Resumos
FUNDAMENTO: A detecção precoce de alterações septais, tais como a hipertrofia septal comumente presente em fetos de mães diabéticas, contribuiria para a redução das altas taxas de mortalidade infantil. OBJETIVO: Determinar intervalos de referência para a área do septo interventricular fetal por meio da ultrassonografia tridimensional (US3D) utilizando o método STIC (Spatio-Temporal Image Correlation). MÉTODOS: Realizou-se um estudo de corte transversal com 69 gestantes normais entre a 18ª e 33ª semanas de gestação. Utilizou-se como referência o plano de quatro câmaras com a ROI (Região de Interesse) posicionada a partir dos ventrículos, sendo a área do septo delimitada de modo manual. Para se avaliar a correlação da área do septo interventricular com a idade gestacional (IG), construíram-se diagramas de dispersão e calculou-se o coeficiente de correlação de Pearson (r), sendo o ajuste realizado pelo coeficiente de determinação (R²). Foram calculadas médias, medianas, desvios-padrão (dp), valores máximo e mínimo. Para o cálculo da reprodutibilidade intraobservador, utilizou-se o coeficiente de correlação intraclasse (CCI). Obteve-se a medida da espessura do septo interventricular e ela foi correlacionada com a IG e a área septal obtida pelo modo renderizado em 52 pacientes utilizando-se o CCI. RESULTADOS: A área do septo interventricular foi altamente correlacionada com a idade gestacional (r = 0,81), e a média aumentou de 0,47 cm² na 18ª para 2,42 cm² na 33ª semana de gestação. A reprodutibilidade intraobservador foi excelente com CCI = 0,994. Não se observou correlação significativa entre a medida do septo interventricular e a IG (R² = 0,200), assim como não houve correlação com a área do septo obtida pelo modo renderizado com CCI = 0,150. CONCLUSÃO: Intervalos de referência para a área do septo interventricular entre a 18ª e 33ª semanas de gestação foram determinados e se mostraram altamente reprodutíveis.
Gravidez; coração fetal; septo interventricular; valores de referência; imagem tridimensional
FUNDAMENTO: La detección precoz de alteraciones septales, tales como la hipertrofia septal comúnmente presente en fetos de madres diabéticas, contribuiría a la reducción de las altas tasas de mortalidad infantil. OBJETIVO: Determinar intervalos de referencia para el área del septo interventricular fetal por medio de la ultrasonografía tridimensional (US3D) utilizando el método STIC (Spatio-Temporal Image Correlation). MÉTODOS: Se realizó un estudio de corte transversal con 69 gestantes normales entre la 18ª y 33ª semanas de gestación. Se utilizó como referencia el plano de cuatro cámaras con la ROI (Región de Interés) posicionada a partir de los ventrículos, siendo el área del septo delimitada de modo manual. Para evaluar la correlación del área del septo interventricular con la edad gestacional (EG), se construyeron diagramas de dispersión y se calculó el coeficiente de correlación de Pearson (r), siendo el ajuste realizado por el coeficiente de determinación (R²). Fueron calculadas medias, medianas, desviaciones-estándar (de), valores máximo y mínimo. Para el cálculo de la reproductibilidad intraobservador, se utilizó el coeficiente de correlación intraclase (CCI). Se obtuvo la medida del espesor del septo interventricular y la misma fue correlacionada con la EG y el área septal obtenida por el modo renderizado en 52 pacientes utilizando el CCI. RESULTADOS: El área del septo interventricular fue altamente correlacionada con la edad gestacional (r = 0,81), y la media aumentó de 0,47 cm² en la 18ª a 2,42 cm² en la 33ª semana de gestación. La reproductibilidad intraobservador fue excelente con CCI = 0,994. No se observó correlación significativa entre la medida del septo interventricular y la EG (R² = 0,200), así como no hubo correlación con el área del septo obtenida por el modo renderizado con CCI = 0,150. CONCLUSIÓN: Intervalos de referencia para el área del septo interventricular entre la 18ª y 33ª semanas de gestación fueron determinados y se mostraron altamente reproducibles. (Arq Bras Cardiol 2011;96(5):386-392)
