Resumos
OBJETIVO: O presente estudo visa a fornecer dados anatômicos sobre a incidência, a origem, e o trajeto da artéria que transita pela parede posterior do canal inguinal, permitindo evitar acidentes durante as intervenções cirúrgicas na região inguinal. MÉTODO: Os autores realizaram a dissecação de 40 regiões inguinais de cadáveres fixados. RESULTADOS: Em 38 casos (95%) existia uma artéria, às vezes, de calibre insignificante, que estava presente posteriormente ao canal inguinal. Em 27/38 casos (67,5%), esta artéria representava a "coroa mortal", pois era constituída pela origem anômala da artéria obturatória, na artéria epigástrica inferior, ou representava uma anastomose da artéria epigástrica inferior com a artéria obturatória. Nos 11/38 casos restantes (27,5%), existia uma artéria, de reduzido calibre, que tinha origem na artéria epigástrica inferior, e capilarizava-se, após curto trajeto na parede posterior do canal inguinal. CONCLUSÃO: A existência da "coroa mortal", situada posteriormente ao canal inguinal, sempre implica em risco de hemorragias nas herniorrafias inguinais
Hérnia inguinal; Abdome; Cirurgia; Anatomia regional
BACKGROUND:The present study shows the anatomical aspects, the incidence, the origin and the location of the artery that transits through the posterior wall of inguinal canal, allowing the avoidance of accidents during the surgeon interventions in this region. METHODS: The authors performed dissection of 40 inguinal regions in cadavers. RESULTS: In 33 cases (95%) there was an artery, occasionaly, of insignificant caliber, that was present in the posterior inguinal canal. In 27/38 cases (67.5%), this artery represented the "Mortal Crown", as constituted by an anomalous origin of the obturatory artery emerging from the inferior epigstric artery or because of its anastomosis between the inferior epigastric artery and the obturatory artery. In the remaining 11/38 cases (27.5%), there was an artery of a reduced caliber, which emerged from the inferior epigastric artery, with a short tract on the posterior wall of the inguinal canal. CONCLUSION: The existence of the "Mortal Crown", on the posterior wall of the inguinal canal, always implicates risks at the inguinal herniorrhaphy.
Hernia, inguinal; Abdomen; Surgery; Anatomy, regional
ARTIGO ORIGINAL
"Coroa mortal": anatomia e importância nas herniorrafias inguinais
"Mortal crown": anatomy and importance to inguinal herniorrhaphies
Luiz Carlos Buarque de Gusmão, TCBC ALI; Thiago Fortes Pinto CavalcantiII; Renato Wendell Ferreira DamascenoII; Antônio José Casado RamalhoIII; Jacqueline Silva Brito LimaIV
IProfessor do Departamento de Morfologia da Universidade Federal de Alagoas; Mestre e Doutor em Anatomia Humana pela Escola Paulista de Medicina
IIMonitores da Disciplina de Anatomia Humana da Universidade Federal de Alagoas
IIIProfessor do Departamento de Morfologia da Universidade Federal de Alagoas; Especialista em Anatomia Humana
IVProfessora do Departamento de Morfologia da Universidade Federal de Alagoas; Mestre em Anatomia Humana
Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Luiz Carlos Buarque de Gusmão Rua Santa Júlia, 228 Farol CEP: 57055550 Maceió AL
RESUMO
OBJETIVO: O presente estudo visa a fornecer dados anatômicos sobre a incidência, a origem, e o trajeto da artéria que transita pela parede posterior do canal inguinal, permitindo evitar acidentes durante as intervenções cirúrgicas na região inguinal.
MÉTODO: Os autores realizaram a dissecação de 40 regiões inguinais de cadáveres fixados.
RESULTADOS: Em 38 casos (95%) existia uma artéria, às vezes, de calibre insignificante, que estava presente posteriormente ao canal inguinal. Em 27/38 casos (67,5%), esta artéria representava a "coroa mortal", pois era constituída pela origem anômala da artéria obturatória, na artéria epigástrica inferior, ou representava uma anastomose da artéria epigástrica inferior com a artéria obturatória. Nos 11/38 casos restantes (27,5%), existia uma artéria, de reduzido calibre, que tinha origem na artéria epigástrica inferior, e capilarizavase, após curto trajeto na parede posterior do canal inguinal.
CONCLUSÃO: A existência da "coroa mortal", situada posteriormente ao canal inguinal, sempre implica em risco de hemorragias nas herniorrafias inguinais.
Descritores: Hérnia inguinal; Abdome; Cirurgia; Anatomia regional.
ABSTRACT
BACKGROUND:The present study shows the anatomical aspects, the incidence, the origin and the location of the artery that transits through the posterior wall of inguinal canal, allowing the avoidance of accidents during the surgeon interventions in this region.
METHODS: The authors performed dissection of 40 inguinal regions in cadavers.
RESULTS: In 33 cases (95%) there was an artery, occasionaly, of insignificant caliber, that was present in the posterior inguinal canal. In 27/38 cases (67.5%), this artery represented the "Mortal Crown", as constituted by an anomalous origin of the obturatory artery emerging from the inferior epigstric artery or because of its anastomosis between the inferior epigastric artery and the obturatory artery. In the remaining 11/38 cases (27.5%), there was an artery of a reduced caliber, which emerged from the inferior epigastric artery, with a short tract on the posterior wall of the inguinal canal.
