Open-access A “hostilidade para com a teoria” nos estudos do lazer produzidos no Brasil no século XXI

The “hostility to theory” in leisure studies produced in Brazil in the 21st century

La “hostilidad a lo teórico” en los estudios de ocio producidos en Brasil en el siglo XXI

RESUMO

Orientado pelo materialismo histórico-dialético, investigamos a “hostilidade para com a teoria” nos Estudos do Lazer (EL) no século XXI, em um estudo teórico que se vale da análise bibliográfica. Para isso, analisamos a produção de alguns dos mais influentes autores brasileiros do período e o renovado debate sobre a origem do lazer.

Palavras-chave:  Estudos do lazer; Século XXI; Modernidade; Teoria

ABSTRACT

Guided by historical-dialectical materialism, we investigate “hostility to theory” in leisure studies (le) in the 21st century, in a theoretical study that resorts to bibliographical analysis. to do so, we analyze the production of some of the most influential brazilian authors in the period and the reinvigorated debate on the origin of leisure.

Keywords:  Leisure studies; XXI century; Modernity; Theory

RESUMEM

Guiados por el materialismo histórico-dialéctico, investigamos la “hostilidad a lo teórico” en los Estudios de Ocio (EL) en el siglo XXI, en un estudio teórico que recurre al análisis bibliográfico. Para ello, analizamos la producción de algunos de los autores brasileños más influyentes del período y el renovado debate sobre el origen del ocio.

Palabras clave:  Estudios de ocio; Siglo XXI; Modernidad; Teoría

INTRODUÇÃO

A partir da constatação do crescimento quantitativo dos Estudos do Lazer (EL) no Brasil desde a década de 1990 (Peixoto, 2007), propomos uma problematização a respeito das características dessa produção no século XXI1. O ponto de partida para a reflexão é o fato de que parte dos levantamentos bibliométricos do período afirmam como limite para o desenvolvimento da produção do conhecimento nos EL a relativa escassez e superficialidade no diálogo com temas mais gerais das Ciências Humanas (Dias et al., 2017).

Paralelamente ao reconhecimento do pequeno, mas significativo desenvolvimento da crítica marxista do lazer nas últimas décadas, refletimos sobre parte da produção nos EL de alguns dos autores brasileiros mais influentes no século XXI (Dias et al., 2017). É nesse período que identificamos um duplo e convergente movimento: o revigorado debate sobre a origem do lazer e o recuo da teoria nos EL. Essa dinâmica traz aproximações com a noção de uma “hostilidade para com a teoria” (Eagleton, 2006), ao trazer como conteúdo fundamental uma crescente resistência contra as elaborações teóricas, sobretudo de inspiração marxista, ao mesmo tempo em que não aprofunda a teoria que justifica esse posicionamento.

O debate sobre o lazer como um fenômeno moderno e, sobretudo, a problematização sobre o entendimento de modernidade nesses casos, é bastante revelador. A busca incessante por atenuar o conflito entre capital e trabalho, que termina por adotar a evasão da realidade social como premissa ao negar os projetos de sociedade em disputa desde meados do século XIX, se mostra um divisor de águas no debate contemporâneo nos EL, como demonstra a equivocada contraposição entre as “sínteses generalizadoras” e as “particularidades concretas”.

Na contramão da antiontologia da ideologia decadente e das concepções e interpretações que se restringem ao fenomênico, esse artigo é uma defesa da dialética, da historicidade e da totalidade. Orientado pelo materialismo histórico-dialético como perspectiva teórico-metodológica, apresentamos um estudo teórico-bibliográfico que, para além da apropriação de princípios, categorias e conceitos, busca situar na concretude da luta de classes o debate contemporâneo.

É justamente por reconhecer a necessidade de provocar o debate teórico nos EL, numa conjuntura marcada pelo avanço da precarização – como demonstra a plataformização/uberização do trabalho –, que corrói o horizonte de um “tempo livre” e do lazer como direito social ao alcance dos trabalhadores no século XXI, que apresentamos essa contribuição.

