Resumos
Este artigo analisa as mudanças sociais, econômicas, culturais e religiosas que fizeram do Brasil um polo importante de produção do sagrado numa emergente cartografia global. Esta cartografia é policêntrica e entrecortada por uma miríade de redes transnacionais e multi-direcionais que facilitam o rápido movimento de pessoas, ideias, imagens, capitais e mercadorias. Entre os vetores que vamos examinar estão: imigrantes brasileiros que na tentativa de dar sentido ao processo deslocamento e de manter ligações transnacionais com o Brasil levam suas crenças, práticas, identidades religiosas para o estrangeiro, missionários e outros "entrepreneurs" religiosos, o turismo espiritual de estrangeiros que vão ao Brasil em busca de cura ou desenvolvimento espiritual, e as indústrias culturais, a mídia e a Internet que disseminam globalmente imagens do Brasil como uma terra exótica onde o sagrado faz parte intrínseca de sua cultura e natureza.
diáspora brasileira; religião; transnacionalismo; turismo religioso; globalização
This article analyses the social, economic, cultural and religious changes that have made Brazil a key node in the production of religion and spirituality in an emergent global cartography. This cartography is polycentric and cut across by multidirectional transnational networks which facilitate the flows of people, ideas, images, capital and commodities. In this article, we investigate flows of Brazilian migrants who take religious beliefs, practices, and identities to host countries; missionaries and other religions entrepreneurs; foreign spiritual tourists who go to Brazil seeking healing and spiritual development; and culture industries, mass media, and the Internet that spread globally an imaginary of Brazil as an exotic land, where the sacred is an intrinsic part of its culture and nature.
Brazilian diaspora; religion; transnationalism; religious tourism; globalization
O Brasil na nova cartografia global da religião
Brazil in the New Cartography of Religion
Cristina RochaI; Manuel A. VásquezII
IUniversidade de Sydney Ocidental - Sydney Nova Gales do Sul - Austrália
IIUniversidade da Flórida - Gainesville - Flórida Estados Unidos da América
RESUMO
Este artigo analisa as mudanças sociais, econômicas, culturais e religiosas que fizeram do Brasil um polo importante de produção do sagrado numa emergente cartografia global. Esta cartografia é policêntrica e entrecortada por uma miríade de redes transnacionais e multi-direcionais que facilitam o rápido movimento de pessoas, ideias, imagens, capitais e mercadorias. Entre os vetores que vamos examinar estão: imigrantes brasileiros que na tentativa de dar sentido ao processo deslocamento e de manter ligações transnacionais com o Brasil levam suas crenças, práticas, identidades religiosas para o estrangeiro, missionários e outros "entrepreneurs" religiosos, o turismo espiritual de estrangeiros que vão ao Brasil em busca de cura ou desenvolvimento espiritual, e as indústrias culturais, a mídia e a Internet que disseminam globalmente imagens do Brasil como uma terra exótica onde o sagrado faz parte intrínseca de sua cultura e natureza.
Palavras-chave: diáspora brasileira, religião, transnacionalismo, turismo religioso, globalização.
ABSTRACT
This article analyses the social, economic, cultural and religious changes that have made Brazil a key node in the production of religion and spirituality in an emergent global cartography. This cartography is polycentric and cut across by multidirectional transnational networks which facilitate the flows of people, ideas, images, capital and commodities. In this article, we investigate flows of Brazilian migrants who take religious beliefs, practices, and identities to host countries; missionaries and other religions entrepreneurs; foreign spiritual tourists who go to Brazil seeking healing and spiritual development; and culture industries, mass media, and the Internet that spread globally an imaginary of Brazil as an exotic land, where the sacred is an intrinsic part of its culture and nature.
Keywords: Brazilian diaspora, religion, transnationalism, religious tourism, globalization.
Neste artigo esboçaremos os contextos econômicos, políticos, culturais e religiosos que contribuíram para o recente crescimento do papel do Brasil como um centro chave de criatividade religiosa dentro de uma cartografia religiosa policêntrica global. Usamos o termo "cartografia" para enfatizar os processos de desterritorialização e reterritorialização que acompanham a nova fase de globalização produzida pelo capitalismo neoliberal. Segundo o geógrafo David Harvey (1989) e o teorista da cultura Fredric Jameson (1991), estes processos estão costurando novos mapas cognitivos e geopolíticos, reposicionando economias emergentes como o Brasil na ordem mundial. Tradicionalmente, a cartografia inscreve no espaço geográfico uma hierarquia que privilegia o norte sobre o sul, o "civilizado" sobre o "não-civilizado", as nações industrializadas e desenvolvidas sobre aquelas em desenvolvimento ou não-industrializadas. Em suma, a arte da cartografia sempre esteve ligada ao eurocentrismo e ao sistema colonial. Nos estudos pós-coloniais vemos uma inversão ou, pelo menos, uma tentativa de tornar visível e desafiar este eurocentrismo (cf. Said 1978, 1993), reconhecendo assim as contribuições dos grupos subalternos na história mundial. Neste contexto, entendemos que fluxos culturais (incluídos os religiosos) não partem somente do Norte Global, mas também do Sul Global. Mais ainda, eles conectam num sistema complexo de rede além do Sul e o Norte Globais, as nações do Sul e as nações periféricas, como mostraremos a seguir.
As razões para a importância do Brasil na nova cartografia religiosa global são diversas e complexas. Elas são uma mistura de processos sócio-políticos e culturais que na década passada reinseriram o Brasil em uma posição favorável no sistema global, operando em conjunto com um campo religioso nacional historicamente dinâmico. No entanto, existem vetores identificáveis que contribuíram para a construção, difusão e consumo global de identidades religiosas, visões de mundo e estilos de vida brasileiros:
•Brasileiros imigrantes que deixaram o país em grande número durante as décadas de 1980 e 1990, um período de grande instabilidade econômica e política no país. Em uma tentativa de dar sentido à sua jornada, construir uma nova vida no exterior e manter relações transnacionais com o Brasil, estes imigrantes trouxeram consigo suas religiões para onde emigraram.
•A criação, circulação e consumo de um imaginário global do Brasil, de sua cultura e religiões como exóticas, sexy, transgressoras, primitivas e autênticas, em contraste com a superficialidade, impessoalidade, monotonia e artificialidade da vida cotidiana na Metrópole. Este imaginário é muitas vezes construído por peregrinos ou turistas religiosos que viajam ao Brasil em busca de cura ou como parte de uma busca espiritual ou existencial.
•Meios de comunicação e internet, que globalizam certos líderes religiosos, práticas ou ideias sobre o Brasil.
•Empresários religiosos brasileiros usando a "sócio-gênese pluralista e fusionista" do Brasil (Siqueira 2003:151), ou seja, de um campo religioso enormemente diversificado e dinâmico, rumam ao exterior com o objetivo explícito de propagação de suas religiões.