CONCLUSION: The existence of the "Mortal Crown", on the posterior wall of the inguinal canal, always implicates risks at the inguinal herniorrhaphy.
Key Words: Hernia, inguinal; Abdomen; Surgery; Anatomy, regional.
INTRODUÇÃO
Os vários procedimentos para correção de hérnias inguinais defrontamse, ainda hoje, com uma série de dificuldades técnicas, o que leva a um índice considerável de recidivas. Por outro lado, o avanço irreversível das correções herniárias por videolaparoscopia tem levado cada dia mais a uma busca de um melhor conhecimento anatômico da região inguinal.
Vários acidentes vasculares são descritos na literatura durante a abordagem do saco herniário e durante o reforço da parede posterior do canal inguinal. Entre os acidentes vasculares descritos na literatura, está a secção completa ou a transfixação de uma artéria existente na parede posterior do canal inguinal1, 2 . Essa artéria é ramo da artéria epigástrica inferior e se anastomosa com a artéria obturatória3, 48 ou pode ser a própria origem da artéria obturatória915, ou seja, uma artéria obturatória aberrante que se origina da artéria epigástrica inferior e segue em direção ao canal obturatório, passando antes por trás do canal inguinal e pela borda medial do anel femoral16 . Essa anastomose é denominada "Coroa Mortal" pelas grandes hemorragias que acarreta e que podem levar à morte do paciente 3 .
Objetivo da pesquisa é dirimir dúvidas e esclarecer dados a respeito da incidência, origem e principalmente trajeto deste vaso, buscando prevenir os acidentes vasculares durantes as herniorrafias inguinais.
MÉTODO
Cumprindo o que determina a Lei Federal n° 8.501, de 30 de novembro de 1992, e após aprovação institucional, foram utilizadas 40 regiões inguinais de cadáveres adultos, fixados, de ambos os sexos e de diferentes raças, pertencentes à Universidade Federal de Alagoas e à Escola de Ciências Médicas.
A dissecação buscou informações sobre a presença de vasos arteriais na parede posterior do canal inguinal, analisando sua origem, seu trajeto e sua incidência.
RESULTADOS
Das 40 regiões inguinais dissecadas, em 38 delas (95%), foi observado a presença de uma artéria, às vezes de reduzido calibre, transitando posteriormente ao canal inguinal (Figuras 1, 2 e 3). Em 14 casos (35%), houve origem de dois ramos, sendo um ramo da artéria epigástrica inferior e outro originário da artéria obturatória. Esses dois ramos anastomosavamse na face pélvica do púbis, constituindo a "coroa mortal" (Figura 1). Em 13 casos (32,5%), a "coroa mortal´era a própria artéria obturatória, que teve origem anômala da artéria epigástrica inferior, e que após passar por trás do canal inguinal, seguiu em direção ao canal obturatório (Figura 2). Finalmente, em 11 casos (27,5%), o vaso em questão saía da face medial da artéria epigástrica inferior, e após curto trajeto na parede posterior do canal inguinal, capilarizavase sobre o púbis e o anel femoral (Figura 3).
DISCUSSÃO
A presença de um vaso arterial na parede posterior do canal inguinal, observado em 95% dos casos, é um dado importante que deve ser levado em conta durante a realização de herniorrafias inguinais.
A "Coroa Mortal" é referida na literatura como a anastomose entre a artéria epigástrica inferior e a artéria obturatória, ou a própria origem aberrante da artéria obturatória a partir da artéria epigástrica inferior.
A origem da artéria obturatória da artéria epigástrica inferior foi observada em 32,5% dos casos, o que contraria a literatura2, 4, 1116., que fornece uma freqüência de 20%. A anastomose da artéria epigástrica inferior com a artéria obturatória foi detectada em 35% dos casos, fato que contraria os dados encontrados na literatura pesquisada³, quando informa um resultado de 10%.
Portanto, a presença da "Coroa Mortal" foi evidenciada em 67,5% das dissecções. Os casos restantes (28,5%), em que existia um ramo originário da artéria epigástrica inferior, posteriormente ao canal inguinal, não acreditamos que, devido ao seu reduzido calibre, possa produzir hemorragias que sejam tão importantes como aquelas decorrentes da lesão da "Coroa Mortal".
Quanto ao trajeto, a artéria obturatória aberrante tinha um trajeto em direção ao canal obturatório, passando por trás do canal inguinal e pela face pélvica do púbis, sendo essa a descrição relatada pela literatura pesquisada16. Por outro lado, o ramo púbico da artéria epigástrica inferior, após passar pela parede posterior do canal inguinal, tinha trajeto na parte superior do púbis em direção ao anel femoral, para depois descer pela borda medial do anel femoral e anastomosarse com o ramo púbico da artéria obturatória, sendo esse achado igual ao citado na literatura pesquisada610.
Concluimos que, a presença de vasos na parede posterior do canal inguinal, que podem ou não representar a anastomose entre a artéria epigástrica e a artéria obturatória, sempre implica em risco nas herniorrafias inguinais.
Recebido em 07/05/2003
Aceito para publicação em 14/10/2003
Trabalho realizado no Departamento de Morfologia da Universidade Federal de Alagoas com financiamento da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Alagoas e do CNPq.
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Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
29 Out 2007 -
Data do Fascículo
Fev 2004
Histórico
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Aceito
14 Out 2003 -
Recebido
07 Maio 2003