Palavras-chave Biomarcadores; Osteoprotegerina; Calcificação Vascular; Doença Renal Crônica
Os biomarcadores são indicadores biológicos que podem ser quantificados para avaliar processos biológicos normais ou patológicos e respostas às diversas intervenções terapêuticas.1 São encontrados nos diversos fluidos corporais, tais como sangue, urina ou em tecidos e ajudam no diagnóstico precoce de algumas doenças, além do monitoramento da progressão ou da avaliação da eficácia do tratamento. Além da importância no diagnóstico clínico, podem estimar o risco e o prognóstico. Isto é muito bem estruturado nos processos cuja base inflamatória se destaca em um cenário multifatorial, tais como a hipertensão arterial, diabetes mellitus, dislipidemias e doença renal crônica (DRC).2,3
A DRC, que é um problema crescente de saúde pública, cada vez mais presente no cenário das doenças cardiovasculares (CVs) devido à alta morbimortalidade. Está no final evolutivo da sequência do continuum CV onde os principais fatores de risco (hipertensão, diabetes, dislipidemia) não foram tratados de forma adequada. Além disso, os pacientes com DRC estão ainda sob um risco CV maior devido à presença destes fatores que muitas vezes continuam sem tratamento adequado.4
Na medicina de precisão é necessária para a identificação e a quantificação de diversos elementos dependendo dos aspectos clínicos e da proposta terapêutica em cada doença de forma particular.5 Na DRC a utilização de potenciais biomarcadores otimiza a medicina de precisão, podendo fornecer uma nova estratégia para conhecer os meandros fisiopatológicos da evolução deste complexo mecanismo de perda evolutiva da função renal.6
Assim, a osteoprotegerina (OPG), uma glicoproteína pertencente ao grupo dos receptores do fator de necrose tumoral, participa na regulação do metabolismo ósseo e tem sido associada à calcificação vascular e à doença arterial coronária, estando seus níveis associados com maior incidência e prevalência de doenças CVs.7
O trabalho de Matos TO et al. avaliou em pacientes com função renal diminuída em estágio 3 (TFG <60 ml/min/1,73 m2), a relação da OPC com diversos parâmetros CVs que se relacionam com o risco CV ou com a função endotelial.8 O racional foi estudar a relação da OPG com a DRC e analisar diversos parâmetros CVs, visto a relação deste biomarcador com o metabolismo do cálcio na matriz vascular e a consequente calcificação. Geralmente os níveis de OPG estão elevados nas fases terminais da DRC e é um forte preditor de calcificação vascular em todos os estágios da disfunção renal.
Os resultados foram interessantes, mostrando a relação positiva e significante deste biomarcador do metabolismo ósseo, com os parâmetros hemodinâmicos da pressão de pulso central, velocidade de onda de pulso (VOP), augmentation index, pressão arterial sistólica periférica e pressão arterial sistólica central. Todos são fatores de risco independentes para a maioria das doenças CVs.
A prevalência da calcificação vascular e da calcificação das artérias coronárias é frequente na DRC, principalmente nas fases mais avançadas. Porém podem se instalar nas fases mais precoces e são um fator de risco independente para as doenças CV.9 Por isso, a importância deste biomarcador é a detecção precoce da deposição de cálcio nas artérias.10
Deve-se destacar a correlação positiva e significante da OPG com a VOP, que se correlaciona com a idade vascular, refletindo do caso da DRC a presença de lesão ou envelhecimento vascular mais precoce. Entretanto a dilatação mediada pelo fluxo não apresentou qualquer relação com a OPG. Sabemos que é utilizada para avaliar a função endotelial, porém estas alterações endoteliais na DRC ainda não têm os aspectos fisiopatológicos bem definidos. Diversos mecanismos podem estar envolvidos ou participar de forma peculiar alterando a função endotelial e não somente o metabolismo do óxido nítrico. A própria calcificação vascular está envolvida globalmente sendo o destaque nesta disfunção.11
Neste trabalho de Matos et al. os níveis de OPG tiveram uma relação direta e crescente com o grau da DRC, mostrando uma relação tipo "dose/efeito" aumentando a sua validade como marcador.8 Ainda não sabemos de que forma a OPG está envolvida na patogenia da calcificação da arterial, os meandros fisiopatológicos no contexto do metabolismo do cálcio e a verdadeira relação com o prognóstico da doença renal.12
Este estudo pioneiro na população brasileira deu os primeiros passos para compreendermos o valor de determinados biomarcadores, e sua relação diagnóstica e prognóstica na doença renal onde a esfera de morbimortalidade é tão grave e não só explicada pelos fatores de risco clássicos comuns às doenças CV.
Referências
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Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
02 Dez 2024 -
Data do Fascículo
2024
Histórico
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Recebido
14 Out 2024 -
Revisado
16 Out 2024 -
Aceito
16 Out 2024