Open-access Nanopartículas de poli-hidroxibutirato-co-valerato como suporte para a imobilização da lipase de Candida antarctica fração B

Nanoparticles of poly(hydroxybutyrate-co-hydroxyvalerate) as support for the immobilization of Candida antarctica lipase (fraction B)

Resumo

This work evaluates the immobilization of Candida antarctica lipase (Fraction B) using poly(hydroxybutyrate-co-hydroxyvalerate) (PHBV) nanoparticles as support. The effects of immobilization time (30-150 min) and pH (5-10) on lipase loading were evaluated. The stability of the immobilized enzyme towards temperature (40, 60, and 80 ºC), reuse and storage (at 4 ºC) were also determined. Furthermore, to assess its potential application in a system of interest, the immobilized lipase was used as a catalyst in the esterification of geraniol with oleic acid. The results indicated a time of 120 minutes and pH of 7 as optimal for immobilization. A 21 hour exposure of the PHBV-lipase derivative to 60 ºC showed a 33% reduction of the initial activity while storage at 4 ºC led to a residual activity (5% of the original activity). The derivative was used without significant loss of activity for 4 successive cycles. The use of the immobilized lipase as a catalyst in the production of geranyl oleate led to about 88% conversion of the initial reactants to products.

nanoparticles; immobilization; lipases


nanoparticles; immobilization; lipases

NOTA TÉCNICA

Nanopartículas de poli-hidroxibutirato-co-valerato como suporte para a imobilização da lipase de Candida antarctica fração B

Nanoparticles of poly(hydroxybutyrate-co-hydroxyvalerate) as support for the immobilization of Candida antarctica lipase (fraction B)

Ilizandra A. FernandesI; Nádia L. D. NyariI; José Vladimir de OliveiraII; Elisandra RigoIII; Maria Cristiane M. de SouzaIV; Luciana R. B. GonçalvesIV; Sibele Berenice C. PergherV; Débora de OliveiraII,*

IDepartamento de Ciências Agrárias, Universidade Regional Integrada, Campus de Erechim, 1621, 99700-000 Erechim - RS, Brasil

IIDepartamento de Engenharia Quimica e Engenharia de Alimentos, Universidade Federal de Santa Catarina, 88040-900 Florianópolis - SC, Brasil

IIIDepartamento de Engenharia de Alimentos, Universidade do Estado de Santa Catarina, 89802-200 Pinhalzinho - SC, Brasil

IVDepartamento de Engenharia Quimica, Universidade Federal do Ceará, 60455-760 Fortaleza - CE, Brasil

VInstituto de Quimica, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, 59078-970 Natal - RN, Brasil

ABSTRACT

This work evaluates the immobilization of Candida antarctica lipase (Fraction B) using poly(hydroxybutyrate-co-hydroxyvalerate) (PHBV) nanoparticles as support. The effects of immobilization time (30-150 min) and pH (5-10) on lipase loading were evaluated. The stability of the immobilized enzyme towards temperature (40, 60, and 80 ºC), reuse and storage (at 4 ºC) were also determined. Furthermore, to assess its potential application in a system of interest, the immobilized lipase was used as a catalyst in the esterification of geraniol with oleic acid. The results indicated a time of 120 minutes and pH of 7 as optimal for immobilization. A 21 hour exposure of the PHBV-lipase derivative to 60 ºC showed a 33% reduction of the initial activity while storage at 4 ºC led to a residual activity (5% of the original activity). The derivative was used without significant loss of activity for 4 successive cycles. The use of the immobilized lipase as a catalyst in the production of geranyl oleate led to about 88% conversion of the initial reactants to products.

Keywords: nanoparticles; immobilization; lipases.

INTRODUÇÃO

A área da nanotecnologia aplicada ao setor de alimentos vem apresentando um crescimento significativo nos últimos anos. Os processos de microencapsulação são interessantes em diferentes áreas da indústria, como por exemplo, no encapsulamento de ingredientes alimentícios, controle da liberação de pesticidas em agroquímica, podendo ainda ser usado em cosméticos, eletrônicos, biomedicina e processamento de materiais especiais.1

Os fluidos supercríticos (FSCs) têm sido propostos como meio para a produção de nanomateriais. As propriedades que fazem os fluidos supercríticos particularmente atraentes são a difusividade, o poder solvente, a seletividade e a possibilidade da sua eliminação completa ao final do processo.2