OS ESTUDOS DO LAZER PRODUZIDOS NO PAÍS NO SÉCULO XXI

Desde a década de 1990 observamos o crescimento quantitativo dos EL no Brasil, tendência que justifica afirmar o início de um ciclo de publicações com características diferentes dos três ciclos anteriores2 (Peixoto, 2007). Marcado pela consolidação da democracia burguesa no país, acompanha a eleição de Fernando Henrique Cardoso para a presidência (1994), os ajustes neoliberais ditados pelo FMI e Banco Mundial e a dissolução dos limites para a expansão e livre circulação do capital, espaço para o financiamento dos empreendimentos da “grande indústria do lazer” e da chamada “explosão divertida” no país (Mascarenhas, 2005).

Para Peixoto (2007), conforme as primeiras gerações de pesquisadores formados na década de 1990 eram incorporadas ao ensino superior público, expandia o número de instituições com linhas e grupos de pesquisa associados ao lazer3 e os cursos de pós-graduação em nível Lato e Stricto Sensu. Posteriormente, as diretrizes da CAPES/CNPq para a produtividade em pesquisa aparecem como determinantes para a obtenção de recursos públicos, induzindo uma produção do conhecimento avaliada pela quantidade de trabalhos publicados.

No mesmo período, dois importantes eventos surgiram e/ou se consolidaram. O primeiro foi o Encontro Nacional de Recreação e Lazer (ENAREL), realizado desde 1989. O segundo, o Seminário O Lazer em Debate, realizado desde o ano 2000. A partir do ano de 2014 o Seminário foi substituído pelo Congresso Brasileiro de Estudos do Lazer (CBEL). Outro evento, os Ciclos de Debates Lazer e Motricidade, organizado pela DEL/FEF/UNICAMP contou apenas com três edições (1999, 2000, 2001).

Esse desenvolvimento estimulou o periodismo científico. A Revista Brasileira de Ciências do Esporte (RBCE), ainda na primeira metade da década de 1990, dedicou um número especial ao tema. No ano de 1998 foi organizada a primeira revista totalmente voltada ao lazer: a Licere. No ano de 2014 foi lançada a Revista Brasileira de Estudos do Lazer (RBEL), ligada à Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Lazer (ANPEL), entidade criada em 2013.

De acordo com Peixoto (2007), neste ciclo predominaram estudos sobre as relações entre lazer e trabalho, a preocupação com o entendimento da história das práticas, das políticas, da produção do conhecimento e a compreensão do mercado do lazer, sem que fosse abandonada a preocupação com os conteúdos culturais no contexto dos modismos e interesses dominantes. Dada a quantidade de pesquisadores e, sobretudo, a dispersão da produção em diferentes áreas, surgiram estudos dedicados a interpretar as características desse fluxo4.

Numa análise bibliométrica dos EL veiculados pela revista Licere na primeira década do século XXI é apontada uma “[...] relativa escassez ou mesmo superficialidade no diálogo com temas mais gerais das Ciências Humanas, o que pode condicionar negativamente o desenvolvimento desse campo de pesquisas especializado [...]” (Dias et al., 2017, p. 609). No entanto, o problema se revela bem mais profundo.

Refletindo esse contexto surgiram trabalhos de inspiração marxista que propuseram a crítica do lazer enquanto prática social, recuperando e aprofundando um debate iniciado ainda na década de 1980. O pequeno, porém significativo aumento da produção de pesquisas fundamentadas na tradição marxista refletiu tanto o acirramento das condições objetivas de sobrevivência dos trabalhadores no capitalismo, quanto a crítica das possibilidades do lazer nessa sociedade (Peixoto, 2007). Entretanto, o reconhecimento dessas contribuições, para além de suas contradições internas e avanços evidentes, guardam ainda um enorme potencial explicativo.

De outro modo, acompanhamos um “esforço de desconstrução” nos EL que mais desorienta do que possibilita a compreensão do objeto. Como sugere Terry Eagleton se referindo ao debate literário contemporâneo, identificamos uma espécie de “hostilidade para com a teoria”, portadora de um duplo significado: a) uma oposição às teorias de outras pessoas e b) um esquecimento da teoria que se tem (Eagleton, 2006, p. XII). Nos EL esse posicionamento aparece explicitamente:

Estudos de natureza mais teórica ou conceitual tendem a estar concentrados em analisar concepções e abordagens canonizadas por uma dada comunidade de pesquisadores, ao invés do diálogo com a apresentação de resultados empíricos mais recentes. [...] Embora interessante e até necessária em muitos aspectos, a ênfase sobre discussões teóricas talvez devesse, de agora em diante, ceder mais espaço para a apresentação dos resultados das pesquisas propriamente ditas, ao invés das circulares e por vezes monótonas discussões acerca de premissas ou pressupostos teóricos. (Dias et al., 2017, p. 614).

