Open-access Travail et Rapports Sociaux de Sexe: Rencontres autour de Danièle Kergoat

RESENHAS

Travail et Rapports Sociaux de Sexe: Rencontres autour de Danièle Kergoat

Maria Rosa Lombardi I

ISocióloga e pesquisadora das relações de trabalho e de gênero, profissões tecnológicas, do Departamento de Pesquisas Educacionais da Fundação Carlos Chagas mlombard@fcc.org.br

XAVIER DUZENAT ET AL. (ORG.) PARIS: L'HARMATTAN, 2010, 277 p.

Recentemente publicada na França, esta obra homenageia a socióloga francesa Danièle Kergoat, conhecida internacionalmente por estudos teórico-empíricos sobre a divisão sexual do trabalho e as relações sociais de sexo, conceitos importantes para as ciências sociais de uma forma geral e, para a sociologia das relações de gênero, em particular. Danièle inovou o pensamento sociológico ao considerar que as relações sociais de sexo identificam uma tensão entre os grupos de homens e mulheres que atravessa todo o campo social e que se revela permanente, quando se trata do trabalho e da sua divisão social. Nesse sentido, as relações sociais de sexo e a divisão sexual do trabalho são indissociáveis. A partir de dois princípios organizadores presentes na divisão sexual do trabalho - separação e hierarquização -, atribuem-se não só trabalhos diferentes a homens e a mulheres, mas também maior valor aos dos homens. Danièle Kergoat1 compreende o trabalho, tanto na sua dimensão coletiva, em que se incluem o trabalho profissional e o doméstico, como no nível individual, como "produtor de si mesmo", levando em conta a subjetividade. Daí a importância de estudar o trabalho, de forma relacional, na esfera pública e na doméstica, na instância coletiva e na individual e subjetiva. Os princípios de separação e hierarquização são válidos para todas as sociedades conhecidas e costumam ser legitimados por uma ideologia "naturalista", a qual compreende que a divisão sexual do trabalho está inscrita na ordem natural da sociedade e assim deve permanecer. A argumentação da autora, ao contrário, será de que essas relações não se fundam em causas biológicas, são construções sociais e, como tal, não são imutáveis, havendo espaço para a luta coletiva e/ou individual em prol da sua transformação. Kergoat2 considera as relações sociais de sexo como "paradigma das relações de dominação", pois elas estruturam o campo social e são transversais à totalidade desse campo. Afirma que as relações sociais de sexo são consubstanciais, quer dizer, para melhor compreender a complexidade e a diversidade das práticas masculinas e femininas, as relações sociais de sexo devem ser consideradas, simultaneamente, com outras relações sociais, como as de classe, etnia, qualificação, divisão internacional do trabalho, pois todas elas, em conjunto, tecem a trama da sociedade e impulsionam sua dinâmica. Particularmente louvável é a reflexão constante sobre as relações de trabalho, de poder, de sexo e raça e sua "consubstancialidade" atual, empreendida por Danièle Kergoat em solo, ou em conjunto com algumas pesquisadoras, como Helena Hirata, a quem devemos a difusão do pensamento da autora no Brasil, como bem lembra Liliana Segnini neste livro (p. 172). As categorias analíticas "relações sociais de sexo" e "divisão sexual do trabalho" têm-se mostrado fecundas, por exemplo, para procurar compreender situações e condições de trabalho que emergiram recentemente, como o aumento dos fluxos migratórios intra e internacionais de homens e mulheres à procura de trabalho, a flexibilidade exigida de cada vez maiores contingentes de trabalhadores(as), o crescimento do nicho de trabalho de cuidados ao redor do mundo.