O poli(hidroxibutirato-co-valerato) vem se destacando em diversas áreas por ser um polímero biodegradável, com boa biocompatibilidade, sendo uma alternativa como agente encapsulante.3 Neste sentido, os polímeros ganham destaque devido à possibilidade de sua utilização como agente estabilizante de biocompostos, como enzimas. A imobilização de enzimas em suportes sólidos permite a sua reutilização e fácil manuseio e melhora a estabilidade do catalisador, que são importantes para o desenvolvimento de processos biotecnológicos econômicos.4 Desta forma, a imobilização de enzimas tem sido uma estratégia para a maioria das aplicações em grande escala devido à facilidade de reutilização do catalisador, operação contínua e purificação do produto.5

A pesquisa nesta área busca a descoberta de novas enzimas eficientes, de novos compostos alvo e também de novos suportes sólidos convenientes, capazes de sustentar a atividade enzimática em meio orgânico com perda mínima. A reutilização de enzimas imobilizadas representa uma excelente abordagem para química verde, reduzindo o custo e a quantidade desses biocatalisadores, em geral, de alto valor agregado.6

A imobilização de enzimas tem atraído grande atenção nas áreas da química fina, biomedicina e biossensores. Sabidamente, o desempenho da enzima imobilizada depende em grande parte da estrutura do suporte, sendo que os suportes nanoestruturados são capazes de manter a atividade catalítica, bem como garantir a eficiência de imobilização da enzima.7

A imobilização pelo método de adsorção consiste na utilização da enzima e um suporte sólido por ligações de baixa energia, tais como interações de van der Waals ou hidrofóbicas, ligações de hidrogênio e iônicas, entre outras. Vários materiais podem ser usados para este propósito e a escolha de um deles depende de suas propriedades, como força mecânica, estabilidade física e química, caráter hidrofóbico/hidrofílico, capacidade de adsorção de enzima e custo.8 Os suportes para adsorção, tanto na fase sólida ou líquida, podem ser orgânicos (derivados da DEAE-celulose, Dowex) e inorgânicos (celite, bentonita, alumina, argilas, zeólitas, Accurel) entre outros.9,10

Há uma diversidade de biopolímeros naturais ou sintéticos que podem ser empregados como agentes encapsulantes de compostos bioativos, por apresentarem biocompatibilidade e biodegrabilidade. Dentre os principais destacam-se o ácido poliláctico, policaprolactona, polilactídeo, poli(lactídeo-co-glicosídeo), polietilenoglicol, polivinil álcool, polihidroxibutirato e o co-polímero poli(3-hidroxibutirato-cohidrovivalerato).3,11 A utilização de nanopartículas como agentes encapsulantes tem sido alvo de pesquisas recentes, podendo-se citar a aplicação de suportes nanométricos tais como sílica, quitosana e ferro.12,13

A formação de partículas e o encapsulamento usando técnicas tradicionais (spray-drying, coacervação, freeze-drying, polimerização interfacial) podem apresentar algumas desvantagens, como o não controle do tamanho das partículas, morfologia, degradação de compostos termossensíveis, além da baixa eficiência no encapsulamento e rendimento. Neste sentido, alguns fluidos supercríticos têm sido utilizados para este fim. Além de fornecer partículas de tamanho uniforme, com estreita distribuição de tamanho de partículas, esta técnica permite uma separação eficiente das partículas, impedindo resíduos de solventes orgânicos no produto final, permitindo a reutilização do solvente ou anti-solvente.3

O tratamento de polímeros como o poli-hidroxibutirato-co-valerato com fluidos supercríticos, para posterior imobilização de enzimas, vem se constituindo em alternativa promissora. Neste contexto, destacam-se as lipases, enzimas de relevância biotecnológica por apresentarem várias aplicações na área de alimentos, indústrias de detergentes e fármacos. Novas aplicações biotecnológicas têm sido estabelecidas com sucesso utilizando lipases para a síntese de biopolímeros e biodiesel, a produção de compostos farmacêuticos enantiopuros, agroquímicos e sabores (flavor).14 A lipase Candida antarctica do tipo B (CalB) possui estrutura globular, é constituída de 317 resíduos de aminoácidos, tem dimensões de 30 A x 40 A x 50 A, massa molecular (MM) de 33 kDa e o ponto isoelétrico (pI) de 6,0.15,16

Com base nestes aspectos, o presente trabalho tem como objetivo central avaliar o efeito de parâmetros de imobilização (tempo de imobilização e pH) da lipase comercial CalB pelo método de adsorção, utilizando como suporte nanopartículas do PHBV obtidas através da precipitação com dióxido de carbono supercrítico. A estabilidade do derivado enzimático frente à temperatura (40, 60 e 80 ºC), ao reuso e à estabilidade à estocagem (4 ºC) também foram determinados. O derivado enzimático foi utilizado como catalisador na reação de esterificação do geraniol e ácido oleico para verificar seu potencial de aplicação em um sistema de interesse.