Vejamos a seguir alguns desdobramentos dessa “hostilidade para com a teoria” em parte dos pesquisadores mais influentes dos EL no Brasil. Sobretudo, destacamos as dúvidas sobre o vínculo entre a origem do lazer e a gênese do capitalismo, até então, ponto de partida para autores dos mais diversos matizes teóricos.

A “HOSTILIDADE PARA COM A TEORIA” NO DEBATE SOBRE A ORIGEM DO LAZER NO SÉCULO XXI

Gomes (2004) - nona autora mais citada na revista Licere durante a primeira década do século XXI (Dias et al., 2017) - identificou duas correntes antagônicas dedicadas ao problema da origem do lazer: a) autores que consideram a existência do lazer em sociedades mais antigas; b) autores que entendem o lazer como um fenômeno moderno, com origem nas sociedades urbano-industriais. Nesse quadro a autora se põe distante de ambos. Dada a complexidade para se precisar cronologicamente o surgimento do lazer, estaria justificada uma postura cautelosa. Se não é possível igualar manifestações e práticas culturais de períodos antigos da história com uma versão clássica do lazer moderno, tão pouco o lazer poderia ser interpretado como um fato exclusivo da modernidade, com data de nascimento no século XVIII, mesmo admitindo que a delimitação da jornada de trabalho marca a distinção entre tempo de trabalho e tempo livre.

Cabe observar que a preocupação com a validade transitória e histórica de um dado conhecimento está presente no trabalho da autora. O entendimento de que o processo histórico abrange a superação como possibilidade se mostra ao afirmar que “conhecer e considerar as peculiaridades [...] de outras realidades que compõe a nossa história pode fornecer expressivas contribuições para apreendermos o processo de constituição do lazer” (Gomes, 2004, p. 138). Embora Gomes não adote no texto a defesa de que o lazer sempre existiu, como demonstraremos adiante, suas observações animará os adeptos dessa interpretação.

Reis et al. (2009) identificam três referências teóricas que sintetizam o debate brasileiro sobre as origens do lazer: Victor Melo, Christianne Gomes e Fernando Mascarenhas. Mas será justamente em Gomes (2004) que os autores buscarão apoio para relativizar a “ocorrência histórica do lazer”.

Do primeiro e do último - Melo e Mascarenhas - são destacados aspectos que corroboram a interpretação de Gomes (2004), que os localizou na perspectiva do lazer como um fenômeno moderno. Mas é na afirmação feita por Gomes (2004) - para quem apontar precisamente quando o lazer surgiu é uma tarefa “complexa e arriscada” -, que Reis et al. (2009) apresentam seus aportes a partir da teoria configuracional de Norbert Elias. O epílogo, na palavra dos autores, é a “possibilidade de pensarmos o lazer como algo que não surge com o advento da modernidade” (Reis et al., 2009, p. 71). Remetendo aos autores, nessa matriz teórica “as modificações que decorrem de um processo social de longa duração não podem ser interpretadas como consequência de planos racionais e ações deliberadas de indivíduos ou grupos sociais específicos” (Reis et al., 2009, p. 69).

Pelas afirmações acima estão descartadas as ações de setores ou mesmo de classes organizadas e o embate entre projetos históricos antagônicos na configuração do lazer. Além disso, os autores sustentam que os teóricos configuracionais não assinalam o início desses processos por serem “sempre como algo contínuo e em constante modificação” (Reis et al., 2009, p. 70). Sendo o real um constante vir-a-ser, está descartada a possibilidade de uma teoria enquanto “reprodução ideal do movimento real do objeto pelo sujeito que pesquisa” (Netto, 2011, p. 21). Essa “impossibilidade” de conhecer o real tem como desdobramento político a inviabilidade de qualquer projeto de transformação social radical. Diante da “impossibilidade” de estabelecer marcos objetivos concretos, prevalecem parâmetros subjetivos que dão margem para “encontrar” o lazer em qualquer tempo ou espaço. Ao concluírem que o ingrediente fundamental das práticas de lazer é a excitação agradável, prazerosa, presente “em diversos tipos de atividades lúdicas, divertimentos, jogos e passatempos das mais variadas sociedades”, encontraremos o lazer onde houver humanidade.

