Open-access Bulbilhos aéreos de alho, provenientes de escapes florais, são infectados por vírus

Garlic aerial bulbils, from floral scapes, are infected by viruses

Resumos

Em campos de produção comercial de alho é comum observar plantas naturalmente infectadas por vírus dos gêneros Allexivirus, Carlavirus e Potyvirus. Os bulbilhos aéreos podem ser uma alternativa para a propagação de plantas de alho livres de vírus. Desta forma, o objetivo deste trabalho foi analisar a taxa de perpetuação dos vírus de plantas infectadas para os bulbilhos aéreos. Os bulbilhos aéreos obtidos de plantas infectadas foram analisados por RT-PCR utilizando oligonucleotídeos universais para os gêneros Allexivirus, Carlavirus e Potyvirus. A taxa de perpetuação foi de 65% para allexivírus, 20% para carlavírus e 82,22% para potyvírus. Os resultados demonstraram que a perpetuação dos diferentes vírus do bulbo para os bulbilhos aéreos é elevada, inviabilizando a utilização direta dos bulbilhos aéreos provenientes de plantas matrizes infectadas por vírus. Esta metodologia deve ser utilizada somente a partir de plantas isentas de vírus.

allexivírus; carlavírus; potyvírus; propagação


In commercial garlic fields, plants naturally infected by viruses of the genera Allexivirus, Carlavirus and Potyvirus are commonly observed. Aerial bulbils may be an alternative for the propagation of virus-free garlic plants. Thus, the aim of this study was to analyze the rate of virus perpetuation from infected plants to aerial bulbils. Aerial bulbils obtained from infected plants were analyzed by RT-PCR using universal primers for the genera Allexivirus, Carlavirus and Potyvirus. Results showed that the perpetuation of different viruses from the bulb to aerial bulbils is high, impairing the direct use of aerial bulbils from virus-infected matrix plants. This methodology should use solely virus-free plants.

allexivirus; carlavirus; potyvirus; propagation


NOTAS CIENTÍFICAS SCIENTIFCS NOTES

Bulbilhos aéreos de alho, provenientes de escapes florais, são infectados por vírus

Garlic aerial bulbils, from floral scapes, are infected by viruses

Tatiana Mituti; Milena Leite Oliveira; João Paulo Calore Nardini; Monika Fecury Moura; Maria Isabel Motta Hoffmann; Leysimar Ribeiro Pitzr Guimarães; Renate Krause Sakate; Marcelo Agenor Pavan

Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho – Faculdade de Ciências Agronômicas, Campus de Botucatu. Departamento de Proteção Vegetal, Rua José Barbosa de Barros, 1780, Botucatu, SP, Brasil, 18610-370

Autor para correspondência Autor para correspondência: Marcelo Agenor Pavan ( mapavan@fca.unesp.br)

RESUMO

Em campos de produção comercial de alho é comum observar plantas naturalmente infectadas por vírus dos gêneros Allexivirus, Carlavirus e Potyvirus. Os bulbilhos aéreos podem ser uma alternativa para a propagação de plantas de alho livres de vírus. Desta forma, o objetivo deste trabalho foi analisar a taxa de perpetuação dos vírus de plantas infectadas para os bulbilhos aéreos. Os bulbilhos aéreos obtidos de plantas infectadas foram analisados por RT-PCR utilizando oligonucleotídeos universais para os gêneros Allexivirus, Carlavirus e Potyvirus. A taxa de perpetuação foi de 65% para allexivírus, 20% para carlavírus e 82,22% para potyvírus. Os resultados demonstraram que a perpetuação dos diferentes vírus do bulbo para os bulbilhos aéreos é elevada, inviabilizando a utilização direta dos bulbilhos aéreos provenientes de plantas matrizes infectadas por vírus. Esta metodologia deve ser utilizada somente a partir de plantas isentas de vírus.

Palavras-chave adicionais: allexivírus, carlavírus, potyvírus, propagação.