Estes vetores se encaixam aproximadamente na tipologia do antropólogo Thomas Csordas (2009:5-6), que vê quatro meios de se estabelecer uma "transcendência transnacional": missão, migração, mobilidade e mediatização. Eles podem ser isolados para fins analíticos, mas na prática estes vetores frequentemente interagem uns com os outros, muitas vezes se reforçando mutuamente e outras vezes gerando "zonas de atrito" (Tsing 2005). Por exemplo, em seu trabalho sobre sobre a circulação global de jogadores de futebol brasileiros que atuam também como missionários pentecostais, Rial (2013) demonstra que os migrantes também podem ser empresários religiosos bem sucedidos. Além disso, esses jogadores de futebol exploram uma dimensão chave do imaginário global sobre o Brasil - o Brasil como o país do futebol por excelência, o país do jogo bonito - para avançar o seu trabalho missionário transnacional. Finalmente, a mídia global e o espetáculo global que é o futebol são centrais para a suas confissões públicas de fé.
Para caracterizar o impacto global destes vetores perante a propagação global das religiões brasileiras, escolhemos o termo "diáspora". Este termo tem sido objeto de um corpo de literatura crescente (Boyarin & Boyarin 2002; Cohen 2008; Johnson 2007; Safran 2004; Weinar 2010). Uma preocupação fundamental nessa literatura tem sido a tendência de estender o significado do termo além do seu referente inicial: o deslocamento forçado de uma população de sua terra natal1. Embora incapazes de retornar à sua terra natal, estas populações permanecem conectadas a ela através da memória e o desejo intenso de retorno (Clifford 1994; Shuval 2000). A saudade e a incapacidade de se sentir em casa na nova sociedade criam uma forte identidade coletiva, que envolve muitas vezes a religião como seu principal ingrediente. O uso do termo além desta conotação original para significar simplesmente a dispersão de povos, línguas e culturas levou alguns estudiosos a se preocupar com a perda de rigor do termo. Brubaker, por exemplo, se queixou da "diáspora da diáspora", porque a categoria,
torna-se tão abrangente a ponto de se tornar inútil. Se todo mundo é diaspórico, então ninguém o é. O termo perde seu poder de discriminação - sua capacidade de explicar fenômenos e fazer distinções. A universalização da diáspora, paradoxalmente, significa o desaparecimento da diáspora (Brubaker 2005:3).
Enquanto estamos atentos a este problema, usamos a palavra diáspora noutro sentido seminal: termo de diaspeirein, um termo grego que significa literalmente "espalhar sementes", que designa a disseminação da cultura helenística através da conquista, colonização, imigração e redes mercantis do antigo Mediterrâneo (Reis 2004). Veremos que as religiões brasileiras estão se espalhando precisamente por meio de dois desses vetores: empreendedores (religiosos) e migrantes. Além disso, muitas vezes construções particulares de brasilidade viajam juntamente com religiões brasileiras, e embora não integradas a uma língua franca coerente e abrangente como era o helenismo, envolvem memória, nostalgia, invenção de tradição, mitificação e a transposição de uma pátria imaginada para o exterior.
Começamos nossa visão geral das condições que propiciam a diáspora das religiões brasileiras com uma análise de fatores econômicos e políticos, incluindo mais proeminente a imigração, passando para as dimensões "culturais" como turismo espiritual e exotismo. A partir daí, exploraremos a dinâmica do campo religioso brasileiro e sua interação com a globalização.
O despertar do gigante adormecido?
O Brasil passou por uma crise econômica, política e social nas últimas décadas do século XX. O tão falado milagre brasileiro da década de 1970 implicou uma industrialização rápida e desigual, que levou a um processo desordenado de urbanização, e fez muitos brasileiros partirem para cidades como São Paulo e Rio de Janeiro em busca de empregos nos parques industriais crescentes. Por sua vez, essa migração, como veremos, está ligada à drástica transformação do campo religioso brasileiro, incluindo o crescimento explosivo do pentecostalismo.
Entretanto, este "milagre brasileiro" desapareceu com a acumulação de dívidas herdadas de décadas anteriores e a crise do petróleo dos anos 1970. Nos meados da década de 1980 a crise econômica explodiu. O Fundo Monetário Internacional e o Banco Mundial aprofundaram ainda mais a crise através de empréstimos e pacotes de assistência que incentivavam os países em desenvolvimento a cumprir duras reformas econômicas neoliberais. Os brasileiros tornaram-se desiludidos. Cinicamente começaram a dizer que o Brasil era para ser eternamente o país do futuro e que o futuro nunca chegaria. Muitos migraram, primeiro para os EUA, Europa e Japão e depois para outras partes do Norte Global. O processo que começou como um conta-gotas em meados da década de 1980, tornou-se uma diáspora de 3 milhões de pessoas em 2008, de acordo com o Ministério das Relações Exteriores (Brasil MRE 2009).
No entanto, para surpresa de todos, o futuro parecia ter chegado na primeira década do século XXI. Em 2001, Jim O'Neill, um economista da Goldman Sachs, cunhou o acrônimo BRIC (Brasil, Rússia, Índia, China) para denominar "gigantes econômicos emergentes". Na última década, a economia brasileira cresceu rapidamente e, no final de 2011, o Brasil ultrapassou o Reino Unido para se tornar a sexta maior economia do mundo (The Economist 2010:4). Mesmo que este crescimento e a consequente nova força política do Brasil em termos globais não tenham se sustentado e que atualmente se questiona se o país vai realmente se transformar, eles aprofundaram a penetração do capitalismo tardio na sociedade brasileira, estabelecendo conexões mais estreitas com redes e fluxos transnacionais. O crescimento rápido da economia brasileira também gerou um grande entusiasmo com o futuro do país. Inúmeros artigos de jornal, revistas e alguns livros (Roett 2010; Rohter 2010) tratam do tema. Por exemplo, a revista Vanity Fair produziu uma edição especial sobre o Brasil em 2007, enquanto em 2010 a Revista Wallpaper, a bíblia dos artistas, arquitetos e designers da moda, dedicou todo um número para cobrir o que chamou de "o país mais emocionante do mundo". Este entusiasmo culminou em 2010, quando o Brasil foi escolhido para sediar a Copa do Mundo de 2014 e os Jogos Olímpicos de 2016.
No entanto, este novo lugar do Brasil na ordem mundial não interrompeu a emigração. Enormes desigualdades sociais persistem. Por exemplo, de acordo com o Instituto Brasileiro de Estatística (IBGE), em 2007, enquanto os 10% mais ricos da população brasileira detinham 43,2% de toda a renda individual, os 10% mais pobres detinham apenas 1,1% (Lage & Machado 2008). Nesse sentido, o Brasil está entre os países com maior desigualdade social (ocupando a décima pior posição) de acordo com o coeficiente de Gini.
Brasileiros no exterior
O Brasil foi tradicionalmente um país que recebia fluxos de migrantes. No entanto, desde meados da década de 1980, o fluxo se inverteu. A crise socioeconômica da década de 1980 levou a enormes desigualdades sociais, criminalidade e violência, o que motivou muitos brasileiros a emigrar (Margolis 1994). Segundo um censo de 2000 de consulados estrangeiros realizado pelo Ministério das Relações Exteriores (MRE), 1,5 milhões de brasileiros haviam deixado o país entre 1980 e 2000. Um relatório do MRE de 2009 estimou que esse número havia chegado a 3 milhões. Atualmente, as maiores comunidades de brasileiros estão nos EUA (1,4 milhões), Paraguai (200.000), Japão (230.000) e no Reino Unido (180.000) (BRASIL, MRE 2011). Esta diáspora policêntrica tem facilitado a circulação global da cultura brasileira, incluindo símbolos, práticas e identidades religiosas.