Para Dias - terceiro autor em número de artigos publicados na revista Licere (Dias et al., 2017) -, o problema está num suposto antagonismo entre o “geral” e o “particular”:

Abandonar a pretensão de grandes sínteses generalizadoras, apontando, ao invés disso, para particularidades mais concretas, cotidianas [...] pode nos conduzir a análises capazes de revelar [...] imagens extremamente distantes das caricaturas estereotipadas que se cristalizaram em torno do universo do trabalho e do lazer. (Dias, 2009, p. 27).

A esse respeito encontramos ainda o conteúdo do livro Teorias do lazer (Pimentel, 2010). Nele estão reunidos seis capítulos escritos por pesquisadores experientes que sistematizaram as matrizes teóricas mais conhecidas (positivismo, fenomenologia, marxismo, pós-modernidade etc.) e seus aportes para o estudo do lazer. Ainda que se trate dos próprios pesquisadores expondo e defendendo suas concepções teóricas, parece correto afirmar que o espírito geral da dicotomia entre as “sínteses generalizadoras” e as “particularidades concretas” repercute no debate contemporâneo nos EL.

Cabem aqui duas breves observações a respeito. Primeiramente, identificamos nesse entendimento a presença daquilo que Lukács (2012, p. 195) apontou como uma “representação fetichizante-idealista da independência absoluta dos complexos singulares”, algo recorrente nas ciências históricas e sociais que partem de uma representação estreita e reificada do econômico, ignorando que este não é uma realidade puramente objetiva, indiferente à nossa existência.

A segunda se refere ao problema do cotidiano. Para Dias (2009), este é o espaço “das particularidades mais concretas”, mas como observa Lukács (2013), a ontologia da vida cotidiana pressupõe a influência recíproca entre a totalidade social e as decisões singulares. O completo antagonismo entre os dois pólos, no melhor dos casos, não vai além da aparência dos fenômenos.

Diferente das problematizações apresentadas por Gomes (2004) e Reis et al. (2009), que aventam a possibilidade do lazer ser anterior à modernidade, Dias (2009, p. 2) inicia seu argumento afirmando que não se trata de problematizar se o lazer é um fenômeno moderno, mas sim, “definir mais precisamente o que se entende por modernidade nesses casos ou em que acepção este conceito está sendo empregado”. O autor observa que a nova condição do trabalho sob a manufatura de grande escala é a principal referência com a qual e contra a qual se define o que é lazer, correspondendo à indústria o status de unidade de análise nos autores clássicos dos EL, ainda que existam proposições que a relacionem nem tanto ao industrialismo, mas muito mais ao capitalismo.

Seguindo esse argumento, Dias (2009) afirma que Marx - de modo similar a Durkheim, embora antes dele – identificou o homem moderno como um homem especializado. Remetendo a uma interpretação exclusivamente econômica da história em Marx, o autor lança mão de uma citação para ilustrar essa premissa. Reproduzimos a seguir o trecho tal como aparece no artigo:

A estrutura econômica da sociedade, o fundamento real sobre o qual se levanta um edifício jurídico e político, e ao qual respondem formas determinadas da consciência social. O modo de produção da vida material domina em geral o desenvolvimento da vida social, política e intelectual. Não é a consciência dos homens que determina sua existência, mas, ao contrário, é sua existência social que determina a sua consciência (Marx apudDias, 2009, p. 7)

O texto de Dias (2009) corrobora mais uma das tentativas de imputar a Marx algo que o conjunto de sua teoria social demonstra uma distância vertiginosa: o determinismo econômico. Não é a toa que, numa obra monumental como a produzida pelo alemão, a citação escolhida para acusá-lo de determinismo econômico corresponda a uma das raras vezes em que o autor faz uma analogia entre a construção de um edifício e a organização da sociedade, entre estrutura e superestrutura. Não foram poucos os detratores de Marx, ainda em vida e após sua morte, que insistiam em apontar um suposto determinismo econômico, particularmente n’A Ideologia Alemã e em Para a Crítica da Economia Política (Prefácio). No entanto, trata-se de uma interpretação que não se sustenta sequer a partir do próprio fragmento. Basta uma leitura atenta para observar que as relações sociais são condicionadas pelo modo de produção e não determinadas. Tanto é assim que, na sua afirmação sobre o modo de produção da vida material, o anunciado domínio sobre o desenvolvimento da vida social, política e intelectual alude a uma tendência, uma característica em geral e não absoluta.