PARTE EXPERIMENTAL

Materiais

Nos experimentos de precipitação foram utilizados os seguintes reagentes: dióxido de carbono (White Martins S.A., pureza de 99,8%), diclorometano (FMaia, pureza de 99,5%), e o copolímero, poli(hidroxibutirato-co-hidroxivalerato) (PHBV) com massa molar média (Mw) de 196.000 e índice de polidispersão de 1,85, gentilmente cedido pela empresa PHB Industrial S/A. Estes materiais foram utilizados como recebidos, sem qualquer tratamento prévio, e foram armazenados de forma adequada, evitando contato com a luz, calor e umidade.

O co-polímero foi submetido a uma pré-purificação, pela sua dissolução em clorofórmio P.A. (Vetec, pureza de 99,5%) e posterior precipitação em n-heptano P.A. (Vetec, pureza de 99,5%) para retirada de impurezas.

A imobilização foi realizada utilizando a lipase solúvel de Candidaantarctica do tipo B livre (Novozym CalB), gentilmente doada por Novozymes Latina América Ltda. A atividade hidrolítica foi medida. O meio reacional para determinação da atividade de hidrólise consistia de 15 mM de butirato de p-nitrofenila (Sigma Aldrich, pureza de 99,9%) em 10 mL de álcool isopropílico (Neon, pureza de 99,5%) e 100 mL de tampão fosfato de sódio 25 mM, pH 7, sob agitação a 28 ºC.16

No estudo da aplicação do derivado enzimático como catalisador de reações de esterificação em sistema livre de solvente, foram utilizados como substratos o geraniol (Sigma Aldrich, pureza > 97%) e o ácido oleico (Sigma Aldrich, pureza > 99%).

Precipitação do PHBV

A precipitação do poli (hidroxibutirato-co-hidroxivalerato) (PHBV) puro foi realizada utilizando dióxido de carbono supercrítico como anti-solvente e diclorometano como solvente orgânico, utilizando a técnica de Dispersão da Solução Aumentada por Fluidos Supercríticos (SEDS) para formação das nanopartículas. Os valores do parâmetros de processo de precipitação utilizados foram a concentração de PHBV (30 mg mL-1), pressão da solução orgânica (80 bar), a vazão da solução foi 1 mL min-1, taxa de fluxo anti-solvente 40 mL min-1 e temperatura constante de 40 ºC.3,17 Detalhes do equipamento utilizado neste trabalho para a precipitação do PHBV podem ser encontrados na literatura.18,19 Uma descrição detalhada do aparato e procedimento experimental de formação de partículas de PHBV pode ser encontrada nos trabalhos de Franceschi et al..3,17

Imobilização da lipase utilizando PHBV como suporte

Em tubos típicos para uso em centrífuga de 50 mL, foram colocados em contato 0,1 g de nanopartículas de PHBV e 10 mL de solução tampão em diferentes valores de pH, contendo 0,1 mL de lipase CalB (atividade inicial 75 U/mL). Os tubos foram mantidos sob agitação de 7 rpm utilizando diferentes tempos em agitador rotativo (Tecnal TE-165). Posteriormente, separou-se o sobrenadante por filtração a vácuo. O imobilizado foi lavado com água destilada sob filtro com o auxílio de uma bomba de vácuo e, posteriormente, mantido durante 24 horas em dessecador para equalização do teor de umidade.

A avaliação do tempo de imobilização foi realizada nos valores de 30, 60, 90, 120 e 150 min, segundo metodologia proposta por Rodrigues et al..20 A avaliação do efeito do pH na imobilização da enzima foi realizada utilizando-se diferentes tampões de 25 mM em diferentes pH's: acetato de sódio, pH 5; fosfato de sódio, pH 6, 7 e 8; tris aminometano, pH 9 e carbonato de sódio, pH 10. O mesmo procedimento adotado anteriormente para obtenção do derivado enzimático foi empregado nesta etapa.