Nos EUA, as maiores comunidades brasileiras estão em Nova York, Boston e Miami, mas há brasileiros também em Los Angeles, Washington DC, São Francisco e Chicago (Jouet-Pastre & Braga 2008; Martes 2011). Nos últimos anos, brasileiros começaram a se estabelecer no chamado "Novo Sul" em busca de trabalho. Em Atlanta, foram trabalhar na construção das instalações olímpicas, enquanto em Nova Orleans trabalharam no esforço de reconstrução após o furacão Katrina (Fussell 2009). Mais recentemente, a direção dos fluxos migratórios para os Estados Unidos começou a mudar. O nível mais elevado de vigilância após os atentados de 11 de setembro, o crescente medo de deportação, a desaceleração da economia americana e a queda no valor do dólar americano em relação ao real influenciaram uma reformulação dos fluxos globais de brasileiros (Margolis 2008). Desde 2005, mais brasileiros deixaram os EUA do que chegaram (Bernstein & Dwoskin 2007). Alguns decidiram voltar para casa, muitos outros migraram para a Europa, onde o euro era muito mais forte que o dólar americano e não era necessário possuir visto de entrada. Além disso, muitos brasileiros podem ficar permanentemente porque têm passaportes europeus, já que são descendentes de europeus que migraram para o Brasil nos séculos XIX e XX para trabalhar e/ou escapar das duas guerras mundiais (Souza 2010). O MRE estima que, na Europa, as maiores comunidades brasileiras se encontram no Reino Unido (180.000), Portugal (136.000), Espanha (159.000), Alemanha (91.000), Itália (850.000), França (80.000) e Suíça (57.000) (Brasil MRE 2011). Além desses locais de migração tradicionais europeus, a Irlanda tornou-se um novo destino até a crise econômica mundial. Dos estimados 816.000 brasileiros vivendo na Europa em 2008, 20.000 residiam na Irlanda (Brasil MRE 2009).
No entanto, a Europa também foi atingida pela crise financeira global. Este é particularmente o caso de alguns países com grandes comunidades brasileiras, como Portugal, Espanha, Irlanda e Reino Unido. Uma vez que a economia brasileira atravessou a crise quase incólume, como vimos na seção anterior, muitos imigrantes decidiram voltar para casa. Por exemplo, em Portugal, onde os brasileiros representam 25% do número de imigrantes estrangeiros e a crise é bastante forte, o número de pessoas que voltaram para casa triplicou em 2009 (Rodrigues 2011). A Organização Internacional para Migração (IOM, em inglês), uma agência associada com a ONU, assistiu o retorno de 1.011 imigrantes pobres de Portugal em 2009, 78% deles brasileiros. No entanto, não são apenas imigrantes brasileiros que estão retornando, portugueses estão também emigrando para o Brasil. Com as portas abertas a imigrantes qualificados de Portugal, bem como de países do Cone Sul, como Paraguai, Bolívia, Peru e Uruguai, onde imigrantes transnacionais brasileiros estão se tornando cada vez mais influentes, são estabelecidos novas redes e fluxos através dos quais as religiões podem viajar.
O Japão, outro importante destino para os brasileiros, também sofreu os efeitos da crise financeira global. Nipo-brasileiros começaram a migrar para o Japão em meados da década de 1980. Necessitando de operários durante o aquecimento de sua economia nos anos 1980 e perante um número crescente de trabalhadores sem documentos do Oriente Médio e Ásia, em 1990 o governo japonês revisou a lei de imigração de 1951. Ao mesmo tempo que estabeleceu sanções penais para o recrutamento de outros trabalhadores estrangeiros, criou um novo visto de "longa duração" exclusivamente para os descendentes de japoneses. As razões dadas para estas mudanças estão relacionadas à ideia de raça: descendentes manteriam homogeneidade racial, étnica e social enquanto ajudavam o Japão a superar uma perigosa escassez de trabalhadores para as fábricas em uma sociedade cada vez mais de classe média. Estes, brasileiros (e outros sul-americanos descendentes de japoneses), trabalham em empregos que são evitados pelos japoneses, uma vez que eles são considerados kiken (perigoso), kitanai (sujo) e kitsui (difícil). Mais tarde, esses trabalhadores nipo-brasileiros adicionaram mais dois Ks: kibishii (estrito) e kirai (repugnante). No ano 2000, dos 1,5 milhões de nipo-brasileiros residentes no Brasil, 18% em idade ativa, tinham partido para o Japão (Yamanaka 2000). Em 2008, brasileiros representavam a terceira maior população migrante (317.000), atrás apenas de coreanos (635.000) e chineses (335.000). No entanto, a desaceleração da economia japonesa fez com que até 2010 cerca de 50.000 brasileiros voltassem para casa. Atualmente a comunidade brasileira no Japão é estimada em 230.000 brasileiros (Brasil MRE 2011).
Notadamente a diáspora das religiões brasileiras não é apenas o produto de brasileiros deixando o Brasil e levando suas religiões com eles. Atraídos pelas religiões e tradições espirituais do Sul Global, buscadores espirituais também desempenham um papel importante neste processo. Frequentemente eles encontram religiões brasileiras no seu próprio país e posteriormente vão ao Brasil como turistas espirituais. Na próxima seção iremos explorar este fenômeno.
Turismo espiritual, exotismo e o imaginário
Nas últimas décadas, muito tem sido escrito sobre o turismo espiritual, ou seja, a interseção entre peregrinação e turismo. Partindo da conhecida afirmação de Victor e Edith Turner que "um turista é meio peregrino, se um peregrino é meio turista" (1978:20), muitos outros estudiosos têm argumentado que turistas também podem viajar procurando autenticidade ou em busca de significado e uma experiência de transcendência. Por sua vez, peregrinos se envolvem em atividades de turismo, consumo e lazer e usam a mesma infraestrutura que os turistas em suas viagens (Cohen 1992; Coleman & Eade 2004; Graburn 1977, 1983; Preston 1992; Reader & Walter 1993).
Enquanto "turista" e "peregrino" não são categorias homogêneas em si, alguns estudiosos têm argumentado que, como tipos ideais, turistas viajam para as periferias do mundo, enquanto peregrinos viajam aos centros espirituais, políticos e culturais do seu mundo (Cohen 1992:52-54; MacCanell 1976). Para estes autores, o advento da modernidade teve como consequência maior alienação e um crescente desejo de escapar para as periferias, onde habitantes do primeiro mundo acreditam que as pessoas vivem vidas mais "autênticas", intimamente ligadas à tradição e espiritualidade. O Brasil é imaginado como um lugar onde a conexão com o sagrado não foi erradicada pela modernidade. O turismo espiritual tem um papel importante na construção de um "imaginário transnacional" do Brasil no exterior.