Muito diferente do que Dias (2009, p. 7) afirma - “o modo de pensar dos homens ou qualquer outro aspecto da vida social que não a economia, não poderia ter supremacia explicativa” -, encontramos no autor alemão um arsenal teórico privilegiado para se pensar a sociedade burguesa e o próprio lazer. Podemos ir além: a teoria social de Marx – e aqui também inserimos a vasta obra daquele conjunto de autores reconhecidos como clássicos do marxismo (Engels, Lênin, Trotsky, Rosa Luxemburgo, Gramsci, Lukács entre outros) –, ainda que insuficiente, é incontornável se pretendemos compreender qualquer aspecto da sociedade burguesa. A crítica em torno da “ênfase sobre discussões teóricas” nos EL pressupõe, de algum modo, uma concepção de homem, ciência e projeto de sociedade que deve ser problematizada.

Como tentaremos demonstrar a seguir, o presente artigo se apoia na compreensão de que o projeto sociocultural da modernidade precisa ser tomado como um processo histórico que vai da gênese do capitalismo até os dias atuais, mas que carrega a especificidade de se dividir em duas vertentes a partir de 1848.

MODERNIDADE, IDEOLOGIA E A TENTATIVA DE ATENUAR O CONFLITO ENTRE CAPITAL E TRABALHO NOS EL

Como indica Mészáros (2014), o aprofundamento das contradições do mundo social e sua difusão pelo globo são acompanhados de perto por declarações de que tais contradições foram ou estão prestes a serem “superadas”. Desse modo, temos um conjunto interminável de construções ideológicas que promovem a mesma racionalização confortadora que, continuamente substituída, visa recuperar a credibilidade perdida por meio de um novo e dessocializado rótulo começado com “pós”. É por essa razão que modernidade e pós-modernidade acusam uma a outra de permanecerem dentro dos limites de uma “ideologia”.

Analisando as produções de Jürgen Habermas e Jean-François Lyotard a esse respeito, Mészáros (2014) afirma que parte desta controvérsia é mais imaginária do que real. Ambas evitam fazer suas proposições teóricas fundamentais baseadas no “mundo da atividade concreta” da ordem social historicamente dada. O núcleo ideológico deste problema está na atitude convergente negativa desses teóricos em relação ao potencial emancipador do trabalho: “[...] não há lugar para um agente de emancipação historicamente identificável, apesar do fato de que nenhuma das teorias abandonou explicitamente sua preocupação com a possibilidade da emancipação” (Mészáros, 2014, p. 101).

Nos EL a desconexão com a “atividade concreta” também comparece naquela problematização sobre a modernidade apresentada por Dias (2009). Para ilustrar esse entendimento segue uma longa citação do autor:

[...] a sociedade moderna é o resultado de um extenso e eclético conjunto de experiências sociais que se acumularam num período de longa duração e que podem ser subsumidos ao liberalismo no âmbito político, ao mecanicismo no âmbito filosófico, ao capitalismo no âmbito econômico, ao industrialismo no âmbito tecnológico e ao individualismo no âmbito ideológico.

Nesse sentido, não seria justo atribuir ao século XIX todos os créditos pela invenção da vida moderna. Acontecimentos ainda que inegavelmente importantes e em certo sentido até revolucionários não seriam capazes de tanto num espaço tão curto de tempo. [...] modernidade então não é exatamente um período histórico, mas muito mais um processo social que, de maneira mais remota, iniciou-se no século XVI e se estendeu até os dias de hoje através de muitas e intensas mudanças e rupturas. (Dias, 2009, pp. 14-15).

O sentido da categoria modernidade, tal como comparece nos debates sobre a origem do lazer neste século, evidencia a ideologia de atenuação anistórica do conflito entre capital e trabalho. Como destaca Mészáros (2014), as correntes definições de modernidade são construídas de modo a ofuscar as especificidades socioeconômicas, para que a formação histórica descrita como “sociedade moderna” nos vários discursos ideológicos sobre a modernidade adquira um caráter atemporal em direção ao futuro, em contraposição, acriticamente exagerada, ao passado mais ou menos distante. É dessa maneira que, de forma não dialética, o momento da descontinuidade e da ruptura é exagerado tendenciosamente até se tornar irreconhecível, à custa de algumas continuidades de importância vital.

