebidas alcoólicas três dias antes do teste.

As concentrações de colesterol total (CT), HDL e triglicérides (TG) foram analisadas pelo método enzimático colorimétrico automatizado. O LDL-C em mg/dl foi calculado pela fórmula de Friedewald e cols.26: LDL-C= CT-HDL-TG/5. O VLDL foi calculado pela fórmula: VLDL= TG/5. Os valores de referências adotados para definir o perfil lipídico-lipoprotéico de risco aterogênico, estão de acordo com a I Diretriz de Prevenção da Aterosclerose na Infância e Adolescência13 (tab. 2).

Tratamento dos dados e análise estatística

Para a caracterização da amostra foi utilizada a estatística descritiva expressa em valores médios e desvio padrão. A distribuição de freqüência foi empregada para a classificação dos indivíduos de acordo com os pontos de corte adotados para cada variável. Análises de variância (ANOVA) de um fator foram adotadas para comparação das variáveis entre os diferentes índices de GED. Subseqüentemente, para localizar as diferenças encontradas na ANOVA, foi utilizado o teste de comparação múltipla de Tukey, com um nível de significância estipulado em p<0,05. Todos esses procedimentos foram realizados no software estatístico SPSS 13.0 (Chicago, IL).

Resultados

Inicialmente, apresenta-se na tabela 3 a caracterização da amostra dos grupos masculino e feminino, com valores médios e desvios padrão das variáveis: idade decimal, estatura, massa corporal e GED. Da amostra total, 7,7% dos adolescentes encontram-se no estágio dois, 12,9% no estágio três, 52,8 % no estágio quatro e 26,6% no estágio cinco de maturação sexual.

Em vista das particularidades da população avaliada quanto às características biológicas, são apresentadas na tabela 4 as prevalências de sujeitos com valores desejáveis e indesejáveis das variáveis antropométricas (IMC e PC), hemodinâmicas (PAS e PAD) e bioquímicas (CT, LDL-C, HDL-C e TG) correspondentes aos fatores de risco cardiovascular.

Na tabela 5 são apresentados os valores médios e desvios-padrão para os rapazes divididos em: GS, GM e GA. A análise de variância indicou diferenças significativas entre os grupos para o gasto energético nas atividades diárias (F=123,24 e p=0,0001), demonstrando que os grupos são heterogêneos quanto ao nível habitual de atividades físicas. Foram observadas diferenças estatísticas entre os grupos para o CT e TG (F=3,70 e p=0,03; F=3,40 e p=0,04, respectivamente). Para as demais variáveis, não foram observadas diferenças significativas.

Na tabela 6 são apresentados os valores médios e desvios padrão dos valores apresentados pelas moças. A análise de variância indicou diferenças significativas entre os grupos somente para o GED (F=123,24 e p=0,0001). Para as demais variáveis, não foram observadas diferenças significativas.

Discussão

Diante das prevalências apresentadas na tabela 4, observa-se para o IMC que a maior proporção de rapazes e moças se encontra com valores adequados quanto ao estado nutricional, seguido de uma menor proporção com sobrepeso e obesidade. Contudo, a proporção de sujeitos com valores adequados se apresenta menor quando comparada ao estudo realizado com adolescentes do Estado da Bahia27, que encontraram uma proporção de 90,4% dos rapazes e 94,1% das moças com estado nutricional adequado.

Quanto às variáveis hemodinâmicas, a maior proporção de adolescentes, tanto os rapazes quanto as moças, apresentaram valores desejáveis. No entanto, deve-se preocupar com a incidência de adolescentes com valores indesejáveis de PAD, que geralmente estão associados ao excesso de peso e obesidade28,29. Os valores limítrofes da pressão arterial do presente estudo são maiores do que apresentados por Ribeiro e cols.28 na cidade de Belo Horizonte, que encontraram 12% dos indivíduos com valores limítrofes ou aumentados de PAS ou PAD.

Guedes e cols.2 apresentaram uma prevalência de valores indesejáveis para a PAS de 9,7% para as moças e 8,8% para os rapazes, e para PAD as moças apresentaram valores 10,8% e os rapazes apresentaram 8,1%. As diferenças entre os resultados podem ocorrer pelos diferentes pontos de corte utilizados para a pressão arterial.

O presente estudo demonstrou uma prevalência de hipercolesterolemia em 16,7% nos meninos e 13,8% nas meninas, diferindo das observadas no estudo de Giuliano e cols.14, que encontraram 10% de valores aumentados, enquanto Guedes e cols.2 encontraram 5,6% dos rapazes, e 12,9% das moças com valores aumentados de CT. Entretanto, a diferença entre os resultados dos estudos se deve ao diferente ponto de corte utilizado para hipercolesterolemia, ressaltando que a presente pesquisa utilizou os pontos de corte de acordo com a I Diretriz de Prevenção da Aterosclerose na Infância e Adolescência13.