Appadurai afirmou que a intensificação dos fluxos globais de mídia e migração teve uma profunda influência sobre o "trabalho da imaginação como uma característica constitutiva da subjetividade moderna" (1996:3). Para ele, "o trabalho da imaginação é um espaço [...] em que indivíduos e grupos procuram anexar o mundo às suas próprias práticas do moderno" (1996:4). Com efeito, através de mediascapes2, bem como da chegada de migrantes brasileiros que estrategicamente adotam maneiras essencializadas de ser brasileiro (tais como dar aulas de dança e capoeira ou como líderes espirituais) para conquistar um lugar no Norte Global, vemos que no imaginário coletivo do Ocidente, o Brasil se torna um Outro exótico, primitivo e tradicional. O país está associado por um lado com sensualidade, paixão, beleza, vivacidade, liberdade sexual, e, por outro, com um passado perdido pelos países industrializados no qual a espiritualidade está presente na vida cotidiana. A Amazônia, seus povos indígenas e a cultura afro-brasileira contribuem particularmente para o imaginário de um país profundamente espiritual. Grandes cidades como São Paulo raramente figuram neste imaginário.
Esta disjunção entre a imagem e a realidade deriva do que Edward Said (1978) chamou de "Orientalismo Romântico", ou seja, um anseio nostálgico por um passado puro e intocado. Este discurso orientalista é paradoxal: exalta apropriações abstratas de culturas autóctones, embora ignore as condições de vida precárias e a marginalização sistemática sofrida por indígenas brasileiros. Embora o Orientalismo geralmente se refira a representações da geografia e culturas de grande parte da Ásia e norte da África, baseados em Aparicio e Chávez-Silverman (1997), sugerimos que o conceito pode ser expandido para incluir a América Latina3.
Ideias românticas sobre o terceiro mundo foram adotadas e reforçadas pelo movimento da Nova Era a partir da década de 19804. A expansão de novas espiritualidades está diretamente ligada à modernidade. Ao contrário do que se pensava anteriormente, hoje é mais clara a noção de que a modernidade não gera secularização. Em vez disso, a quebra do "dossel sagrado" levou a um pluralismo religioso crescente, ao estabelecimento de um mercado religioso, a escolha religiosa privada e ao posicionamento do indivíduo como fonte de significado. A característica central deste mercado religioso é a de que "consumidores" são livres para escolher entre diversas religiões. O exotismo é uma parte integrante deste fascínio por espiritualidades alternativas e práticas do terceiro mundo (Huggan 2001).
A melhoria e barateamento dos meios de comunicação e de transporte impactou de várias formas no turismo espiritual. Primeiramente, líderes espirituais podem exercer maior controle de suas religiões no exterior através de viagens, e-mails e telefonemas, enquanto seguidores podem viajar para o Brasil várias vezes por ano (se possuem meios para fazê-lo) e entrar em contato com líderes espirituais e outros adeptos no Brasil e no exterior por meio de e-mail, Skype, Facebook e boletins eletrônicos. Em segundo lugar, canadenses, norte-americanos, europeus e australianos são capazes de construir locais sagrados da religião brasileira nos seus próprios países. O centro não está apenas "lá fora" acessível através de viagens (Turner & Turner 1973), mas onde eles próprios vivem. Como demonstrou Rocha (2009, 2013a) em seu trabalho sobre João de Deus, um curador espírita brasileiro, espíritos visitam seguidores e curam quando estes fazem banhos de cristal, assistem filmes do curador fazendo operações, leem livros, ou sentam-se na "corrente" no exterior. Adeptos hibridizam o que aprendem no Brasil com suas próprias crenças e cultura. Muitos deles usam religiões brasileiras para dar sentido às suas próprias vidas, além de estarem procurando maneiras de experienciar a transcendência em seus países.
Sejam seguidores da umbanda no Canadá (Meintel & Hernandez 2013), seguidores de João de Deus na Austrália (Rocha 2009, 2013a), adeptos de religiões afro-brasileiras em Portugal (Saraiva 2013), usuários de ayahuasca na Holanda (Groisman 2000, 2013) e praticantes de capoeira no Reino Unido (Stephens & Delamont 2013), muitos ocidentais adotam religiões brasileiras como parte de uma busca de desenvolvimento pessoal, cura de doenças físicas e mentais, solução de problemas sociais que vão do desemprego ao divórcio e à solidão e uma transformação radical de si mesmos. Além disso, são atraídos pelo desejo de estar em um lugar sagrado, onde líderes espirituais e espíritos habitam, e onde eles podem vivenciar o sagrado sem intermediários. De acordo com Preston (1992:33), locais de peregrinação têm "magnetismo espiritual". Para ele, este magnetismo é devido a quatro elementos: "curas milagrosas, aparições de seres sobrenaturais, geografia sagrada e dificuldade de acesso". Eade e Sallnow (1991:6) associam este magnetismo a um líder espiritual. Acreditamos que para estes adeptos estrangeiros, visitar os locais sagrados no Brasil onde vivem seus líderes espirituais é uma "maneira experiencial de 'tocar' o numinoso" (Tomasi 2002:208).
É importante notar que turistas espirituais em suas viagens ao Brasil também buscam lazer e estas viagens também incluem atividades seculares. Eles podem viajar usando guias e pacotes turísticos, visitar pontos turísticos, comprar lembranças, bijuterias e objetos sagrados necessários para rituais (por exemplo, rosários, camas de cristal e água fluidificada para seguidores de João de Deus, perfume, roupas especiais e incenso para adeptos da umbanda, plantas para fazer ayahuasca para os seguidores do daime, instrumentos musicais para os praticantes de capoeira) e trazer essas lembranças sagradas e seculares de volta aos seus países.
Imigração, turismo espiritual, exotismo e a constituição de um imaginário de Brasil estão incorporadas na "globalização", um termo que estudiosos usam para caracterizar uma dinâmica complexa de desterritorialização e reterritorialização. Para entendermos o processo pelo qual as religiões brasileiras se disseminam em todo o mundo, temos que discutir brevemente como processos de globalização interagem com a religião.
Religião e Globalização
A literatura sobre globalização teve um crescimento explosivo na última década. Apesar dessa proliferação, é indiscutível que as obras do geógrafo crítico David Harvey e do sociólogo Anthony Giddens continuam sendo pontos de referência essenciais na análise deste fenômeno tão dinâmico e complexo. Em seu livro The Condition of Postmodernity (1989), Harvey argumenta que a cultura pós-moderna é o reflexo da transição de um regime Keynesiano-Fordista de produção ancorado no Estado-Nação para um regime flexível e desterritorializado. Esta transição, que foi facilitada por rápidos avanços tecnológicos nos campos da comunicação e transporte, produziu uma compressão espaço-temporal. Como a atual crise econômica revela, processos que acontecem numa localidade particular podem quase instantaneamente ter efeitos globais. Por exemplo, os problemas econômicos na Grécia, Irlanda e Islândia tiveram repercussões poderosas não só para a União Europeia mas também para o capitalismo global.
Por outro lado, em seu livro The Consequences of Modernity, Giddens (1990) propõe que a globalização também resulta num processo de distanciamento radical; isto é, um processo de desenraizamento das relações sociais e padrões culturais de seus referentes locais, assim como na sua circulação através de redes e fluxos globais. Estas relações sociais e artefatos culturais (imagens, narrativas, identidades) podem então ser reapropriados e ressignificados em localidades muitas vezes longe das suas fontes originais. Desse modo, apesar da globalização aumentar a possibilidade do anonimato e a simulação virtual, é agora possível ter relações mais intensas e significativas no ciberespaço do que através de encontros pessoais. O melhor exemplo disto são as mídias sociais como Facebook5.