Em outro estudo, Dias (2018) afirma que o desenvolvimento comercial do lazer no Brasil, uma “protoindustrialização da cultura” ou a existência de uma “cadeia produtiva da cultura”, é anterior a década de 1960. A proposta do autor com este trabalho é refletir sobre a mercantilização do lazer dentro de um marco temporal mais amplo, desde o século XVIII, se contrapondo às correntes “visões históricas de curto prazo”. Para o autor, a mercantilização das diversões, quando tomada como um dos seus principais aspectos, ganha o estatuto de explicação mais geral da emergência histórica do lazer no país. O contraponto evidente aqui é com as compreensões que partem daquilo que ele considera ser a “[...] virtual separação entre trabalho e não trabalho tão usualmente apontada como característica distintiva fundamental das formas modernas de ocupação do tempo livre” (Dias, 2018, p. 369). Desse modo, o motor para o desenvolvimento do lazer na modernidade se encerra na “subordinação das oportunidades de diversão a uma racionalidade econômica, orientado para a busca do lucro e consumida como forma de entretenimento por uma audiência ampliada através de pagamentos em dinheiro”. A afirmação do autor de que noções abstratas, “como o ‘lazer mercadoria’”, além de “esvaziadas de significado histórico” são também “redundantes”, têm como pressuposto a compreensão de que o lazer “sempre foi uma mercadoria”.

O autor parece desconsiderar que a generalização das relações mercantis só foi possível sob o domínio do capital, modo de produção fundado no trabalho abstrato, no qual os agentes econômicos se tornaram totalmente dependentes do mercado. Conforme Carcanholo (2011, p. 69), o desenvolvimento da mercadoria ocorreu na medida em que a sociedade mercantil se expandiu. Evidente que a mercadoria sob o capitalismo contemporâneo, por exemplo, é uma mercadoria que tende a ser mais desenvolvida do que aquela existente há cinquenta anos, mais ainda do que aquela sob a sociedade feudal. Mas esse desenvolvimento mercantil é ao mesmo tempo o desenvolvimento da contradição entre valor e valor de uso, no qual “o valor passa progressivamente de polo dominado pelo valor de uso, a polo dominante”, carregando implicações para todo o funcionamento da sociedade.

Conforme Mészáros (2014, p. 70), concepções dessa natureza admitem “a visão de ‘universalidades’ imaginárias e das correspondentes ‘soluções’ fictícias para problemas dolorosamente reais, que, na realidade, só poderiam ser resolvidos através do confronto concreto das principais classes da sociedade”.

De outro modo, compreendemos que o projeto sociocultural da modernidade carrega a especificidade de se dividir em duas vertentes a partir de 1848. Entre aproximadamente 1830 e 1848 as vertentes teórico-filosóficas progressistas dominantes da Ilustração são conduzidas a um impasse. Essas vertentes, em sua gênese vinculadas ao protagonismo revolucionário da burguesia, enfrentaram de maneira crítica e otimista a realidade social emergente. Para Netto (2014), o primeiro aspecto, a postura crítica, decorria dos próprios autores serem ideólogos intelectualmente autônomos de uma classe ascendente, vitoriosa e sem ameaças visíveis; o otimismo resultava do entendimento de que as nocivas sequelas do jovem capitalismo industrial correspondiam as dores do parto de uma nova era histórica.

Diante da insistência periódica das crises entre os anos de 1825-1830, o desenvolvimento organizativo do proletariado e a decorrente agudização das lutas de classes erodiram as condições daquele progressismo. A burguesia se projetou, desde então, como sujeito histórico conservador, esvaziando seu otimismo e, principalmente, sua criticidade. Com a crítica convertida em arma antiburguesa, a revolução de 1848 pôs fim definitivo ao ciclo progressista da burguesia e das possibilidades radicalizadas dos pensadores que expressavam a sua visão de mundo. A consolidação da dominação burguesa escancara o distanciamento entre os interesses dos proprietários dos modernos meios de produção fundamentais e os possuidores unicamente de sua força de trabalho. Desse modo, as jornadas de 1848 explicitam, “[...] em nível histórico-universal, a ruptura do bloco histórico que derruiu a ordem feudal [...]” (Netto, 2014, p. 6). A consciência social do antagonismo entre capital e trabalho possibilitou a “auto-percepção classista do proletariado”.

