EDITORIAL
O uso de sensibilizadores de insulina no tratamento de infertilidade em pacientes com síndrome dos ovários policísticos (SOP)
Use of insulin sensitizers in the treatment of infertility in patients with polycystic ovary syndrome (POS)
Eduardo Leme Alves da MottaI; Thaís Sanches DominguesII; José Maria Soares JúniorIII
IDisciplina de Ginecologia Endocrinológica do Departamento de Ginecologia da Universidade Federal de São Paulo UNIFESP São Paulo (SP), Brasil; Huntington Medicina Reprodutiva São Paulo (SP), Brasil
IIPrograma de Pós-graduação (Doutorado) do Departamento de Ginecologia da Universidade Federal de São Paulo UNIFESP São Paulo (SP), Brasil; Huntington Medicina Reprodutiva São Paulo (SP), Brasil
IIIDepartamento de Ginecologia da Universidade Federal de São Paulo UNIFESP São Paulo (SP), Brasil
Correspondência Correspondência José Maria Soares Júnior Rua Napoleão de Barros 715 7º andar Vila Clementino CEP: 04024-002 São Paulo (SP), Brasil
Introdução
A síndrome dos ovários policísticos (SOP) é uma condição heterogênea, que apresenta grande variedade de sintomas clínicos e alterações endócrinas e metabólicas. É a mais frequente endocrinopatia da população feminina jovem. Afeta cerca de 510% das mulheres em idade reprodutiva1, sendo a maior causa de infertilidade nas pacientes anovuladoras2. Seu tratamento é baseado na sintomatologia preponderante, mas muitas controvérsias existem, principalmente envolvendo a resistência periférica à insulina. Estima-se que essa condição esteja presente em cerca de 50% das mulheres com SOP e, sobretudo, nas obesas, atingindo quase 70%3,4.
Nas últimas duas décadas, foi demonstrado o papel crucial da resistência periférica à insulina, com consequente hiperinsulinemia compensatória, como importante fator fisiopatológico. A hiperinsulinemia contribui ao estimular diretamente as células da teca-ovariana, ativando os receptores de IGF-15, corroborando assim para a maior secreção androgênica e, ao mesmo tempo, suprimindo a produção da globulina carreadora de hormônios sexuais (SHBG), levando a uma maior disponibilidade das frações livres dos androgênios6.
Desse modo, a indução ovariana na mulher infértil é muito variável e instável, com um limiar muito tênue entre o hiperestímulo ovariano e a baixa resposta, pois é comum o excessivo recrutamento folicular típico da SOP, mas a elevação androgênica também contribui para sua precoce atresia. Logo, os agentes sensibilizadores de insulina vêm sendo avaliados desde meados dos anos 1990, tendo a metformina (MTF) como o seu representante mais estudado, ao impedir a excessiva ação insulínica nas células da teca, chegando, inclusive, a restabelecer os ciclos ovulatórios7. Assim, muitos pesquisadores se dispuseram a utilizar essa medicação como opção inicial no tratamento da SOP8. Posteriormente, demonstrou-se que esses resultados eram contraditórios, pois incorriam em diversos vícios metodológicos, sobretudo a falta de critérios para determinar a resistência periférica à insulina, além do pequeno número de pacientes e a extrema heterogeneidade dos grupos8,9. Dessa forma, para que os hipoglicemiantes orais tenham relevância no tratamento da SOP, é fundamental a pesquisa da resistência insulínica e a determinação de quais mulheres realmente irão se beneficiar de sua administração. É importante ainda salientar que sua eficácia na melhoria dos sintomas geralmente ocorre somente após três a seis meses de uso7.
Opções de tratameno na infertilidade
Além da investigação inicial do casal infértil, a perda de peso deve ser encorajada antes de se iniciar qualquer tratamento, sobretudo nas mulheres obesas que desejam engravidar10,11, já que a indução da ovulação é menos efetiva quando o índice de massa corpórea (IMC) é maior que 2830 kg/m2 (Tang et al.)2. Ademais, a perda de peso de cerca de 510% da massa corpórea melhora a sensibilidade à insulina e, em grande parte, restaura a ovulação12. Assim, a principal atitude inicial a ser tomada deve ser a mudança no estilo de vida, a prática de exercícios13 e a restrição dietética14. Além dessas medidas, se comprovada laboratorialmente a resistência à insulina, é aconselhável o uso da MTF, pois poderá contribuir com a melhor foliculogênese e até ao retorno aos ciclos ovulatórios, além da diminuição do IMC14,15.
Nas mulheres anovuladoras com SOP, o citrato de clomifeno (CC) ainda é a droga de escolha; entretanto, também aumenta a chance de multiparidade em 10%15,16. Cerca de 80% irão responder ao estímulo ovariano com clomifeno, mas apenas 50% irão engravidar em até seis meses de tratamento17. Aquelas consideradas resistentes ao clomifeno (falta de ovulação após dois ciclos) ou com ausência de gestação após seis meses de CC, podem se beneficiar da associação com a MTF, sobretudo, as obesas e aquelas com comprovada hiperinsulinemia18,19. Nesses casos, se comprovada a resistência à insulina, o uso da MTF, na dose de 1,5 g ao dia, por três meses, tende a melhorar o estímulo ovulatório. Vale ressaltar que a MTF não deve ser utilizada como indutor isolado20.
Nos casos de insucesso, devemos utilizar as gonadotrofinas, de preferência o FSH recombinante, pela não atividade junto às células da teca, associados não só a ciclos de coito programado, mas também de inseminação intrauterina. As doses iniciais devem ser mínimas, com contínua monitorização ultrassonográfica e aumento gradual de doses, se comprovada a falta de crescimento folicular. Em geral, os resultados com a administração do FSH são superiores, não só pela melhor atividade folicular, mas corrobora ainda pelo sincronismo endometrial, que o CC não apresenta. O uso da MTF também é benéfico, se corretamente indicado em associação às gonadotrofinas, por aprimorar o desenvolvimento folicular, tornando-o mais fisiológico e, assim, melhorando as taxas de gestação, sem elevar o risco de multiparidade21.
Devemos considerar a fertilização in vitro (FIV), para aquelas pacientes sem sucesso com as táticas anteriormente descritas. A atividade da MTF ainda é escassa e controversa quanto à gestação22, mas auxilia na prevenção da síndrome de hiperestímulo ovariano23.
Em síntese, a resistência insulínica deve sempre ser avaliada nas mulheres com SOP, pois é reconhecida sua ação deletéria junto às células da teca-granulosa, sobretudo nas obesas, quando é mais prevalente. Seu uso, quando apropriado, por, pelo menos, três a seis meses, em doses de 1,5 g/dia, tende a restabelecer a ovulação24. Além disso, o aconselhamento pré-concepcional, com a modificação do estilo de vida e a redução de peso, por meio de atividade física e dieta, é eficaz em reaver os ciclos ovulatórios.
Recebido 23/11/2011
Aceito com modificações 04/01/2012
Conflito de interesses: não há.
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Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
04 Abr 2012 -
Data do Fascículo
Mar 2012