A compressão e distanciação espaço-temporal têm desencadeado processos de desterritoralização e reterritoralização que desafiam os nossos mapas cognitivos modernistas que "equiparam território, cultura e formas de governo. Fluxos de pessoas, capital, bens e ideias fazem com que seja cada vez mais insustentável mapear o mundo de acordo com a lógica de que para cada nação existe uma cultura, uma religião, uma história e uma formação social autônoma" (Vásquez 2009:3).
A "particularização do universal e a universalização do particular", uma dialética que o sociólogo Roland Robertson (1992:178) chama de "glocalização", ressalta o entrelaçamento e as tensões entre dinâmicas locais e globais que implicam a fabricação de identidade, práticas, visões do mundo e formas de organização híbridas (Robertson 1991, 1995; Rocha 2006; Vásquez e Marquardt 2003). A religião tem um papel chave na criação destas identidades e culturas híbridas, especialmente nos processos de imigração transnacional, oferecendo matérias-primas e infraestrutura para a construção de campos sociais que ultrapassam as fronteiras nacionais, ligando e transformando tanto as sociedades de origem quanto as sociedades de acolhimento (Csordas 2009; Levitt 2001, 2004, 2007; Levitt & Glick Schiller 2004; Williams, Steigenga & Vásquez 2009).
Dentro desse marco global, o estudo da diáspora das religiões brasileiras quebra com os modelos simplistas que conceitualizam a globalização como principalmente um processo de "McDonaldização", isto é, de difusão unidirecional da religião a partir dos EUA em conjunção com a hegemonia geopolítica, financeira e da mídia norte-americanas (Ritzer 1996). É verdade que os EUA continuam sendo um "nó" seminal das chamadas "indústrias globais do espírito" (Endress 2010). Por exemplo, os ministérios de T.D. Jakes, Creflo Dollar e Joel Osteen ainda são modelos a serem imitados. Contudo, atores nacionais e locais espalhados pelo mundo têm cada vez mais um papel saliente no desenvolvimento de estilos religiosos alternativos, serviços, estratégias empresariais, redes de distribuição e novos mercados. O resultado é o surgimento de uma cartografia policêntrica da globalização religiosa com vários pontos de injunção, donde se deriva a produção, circulação e consumo.
Alguns dos "centros de comando" na nova economia religiosa global, como Índia e China, já foram importantes na produção e disseminação das grandes religiões antigas, como hinduísmo, budismo, confucionismo e taoísmo. A nova força econômica desses centros revigora seu perfil global como produtores e exportadores de bens religiosos. Outros "nós" como Brasil, Nigéria e Gana, embora estejam numa posição subalterna no sistema capitalista mundial devido a processos históricos de escravidão, colonialismo e à diáspora africana, só recentemente começaram a desempenhar um papel de liderança na globalização religiosa.
O reconhecimento do Brasil como uma das maiores potências na nova geografia global do sagrado aponta para a proliferação de fluxos religiosos e redes multidirecionais e multiescalares que vão não só do "Norte" para o "Sul," mas também na direção oposta. Frequentemente, imigrantes e empresários religiosos brasileiros e de outros países do "Sul Global" "missionizam em reverso" (Adogame 2007; Gornik 2011; Jenkins 2011), exorcizando demônios, convocando espíritos ancestrais ou limpando resíduos cármicos em nações que durante o período colonial interpretaram a conversão religiosa na periferia como parte da sua missão civilizadora. Neste processo, imigrantes e empresários religiosos contribuem para a diversidade e vitalidade religiosa em lugares como Londres, Lisboa, Atlanta, Sydney, ou Montreal, apesar das pressões secularizadoras da modernidade tardia.
Além disso, a nova cartografia policêntrica da religião envolve fluxos Sul a Sul importantes. Seja o trabalho de proselitismo transnacional da Igreja Universal Reino de Deus em Angola, Moçambique e África do Sul (Freston 2001; Mafra et al. 2013; Oro 2004a) ou a popularidade do curador espírita brasileiro João de Deus na Austrália e Nova Zelândia (Rocha 2009, 2010, 2013a), estes intercâmbios Sul a Sul são carac-
terísticos da nova geografia do sagrado e da proeminência do Brasil nesta geografia. Como Frigerio (1998, 2002, 2013) apresenta em seu trabalho sobre a propagação da umbanda e batuque no Cone Sul, fluxos e redes entre países do sul não são unidirecionais - do ponto A (Brasil) ao ponto B (Argentina). Em vez disso, eles podem envolver focos alternativos de produção e circulação das religiões "brasileiras". Nesse caso, Montevidéu gerou sua própria escola de especialistas de umbanda e batuque, que, tendo introduzido variações significativas nestas religiões afro-brasileiras, as levaram para Buenos Aires. Lá, estes especialistas uruguaios disputaram espaço e legitimidade com pais e mães de santo de Porto Alegre, chegando até a fazer ligações pela internet para líderes da santería em Cuba e México para demonstrar a sua pureza e impor sua autoridade (Frigerio 2013). Por conseguinte, para compreender a complexidade dos fluxos e redes transnacionais que envolvem novos nós de produção religiosa como o Brasil, precisamos ir além do modelo simplista de núcleo-semiperiferia-periferia, que os teóricos do enfoque de sistemas mundiais como Immanuel Wallerstein tem utilizado para mapear as relações econômicas e geopolíticas.
Tendo caracterizado os amplos contornos da atual "globalização do sagrado" (Vásquez & Marquardt 2003), gostaríamos agora de examinar as contribuições específicas das religiões brasileiras para este processo de globalização. Para isso, precisamos entender a natureza e a evolução do campo religioso brasileiro. Veremos que, enquanto o Brasil sempre foi um país pluralista em termos religiosos, os últimos cinquenta anos têm sido um período intenso de inovação e hibridização religiosas lideradas pelo crescente número de "empresários" religiosos que estão agora aproveitando as novas tecnologias da modernidade tardia e a nova posição geopolítica do Brasil para produzir e exportar seus produtos.
O campo religioso brasileiro e a globalização
Apesar da hegemonia cultural do catolicismo desde a chegada dos portugueses no país, apoiada institucionalmente pelo Padroado Real, o campo de religioso brasileiro sempre foi não só diverso e complexo, mas também caracterizado por uma grande inovação e vitalidade. Isto é evidente na fertilização cruzada entre religiões indígenas, africanas e o catolicismo português, parte integral da experiência colonial. O pluralismo religioso no Brasil contemporâneo não é inteiramente novo. Pelo contrário, ele deve ser visto dentro de uma longa história de dinamismo e criatividade religiosa enquadrados num marco de relações assimétricas de poder. No entanto, nos últimos cinquenta anos, a sociedade brasileira tem vivenciado grandes mudanças que aumentaram radicalmente a variedade de opções religiosas e criaram condições para a circulação global das religiões originárias do Brasil, em consequência do país ter se tornado um importante ponto de confluência nos circuitos transnacionais financeiros e de mídia. Essas mudanças estão intimamente ligadas à reestruturação da economia brasileira, como resultado da transição de um modo de produção predominantemente rural e agrícola para um sistema econômico industrial e urbano. Nesta fase, os campos da cultura, do conhecimento, e da comunicação desempenham um papel importante na extração do superavit dentro do capitalismo global tardio.
