Palavras-chave Doença das Valvas Cardíacas/cirurgia; Implante de Prótese de Valva Cardíaca; Biopróteses/tendências; Mario Vrandecic
A doença valvar cardíaca ocupa atualmente os holofotes da medicina cardiovascular em face dos recentes avanços das técnicas de imagens e emergentes possibilidades terapêuticas, atraindo a atenção de médicos, pesquisadores, fabricantes de dispositivos e investidores.1 O Brasil ocupa um lugar de destaque internacional na história e no desenvolvimento tecnológico de substitutos valvares utilizados no tratamento dessa enfermidade.
O primeiro implante mundial de uma bioprótese valvar suína, comercialmente disponível, aconteceu em outubro de 1968.2 Cerca de meio século depois, em setembro de 2019, faleceu o médico e cientista Mario Vrandecic, criador da única bioprótese cardíaca de tecido porcino produzida no Brasil e aprovada na agência norte-americana Food and Drug Adminstration (FDA), há décadas globalmente utilizada no tratamento da doença cardíaca valvar.
Nesse artigo, destacamos a história do seu criador e as evidências de efetividade e segurança da bioprótese valvar Biocor, hoje denominada St. Jude Medical Biocor (St. Jude Medical, Inc., St Paul, MN).3–16
Mario Vrandecic, de ascendência croata e nascido na Bolívia, cursou Medicina na Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais (FM/UFMG). Especializou-se em cirurgia geral e cardiovascular nos Estados Unidos da América (EUA), onde serviu ao exército americano como cirurgião, inclusive durante a guerra do Vietnã. Retornou definitivamente ao Brasil em 1976 e passou a atuar como professor da FM/UFMG e cirurgião cardiovascular na Santa Casa de Belo Horizonte, entre outros hospitais.
Tendo realizado pesquisas com tecidos biológicos durante a sua residência nos EUA, em 1981 criou a Biocor Indústria, empresa na qual desenvolveu uma bioprótese valvar cardíaca de tecido porcino, entre outras patentes. Inicialmente usada no Brasil, na América Central e na Ásia, a bioprótese logo obteve o CE Marking, passando a ser utilizada na Europa e, posteriormente, com a aprovação pelo FDA, também nos EUA. Recebeu homenagens de várias sociedades científicas e de entidades da área de inovação nacionais e internacionais. Em 1997, a Biocor Indústria foi vendida à empresa norte-americana St. Jude Medical, sendo posteriormente incorporada no ano de 2016 à Abbott Laboratories.
Após quase 40 anos de uso clínico, as evidências de seguimentos de curto, médio e longo prazos demonstram efetividade, durabilidade e segurança da referida bioprótese valvar em séries nacionais e de outros países (Tabela 1).3–16 Em um dos seguimentos mais longos, Mykén e Bech-Hansen, avaliaram 1.712 pacientes que receberam a bioprótese Biocor porcina no Sahlgrenska University Hospital, em Gotemburgo, na Suécia, demonstrando uma sobrevida livre de mortalidade devido à falência valvar após 20 anos de 84,3% ± 6,9% e 88,0% ± 4,0%, para implantes em posições aórtica e mitral, respectivamente16 (Tabela 1).
Desfechos clínicos observados em pacientes que receberam bioprótese porcina Biocor em posições aórtica e mitral* * Dados de 14 publicações que avaliaram os desfechos de curto, médio e longo prazos das biopróteses porcinas Biocor, publicados entre 1988 e 2008.3–16
Mario Vrandecic fundou ainda, em 1985, o Biocor Instituto, localizado em Nova Lima, região metropolitana de Belo Horizonte (MG). Inicialmente dedicado às doenças cardiovasculares, o hospital logo evoluiu para ser um importante centro de Medicina de alta complexidade. O hospital tem sido o responsável pela especialização e atuação de muitas gerações de cardiologistas, cirurgiões cardíacos, médicos de diversas especialidades e outros profissionais de saúde, além de ser referência em assistência de qualidade à população do estado, com importantes certificações nacionais e internacionais. A gestão de Mario Vrandecic foi pautada na ética, na geração de confiança, na qualificação de pessoas e na educação continuada. O seu legado simboliza um exemplo de humanismo e dedicação à Medicina, um marco de inovação em ciência cardiovascular e uma prova da potencialidade biotecnológica do país.
Referências
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Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
16 Abr 2021 -
Data do Fascículo
Abr 2021