Resumo
The phaeophorbide ethyl ester named Purpurin-18 and the flavonoids quercetin and kaempferol were obtained by chromatographic procedures from the chloroform fraction of aerial parts of Gossypium mustelinum. The structure of these compound was determined by NMR, IR and mass spectra data analysis. This is the first occurrence of this compound in Angiosperm.
Gossypium mustelinum; phaeophorbide; ethyl ester purpurin-18
Gossypium mustelinum; phaeophorbide; ethyl ester purpurin-18
ARTIGO
Feoforbídeo (etoxi-purpurina-18) isolado de Gossypium mustelinum (Malvaceae)
Ethyl ester putpurin-18 from Gossypium mustelinum (Malvaceae)
Tania Maria Sarmento SilvaI,*; Celso Amorim CamaraI; José Maria Barbosa-FilhoII; Ana Maria GiuliettiIII
IDepartamento de Química, Universidade Federal Rural de Pernambuco, 52171-900 Recife - PE, Brasil
IILaboratório de Tecnologia Farmacêutica, Universidade Federal da Paraíba, CP 5009, 58051-970 João Pessoa - PB, Brasil
IIIDepartamento de Ciências Biológicas, Universidade Estadual de Feira de Santana, 44031-640 Feira de Santana - BA, Brasil
ABSTRACT
The phaeophorbide ethyl ester named Purpurin-18 and the flavonoids quercetin and kaempferol were obtained by chromatographic procedures from the chloroform fraction of aerial parts of Gossypium mustelinum. The structure of these compound was determined by NMR, IR and mass spectra data analysis. This is the first occurrence of this compound in Angiosperm.
Keywords:Gossypium mustelinum; phaeophorbide; ethyl ester purpurin-18.
INTRODUÇÃO
O gênero Gossypium L. (Malvaceae) apresenta cerca de 50 espécies (45 espécies diploides e cinco alelotetraploides),1 distribuídas, principalmente, na África, Austrália, Peru, México, Arábia e Brasil. O Brasil é considerado um importante centro de distribuição de três espécies (G. barbadense L., G. barbadense var. brasiliense Hutch. e G. hirsutum var. Marie galante Hutch.) e o centro de origem da espécie Gossypium mustelinum, conhecido popularmente como "algodão bravo", que é uma espécie de algodoeiro selvagem, alelotetraploide, arbórea, endêmica do semiárido, no nordeste do Brasil.2 Em nosso trabalho anterior com a fração clorofórmica das partes aéreas desta espécie foi mostrado o isolamento de três feofitinas: faeofitina B, 173-etoxifaeoforbídeo A e faeoforbídeo A.3
Substâncias naturais que estão relacionadas com a clorofila são relativamente raras na natureza, devido, provavelmente ao alto potencial fotodinâmico destes pigmentos.4 A diversidade estrutural das feofitinas/feoforbídeos e as atividades biológicas que apresentam têm despertado muito interesse, principalmente na terapia fotodinâmica do câncer, sendo um novo método de tratamento com drogas menos tóxicas (sensibilizadores) que utiliza a luz visível e do infravermelho próximo (VIS/NIR) combinadas para gerar espécies citotóxicas derivadas de oxigênio (ROS) em um lugar selecionado do tratamento.5
Dando continuidade ao estudo químico de G. mustelinum é descrito neste trabalho o isolamento e a completa determinação estrutural da etoxi-purpurina-18.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
O extrato etanólico das partes aéreas de G. mustelinum foi submetido à partição com solventes orgânicos.3 A fração clorofórmica foi submetida à cromatografia com Sephadex LH-20 e sílica gel e forneceu o feoforbídeo 1 e os flavonoides 2 (quercetina) e 3 (kanferol). A substância 1 foi isolada como um sólido amorfo preto azulado. A análise obtida através de CL-EM-ESI (ionização por electrospray) no modo positivo mostrou o pico do íon molecular em m/z 593,42 [M+H]+. A fórmula molecular C35H36N4O4 foi deduzida pelos dados obtidos da CL-EM, RMN 1H e 13C-APT (Tabela 1) correspondendo a 20 graus de insaturação. O espectro de IV (KBr) apresentou absorções em 3433 (NH), 1723 (C=O), 1631 (C=C) cm-1. A cor preta azulada característica indicou a presença de um grande cromóforo que pode estar relacionado com a clorofila ou seus derivados.