Gravidez; corazón fetal; septo interventricular; valores de referencia; imagen tridimensional
BACKGROUND: Early detection of septal changes such as septal hypertrophy commonly present in fetuses of diabetic mothers would help reduce the high rates of infant mortality. OBJECTIVE: Determine reference ranges for the fetal ventricular septal area through three-dimensional ultrasound (US3D) using the STIC method (Spatio-Temporal Image Correlation). METHODS: We conducted a cross-sectional study with 69 pregnant women between the 18th and 33rd weeks of pregnancy. We used as a reference the four-chamber plane with the ROI (Region of Interest) positioned from the ventricles; the septum area were manually marked. To assess the correlation of the interventricular septum area with gestational age (GA), we constructed scatter plots and calculated Pearson's correlation coefficient (r), and the adjustment was performed by the coefficient of determination (R²). We calculated averages, medians, standard deviations (sd), as well as maximum and minimum values. To calculate the intraobserver reproducibility, we used the intraclass correlation coefficient (ICC). The interventricular septum thickness was measured and it was correlated with gestational age and the septal area rendered in 52 patients using the ICC. RESULTS: The interventricular septum area was highly correlated with gestational age (r = 0.81), and the average increased from 0.47 cm² in the 18th week to 2.42 cm² in the 33rd of gestation. The intraobserver reproducibility was excellent with ICC = 0.994. No significant correlation was observed between the interventricular septum measurement and the GA (R² = 0.200), as well as there was no correlation with the septal area rendered with ICC = 0.150. CONCLUSION: Reference intervals for the interventricular septum area between the 18th and the 33rd pregnancy week were determined to be highly reproducible.
Pregnancy; fetal heart; ventricular septum; reference values; imaging, three-dimensional
ARTIGO ORIGINAL
Curva de referência da área do septo interventricular fetal pelo método STIC: estudo preliminar
Liliam Cristine Rolo; Luciano Marcondes Machado Nardozza; Edward Araujo Júnior; Christiane Simioni; Marina Maccagnano Zamith; Antonio Fernandes Moron
Departamento de Obstetrícia - Universidade Federal de São Paulo, São Paulo, SP - Brasil
Correspondência Correspondência: Edward Araujo Júnior Rua Napoleão de Barros, 875 - Vila Clementino 04024-002 - São Paulo, SP - Brasil E-mail: araujojred@terra.com.br
RESUMO
FUNDAMENTO: A detecção precoce de alterações septais, tais como a hipertrofia septal comumente presente em fetos de mães diabéticas, contribuiria para a redução das altas taxas de mortalidade infantil.
OBJETIVO: Determinar intervalos de referência para a área do septo interventricular fetal por meio da ultrassonografia tridimensional (US3D) utilizando o método STIC (Spatio-Temporal Image Correlation).
MÉTODOS: Realizou-se um estudo de corte transversal com 69 gestantes normais entre a 18ª e 33ª semanas de gestação. Utilizou-se como referência o plano de quatro câmaras com a ROI (Região de Interesse) posicionada a partir dos ventrículos, sendo a área do septo delimitada de modo manual. Para se avaliar a correlação da área do septo interventricular com a idade gestacional (IG), construíram-se diagramas de dispersão e calculou-se o coeficiente de correlação de Pearson (r), sendo o ajuste realizado pelo coeficiente de determinação (R2). Foram calculadas médias, medianas, desvios-padrão (dp), valores máximo e mínimo. Para o cálculo da reprodutibilidade intraobservador, utilizou-se o coeficiente de correlação intraclasse (CCI). Obteve-se a medida da espessura do septo interventricular e ela foi correlacionada com a IG e a área septal obtida pelo modo renderizado em 52 pacientes utilizando-se o CCI.