Estabilidade térmica do derivado imobilizado

A enzima livre e imobilizada em PHBV foi mantida em estufa a vácuo a 40, 60 e 80 ºC por 21 horas, segundo metodologia descrita por Silva et al..21 Periodicamente, efetuava-se a dosagem da atividade hidrolítica em butirato de p-nitrofenila.

A enzima imobilizada foi armazenada em geladeira (4 ºC) em frascos de vidro (sem presença de tampão). Periodicamente, efetuava-se a dosagem da atividade hidrolítica em butirato de p-nitrofenila.

Estabilidade operacional do derivado enzimático

Foram adicionados 50 mg de enzima imobilizada em béquer de 50 mL contendo 25 mL de meio reacional (15 mM butirato de p-nitrofenila), 10 mL de álcool isopropílico e 100 mL de tampão fosfato de sódio 25 mM a pH 7. A reação foi conduzida em banho-maria a 28 ºC, sob agitação. A cada minuto, um volume de 2,5 mL era coletado para medida da atividade em espectrofotômetro a 348 nm e, posteriormente, readicionado ao meio reacional. Cada ciclo teve duração de 15 min. Após cada ciclo, o imobilizado era lavado com água destilada e a umidade equalizada em bomba de vácuo por 30 min. Esta etapa teve por objetivo avaliar a possibilidade de reuso do derivado enzimático. A atividade do derivado foi monitorada por quatro ciclos consecutivos.

Determinação da atividade de hidrólise

O meio reacional consistia de 15 mM de butirato de p-nitrofenila em 10 mL de álcool isopropílico e 100 mL de tampão fosfato de sódio 25 mM, pH 7, sob agitação a 28 ºC. Adicionava-se 2,5 mL deste substrato em cubeta onde se acrescia 0,1 mL de solução de enzima livre. Para dosagem da atividade do imobilizado, foram adicionados 50 mg de enzima imobilizada em 2,5 mL do substrato. Posteriormente, foi efetuada a medida da atividade hidrolítica, em espectrofotômetro Lambda 35, UV-Vis (PerkinElmer) a 348 nm.16

Esterificação enzimática do geraniol e ácido oleico utilizando o derivado enzimático

A esterificação enzimática foi realizada conforme condições otimizadas em trabalho anterior,22 utilizando geraniol e ácido oleico como substratos na proporção molar de 3:1. Os substratos foram adicionados em Erlenmeyers de 50 mL com volume médio reacional de 5 mL. Pesou-se 0,5 g (10 % m/m em relação aos substratos) da enzima CalB imobilizada em PHVB e o tempo reacional foi contado a partir da adição da mesma. Todos os experimentos foram realizados em agitador orbital (shaker) com agitação constante de 150 rpm e temperatura de 40 ºC. Após o término do tempo de reação, fixado em 6 horas, o biocatalisador foi filtrado com papel filtro. A conversão em ésteres foi determinada por titulação com hidróxido de sódio (NaOH) 0,05 M até pH 11.22

Caracterização estrutural do polímero e do derivado imobilizado

Microscopia Eletrônica de Varredura (MEV)

Visando inspecionar a morfologia das nanopartículas de PHBV e do derivado imobilizado foram obtidas micrografias a partir de um microscópio eletrônico de varredura. As análises de Microscopia Eletrônica de Varredura (MEV) foram realizadas no Laboratório de Microscopia Eletrônica de Varredura da UFRN, utilizando um microscópio JEOL - JSM 5800 com voltagem de aceleração de 20KV e magnificações de 200x, 1.000x e 10.000x.

Difração de Raio-X

Os difratogramas das amostras das nanopartículas de PHBV e do derivado imobilizado foram obtidas através de um difratômetro de raio-X da marca Rigaku, Miniflex II, com tubo emissor de Cu ( λ = 1,54Å). As análises foram realizadas no Laboratório de Instrumentação Analítica da Universidade Federal do Rio Grande do Norte.

Análise termogravimétrica

As análises termogravimétricas foram realizadas em analisador térmico TGA-50H Shimadzu com taxa de aquecimento de 10 ºC/min sobre fluxo de ar sintético no Laboratório de Instrumentação Analítica da Universidade Federal do Rio Grande do Norte.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Maximização das condições de processo para imobilização da lipase em PHBV

O estudo do tempo de imobilização da lipase Candida antarctica B em nanopartículas de PHBV indicou o período de contato entre a enzima e o suporte necessário para que houvesse um bom fator de imobilização, sendo os resultados obtidos apresentados na Tabela 1.