Quanto ao LDL-C, o estudo de Giuliano e cols.14 encontrou menor proporção de sujeitos com valores limítrofes (14%) e aumentados (6%), assim como, menor a incidência de valores indesejáveis de HDL-C (5%), quando comparados ao presente estudo. Desse modo, há de preocupar com a proporção de adolescentes com valores indesejáveis de LDL-C, a qual pode levar ao surgimento de indicadores de risco cardiovascular como hipertensão arterial, intolerância a glicose e deficiência nos receptores de insulina14,28-30.

Tratando-se dos níveis de TG, a amostra deste estudo apresentou menor prevalência de adolescentes com valores aumentados quando comparada à amostra avaliada por Giuliano e cols.14, que detectaram 22% dos sujeitos com valores indesejáveis, indicando quadro de hipertrigliceridemia plasmática31.

Dessa forma, como as variáveis investigadas nas análises de prevalência demonstraram estado de risco cardiovascular para uma parte dos indivíduos, e sabendo das contribuições da atividade física sobre o estado de saúde, pretendeu-se verificar a predisposição destes indicadores nos adolescentes com diferentes níveis de gasto energético (tab. 5 e 6).

Observa-se pela análise de variância que, em ambos os sexos, as variáveis antropométricas não diferiram significativamente entre os grupos, possivelmente pelo fato de que a maioria dos sujeitos avaliados se encontra com estado nutricional adequado.

Quanto às variáveis bioquímicas, os rapazes mais ativos fisicamente apresentaram menores valores de colesterol total e de triglicérides, quando comparados aos menos ativos (moderado e sedentário). Além disso, apesar de não apresentar significância em linguagem estatística, verifica-se que os valores médios do GA para as variáveis LDL-C e VLDL-C se apresentaram inferiores aos valores médios do GM e GS. Assim, percebe-se que o maior GED nas atividades físicas habituais, conseqüentemente, contribui na redução dos valores excessivos de lipoproteínas e lipídios plasmáticos nos adolescentes do sexo masculino.

Condizentes com esses achados, Durstine e Haskell32 observaram que indivíduos fisicamente ativos e envolvidos em programas de treinamento aeróbico apresentam menores concentrações de colesterol total e triglicérides, quando comparados aos seus pares sedentários.

Além disso, em estudo de intervenção, foi demonstrado que o exercício físico é um dos principais responsáveis em favorecer o estado desejável do perfil de lipídios, lipoproteínas e patologias por doenças coronarianas33. Isso se deve as características fisiológicas do exercício físico, que melhoram a capacidade do tecido muscular em realizar a oxidação dos ácidos graxos; além disso, estimula a atividade da enzima lípase no músculo, contribuindo assim para a diminuição das lipoproteínas e lipídios plasmáticos, inclusive em indivíduos jovens32-34.

A mesma situação, todavia, não se confirmou para as moças, as quais não apresentaram diferenças significativas entre os grupos classificados pelo GED em nenhum dos indicadores de risco cardiovascular analisados. Isso sugere que, para essa amostra, o maior GED por si só não ocasionou menores valores de IMC, PC, pressão arterial, lipídios e lipoproteínas plasmáticas nas adolescentes ativas.

Esses resultados corroboram os estudos de Guedes e cols.2, em que o gasto energético diário das adolescentes não foi determinante para diminuição dos indicadores correspondentes aos fatores de risco para doenças cardiovasculares. Da mesma forma, Sung e cols.34 observaram que seis semanas de treinamento não foram suficientes para a diminuição dos valores de CT e LDL-C em indivíduos jovens do sexo feminino.

Sendo assim, os resultados não significativos do presente estudo levam a crer que outros fatores como características da puberdade, histórico familiar de doenças cardiovasculares, tabagismo e o uso de álcool podem estar influenciando no comprometimento dos indicadores correspondentes aos fatores de risco para doenças cardiovasculares2,30.

Sabendo, portanto, das limitações da presente pesquisa, futuros estudos devem ser conduzidos, com maior número de participantes realizando acompanhamento em médio ou longo prazo, ou envolvendo aplicação de tratamento experimental com controle dos hábitos alimentares, a fim de melhor diagnosticar o estado de saúde e suas inter-relações com aspectos comportamentais da população pediátrica.

Em síntese, verificou-se que uma parcela significativa dos adolescentes dessa amostra se encontra com níveis indesejáveis de IMC, PC, PAD, CT, LDL-C, HDL-C e TG, o que demonstra a necessidade de adotar medidas de intervenção para esses sujeitos. Levando em consideração o gasto energético diário, os rapazes do GA apresentaram menores concentrações de CT e TG, quando comparados aos seus pares moderadamente ativos e sedentários.