Diante da incompatibilidade entre o legado teórico-cultural emancipatório e a perspectiva de classe da burguesia emergiram dois caminhos antagônicos: a) os componentes emancipatórios foram criticamente reelaborados numa perspectiva de classe proletária (a teoria social de Marx e a relação de continuidade e de ruptura com suas “fontes”); b) o pensamento da ordem foi dividido entre um funcional, ainda que aparentemente “radical” anticapitalismo romântico5 (o irracionalismo) e um positivismo domesticado (prisioneiro de um racionalismo formal), em cujo berço nascem as ciências sociais.

No ano de 1938, Lukács redigiu o ensaio Marx e o Problema da Decadência Ideológica. Ao analisar o influxo do chamado pensamento decadente burguês sobre a vida social, Lukács (2010, p. 51) retoma do pensamento de Marx a afirmação de que, após 1848, a burguesia não deseja saber se um teorema é verdadeiro, mas se é útil ou prejudicial ao capital, cômodo ou incômodo. A investigação detida dá lugar à “[...] atividade de espadachins assalariados; em lugar de uma análise científica despida de preconceitos, a má consciência e a premeditação apologética”.

Lukács (2010, p. 56) se debruçou sobre importantes expressões do período decadente. Identificou que a economia burguesa se limita, cada vez mais, a uma mera reprodução dos fenômenos superficiais (imediatos): um “processo espontâneo da decadência científica” que “opera em estreito contato com a apologia consciente e venal da economia capitalista”. A sociologia vulgar configura uma ciência “especializada” e “fragmentada” que “liberta-se” da economia e da história (totalidade social) e elabora um pensamento que se reduz a traduzir o senso comum. Para o filósofo húngaro, a fixação na imediaticidade e a enorme especialização/fragmentação nas ciências sociais burguesas têm suas razões na divisão capitalista do trabalho, no modo e na direção de desenvolvimento das ciências sociais modernas, na qual a decadência ideológica burguesa opera tão intensa modificação que não se podem mais relacionar entre si, e o estudo de uma não serve mais para promover a compreensão da outra.

O combate à dialética, à historicidade e à totalidade são expressões do caráter antiontológico da ideologia decadente, com concepções e interpretações que se restringem ao fenômeno e desconsideram as suas conexões reais. Paralelamente a negação do materialismo e do idealismo, prospera em torno do irracionalismo a impossibilidade social e teórica de defesa da ordem social dominante. Essa “terceira via”, que pode ser compreendida como processo de degeneração da racionalidade moderna, com grande ênfase no determinismo social, vai tomar forma concreta com o fascismo. Sob o impulso da decadência ideológica no período do imperialismo, cada vez menos são consideradas as relações sociais e econômicas da sociedade, a realidade sócio-histórica como pressuposto à reflexão teórica e o caráter revolucionário do proletariado.

A representação científica do real e uma correspondente práxis ampla e eficaz demandam a mediação dialética entre os momentos constitutivos da realidade objetiva, aparência e essência. Quando o pensamento não supera o imediatismo e o espontaneísmo, não alcança a reprodução da essência por meio do pensamento, convertendo essa forma aparente em fetiche. Submetida ao espontaneísmo, a filosofia da decadência revela seu traço essencial, o de “ser um pensamento fetichizador” que “termina por converter em antinomias algumas contradições dialéticas e por elevar a fetiches coagulados momentos isolados de uma totalidade contraditória.” (Coutinho, 2010, p. 39). Assumida a positividade capitalista, se submete aos limites impostos pela economia de mercado que fetichiza as relações humanas (a) pela aceitação acrítica da alienação entre vida pública/vida privada, subjetividade individual e objetividade social e (b) pela aceitação acrítica da rígida especialização das atividades humanas sob a divisão capitalista do trabalho.