De acordo com os resultados obtidos verificou-se que nos tempos de 30 e 60 min a percentagem de adsorção foi superior a 93%, mas a atividade do imobilizado foi de 0,11 e 0,09 U/g. No tempo de 120 min a imobilização em tampão fosfato de sódio 25 mM, pH 7 resultou no maior valor de atividade do imobilizado (0,33 U/g), sendo que a percentagem de adsorção foi de 88,90%.

A avaliação do pH de imobilização foi realizada buscando um maior fator de imobilização. Os resultados do pH ótimo para imobilização estão apresentados na Tabela 2, observando que os resultados obtidos com a imobilização em pH 5 (tampão acetato de sódio 25 mM) e pH 6 (tampão fosfato de sódio 25 mM) apresentaram a maior atividade do imobilizado (0,35 U/g). Contudo, verificou-se que em pH 7 (tampão fosfato de sódio 25 mM) foi obtida uma atividade similar (0,33 U/g) e uma maior percentagem de imobilização (92,30%). Os menores valores de atividade do derivado foram obtidas nos pH 8 (tampão fosfato de sódio 25 mM), 9 (tampão tris-aminometano 25 mM) e 10 (tampão carbonato de sódio 25mM). Levando em consideração que o ponto isoelétrico da lipase CalB é 6, os resultados obtidos neste estudo indicaram uma faixa de pH ótimo próxima do ponto isoelétrico da enzima.15,23 Os resultados obtidos no presente trabalho encontram-se em concordância com os de Liu et al.,12 os quais imobilizaram lipase de pâncreas suíno em nanopartículas de quitosana e ferro pelo método de adsorção, obtendo mais elevadas percentagens de mobilização e atividades enzimáticas em valor de pH igual a 7.

Estabilidade térmica do derivado imobilizado

Após determinar a melhor condição para imobilização da lipase em PHBV (120 min, pH 7) foi realizada a avaliação da estabilidade de temperatura da enzima livre e imobilizada em função do tempo, conforme apresentado na Tabela 3.

A enzima livre submetida a 40 ºC manteve sua atividade inicial (75 U/mL) após 21 horas de exposição. Nas temperaturas de 60 e 80 ºC, as atividades residuais foram de 1,26 e 0,33% após exposição de 3 horas.

O estudo da estabilidade de temperatura CalB livre foi estudada por Arroyo et al.,24 onde após 1 hora de exposição a 50 ºC a atividade apresentou redução de 70%. A estabilidade da CalB livre em temperaturas elevadas também foi avaliada por Silva et al.21 Os autores verificaram que a enzima foi completamente inativada após 21 h de exposição a 60 ºC.

O derivado imobilizado, após exposição de 21 horas a 40 ºC manteve sua atividade inicial. Após 21 horas de exposição a 60 ºC, a atividade hidrolítica da CalB/PHBV apresentou decréscimo, com atividade residual de 67%. Cabe ressaltar que Silva et al.21 utilizaram diversas preparações de quitosana para imobilizar a lipase Candida antarctica B e a estabilidade térmica dos derivados imobilizados a 60 ºC por 21 horas apresentaram uma atividade residual em torno de 40 %. Na temperatura de 80 ºC a enzima imobilizada manteve mais de 50 % de sua atividade inicial.

Nesse sentido, dentro do escopo deste trabalho, pode-se verificar que e metodologia de imobilização proposta apresenta viabilidade técnica, tendo em vista o aumento considerável da estabilidade do derivado enzimático em comparação à enzima livre, quando submetida a temperaturas elevadas.

O derivado enzimático demonstrou atividade residual de 50% após 30 dias de estocagem em geladeira (4 ºC). Nesta mesma temperatura, o extrato imobilizado perdeu completamente sua atividade hidrolítica após 45 dias de armazenamento.

Caracterização das nanopartículas de PHBV e do derivado enzimático

A precipitação do polímero PHBV em dióxido de carbono supercrítico utilizando a técnica SEDS resultou na formação de nanofibras de 5 a 7 µm de largura (Figura 1 (A)) e após a imobilização ocorreu um aumento na espessura das nanofibras para valores entre 7 a 10 µm (Figura 1 (B)). As micrografias demonstram existência de similaridade morfológica. As enzimas imobilizadas possuem maior tamanho de partícula, este fato está relacionado com as pequenas aglomerações formadas durante a imobilização.24