RESULTADOS: A área do septo interventricular foi altamente correlacionada com a idade gestacional (r = 0,81), e a média aumentou de 0,47 cm2 na 18ª para 2,42 cm2 na 33ª semana de gestação. A reprodutibilidade intraobservador foi excelente com CCI = 0,994. Não se observou correlação significativa entre a medida do septo interventricular e a IG (R² = 0,200), assim como não houve correlação com a área do septo obtida pelo modo renderizado com CCI = 0,150.
CONCLUSÃO: Intervalos de referência para a área do septo interventricular entre a 18ª e 33ª semanas de gestação foram determinados e se mostraram altamente reprodutíveis.
Palavras-chave: Gravidez, coração fetal, septo interventricular, valores de referência, imagem tridimensional.
Introdução
O aumento progressivo da demanda de oxigênio em razão do rápido crescimento do embrião durante as fases iniciais da embriogênese determina a precoce formação cardíaca por volta do 22º-23º dias de gestação1. Progressivamente, o coração primitivo fetal sofre uma série de processos remodeladores capazes de modificar a sua anatomia, até atingir a forma funcional que conhecemos1.
O coração, quando já composto de suas quatro câmaras (átrios e ventrículos), apresenta no interior de seus ventrículos o septo interventricular (IV) divisor, formado a partir da fusão das paredes mediais: a parte muscular do septo IV. Dentro dos ventrículos, com a cavitação dos mesmos, os feixes musculares serão formados e esses originam os músculos papilares e as cordas tendíneas1, com função de competência valvar, impedindo o prolapso das cúspides durante a sístole cardíaca e o refluxo sanguíneo2.
Em 50% dos casos, as malformações cardíacas são consideradas defeitos maiores, fatores determinantes da elevação da taxa da mortalidade infantil precoce e tardia3,4, evidenciando a necessidade do rastreamento e diagnóstico precoce de tais cardiopatias. Apesar da ampla aplicação da ultrassonografia convencional no rastreamento de cardiopatias congênitas, a detecção pré-natal ainda apresenta lacunas diagnósticas, o que impulsiona o desenvolvimento de novas técnicas de aquisição de imagem para um melhor rastreamento cardíaco durante a rotina do pré-natal5-7.
Nas últimas décadas, com o desenvolvimento da ultrassonografia tridimensional (US3D) e da tecnologia do Spatio-Temporal Image Correlation (STIC), surgiu uma nova forma de análise cardíaca pré-natal. Tal técnica permite a obtenção do volume cardíaco e seu armazenamento para posterior reconstrução e análise da sua anatomia, apresentando a imagem no modo multiplanar e de superfície (renderizada), identificando-se as câmaras cardíacas, as válvulas atrioventriculares e semilunares, além do posicionamento dos vasos e suas correlações, podendo-se também acompanhar o movimento cardíaco pelo uso da técnica do cineloop7-9.
Apesar dos inúmeros trabalhos desenvolvidos com a técnica de STIC, não se encontra na literatura a sua aplicação na avaliação da medida da área do septo interventricular em corações de fetos normais e/ou cardiopatas. Essa medida seria uma forma de analisar diretamente os defeitos septais, que são os defeitos cardíacos congênitos mais comumente encontrados, perfazendo cerca de 30% das doenças cardíacas, em especial os defeitos membranáceos1, além de analisar indiretamente as demais malformações cardíacas (como as estenoses valvares com consequentes hipertrofias ventriculares dentre outras). Além disso, a medida da área valvar possibilitará a detecção precoce da hipertrofia septal nos fetos de gestantes diabéticas, rastreando fetos com maior probabilidade de desenvolvimento de macrossomia e cardiomiopatia10,11.
Este estudo tem por objetivo determinar valores de referência para a área do septo interventricular de fetos normais entre a 18ª e a 33ª semanas de gestação por meio da US3D utilizando o método STIC.
Métodos
Realizou-se um estudo do tipo corte transversal, entre dezembro de 2009 e maio de 2010, com 69 gestantes entre a 18ª e a 33ª semanas completas de gestação. Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) sob o n0 0135/10, e as pacientes que concordaram na participação voluntária assinaram Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.