Desde Christian Lalive D'Epinay (1968) e Emilio Willems (1967), estudiosos da religião e sociedade têm documentado o papel social e cultural do pentecostalismo durante a ruptura da velha ordem católica construída na base de relações estreitas mas desiguais entre patrões e clientes e o surgimento de processos concomitantes de diferenciação social e de individualização que acompanham o processo de urbanização. Para Lalive D'Epinay e Willems, o sucesso do pentecostalismo, particularmente entre os pobres brasileiros, é devido ao fato de que ele rearticula de certa forma o corporativismo do catolicismo rural tradicional em meio à anomia urbana através da congregação unida por uma poderosa efervescência pneumo-cêntrica, isto é, por fortes vínculos afetivos originados da experiência comum do Espírito Santo. Ao mesmo tempo, a ética severa do pentecostalismo isola e resguarda o crente das patologias do dia a dia urbano: o alcoolismo, a criminalidade e a violência (Mariz 1994; Mariz & Machado 1996). Mais ainda, o pentecostalismo oferece a possibilidade de uma renovação pessoal radical no presente e da salvação no futuro através de um relacionamento direto e íntimo com Jesus Cristo (Robbins 2010:160-166).
Não é de surpreender então que o crescimento do pentecostalismo tenha se tornado a principal marca do crescente pluralismo religioso brasileiro. De 1950 a 2010, a percentagem de católicos entre a população caiu de 93,5% para 64,6%. Durante o mesmo período, a proporção de protestantes/evangélicos aumentou de 3,4% para 22,2%, crescendo 61% entre 2000 e 2010 (O Globo 2012). A grande maioria (75-80%) desses protestantes se identifica como pentecostais.
O processo desordenado de democratização, a turbulência econômica e as incertezas das décadas de 1980 e 1990 forneceram o contexto para o surgimento de uma nova onda vigorosa de pentecostalismo que acentuam a cura divina e o exorcismo, ao contrário de igrejas pentecostais clássicas, que fazem da glossolalia a primeira e principal prova do batismo no Espírito Santo. Este "neopentecostalismo" defende abertamente uma teologia da prosperidade baseada num evangelho de saúde e riqueza que não vê contradição nenhuma entre a redenção espiritual, o sucesso econômico e o bem-estar físico (Mariano 2005; Oro et al. 2003). O evangelho da prosperidade atrai simultaneamente vastos setores da população brasileira que não tem acesso a serviços de saúde e aquelas camadas da classe média urbana que estão em busca de ascensão ou até mesmo estabilidade social, isto é, de sucesso financeiro e bem-estar (Dantas 2010; Mariano 1999:101-102; Pereira e Linhares 2006). Ele também apela aos imigrantes, brasileiros e não-brasileiros, que deixaram seus países de origem em busca do sonho de viver no primeiro mundo (Freston 2008, 2004, 2001; Mafra 2003; Martes 2000; Oro 2004b; Rocha 2013b). Na verdade, o evangelho da saúde e riqueza é altamente portátil na sua estética espetacular. O sucesso de uma igreja baseia-se não só no uso estratégico das mais recentes tecnologias de comunicação para espalhar sua mensagem, mas também no fato de que o neopentecostalismo é uma fé performativa, uma fé que trabalha com imagens impactantes da batalha cósmica entre Jesus e o Diabo ou dos carismas exuberantes do Espírito (os templos monumentais, os eventos enormes e suntuosos em estádios etc.). Mesmo num mundo saturado de símbolos, estas imagens e práticas dramáticas podem viajar com muita facilidade através da mídia eletrônica, seja da TV ou internet (Freston 2004, 2001, 1999; Meyer 2010).
Como consequência, a "pentecostalização" é muito pronunciada na diáspora brasileira. Freston nota que "os pentecostais já são dois terços dos protestantes no Brasil, mas na diáspora esta porcentagem parece crescer mais ainda" (2008:259). Isto é devido à lentidão com que a Igreja Católica estabelece igrejas para atender comunidades de imigrantes no exterior e pelo fato do pentecostalismo ser policêntrico. Já que não possui uma autoridade central, suas práticas e crenças podem ser adaptadas por empreendedores locais muito mais rapidamente do que a Igreja Católica (Freston 1999; Martes 2000). Em resposta à forte expansão do pentecostalismo e à reavaliação conservadora do Vaticano II iniciada por João Paulo II e sustentada por Bento XVI6, a influência do movimento de Renovação Carismática cresce dentro da Igreja Católica brasileira, deslocando o catolicismo progressista das CEBs e da Teologia da Libertação como eixos principais de trabalho pastoral. Tal como o pentecostalismo, a Renovação Carismática Católica (RCC) surgiu nos Estados Unidos. Em seus primeiros anos, a RCC cresceu rapidamente entre os americanos da classe média urbana e se espalhou rapidamente em países tão diversos como Canadá, Austrália, Peru e Brasil, onde oferece um "pneuma-centrismo virgofílico" como uma opção viável ao pentecostalismo7. De acordo com Chesnut (2003), a RCC permite aos brasileiros experimentar a renovação pessoal e a intimidade com o sagrado, que são as características marcantes do pentecostalismo, mas sem levar à ruptura com a hierarquia da Igreja Católica e com tradições populares como a devoção mariana. Esta mistura de mudança e continuidade, communitas e estrutura, pode servir bem à classe média urbana brasileira, que está passando por um período de transição. Apesar de nos últimos anos as condições econômicas terem melhorado consideravelmente para esta classe, as mudanças e contradições sociais que acompanham a globalização geram incertezas e ansiedades. Neste sentido, partindo das teorias de Mary Douglas e Wildavsky (1983), Ulrich Beck (1992) e Zygmunt Bauman (2006), poderíamos levantar a hipótese de que uma das razões por trás da expansão do catolicismo carismático - assim como do neopentecostalismo - é a necessidade de administrar o risco, de lidar com o "medo líquido" (liquid fear) da modernidade tardia, seja o medo da criminalidade, da crise econômica, do terrorismo, dos desastres ecológicos, ou até do fim do mundo. Assim como as classes médias e altas brasileiras se protegem dos perigos percebidos na cidade por meio de muros altos, carros blindados e guarda-costas, assim também muitos de seus membros encontram nos cristianismos pneumo-cêntricos teologias dualistas e práticas de purificação e combate espiritual para fechar o corpo e proteger a alma. Nesses cristianismos, o temor do desconhecido e de dificuldades viram demônios visíveis que podem ser exorcizados.