A cristalinidade das nanofibras foi avaliada pela análise de DRX. Os difratogramas do suporte e do derivado imobilizado são apresentados nas Figuras 2 (A) e (B), respectivamente. Os difratogramas para ambas as amostras exibem reflexões intensas e definidas indicando que o material possui estrutura cristalina. Os compostos cristalinos apresentam estrutura organizada e, consequentemente, uma superfície mais uniforme. Comparando as figuras observa-se o mesmo comportamento, ou seja, aparecem os mesmos planos cristalinos (mesmas reflexões). Este resultado era esperado tendo em vista que a imobilização ocorre com uma enzima solúvel, sua estrutura permanece praticamente inalterada. Perfis de difração similares para PHBV puro foram encontrados por Senhorini et al.,25 trabalho no qual o difratograma deste composto apresentou valores de 2θ correspondentes aos planos cristalinos na faixa de 13 a 30º.


A Figura 3 apresenta os espectros de infravermelho dos materiais, onde se pode observar as mesmas bandas nos dois espectros, indicando que a estrutura da nanofibra não foi modificada com a imobilização da enzima. Estes resultados estão de acordo com os obtidos pelas análises de DRX e MEV. Nos espectros observa-se banda a ~1701 cm-1 devido ao estiramento da ligação -C=O, bandas características de 1200 cm-1 a ~1000 cm-1 relacionadas ao estiramento -C-O-C- e bandas a 1455 cm-1 e 1382 cm-1, características do estiramento angular assimétrico -CH.


A Figura 4 apresenta os resultados da análise termogravimétrica das amostras antes e após a incorporação da enzima. Observa-se desta figura que os materiais possuem uma grande estabilidade térmica (~ 297 ºC) e que a esta temperatura ocorre uma degradação total do polímero com perda total de massa. Esta perda ocorre um uma única etapa, à temperatura de ~ 297 ºC e é associada a um evento exotérmico. Este comportamento sugere que nenhuma alteração nas propriedades térmicas ocorre em função da imobilização da enzima nas nanofibras.


Os resultados de caracterização contribuem para mostrar que as propriedades estruturais, químicas e térmicas não são modificadas após o processo de imobilização da enzima. Uma tendência de aumento da largura das nanofibras é observado após o processo de imobilização. Um fato relevante é que a morfologia das nanopartículas é de nanofibra, estrutura interessante para empregos destes materiais como suporte para a imobilização de enzimas, uma vez que o entrelaçamento das fibras pode proporcionar uma maior estabilidade mecânica ao material imobilizado.

Aplicação do derivado enzimático na esterificação de geraniol e ácido oleico

Em relação à estabilidade operacional da lipase Candida antarctica B em PHBV, estes biocatalisadores foram testados por 4 ciclos nos quais foi possível constatar que os mesmos mantiveram sua atividade inicial inalterada (atividade inicial do primeiro ciclo de 0,33 U/g, atividade residual de 100%).

A aplicação da lipase na catálise de reações para esterificação de geraniol e ácido oleico em sistema livre de solvente orgânico apresentou 88% de conversão, resultado similar ao obtido por Paroul et al.,22 que obtiveram 93% de conversão utilizando uma lipase imobilizada comercial (Novozym 435).

CONCLUSÕES

Avaliando os resultados concernentes à atividade do imobilizado e percentual de adsorção, foi possível concluir que o melhor tempo e pH de imobilização foram 120 min e 7, respectivamente. A lipase CalB imobilizada em PHBV possui relativa boa estabilidade a temperaturas mais elevadas comparada com a enzima livre. Apesar da atividade hidrolítica do imobilizado ser baixa, este derivado apresentou boa estabilidade nas temperaturas de 60 e 80 ºC mantendo mais de 50% de sua atividade inicial após 21 horas de exposição. Comparando a estabilidade da enzima livre em relação à enzima imobilizada, observa-se que nas temperaturas mais elevadas a enzima livre apresenta rápida desnaturação, o que não ocorre com a enzima imobilizada em nanopartículas de PHBV. Portanto, é possível concluir que a imobilização utilizando este suporte biodegradável apresenta uma nova rota, promissora, para imobilização da lipase CalB.

AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem à CAPES (Brasil) e ao CNPq (Brasil) pelo apoio financeiro, à Novozymes (PR, Brasil) pela amostra de lipase e às IES (URI, UFSC e UFRN) onde o trabalho foi desenvolvido pela infraestrutura disponibilizada.