Todas as pacientes foram selecionadas no setor de pré-natal de baixo risco do Departamento de Obstetrícia da Unifesp, sendo essas oriundas do Sistema Único de Saúde do município e da região metropolitana da cidade de São Paulo. Os critérios de inclusão foram os seguintes: gestação única com embrião vivo e idade gestacional determinada pela data da última menstruação (DUM) e confirmada por ultrassonografia realizada até a 10ª semana utilizando como parâmetro o Comprimento Cabeça-Nádega (CCN). Os critérios de exclusão foram: oligoâmnio [Índice de Líquido Amniótico (ILA) abaixo do percentil 5 para a idade gestacional, segundo tabela proposta por Moore e Cayle12; feto posicionado com o dorso anterior (entre 11 e 1h); fetos com peso estimado abaixo e/ou acima de dois desvios-padrão da média, de acordo com a tabela proposta de Hadlock; gestantes portadoras de doenças crônicas que pudessem afetar o crescimento e desenvolvimento fetal, tais como hipertensão arterial, diabete melito, colagenoses, entre outras; atenuação intensa do feixe sonoro por condições tais como obesidade materna e cicatrizes abdominais; malformação fetal diagnosticada à ultrassonografia morfológica de 1º e 2º trimestres; pacientes tabagistas e/ou usuárias de drogas ilícitas. Todas as gestantes foram submetidas a ecocardiografia fetal realizada entre 20 e 24 semanas de gestação.
Todos os exames foram realizados no Setor de Cardiologia Fetal do Departamento de Obstetrícia da Unifesp, sendo esses realizados por apenas um examinador (LCR) com experiência de três anos em US3D em obstetrícia. Todos os exames foram realizados em um aparelho da marca Voluson 730 Expert (General Eletric Medical Systems, Kretztechnic, Zipf, Austria) equipado com um transdutor convexo volumétrico (RAB4-8P). As análises off-line para a mensuração das áreas do septo interventricular foram realizadas pelo mesmo examinador utilizando o software 4D View versão 9.0 (GE, Medical Systems Kretztechnic, GmbH & Co OHG).
Os volumes cardíacos foram colhidos no corte das 4 câmaras cardíacas com o dorso fetal, se possível, na posição de 6 horas, utilizando-se um ângulo de abertura entre 20 e 400 e um tempo de aquisição entre 10 e 15 segundos. Após a varredura tridimensional, a imagem foi apresentada na tela do aparelho na forma de três planos ortogonais: axial (A), sagital (B) e coronal (C). Antes de se iniciar as avaliações, foi utilizada a padronização proposta por Paladini13 para a orientação de volumes obtidos pelo STIC, ou seja, para fetos em apresentação cefálica, o lado esquerdo do coração coincide com o lado esquerdo da tela, enquanto para os fetos pélvicos, o lado esquerdo do coração coincide com o lado direito da tela; devendo-se o plano A ser rodado 1800 em torno do eixo "Y".
O plano das quatro câmaras cardíacas (A) foi selecionado como referencial, sendo esse rodado em torno do eixo "Z", de forma que o ápice cardíaco se depusesse em 6 horas; em seguida, foi ativada a tecla RENDER, com ponto de referência da caixa disposta no terço médio do septo interventricular. Três planos virtuais para avaliação do septo interventricular foram utilizados. Dois planos foram determinados pelo posicionamento da linha verde (ativa) da caixa de renderização paralelo à borda externa do septo interventricular, com o ponto médio mantido no seu terço médio. Utilizou-se a opção seis da ROI selection, delimitando-se a região do septo; por convenção, optou-se pela sua visibilização através do lado do ventrículo esquerdo. A imagem renderizada foi magnificada e então a tecla MEASURE foi acionada e a opção TRACE AREA foi selecionada para se delimitar manualmente a área septal em cm². A mensuração da área septal foi realizada durante a fase inicial da diástole ventricular, momento em que o septo encontrava-se menos contraído (Figura 1). A medida bidimensional da espessura septal também foi obtida no plano de quatro câmaras em mm (Figura 2).