O espectro de RMN 1H mostrou absorções características para a substância do tipo feoforbídeo ou seus derivados6 pela presença de três grupos metilas ligadas a anel aromático (δH 3,68; 3,32 e 3,08), três sinais de hidrogênios olefínicos em δH 9,44; 9,27 e 8,54, e um grupo vinila (δH 6,25; 5,15 e 7,83) com um padrão característico para metileno, além da ausência da cadeia fitila, uma vez que o envelope característico de sinais na região alifática de grupos metilenos das feofitinas se encontra ausente.6
O espectro de APT junto com HMQC mostrou a presença de seis metilas, cinco grupos metilenos (quatro alifáticos e um olefínico), seis metínicos (dois alifáticos e quatro olefínicos) e dezoito carbonos quaternários (15 olefínicos e três carbonilas). Os dados de RMN e EM (ESI), associados com os graus de insaturação permitiram estabelecer a estrutura como um anidrido cíclico conjugado de seis membros, supostamente presente entre os carbonos C-131-C-132 no anel E, com dois valores de carbonila em δC 164,17 e 159,36, além de um grupo etoxila (δC 60,40 e 14,2), provavelmente no lugar da cadeia fitila.
O completo assinalamento da estrutura do núcleo porfirina da feoforbida 1 foi realizada através dos assinalamentos a longa distância 2,3JCH das metilas aromáticas 3H-121, 3H-21 e 3H-71 e uma alifática 3H-181, que mostraram correlações entre os quatro anéis pirrólicos (Figura 1). O sinal da metila 21 (δH 3,32) mostrou correlação com os carbonos C-1, C-2 e C-3 (anel A), a metila 71 correlacionou com C-7 e C-8 (anel B). No anel C verificou-se a correlação da metila 121 com os carbonos C-11, C-12 e C-13 e, finalmente, a metila 181 correlacionou-se com C-17, C-18 e C-19 (anel D). A correlação 2JCH entre os hidrogênios δH 174 (4,03), 172-B (δH 2,37) e 172-A (2,66) com a carbonila em C-173 (δC 173,25) confirmou a presença do grupo etoxi ligado à carboxila terminal em C-17.
A configuração relativa em C-17 e C-18 foi determinada como sendo trans, devido à interação espacial observada através do espectro de NOESY do H-17 (δH 5,13) com a metila 3H-181 (δH 1,72), e a comparação com os dados da literatura aponta que a configuração absoluta mais provável seria 17-S e 18-S,6 (Figura 1). A análise de todos os dados permitiu identificar 1 como sendo a etoxi-purpurina-18. Esta substância está sendo isolada pela primeira vez como uma substância natural. Existe somente um relato na literatura da existência deste composto como produto de síntese.7
As purpurinas-18 ocorrem naturalmente somente em organismos marinhos e em sedimentos.8-12 São biossintetizadas nos próprios organismos marinhos, apresentando atividade antioxidante.8 Seus derivados são alvo de muito interesse devido à sua utilização como anticancerígeno.13-15
O isolamento de mais um feoforbídeo de G. mustelinum nos conduz à suposição de que esta é uma substância que ocorre naturalmente, e não um artefato produzido durante o processo de isolamento. De acordo com o estudo realizado anteriormente,3 é possível que estes pigmentos ocorram naturalmente na planta. Observando-se a espécie vegetal in natura alguns "pontos" de forte pigmentação escura ("pretos") são visíveis em toda parte vegetal. A hipótese de que estes pontos sejam regiões de concentração de pigmentos desta natureza e qual é a sua função precisa de maior fundamentação. Assim, é possível que os pigmentos presentes em G. mustelinum ocorram naturalmente, mas a hipótese de que sejam produtos de transesterificação e/ou alomerização, formados durante o processo de extração/isolamento, não pode ser inteiramente descartada. Outras espécies vegetais coletadas na região semiárida, como Anisacanthus brasiliensis16 e Sida galheirensis,17 também apresentaram a presença de feofitinas.