REFERÊNCIAS

1. Garay, I.; Pocheville, A.; Madariaga, L: Powder Technol. 2010,197,211.

2. Reverchon, E; Adami, R.; J. Supercrit. Fluids 2006,37,1.

3. Franceschi, E.; De Cesaro, A. M.; Feiten, M.; Ferreira, S. R. S.; Dariva, C.; Kunita, M. H.; Rubira, A. F.; Muniz, E. C.; Corazza, M. L.; Oliveira, J. V.; J. Supercrit. Fluids 2008,47,259.

4. Milašinović, N.; Milosavljević, N.; Filipovic, J.; Knezević-Jugović, Z.; Krušic, M. K.; React. Funct. Polym. 2010,70,807.

5. Kim, J.; Grate, J. W.; Wang, P.; Chem. Eng. Sci. 2006,61,1017.

6. Andrade, L. H.; Rebelo, L. P.; Netto, C .G. C. M.; Toma, H. E.; J. Mol. Catal. B: Enzym. 2010,66,55.

7. Wang, Z. G.; Wan, L. S.; Liu, Z. M.; Huang, X. J.; Xu, Z. K.; J. Mol. Catal. B: Enzym. 2009,56,189.

8. Dalla-Vecchia, R.; Nascimento, M. G.; Soldi, V.; Quim. Nova. 2004, 27,623.

9. Vitolo, M. Em Biotecnologia Industrial, v.3 - Processos Fermentativos e Enzimáticos; Lima, U.A.; Aquarone, E.; Borzani, W.; Schmidell, W., eds.; Edgard Blucher: São Paulo. 2001, cap 3, 391-394.

10. Scherer, R.; Oliveira, J. V.; Pergher, S.; Oliveira, D.; Materials Research 2011,14,483.

11. Cocero, M. J.; Martin, A.; Mattea, F.; Varona, S.; J. Supercrit. Fluids 2008,47,546.

12. Liu, Y.; Jia, S.; Wu, Q.; Ran, J.; Zhang, W.; Wu, S.; Catal. Commun. 2011,12,717.

13. Macario, A.; Verri, F.; Diaz, U.; Corma, A.; Giordano, G.; Catal. Today 2013,204,148.

14. Hasan, F.; Shah, A. A.; Hameed, A.; Biotechnol. Adv. 2009,27,782.

15. Uppenberg, J.; Hansen, M. T.; Patkar, S.; Jans, T. A.; Structure 1994,2,293.

16. Brigida, A. I. S.; Pinheiro, A. D. T.; Ferreira, A. L. O.; Gonçalves, L. R. B.; Appl. Biochem. Biotechnol. 2008,146,173.

17. Franceschi, E.; Cesaro, A. M.; Ferreira, S. R. S.; Oliveira, J. V.; J. Food Eng. 2009,95,656.

18. Priamo, W. L.; Cezaro, A. M.; Ferreira, S. R. S.; Oliveira, J. V.; J. Supercrit. Fluids 2010,54,103.

19. Priamo, W. L.; Cezaro, A. M.; Beneti, S. C.; Oliveira, J. V.; Ferreira, S. R. S.; J. Supercrit. Fluids 2011,56,137.

20. Rodrigues, D. S.; Cavalcante, G. P.; Ferreira, A. L. O.; Gonçalves, L. R. B.; Chem. Biochem. Eng. Q. 2008,22,125.

21. Silva, J. A.; Macedo, G. P.; Rodrigues, D.S.; Giordano, R. L. C.; Gonçalves, L. R. B.; Biochem. Eng. J. 2012,60,16.

22. Paroul, N.; Grzegozeski, L. P.; Chiaradia, V.; Treichel, H.; Cansian, R. L.; Oliveira, J. V.; Oliveira, D.; Bioprocess. Biosyst. Eng. 2011,34,323.