ABSTRACT

In commercial garlic fields, plants naturally infected by viruses of the genera Allexivirus, Carlavirus and Potyvirus are commonly observed. Aerial bulbils may be an alternative for the propagation of virus-free garlic plants. Thus, the aim of this study was to analyze the rate of virus perpetuation from infected plants to aerial bulbils. Aerial bulbils obtained from infected plants were analyzed by RT-PCR using universal primers for the genera Allexivirus, Carlavirus and Potyvirus. Results showed that the perpetuation of different viruses from the bulb to aerial bulbils is high, impairing the direct use of aerial bulbils from virus-infected matrix plants. This methodology should use solely virus-free plants.

Additional keywords: allexivirus, carlavirus, potyvirus, propagation.

A redução na produção de alho pode ser ocasionada devido ao acúmulo de um complexo de vírus dos gêneros Allexivirus, Carlavirus e Potyvirus, que são transmitidos de uma geração para outra, através da propagação vegetativa. No Brasil, há duas espécies de potyvírus descritas em alho: Leek yellow stripe virus (LYSV) e Onion yellow dwarf virus (OYDV); duas espécies de carlavírus: Garlic common latent virus (GarCLV) e Shallot latent virus (SLV); e seis espécies de allexivírus: Garlic mite-borne filamentous virus (GarMbFV), Garlic virus A (GarV-A), Garlic virus B (GarV-B), Garlic virus C (GarV-C), Garlic virus D (GarV-D) e Garlic virus X (GarV-X) (2, 7, 10, 12).

Para obtenção de plantas livres de vírus, o método mais utilizado até o momento é a termoterapia associada à cultura de meristema. Utilizando o cultivo in vitro de plantas de alho, pode-se evitar ou reduzir a propagação dos vírus de uma geração para outra, permitindo a obtenção de 80 a 95% de plantas livres de vírus (8, 14).

A obtenção de plantas através da cultura de meristemas é uma técnica onerosa e que demanda muito tempo, sendo necessários de dois a três anos até a fase de aclimatização e mais alguns anos para multiplicação dos bulbilhos em campos de produção comercial.

O cultivo de alho através de bulbilhos aéreos, obtidos dos escapes florais tem gerado um grande interesse, e essa prática foi iniciada no Canadá para multiplicação de sementes a um baixo custo, e para evitar a transmissão de doenças de solo (15). Os bulbilhos aéreos são pequenos, comparados aos dentes de alho, podendo variar o tamanho e aparência, de acordo com a cultivar. Em uma única cápsula, pode conter de 4 a 150 bulbilhos (15).

No primeiro ano, os bulbilhos têm peso aproximado de 1 grama, que se desenvolverá em um único dente, e após o segundo ano haverá a formação do bulbo completo com peso aproximado de 15 gramas (5).

Dentro de dois anos, a propagação do alho através de bulbilhos aéreos oferece uma multiplicação 45 vezes maior que o método convencional, e plantios sucessivos das progênies dos bulbilhos têm qualidade superior à produzida a partir dos dentes originados da planta mãe (6, 15).

Para verificar a viabilidade de multiplicação de bulbilhos aéreos isentos de vírus, o presente trabalho teve como objetivo analisar as plântulas obtidas através de bulbilhos aéreos, provenientes de matrizes infectadas, a fim de verificar a porcentagem de perpetuação de allexivírus, carlavírus e potyvírus.

Dez plantas de alho (cv. Caçador) com sintomas de mosaico foram coletadas no Município de São Manuel/SP (2011 - matriz) e analisadas para a presença de vírus. Foi realizada a extração de RNA total, seguindo protocolo descrito por Bertheau e colaboradores (1).

As amostras foram analisadas por RT-PCR em uma só etapa utilizando o Kit GoTaq® Colorless Master Mix (Promega). Para um volume de 25 µl adicionou-se 12,5 µL de PCR Master Mix 2X, 1µM de cada oligonucleotídeo, 1 unidade da transcriptase reversa AMV (Avian myeloblastosis virus, marca Promega a 15 unidades/µL), 2,5µL de RNA total e Nuclease Free Water para completar o volume de 25µL. Foram utilizados oligonucleotídeos universais para detecção dos gêneros Allexivirus (241bp), Carlavirus (370 bp) e Potyvirus (800 bp) (Tabela 1).