Os dados foram armazenados em planilha do programa Excel (Microsoft, Redmond, WA, USA) e analisados por meio de um programa estatístico Statistical Package for the Social Sciences (SPSS) for Windows versão 15.0 (SPSS Inc., Chicago, IL, USA). Foram calculadas médias, medianas, desvios-padrão (dp), valores máximo e mínimo para cada intervalo gestacional avaliado, bem como os percentis 5, 25, 50, 75 e 95. Para se avaliar a correlação entre as áreas do septo interventricular com a idade gestacional (IG), foram determinados diagramas de dispersão obtendo-se índice de correlação de Pearson (r), sendo o ajuste da equação determinado pelo coeficiente de determinação (R2). Para a construção de intervalos de referência das áreas do septo interventricular em função da idade gestacional, seguiu-se o modelo de regressão linear simples14, utilizando-se o método de Altman15 com nível de significância de p < 0,05. Para se avaliar a medida da espessura septal em função da idade gestacional utilizou-se também a regressão linear. Para se avaliar a correlação entre a medida da espessura bidimensional do septo interventricular e a sua área, utilizou-se o coeficiente de correlação intraclasse (CCI). Para o cálculo da reprodutibilidade intraobservador, o mesmo examinador (LCR) realizou uma segunda medida da área septal de 40 fetos, medidas essas blindadas dos resultados da primeira. Para tanto, também se utilizou o CCI e o gráfico de Bland-Altman16. Os gráficos de Bland-Altman plotam as médias duas medidas, realizadas por um mesmo examinador, contra a diferença de suas médias com intervalo de 95% de confiança de 1,96 dp da média. Em todas as análises será utilizado nível de significância de 0,05.
Resultados
Foram avaliadas 69 gestantes portando fetos normais entre a 18ª e a 33ª semanas completas da gestação, e todas preencheram os critérios de inclusão e foram alocadas na análise estatística final. A idade materna em média foi de 29,8 anos com dp ± 5,1, com média de 1,4 gestações (dp ± 0,5) e paridade média de 0,3 partos (dp ± 0,5).
A área média da área septal foi de 0,47 ± 0,10 cm2 (variando de 0,36 - 0,59 cm2) na 18ª semana para 2,42 ± 1,13 cm2 (variando de 1,26 - 3,92 cm2) na 33ª semana de gestação. A tabela 1 mostra médias, medianas, desvios-padrão e valores mínimos e máximos da área do septo interventricular, enquanto a tabela 2 mostra os percentis 5, 25, 50, 75 e 95 em cada intervalo gestacional avaliado.
A área septal apresentou forte correlação com a idade gestacional (r = 0,81). Foram realizados modelos de regressão polinomial, sendo o melhor ajuste com a equação exponencial: área do septo interventricular = 0,125 x IG + 0,043, com R2=0,65 (Figura 3).
Em 52 pacientes, a medida da espessura septal foi obtida no modo bidimensional, mas não apresentou correlação significativa com a idade gestacional (R² = 0,20), mostrando um padrão praticamente linear entre a 18ª e a 33ª semanas completas de gestação (Figura 4). Além disso, não houve correlação estatisticamente significante entre a medida da espessura e da área septal no intervalo gestacional estudado com CCI= 0,150 [95% IC -0,480; 0,512], com p < 0,005.
Observou-se uma excelente reprodutibilidade intraobservador para a medida da área do septo interventricular, com CCI= 0,994 (IC 95% 0,988 - 0,997). O gráfico de Bland-Altman comprovou essa boa reprodutibilidade com diferença média entre as medidas de 0,01 cm2 (dp ± 0,06 cm2 e IC 95% ± 0,12 cm2) (Figura 5).