23. Sun, J.; Jiang, Y.; Zhou, L.; Gao, J.; New Biotechnol. 2010,27,53.

24. Arroyo, M.; Sanchez-Monteiro, J. M.; Sinisterra, J. V.; Enzyme Microb. Technol. 1999,24,3.

25. Senhorini, G. A.; Zawadzki, S. F.; Farago, P. V.; Zanin, S. M. W.; Marques, F. A.; Mater. Sci. Eng., C 2012,32,1121.

Recebido em 02/04/2013; aceito em 26/08/2013; publicado na web em 24/09/2013

Referências bibliográficas

  • 1. Garay, I.; Pocheville, A.; Madariaga, L: Powder Technol 2010,197,211.
  • 2. Reverchon, E; Adami, R.; J. Supercrit. Fluids 2006,37,1.
  • 3. Franceschi, E.; De Cesaro, A. M.; Feiten, M.; Ferreira, S. R. S.; Dariva, C.; Kunita, M. H.; Rubira, A. F.; Muniz, E. C.; Corazza, M. L.; Oliveira, J. V.; J. Supercrit. Fluids 2008,47,259.
  • 5. Kim, J.; Grate, J. W.; Wang, P.; Chem. Eng. Sci 2006,61,1017.
  • 6. Andrade, L. H.; Rebelo, L. P.; Netto, C .G. C. M.; Toma, H. E.; J. Mol. Catal. B: Enzym. 2010,66,55.
  • 7. Wang, Z. G.; Wan, L. S.; Liu, Z. M.; Huang, X. J.; Xu, Z. K.; J. Mol. Catal. B: Enzym. 2009,56,189.
  • 8. Dalla-Vecchia, R.; Nascimento, M. G.; Soldi, V.; Quim. Nova 2004, 27,623.
  • 9. Vitolo, M. Em Biotecnologia Industrial, v.3 - Processos Fermentativos e Enzimáticos; Lima, U.A.; Aquarone, E.; Borzani, W.; Schmidell, W., eds.; Edgard Blucher: São Paulo. 2001, cap 3, 391-394.
  • 10. Scherer, R.; Oliveira, J. V.; Pergher, S.; Oliveira, D.; Materials Research 2011,14,483.
  • 11. Cocero, M. J.; Martin, A.; Mattea, F.; Varona, S.; J. Supercrit. Fluids 2008,47,546.
  • 12. Liu, Y.; Jia, S.; Wu, Q.; Ran, J.; Zhang, W.; Wu, S.; Catal. Commun 2011,12,717.
  • 13. Macario, A.; Verri, F.; Diaz, U.; Corma, A.; Giordano, G.; Catal. Today 2013,204,148.
  • 14. Hasan, F.; Shah, A. A.; Hameed, A.; Biotechnol. Adv 2009,27,782.
  • 15. Uppenberg, J.; Hansen, M. T.; Patkar, S.; Jans, T. A.; Structure 1994,2,293.
  • 16. Brigida, A. I. S.; Pinheiro, A. D. T.; Ferreira, A. L. O.; Gonçalves, L. R. B.; Appl. Biochem. Biotechnol 2008,146,173.
  • 17. Franceschi, E.; Cesaro, A. M.; Ferreira, S. R. S.; Oliveira, J. V.; J. Food Eng 2009,95,656.
  • 18. Priamo, W. L.; Cezaro, A. M.; Ferreira, S. R. S.; Oliveira, J. V.; J. Supercrit. Fluids 2010,54,103.
  • 19. Priamo, W. L.; Cezaro, A. M.; Beneti, S. C.; Oliveira, J. V.; Ferreira, S. R. S.; J. Supercrit. Fluids 2011,56,137.
  • 20. Rodrigues, D. S.; Cavalcante, G. P.; Ferreira, A. L. O.; Gonçalves, L. R. B.; Chem. Biochem. Eng. Q 2008,22,125.
  • 21. Silva, J. A.; Macedo, G. P.; Rodrigues, D.S.; Giordano, R. L. C.; Gonçalves, L. R. B.; Biochem. Eng. J 2012,60,16.
  • 22. Paroul, N.; Grzegozeski, L. P.; Chiaradia, V.; Treichel, H.; Cansian, R. L.; Oliveira, J. V.; Oliveira, D.; Bioprocess. Biosyst. Eng. 2011,34,323.
  • 23. Sun, J.; Jiang, Y.; Zhou, L.; Gao, J.; New Biotechnol 2010,27,53.
  • 24. Arroyo, M.; Sanchez-Monteiro, J. M.; Sinisterra, J. V.; Enzyme Microb. Technol 1999,24,3.
  • 25. Senhorini, G. A.; Zawadzki, S. F.; Farago, P. V.; Zanin, S. M. W.; Marques, F. A.; Mater. Sci. Eng., C 2012,32,1121.
  • *
    e-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      29 Abr 2014
    • Data do Fascículo
      Abr 2014

    Histórico

    • Aceito
      26 Ago 2013
    • Recebido
      02 Abr 2013
    location_on
    Sociedade Brasileira de Química Instituto de Química, Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), CP6154, 13083-0970 - Campinas - SP - Brazil
    E-mail: quimicanova@sbq.org.br
    rss_feed Acompanhe os números deste periódico no seu leitor de RSS
    Acessibilidade / Reportar erro