Agradecimentos

Aos adolescentes e seus respectivos responsáveis, que colaboraram como sujeitos da pesquisa, bem como às Secretarias Municipal de Educação, Cultura e Lazer e Saúde da cidade de São Mateus do Sul, PR, pelo apoio dado na execução do projeto.

Potencial Conflito de Interesses

Declaro não haver conflito de interesses pertinentes.

Fontes de Financiamento

O presente estudo não teve fontes de financiamento externas.

Vinculação Acadêmica

Não há vinculação deste estudo a programas de pós-graduação.

Artigo enviado em 30/05/07; revisado enviado em 17/07/07; aceito em 25/02/08.

Referências bibliográficas

  • 1. World Health Organization. Working for health: an introduction to the WHO. Washington: WHO; 2007.
  • 2. Guedes DP, Guedes JERP, Barbosa DS, Oliveira JA, Stanganelli LCR. Fatores de risco cardiovasculares em adolescentes: indicadores biológicos e comportamentais. Arq Bras Cardiol. 2006; 86 (6): 439-50.
  • 3. Kim HM, Park J, Kim H, Kim DH, Park SH. Obesity and cardiovascular risk factors in Korean children and adolescents aged 10-18 years from the Korean National Health and Nutrition Examination Survey, 1998 and 2001. Am J Epidem. 2006 (8): 787-93.
  • 4. Katzmarzyk PT, Srinivasan SR, Chen W, Malina RM, Bouchard C, Berenson GS. Body mass index, waist circumference, and clustering of cardiovascular disease risk factors in a biracial sample of children and adolescents. Pediatrics. 2004; 114: e198-205.
  • 5 Sociedade Brasileira de Cardiologia. III Diretrizes Brasileiras sobre dislipidemias e diretriz de prevenção da aterosclerose do departamento de aterosclerose. Arq Bras Cardiol. 2001; 77 (supl. 3): 1-48.
  • 6. Freedman D, Srinavasan S, Burke G. Relationship of body fat distribution in children and adolescents: the Bogalusa Heart Study. Am J Clin Nutr. 1987; 46: 403-10.
  • 7. Ciolac EG, Guimarães GV. Exercício físico e síndrome metabólica. Rev Bras Med Esporte. 2004; 10 (4): 319-24.
  • 8. Franks PW, Ekelund U, Brage S, Wong M, Wareham NJ. Does the association of habitual physical activity with the metabolic syndrome differ by level of cardiorespiratory fitness? Diabete Care. 2004; 27 (3): 1187-93.
  • 9. Eriksson J, Taimela S, Koivisto VA. Exercise and the metabolic syndrome. Diabetologia. 1997; 40: 125-35.
  • 10. Sarni RS, Souza FIS, Schoeps DO, Catherino P, Oliveira MCP, Pessotti CFX, et al. Relação da cintura abdominal com a condição nutricional, perfil lipídico e pressão arterial em pré-escolares de baixo estrato socioeconômico. Arq Bras Cardiol. 2006; 87 (2): 153-8.
  • 11. Mendes GA, Martinez TL, Izar MC, Amâncio OM, Novo NF, Matheus SC, et al. Perfil lipídico e efeitos da orientação nutricional em adolescentes com história familiar de doença arterial coronariana prematura. Arq Bras Cardiol. 2006; 86 (5): 361-5.
  • 12. Luiz RR, Magnanini MMF. A lógica da determinação do tamanho da amostra em investigações epidemiológicas. Cad Saúde Pública. 2000; 8 (2): 9-28.
  • 13. Sociedade Brasileira de Cardiologia. I Diretriz de prevenção da aterosclerose na infância e adolescência. Arq Bras Cardiol. 2005; 85 (supl 6): 1-36.
  • 14. Giuliano ICB, Coutinho MSSA, Freitas SFT, Pires MMS, Zunino JN, Ribeiro RQC. Lípides séricos em crianças e adolescentes de Florianópolis, SC - Estudo Floripa Saudável 2040. Arq Bras Cardiol. 2005; 85 (2): 85-91.
  • 15. Tanner JM. Growth and adolescence. Oxford: Blackwell Scientific Publication; 1962.
  • 16. Martin RHC, Uezu R, Parra AS, Arena SS, Bojikian LP, Bohme MTS. Auto-avaliação da maturação sexual masculina por meio da utilização de desenhos e fotos. Rev Paul Ed Fis. 2001; 15 (2): 212-22.
  • 17. Bojikian LP, Massa M, Martin RHC, Texeira CP, Kiss MAPD, Bohme MTS. Auto-avaliação puberal feminina por meio da utilização de desenhos e fotos. Rev Bras Ativ Fis Saúde. 2002; 7 (2): 24-34.