Contudo, a diáspora dos cristianismos brasileiros não é só o resultado das patologias da globalização. Isso seria uma abordagem muito redutiva e incompleta. Não podemos ignorar a força do apelo da RCC aos jovens brasileiros. Fazendo uso das tecnologias mais avançadas de comunicação, de músicas contemporâneas e de estratégias paralelas às do neopentecostalismo - misturando religião, negócios e entretenimento - a Renovação Carismática projeta uma imagem de empreendedorismo e vitalidade que atrai a juventude brasileira impaciente para entrar na modernidade global (Carranza 2000).
Desde os anos 1980, imigrantes brasileiros e de outros países da América Latina, que foram para os Estados Unidos em grande número fugindo da "década perdida", têm desempenhado um papel central na vida da RCC, dando-lhe uma característica transnacional. Pesquisas recentes da religiosidade dos Latinos nos EUA apontam para o fato de que o estilo carismático de culto tem se generalizado para além do movimento de Renovação Carismática propriamente dito, disseminando-se dentro da Igreja Católica em geral8. Redes carismáticas originárias do Brasil, como a Canção Nova (CN), fundada em 1978 por Monsenhor Jonas Abib e Luzia Santiago, adquiriram um papel bastante importante neste transnacionalismo. Com mais de 1.000 membros, a CN opera não apenas no sudeste do Brasil, mas tem agora dezenas de casas de missão em todo o país e no exterior, incluindo Estados Unidos (Texas e Georgia), França, Portugal, Itália e Israel (Carranza & Mariz 2013).
Transformações recentes no campo religioso brasileiro não estão restritas ao cristianismo. Após anos de discriminação e até perseguição, religiões afro-brasileiras como a umbanda e o candomblé surgiram como legítimas expressões da cultura brasileira. Desde sua criação, essas religiões demostraram uma forte tensão entre o desejo de preservar os padrões africanos como marcas de pureza e autenticidade e a necessidade de se adaptar ao contexto hostil brasileiro através do sincretismo com outras religiões. Na segunda diáspora, isto é, na dispersão global das religiões afro-brasileiras, essa tensão em relação à questão da autenticidade e ortodoxia se complexifica ainda mais: por um lado há o apelo não só à África como fonte original mas também à "brasilidade" do candomblé e da umbanda; por outro lado há processos de "glocalização" que fazem com que religiões afro-brasileiras se combinem com outras religiões da diáspora africana como a santería cubana ou vodu haitiano que têm agora uma presença global9. Por ser extremamente aberta ao sincretismo, a umbanda parece estar particularmente bem equipada para lidar com a tensão entre sua identidade brasileira e sua glocalização inovadora em contextos diversos. De fato, segundo Arakaki (2013) em seu estudo sobre a umbanda no Japão, no estrangeiro os terreiros se tornam espaços de encontro e transculturação entre imigrantes, mestres brasileiros itinerantes e seguidores nativos; esses são espaços onde identidades individuais e coletivas são negociadas. Ao incorporar samurais e geishas ao lado de caboclos, pretos velhos e exus, os imigrantes brasileiros no Japão reimaginam noções de pertença nacional10.
Os chamados movimentos religiosos da Nova Era exibem a mesma flexibilidade e capacidade sincrética, nesse caso combinando rituais e cosmologia religiosas com terapias modernas de autoajuda que formam um nexo de cura holística. O espiritismo - que chegou ao Brasil por volta de 1860, após a publicação das obras do educador francês Allan Kardec - é um claro exemplo disso. Kardec combinou a ética cristã, especialmente a ênfase na caridade e no amor fraterno, com noções hinduístas de carma e reencarnação e com ideias iluministas de educação e progresso. Hoje os espíritas são 2% da população brasileira, com uma forte representação entre brasileiros de classe média urbana (de acordo com o censo de 2010, 31,5% têm ensino superior). Com uma perspectiva baseada no Iluminismo e na Razão, com evidente tentativa de apresentar-se como uma doutrina racional e científica, o espiritismo permite aos brasileiros da classe média urbana participar da modernidade ocidental mas sem desencantar o mundo e ficar cativo na "jaula de ferro" (Weber 1958). Em outras palavras, o Brasil de hoje é cada vez mais submetido à racionalidade instrumental da modernidade, mas isso não implica que ele não continue sendo animado por forças sobrenaturais. Poderíamos dizer então que há uma "afinidade eletiva" entre a localização do Brasil na encruzilhada entre modernidade e tradição, entre o nacional e o global, e a capacidade do espiritismo de englobar várias religiões e culturas, abrangendo desde os espíritos "pouco evoluídos" da umbanda até Sócrates e Buda, que operam em espaços e tempos contrastantes (Hess 1991; Hess & DaMatta 1995; Rocha 2006).
Sem dúvida, nenhum outro representante contemporâneo do espiritismo brasileiro tem encontrado mais popularidade no exterior do que João de Deus. Suas cirurgias sem assepsia ou anestesia têm lhe dado uma notoriedade global. Incorporando "espíritos evoluídos" como Inácio de Loyola, Rei Salomão e dr. Oswaldo Cruz, acredita-se que João de Deus pode dissolver tumores e curar câncer, AIDS, viciados em drogas e com depressão clínica. Essas curas milagrosas atraíram a atenção de canais de televisão norte-americanos, como a ABC News, CNN e Oprah Show, e fizeram de João de Deus um importante nó na rede global de gurus e curadores famosos. Ele também ganhou muitos seguidores em países distantes como Austrália e Nova Zelândia, que viajam à sua Casa, em Abadiânia no estado de Goiás, em busca de uma medicina alternativa com um toque pessoal, uma abordagem holística de cura que transcende a impessoalidade e a mercantilização da medicina ocidental moderna (Rocha 2009, 2010, 2013a). Cristina Rocha mostra que a intensa mobilidade de pessoas, objetos sagrados, ideias, práticas e espíritos entre o centro de cura no interior do Brasil e a Austrália cria uma espécie de "comunidade espiritual transnacional", ou, como diria Pierre Bourdieu, "um campo socioespiritual" composto por curadores, doentes, guias turísticos, jornalistas, pesquisadores e aqueles que buscam crescimento espiritual.
A mesma reação à impessoalidade, as ansiedades e as tensões da vida moderna no capitalismo tardio inspira o trabalho do Vale do Amanhecer, em Atlanta, Geórgia (Vásquez & Alves 2013). Como um dos líderes do Vale disse: "Os EUA são uma nação especialmente cármica por causa de sua riqueza e apego às coisas materiais". Como tal, a tarefa deste movimento mediúnico é levar os ensinamentos de Tia Neiva, a fundadora do Vale do Amanhecer, para que ilumine e cure os norte-americanos alienados pelo consumismo e os imigrantes obcecados por alcançar o sonho americano. Para realizar essa tarefa ambiciosa, o Vale do Amanhecer concentrou-se principalmente na situação dos imigrantes brasileiros em Atlanta, muitos dos quais são indocumentados e vivem e trabalham às escondidas, com medo constante perante o forte clima anti-imigrante. O Vale tira da história de imigração de Tia Neiva uma narrativa de cumprimento do destino, mesmo enfrentando obstáculos e dificuldades, e de complementaridade de gênero. Assim, o Vale usa a sua prática de trabalhar com um casal de especialistas que desempenham papéis distintos mas complementares (o homem como doutrinador e a mulher como médium de encarnação), para ajudar as mulheres brasileiras em Atlanta a negociar suas identidades e relações de gênero que são redefinidas pelo processo de migração (Vásquez & Alves 2013).