Como afirma Mészáros (2008, 2014), a ideologia é inseparável das sociedades de classe. Ela é a consciência prática inescapável destas sociedades, “reveladora” dos interesses sociais conflitantes ao longo da história, se expressando na diversidade do discurso ideológico e impactando os processos materiais. Em síntese, as mais importantes classes sociais se confrontam compondo cada qual a sua visão da ordem social correta num todo abrangente (Marx e Engels, 2007, p. 47). Decorre daí que a produção de ideias, as representações e a consciência estão entrelaçadas com a atividade material e com o intercâmbio material dos homens, portanto, correspondendo a uma emanação direta de seu comportamento material: “As ideias dominantes não são nada mais do que a expressão ideal das relações materiais dominantes, são as relações materiais dominantes apreendidas como ideias [...]”.

Justamente para não afirmar a autonomia de qualquer ideologia ou de suas formas de consciência correspondentes, é preciso remeter aos homens no processo de desenvolvimento da produção e dos intercâmbios materiais que atuam sobre o pensamento e de seus produtos. O que determina a natureza da ideologia é a busca por tornar consciente em termos práticos o conflito social fundamental (capital x trabalho), com vistas a resolvê-lo através da luta. Sendo assim, precisamos extrair suas “[...] implicações práticas de longo alcance na arte e na literatura, bem como na filosofia e na teoria social, independentemente de sua ancoragem sociopolítica em posições progressistas ou conservadoras.” (Mészáros, 2008, p. 10).

Vimos como o quadro categorial das estratégias ideológicas dominantes deve ser sustentável e “consistente” em seu próprio campo. Como autoimagens da ideologia dominante, a busca por uma explicação plausível, a partir da qual se possa projetar a estabilidade, não pode resultar em “verdadeiro reflexo do mundo social”, representação objetiva dos conflitos entre os principais agentes sociais. Pelo contrário, a tendência é a produção de um quadro categorial que atenue os conflitos existentes e eternize o estabelecido.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

No estudo tentamos apresentar o revigorado debate contemporâneo acerca da origem do lazer. Observamos que uma produção de conhecimento que adota a evasão da realidade social como premissa, com implícitas ou explícitas intencionalidades de conservação da ordem do capital, induz um recuo da teoria nos EL ao longo do século XXI. Por meio do relativismo e da crítica à modernidade, desconsideram os projetos de sociedade em disputa ao menos desde meados do século XIX.

Paralelamente, constatamos o desenvolvimento da crítica marxista do lazer. Vemos nas conquistas teóricas dos EL no país inspirados por essa tradição um contraponto importante. Como o desvelamento do lazer pressupõe sucessivas aproximações, num esforço necessariamente coletivo, o estímulo ao debate teórico se mostra imprescindível.

  • 1
    As reflexões apresentadas são parte dos resultados da tese intitulada Quando e onde termina o trabalho? Para a crítica do lazer no século XXI (Oliveira, 2022), sobretudo, o capítulo Notas teórico-metodológicas sobre lazer e totalidade.
  • 2
    Peixoto (2007) sugere a seguinte periodização dos EL brasileiros: 1891-1968, 1968-1979, 1979-1989 e 1990 aos dias atuais.
  • 3
    276 grupos de pesquisa cadastrados na Plataforma de Grupos de Pesquisa do CNPQ até 2020.
  • 4
    Mapeando estudos dessa natureza na revista Licere até 2018, listamos: A Revista Licere e a pauta científica do lazer no Brasil de 1998 a 2017: uma revisão integrativa, de Menezes, Costa, Santos, Tomasi e Melo (2018); Estudos do lazer em princípios do século XXI: panoramas e perspectivas, , de Dias, Flores e Lazzarotti Filho (2017); Licere: uma revista brasileira de lazer, de Isayama e Melo (2014); Lazer e meio ambiente na revista Licere, de Terezani, Bahia, Andrade, Rosa Barbosa e Marcellino (2013); A produção do conhecimento na área do lazer: uma análise sobre a revista Licere – atuação profissional, de Stoppa, Delgado, Capi e Marcellino (2013) e; Lazer, políticas públicas não governamentais e estudos conceituais na revista Licere, de Alves, Silva, Sarto e Marcellino (2012).
  • 5
    A propósito do anticapitalismo romântico, cabe mencionar a existência de uma interessante controvérsia a respeito das “afinidades eletivas” com parte dos marxistas, tal como tem defendido Löwy em diferentes obras (Querido, 2017).
  • FINANCIAMENTO
    O presente trabalho não contou com apoio financeiro de nenhuma natureza para sua realização.

REFERÊNCIAS

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    27 Nov 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    02 Ago 2023
  • Aceito
    13 Out 2023
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