  • 18. Bouchard CA, Tremblay C, Leblanc G, Lortie R, Savard R, Theriault GA. Method to assess energy expenditure in children and adults. Am J Clin Nutrition. 1983; 37: 461-7.
  • 19. Docherty D. Measurement in pediatric exercise science. Champaign: Human Kinetics; 1996.
  • 20 American College of Sports Medicine. Diretrizes do ACSM para os testes de esforço e sua prescrição. 6ª ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2003.
  • 21. Anjos LA, Veiga GV, Castro IRR. Distribuição dos valores do índice de massa corporal da população brasileira até 25 anos. Rev Panam Salud Publica. 1998; 3 (3): 167-73.
  • 22. Costa RF. Composição corporal: teoria e prática da avaliação. São Paulo: Manole; 2001.
  • 23. Fernandez JR, Redden T, Pietrobelli A, Allison B. Waist circumference percentiles in nationally representative samples of African-American, European-American, and Mexican-American children and adolescents. J Pediatr. 2004; 145: 439-44.
  • 24. Kuczmarski RJ, Odgen CL, Grummer-Strawn LM, Flegal KM, Guo SS, Wei R, et al. CDC growth charts: United States. Adv Data. 2000; 314: 1-27.
  • 25. National High Blood Pressure Education Program Working Group on High Blood Pressure in Children and Adolescents. The fourth report on the diagnosis, evaluation, and treatment of high blood pressure in children and adolescents. Pediatrics. 2004; 114 (2 Suppl 4th Report): 555-76.
  • 26. Friedewald WT, Levy RL, Fredrickson DS. Estimation of the concentration of low-density lipoprotein cholesterol in plasma without the use of preparative ultracentrifuge. Clin Chem. 1972; 18: 499-502.
  • 27. Santos JS, Costa MCO, Nascimento Sobrinho CL, Silva MCM, Souza KEP, Melo BO. Perfil antropométrico e consumo alimentar de adolescentes de Teixeira de Freitas - Bahia. Rev Nutr Campinas. 2005; 18 (5): 623-32.
  • 28. Ribeiro RQC, Lotufo PA, Lamounier JA, Oliveira RG, Soares JF, Botter DA. Fatores adicionais de risco cardiovascular associados ao excesso de peso em crianças e adolescentes: o estudo do coração de Belo Horizonte. Arq Bras Cardiol. 2006; 86 (6): 408-18.
  • 29. Carneiro JRI, Kushni MC, Clemente ELS, Brandão MG, Gomes MB. Obesidade na adolescência: fator de risco para complicações clínico-metabólicas. Arq Bras Endocrinol Metabol. 2000; 44 (5): 390-6.
  • 30. Gerber ZRSG, Zielinski P. Fatores de risco de aterosclerose na infância: um estudo epidemiológico. Arq Bras Cardiol. 1997; 69 (4): 231-6.
  • 31. Schiavo M, Lunardelli A, Oliveira JR. Influência de triglicérides na concentração sérica de triglicérides. J Bras Patol Med Lab. 2003; 39 (4): 283-8.
  • 32. Durstine JL, Haskell WL. Effects of exercise on plasma lipids and lipoproteins. Exerc Sport Sci Rev. 1994; 22: 477-521.
  • 33. Ekelund LG, Haskell WL, Johnson JL, Whaley FS, Criqui MH, Sheps DS. Physical fitness as predictor of cardiovascular mortality in asymptomatic North American men: The Lipid Research Clinics Mortality Follow-Up Study. N Engl J Med. 1988; 319: 1379-84.
  • 34. Sung RYT, Yu CW, Chang SKY, Mo SW, Woo KS, Lam CWK. Effects of dietary intervention and strength training on blood lipid level in obese children. Arch Dis Child. 2002; 86: 407-10.
  • Correspondência:
    Italo Quenni Araujo de Vasconcelos
    Rua Lamartini Babo, 201 - Castelo Branco
    86812-320 - Apucarana, PR - Brasil
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      11 Nov 2008
    • Data do Fascículo
      Out 2008

    Histórico

    • Recebido
      30 Maio 2007
    • Revisado
      17 Jul 2007
    • Aceito
      25 Fev 2008
    location_on
    Sociedade Brasileira de Cardiologia - SBC Avenida Marechal Câmara, 160, sala: 330, Centro, CEP: 20020-907, (21) 3478-2700 - Rio de Janeiro - RJ - Brazil, Fax: +55 21 3478-2770 - São Paulo - SP - Brazil
    E-mail: revista@cardiol.br
    rss_feed Acompanhe os números deste periódico no seu leitor de RSS
    Acessibilidade / Reportar erro