Este número especial dos Cadernos Cedes presta homenagem ao professor e pesquisador Angel Pino Sirgado, filósofo, psicólogo e pensador da Educação. Angel Pino nasceu na Espanha, em 1933. Formou-se em Filosofia pela Faculdade de Filosofia do Seminário de Madrid. Veio para o Brasil em 1954 e estudou Teologia na Universidade Católica de São Paulo. Na época trabalhou junto à Juventude Estudantil Católica (JEC) e à Juventude Universitária Católica (JUC), tendo coordenado e organizado, em várias cidades, as primeiras comunidades eclesiais de base. Retornando à Europa formou-se em Psicologia pela Universidade Católica de Louvain (graduação, mestrado e doutorado). De 1971 a 1977 foi professor na Universidade de Trois Rivières em Quebec, Canadá. Logo a seguir foi contratado pela Universidade Estadual de Campinas, onde permaneceu até sua aposentadoria compulsória em 2003. Já aposentado, por um período de 10 anos, integrou a equipe docente para a implantação de um Programa de Mestrado na Universidade do Vale do Itajaí, SC. Posteriormente, ele passou a trabalhar na implantação do Programa de Mestrado em Chapecó, SC.
Como teórico, Pino tornou-se reconhecido por suas contribuições relacionadas à abordagem histórico-cultural, que ele começou a estudar na segunda metade da década de 1980, quando se juntou a colegas da Faculdade de Educação da Unicamp para compor, formalmente, o Grupo de Pesquisa Pensamento e Linguagem (GPPL). Desde então Pino trabalhou de forma incessante na busca de aprofundar essa abordagem, cujos princípios epistemológicos condiziam com seu compromisso ético e político, e produziu reflexões e expansões do pensamento de Vigotski, em consonância com os fundamentos do materialismo histórico-dialético.
Sua produção, dirigida para a interface da Psicologia com a Educação, foi marcada pela densidade e rigor teórico, assim como pela preocupação com a análise crítica da vida social concreta. Erudito, em suas elaborações trazia aportes de diferentes disciplinas, como a Semiótica, a Sociologia e a Estética, sem abrir mão de seu referencial maior.
Apaixonado pelo estudo do desenvolvimento humano ou, como ele expressava, da formação humana do homem, orientou suas teorizações para a relação entre natureza, cultura e história, tendo explorado proposições do ponto de vista tanto filogenético como ontogenético, com a constante intenção de explicitar pressupostos, diretrizes metodológicas e bases conceituais da perspectiva de investigação assumida. Nessa temática produziu textos que expunham uma argumentação cuidadosa, em tom preciso e, por vezes, com afirmações poéticas. Procurou refinar e estender as ideias de Vigotski sobre a investigação das funções psíquicas superiores e dos fatos do desenvolvimento, na linha de superar concepções incapazes "[...] de considerar esses fatos como fatos do desenvolvimento histórico, porque os julga unilateralmente como processos e formações naturais, confundindo o natural e o cultural, o natural e o histórico, o biológico e o social [...]". (VYGOTSKI, 1996VYGOTKI, L S. (1931). Historia del desarrollo de las funciones psíquicas superiores. Tomo III. Madri: Visor, 1996., p. 12)
Dessa perspectiva, Pino explorou temas amplos, como a natureza social do desenvolvimento humano; a mediação semiótica; os processos de significação; a afetividade; a criação imaginária. Dedicou atenção especial às condições de vida da infância; aos direitos da criança e do adolescente; à visão promissora de uma educação estética.
Em 2003 defendeu a tese de Livre Docência, intitulada As Marcas do humano: às origens da constituição cultural da criança na perspectiva de L. S. Vigotski, trabalho que visava buscar indícios da presença do humano na criança, ou indícios da gênese dos processos de imersão do bebê na cultura. Essa pesquisa, que envolveu a observação de Lucas (seu neto) no primeiro ano de vida, apresenta importantes contribuições relativas a procedimentos de construção e análise de dados, e contém elaborações teórico-conceituais que evidenciam a capacidade de Pino para lidar, de forma consistente, com proposições de autores de diferentes campos. Ao abordar o desenvolvimento cultural, Pino dava ênfase à função semiótica, tema a que dedicou discussões elaboradas. Segundo sua interpretação da abordagem histórico-cultural, a formação humana ocorre pela conversão das funções sociais em funções pessoais e implica necessariamente a significação. A inserção da criança no mundo da cultura envolve "[...] uma dupla mediação - do signo e do Outro, detentor da significação [...]". (PINO, 2005PINO, A. As marcas do humano - às origens da constituição cultural da criança na perspectiva de Lev S. Vigotski. São Paulo: Cortez Editora, 2005., p. 59)
Os artigos que compõem este Caderno são de autores que conviveram com Angel Pino como colegas, alunos ou orientandos. Os textos destacam algumas de suas contribuições teóricas e evidenciam a riqueza de seus escritos, que continuarão a inspirar o debate teórico e a provocar análises propositivas para mudanças sociais relativas à educação e à formação humana.
O leitor encontrará, nas páginas que seguem, menções à paixão do mestre, à sua incansável disposição para compartilhar ideias e para contar histórias, e encontrará, também, referências a um pensamento singular, forjado ao longo de uma trajetória que amalgama a experiência histórica individual e a coletiva.
- PINO, A. As marcas do humano - às origens da constituição cultural da criança na perspectiva de Lev S. Vigotski. São Paulo: Cortez Editora, 2005.
- VYGOTKI, L S. (1931). Historia del desarrollo de las funciones psíquicas superiores. Tomo III. Madri: Visor, 1996.
Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
Dez 2015