Após o desenvolvimento completo da planta os escapes florais foram cortados, e os bulbilhos aéreos armazenados para plantio no ano seguinte (2012 – geração 1). Dez bulbilhos aéreos originados de cada matriz foram semeados em bandejas, com substrato Plantmax, totalizando 100 plantas e mantidos em casa-de-vegetação. Após 30 dias as folhas originadas da geração 1, foram coletadas e analisadas por RT-PCR, conforme descrito anteriormente.

Das dez plantas analisadas (matrizes), nove amostras foram positivas para potyvírus, uma para carlavírus e quatro positivas para allexivírus (Tabela 2).

No ano seguinte (2012), as 100 plantas da geração 1 foram analisadas. Para potyvírus, 75 amostras da primeira geração apresentaram-se positivas. Os bulbilhos aéreos obtidos das matrizes negativas também foram analisadas, e uma amostra da planta 6 (geração 1) apresentou-se positiva para potyvírus (Tabela 2). Supõe-se que a concentração do vírus estivesse baixa e não pode ser detectado o vírus na matriz.

Para allexivírus, 28 amostras da geração 1 foram positivas. Uma das plantas matrizes (planta número 3), inicialmente apresentou-se negativa, no entanto, quando analisadas a geração 1, duas dessas amostras foram positivas para a presença de allexivírus. Neste caso, duas hipóteses podem ser consideradas para a ocorrência de vírus na geração 1: como os allexivírus podem ser transmitidos por ácaros durante o armazenamento, pode ter ocorrido a infecção da geração 1 durante esse período, pois nenhum tratamento com acaricida foi realizado e as sementes permaneceram juntamente com os demais bulbos infectados; ou o mesmo pode ter ocorrido como explicado anteriormente no caso dos potyvírus, devido a baixa concentração, não foi possível realizar a detecção do vírus em sua respectiva matriz.

Para a análise de carlavírus, apenas uma matriz foi detectada a presença do vírus, e para geração 1 somente duas plantas foram positivas (Tabela 2).

Etoh & Nakamura (3) afirmam que os resultados são contraditórios, pois há vantagem na utilização de bulbilhos aéreos, pois são livres de nematóides e outras doenças causadas por vírus. Em contrapartida Verbeek e colaboradores (16) afirmam que não há diferença para a presença de vírus nos bulbos e nos bulbilhos aéreos, e seria inviável a utilização dos bulbilhos como material propagativo. Pesquisas desenvolvidas na Itália utilizando bulbilhos aéreos para análise demonstraram infecção de 86% para OYDV, 57% para LYSV, 71% de GarV-X e 29% para GarCLV (13).

Os dados obtidos neste trabalho estão de acordo com Verbeek e colaboradores (16) e Parrano e colaboradores (13), onde foi verificada uma elevada taxa de transmissão das matrizes infectadas para os bulbilhos aéreos. Para potyvírus a perpetuação foi de 82,22%, para carlavirus 20% e 65% para allexivirus.

Sendo assim, a utilização de bulbilhos aéreos se torna inviável para multiplicação de sementes, quando as matrizes são provenientes de materiais naturalmente infectados, sendo necessária a indexação do material. Entretanto, utilizando matrizes isentas de vírus, a multiplicação dos bulbilhos aéreos se torna viável, pois é um método que possibilita a obtenção de grandes quantidades de sementes, que poderão ser multiplicadas em campo no período de dois anos, ao contrário da cultura de meristema, que necessita de aproximadamente seis anos a mais para obter quantidades suficientes para multiplicação em campos comerciais. Além disso, o custo de produção utilizando bulbilhos aéreos para multiplicação será menor. No caso de sementes obtidas através de cultura de meristema, para a compra de sementes suficientes para um hectare, o custo de produção é de aproximadamente 175 mil reais (considerando 350 mil sementes/ha, sendo R$0,50/semente).

AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem a Fundação de Amparo à Pesquisa de São Paulo (FAPESP) pelo financiamento deste trabalho (Processo número 2010//16148-9).

Data de chegada: 27/01/2014.

Aceito para publicação em: 03/11/2014.

Referências bibliográficas

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  • Autor para correspondência:
    Marcelo Agenor Pavan
    (
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      18 Dez 2014
    • Data do Fascículo
      Dez 2014

    Histórico

    • Aceito
      03 Nov 2014
    • Recebido
      27 Jan 2014
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