Discussão
A tecnologia STIC tem estado disponível em alguns aparelhos de US3D em meados da década de 2010. STIC consiste na aquisição do volume do coração fetal com suas conexões vasculares, permitindo a sua avaliação nos modo multiplanar ou renderizado na forma de uma sequência "cineloop" de um ciclo cardíaco completo. Para a aquisição do volume, deve-se selecionar uma região de interesse (ROI), que determina a altura e largura do volume, que englobe todo o coração com suas conexões vasculares. Sempre que possível, a aquisição deve ser realizada com o feto em dorso posterior (6 horas) e na ausência de movimentos respiratórios maternos. O ângulo de aquisição, que determina a profundidade do volume, varia de acordo com a idade gestacional, e ângulos entre 20 e 250 são suficientes em fetos no segundo trimestre. O tempo de aquisição é determinado pelo operador, variando de 7,5 a 15 segundos, e corresponde à velocidade com que o transdutor varre a ROI. Ao volume em escala de cinzas, pode-se associar o modo Doppler colorido, além de pós-processamentos como o "inversion mode" e o "B-flow imaging"8,17. A vantagem do STIC em relação à ecocardiografia bidimensional é ser um método menos dependente do operador, possibilitando a identificação de anormalidades nas vias de saída do coração fetal por examinadores com pouca a intermediária experiência18.
Em relação à renderização de estruturas cardíacas, Yagel e cols.19 avaliaram 136 gestantes, sendo 35 portando fetos com anomalias cardíacas, utilizando a renderização para obter planos para avaliação dos septos interatrial e interventricular, ânulo das valvas atrioventriculares e alinhamento dos grandes vasos. Em 13 fetos com anomalias cardíacas, o plano do septo interventricular melhorou a avaliação do defeito septal, e em 4 o plano do septo interatrial contribuiu para avaliação do forame oval. Em 5 casos, o plano do ânulo das valvas atrioventriculares imediatamente distais às valvas semilunares (coronal AV) melhorou a avaliação do alinhamento dos grandes vasos em relação ao ânulo das valvas atrioventriculares, e em 3 a avaliação das valvas semilunares, com ou sem mau alinhamento dos grandes vasos. Recentemente, Paladini e cols.20 avaliaram uma série de 30 casos de defeitos parciais do septo atrioventricular fetal utilizando a ecocardiografia, e em 14 desses casos associou-se o STIC. Em todos os casos os marcadores ecocardiográficos para essa anomalia foram: defeito do septo atrial ostium primum e perda da aparência normal das valvas atrioventriculares.
A medida da área do septo interventricular é de particular importância em fetos de risco para miocardiopatias hipertróficas, como os filhos de mães diabéticas, nos quais há importante espessamento do septo interventricular, podendo causar obstruções no trato de saída do ventrículo esquerdo21. A gravidade dos sintomas de insuficiência respiratória e falência cardíaca congestiva se correlacionam com a severidade da miocardiopatia hipertrófica22,23. Tradicionalmente a medida da espessura do septo interventricular fetal tem sido realizada pela ecocardiografia bidimensional utilizando o modo M10,11,24; contudo, tal medida apresenta imprecisões, pois o septo interventricular não é uma estrutura uniforme.
Neste estudo, utilizou-se a técnica STIC para mensuração da área do septo interventricular, metodologia até o momento inédita na literatura. A área do septo mostrou-se fortemente correlacionada com a idade gestacional, além de comprovada reprodutibilidade intraobservador. Já a medida da espessura septal mostrou fraca correlação com a idade gestacional, mostrando um padrão praticamente linear da medida entre a 18ª e a 33ª semanas completas de gestação, sem apresentar correlação estatisticamente significante com área obtida pelo STIC. Tal resultado torna a área septal um possível parâmetro ultrassonográfico mais fidedigno que a medida da espessura do septo interventricular no diagnóstico de hipertrofia septal.
Em síntese, este estudo determinou valores de referência para a área do septo interventricular fetal que poderão ser aplicados em fetos de risco para hipertrofia septal, como os filhos de mães diabéticas, favorecendo a detecção precoce de alterações funcionais e morfológicas cardíacas fetais.
Artigo recebido em 29/07/10; revisado recebido em 17/11/10; aceito em 14/12/10.
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Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
01 Abr 2011 -
Data do Fascículo
Maio 2011
Histórico
-
Recebido
29 Jul 2010 -
Revisado
17 Nov 2010 -
Aceito
14 Dez 2010