PARTE EXPERIMENTAL
Procedimentos experimentais gerais
As medidas de ponto de fusão foram efetuadas em um aparelho munido de placa de Koefler eletricamente alimentada e não foram corrigidas. Os espectros de infravermelho foram feitos em pastilhas de KBr em um espectrômetro Bomem/MB-102. Os espectros de Ressonância Magnética Nuclear, 1H e 13C (1D e 2D) foram registrados em espectrômetros Bruker DRX-500 (1H: 500 MHz; 13C: 125 MHz) (CENAUREMN-UFC) e Bruker AC 200 (1H 200 MHz e 13C 50,3 MHz) em CDCl3 utilizando DMSO-d6 ou CDCl3 como solvente e TMS como referência interna. O CL-EM (LTF-UFPB) foi utilizado no modo electrospray positivo com um Quattro LC-Micromass (Waters). Silica gel 60 (Vetec) e Sephadex LH-20 (Sigma) foram utilizados para cromatografia em coluna. Usaram-se placas de sílica gel 60 PF254 Merck para cromatografia em camada delgada analítica e como reveladores luz ultravioleta (254 e 366 nm), soluções de AlCl3-EtOH (1%) e ácido difenilbórico etanolamina-MeOH (NP, 1%).
Material vegetal
As partes aéreas de G. mustelinum foram coletadas em Anhaguera, Bahia, Brasil, em março de 2002 e identificada pela Profa. A. M. Giulietti. Uma exsicata (A. M. Giulietti, 2044) está depositada no Herbário da Universidade Estadual de Feira de Santana.
Extração e isolamento
O procedimento experimental é semelhante ao realizado em trabalho anterior.3 O pó seco e pulverizado (1,87 kg) foi extraído com EtOH em temperatura ambiente. O extrato foi concentrado em rotaevaporador sob pressão reduzida fornecendo 205,6 g do extrato etanólico. Uma porção deste extrato (190,0 g) foi suspensa com MeOH:H2O (1:1) e extraída com hexano e CHCl3. Os solventes foram removidos em rotaevaporador fornecendo os extratos hexânico (89,5 g) e clorofórmico (3,8 g). A fração clorofórmica (2,1 g) foi submetido à coluna com Sephadex LH-20® usando como eluentes CHCl3:MeOH (1:1) fornecendo 21 frações. As frações 15-16 (10,0 mg) e 19-21 (15,0 mg) desta coluna apresentaram cristais amarelos revelados intensamente em CCDA com o reagente NP para flavonoides. A análise dos espectros de RMN 1H e 13C permitiu identificar as substâncias como sendo quercetina (2) e kanferol (3), respectivamente. As frações 3 e 4 foram ressubmetidas à cromatografia em coluna de sílica gel e forneceram a feofitina B3. As frações de 5 a 7 foram purificadas em Sephadex LH-20 mostrando a presença de um precipitado identificado como 173-etoxifaeoforbídeo A. As frações de 6-14 foram ressubmetidas à cromatografia em coluna de sílica gel utilizando hexano e clorofórmio em ordem crescente de polaridade. Na fração 3 precipitou o metoxifaeoforbíde A.6 A fração 7 mostrou a presença de uma substância microcristalina de cor preto azulada (35,0 mg), temperatura de fusão 145-146 °C, que foi submetida à analise espectroscópica (IV, CL-EM-ESI e RMN, incluindo 2D) e identificada como sendo a etoxipurpurina-18 (1).
Etoxipurpurina-18 (1). Sólido amorfo; pf 145-146 ºC; IV (KBr) νmax. 3433, 2934, 1723, 1631, 1462 cm-1. RMN 1H (CDCl3, 500 e 200 MHz) (Tabela 1), RMN 13C (CDCl3, 50,3 e 125 MHz) (Tabela 1), EM-ESI (pos) m/z 593,42 [M+H]+ (C35H36N4O4 ).
AGRADECIMENTOS
IMSEAR-CNPq, FACEPE pelos auxílios e bolsas concedidas. Ao Prof. E. de J. Oliveira (LTF-UFPB) pela realização dos espectros de massas. Ao Centro Nordestino de Aplicação e Uso de Ressonância Magnética Nuclear (CENAUREMN) - Programa de Pós-graduação em Química Orgânica, Departamento de Química Orgânica e Inorgânica, Centro de Ciências da Universidade Federal do Ceará, Fortaleza - Ceará, pelos espectros 1D e 2D de Ressonância Magnética Nuclear (RMN 1H e 13C).
Recebido em 6/3/09; aceito em 28/8/09; publicado na web em 11/1/10
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Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
19 Abr 2010 -
Data do Fascículo
2010
Histórico
-
Recebido
06 Mar 2009 -
Aceito
28 Ago 2009