Atualmente, Danièle Kergoat é pesquisadora emérita do Centre Nationale de Recherches Scientifiques - CNRS - e, como ela mesma salienta, as suas trajetórias profissional, militante e de amizade se construíram de forma orgânica e indissociável. Em 1983, Danièle Kergoat inovou ao criar um laboratório no CNRS, cujo eixo central de pesquisa era o gênero ou as relações sociais de sexo, o Groupe d'études sur al division sociale et sexuelle du travail - GEDISST - desde janeiro de 2010, denominado Centre de recherche sociologique et politique de Paris, equipe Genre, Travail, Mobilités - CRESPPA-GTM. As quase 30 contribuições do livro trazem olhares diversificados sobre a rica trajetória de Danièle Kergoat e são escritos por ex-alunos(as), pesquisadores(as) franceses e estrangeiros. O livro se divide em sete partes. Na primeira parte, Relações sociais de sexo, Philippe Zarifian, Xavier Duzenat, Elsa Galerand e Nicky Le Feuvre discutem o conceito de relação social e o caráter heurístico do conceito de relações sociais de sexo. Em Divisão sexual do trabalho, a segunda parte, Odile Chenal, Jacqueline Martin, Roland Pfefferkorn discorrem sobre a formação desse conceito nos anos 1970, relacionado às análises de Danièle Kergoat sobre a heterogeneidade da classe operária3 e sobre o interesse que despertou, no início dos anos 1980, entre os pesquisadores franceses que trabalhavam com as categorias de sexo. Na terceira parte, Trabalho e subjetividade, os artigos se reportam à abordagem do trabalho e do gênero que Daniele faz em sua obra por meio da dimensão da subjetividade. Contribuem com suas reflexões, Françoise Bloch, Helena Hirata e Pascale Molinier. As múltiplas trocas interdisciplinares de Kergoat com a psicodinâmica do trabalho, a psicossomática e a ergonomia são comentadas por Christophe Déjours, Marie Pezè e Catherine Teiger, em Cruzando disciplinas, a quarta parte4. Além das fronteiras, a quinta, traz contribuições de pesquisadores estrangeiros que refletiram e pesquisaram sobre as questões da atividade, do trabalho e da divisão sexual do trabalho, como a brasileira Liliana Segnini, a búlgara Kátia Vladimirova, a mexicana Sara Lara e as canadenses Karen Messing e Ana Maria Seifert. Na sexta parte, Resistir, Marie-France Cristofari, Josette Trat, Gisèle Moulié e Suzy Rojtman discutem a participação da homenageada nos movimentos feminista e sindical e, finalmente, a última parte, Transmitir, ilumina uma dimensão essencial do legado de Danièle, como professora e formadora (Jacqueline Heinen e Emmanuelle Lada) e como mãe ( Prisca Kergoat). O livro ainda apresenta a homenagem poética de Jacques Jenny no Epílogo e uma listagem dos escritos e de outras contribuições de Daniele Kergoat, organizada por Françoise Pujol.

Estudantes e pesquisadores brasileiros esperam que uma versão em português deste livro não tarde.

  • 1
    Le rapport sociaux de sexe: de la reproduction des rapports sociaux à leur subversion.
    Marx Actuel, Paris, n.30, p.85-100, jul./dez. 2001.
  • 2
    Division sexuelle du travail et rapports sociaux de sexe. in: Hirata, Helena et al. (org.).
    Dictionnaire critique du féminisme. Paris: PUF, 2000. p.35-44. (coll. Politique d'aujourd'hui).
  • 3
    Bulledor ou l'histoire d'une mobilisation ouvrière. Paris, Seuil, 1973. (coll. Esprit/La cité prochaine);
    Les Ouvrières. Paris: Sycomore, 1982.
  • 4
    HIRATA, Helena; KERGOAT, Daniéle. Rapport et psychhpathologie du travail. in: DEJOURS, C. (org.).
    Plaisir et souffrances dans le travail, 2. Paris: Psy. T.A., CNAM, 1988. BouTeT, Josiane; KERGOAT, Danièle. Dialogue interdisciplinaire. in: DRIGEARD, Gabrielle; FIALA, Pierre; TOURNIER, Maurice.
    Courants sociolinguistiques. Paris: Klincksieck, 1989, p.9-19.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      19 Set 2011
    • Data do Fascículo
      Abr 2011
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