Caboclos, os espíritos dos indígenas brasileiros como são imaginados na cultura popular brasileira, figuram proeminentemente no Vale. Seus conselhos durantes as consultas em Atlanta apontam para uma vida mais simples, mais natural, autêntica e harmoniosa que contrasta fortemente com o consumismo superficial, o individualismo irrestrito, a cobiça e o ímpeto de possuir coisas que dominam a modernidade. Esse "primitivismo", isto é, a poderosa nostalgia e o desejo de um retorno às origens imaculadas da humanidade, representado pelos indígenas brasileiros que vivem em comunhão com os espíritos e a natureza, também é central na propagação global de religiões ayahuasqueiras como o Santo Daime, a União do Vegetal e a Barquinha (Groisman 2013; Labate & Jungaberle 2011)11.
Santo Daime, por exemplo, pode ser visto como uma rearticulação criativa de cosmologias e práticas xamânicas indígenas, que muitas vezes envolvem o uso de agentes psicoativos como a ayahuasca. Esses elementos ajudam xamãs a viajar no tempo e no espaço, entrar em comunicação com os espíritos ancestrais e experimentar a riqueza e vitalidade da floresta através das perspectivas de animais e plantas, o que o antropólogo Eduardo Viveiros de Castro (2004) chama de "multinaturalismo". No censo de 2010, 35 mil brasileiros se identificaram como adeptos de religiões ayahuasqueiras. Depois de muitos anos fazendo parte de rituais indígenas e da vida dos seringueiros e mestiços no Amazonas, a ayahuasca começou a circular em redes de jovens urbanos de classe média e alta que estavam à procura de experiências alternativas durante os anos repressivos da ditadura. Este grupo cosmopolita, com os meios para viajar para o exterior, levou o Santo Daime e outras religiões ayahuasqueira para Europa, Japão, Austrália e os Estados Unidos. Complementando o circuito, hoje europeus, australianos e americanos viajam como "romeiros-turistas" para o Brasil para beber o daime e experimentar mirações12. Neste sentido, a trajetória internacional das religiões ayahuasqueiras assemelha-se à expansão do movimento espiritual de João de Deus (Rocha 2009, 2010, 2013a).
Os estudos de Alberto Groisman (2000, 2013) sobre o Santo Daime na Holanda ilustram a dinâmica que operam na glocalização de uma religião brasileira. Ele mostra como o humor e jovialidade ajudam aos participantes holandeses e brasileiros a negociar e cruzar fronteiras culturais, linguísticas e sociais, gerando espaços liminais de tradução e hibridização. Os aspectos lúdicos que Groisman observa envolvem a fusão da brincadeira, um estilo exclusivamente brasileiro de humor e diversão, com a lendária tolerância e a abertura à experimentação entre os holandeses. Esta fusão lúdica e transgressora é ainda mais crucial por causa da linha limítrofe que a ayahuasca ocupa como substância ilícita.
Conclusão
Como mostra esta visão panorâmica, o Brasil se tornou um importante ponto de convergência de uma nova cartografia policêntrica de produção religiosa global porque o campo religioso brasileiro diversificado, dinâmico, criativo e profundamente híbrido tem interagido com processos ligados à globalização, tais como imigração transnacional, inovações tecnológicas nas áreas da comunicação e o transporte; além do rápido crescimento das indústrias culturais associadas ao turismo, entretenimento, autoajuda e a construção da identidades - sejam elas religiosas, espirituais, raciais ou étnicas. Por meio de vetores de imigração transnacional, turismo e peregrinação espiritual, bem como de mediatização e missão, a "sociogênese pluralista e fusionista" (Siqueira 2003:151) que caracteriza o Brasil tem entrado na dialética de desterritorialização e reterritorialização que é fundamental nos processos de globalização. Por um lado, essa dialética implica em processos generalizados de glocalização e fertilização cruzada não só entre as diversas religiões, mas também entre a religião, o capitalismo de consumo e a mídia eletrônica, intensificando a inovação religiosa no Brasil e no exterior. Por outro lado, o desenraizamento das culturas e religiões que é parte da condição da pós-modernidade aumenta a necessidade de estabelecer ortodoxias e limites nítidos, bem como a nostalgia e o desejo de recuperar o significado, a pureza e a autenticidade. O Brasil, imaginado utopicamente como a nação do futuro e simultaneamente como o repositório da conexão da humanidade com suas origens e a natureza, está estrategicamente bem posicionado para agir nestes processos.
É ainda muito prematuro para se declarar que chegou finalmente a hora do Brasil se tornar o "país do futuro". Apesar de herdar uma economia em crescimento e o país com um status geopolítico bastante importante, Dilma Rousseff enfrenta os perigos de uma prolongada crise econômica global que pode afetar as exportações brasileiras, a inflação e a possibilidade de desindustrialização resultantes da relação do país com a China, país que se interessa principalmente pela extração de matérias-primas para apoiar seu desenvolvimento maciço. Como sabemos, o crescimento econômico dos últimos dois anos foi decepcionante e os brasileiros têm demonstrado sua insatisfação nas ruas de todo o país desde junho de 2013. O campo religioso brasileiro também está enfrentando a pressão da secularização, com muitos jovens e mulheres católicos abandonando a Igreja não só para se tornar pentecostais ou entrar nos novos movimentos religiosos, mas também para declarar-se como não praticantes de qualquer religião13. Os dados do último censo mostram um aumento de 70% no número de pessoas que marcaram a opção "sem religião" desde o censo de 1991. Atualmente, este grupo representa 8% da população (Castro & Duarte 2012). No entanto, dada a longa vitalidade polimórfica do campo religioso brasileiro, podemos assumir que o Brasil vai continuar a ocupar um lugar central no mapa emergente do sagrado ao lado de outros potências religiosas como a Nigéria, Gana, Índia, China e Coreia do Sul.
Jornais e revistas
Notas
Recebido em março de 2013
Aprovado em setembro de 2013
Cristina Rocha (c.rocha@uws.edu.au)
Doutora em Antropologia pela Universidade de Western Sydney (UWS), Austrália. Atualmente é "Future Fellow" do Australian Research Council, UWS e editora do Journal of Global Buddhism e da coleção "Religion in the Americas" da Editora Brill, na Holanda. Foi pesquisadora visitante do Max Planck Institute for Ethnic and Religious Diversity na Alemanha, em 2011. Suas áreas de pesquisa são: globalização, religião e migração, com um interesse particular em conexões transnacionais entre Austrália, Brasil e Japão.
Manuel Vásquez (manuelv@ufl.edu) Doutor em Ciências da Religião pela Universidade de Temple (Filadélfia, EUA). Atualmente é professor e chefe do Departamento de Religião e pesquisador do Centro de Estudos Latino-americanos na Universidade da Florida-Gainesville. Suas áreas de pesquisa são: religião e mudança social na América Latina, particularmente no Brasil, assim como migração transnacional e teorias da religião.
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Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
01 Ago 2014 -
Data do Fascículo
Jun 2014
Histórico
-
Recebido
Mar 2013 -
Aceito
Set 2013