RESUMO
Neste artigo, intentamos delimitar o espaço social ocupado pelos intelectuais midiáticos de direita que atuaram em favor do impeachment da ex-presidenta Dilma Rousseff entre 2015 e 2016. Consideramos as relações entabuladas por eles com os poderes político, acadêmico, econômico e midiático. Assim, buscamos dar inteligibilidade à organização interna de um âmbito amiúde desprezado pelas ciências sociais brasileiras.
PALAVRAS-CHAVE: intelectuais; mídia; impeachment; sociologia dos intelectuais; direita
ABSTRACT
In this paper, we intend to circumscribe the social space occupied by the right-wing mediatic intellectuals that supported the impeachment of former president Dilma Rousseff between 2015 and 2016. We consider the relations established between them and the political, academic, economic and mediatic powers. Therefore, we aim to make intelligible the internal organization of a field often neglected by the Brazilian social sciences.
KEY-WORDS: Intellectuals; Media; Impeachment; Sociology of Intellectuals; Right-Wing
1. PARA UMA SOCIOLOGIA DA DIREITA
Um fenômeno vem inquietando acadêmicos e pensadores ao redor do mundo: a chamada ascensão conservadora. Expressa politicamente por meio das vitórias eleitorais de representantes identificados à direita e à extrema direita, escora-se na imposição de receitas econômicas neoliberais articuladas, em termos culturais, com xenofobia, instigação de medos diversos, políticas repressivas e policialescas, perdas de direitos trabalhistas, nacionalismos de ocasião e conservadorismos morais diversos (Dardot; Laval, 2016). Em seu movimento característico de reprodução, esse novo espectro que ronda não só a Europa, mas o globo, dota-se de tentáculos intelectuais, dentre os quais os denominados think tanks (Carlotto, 2018), algumas instituições de ensino superior - especialmente as instituições privadas e departamentos específicos, como os de economia, no caso do Brasil - e os meios de comunicação - tanto os tradicionais quanto os primordialmente embasados nas redes sociais. O clima advindo dessa nova razão do mundo, que se serve sobretudo das crises econômicas cíclicas, é o da construção imaginária de inimigos que devem ser combatidos e/ou eliminados a todo custo (Hochschild, 2016). Nesse cenário, são erodidos os próprios pilares em que se embasam as democracias ocidentais, quais sejam, a tolerância para com os adversários políticos e a disputa de valores, canalizada pelos meios institucionais.
No Brasil, percebe-se que elementos centrais na imposição desse tipo de visão ainda foram pouco estudados. O interlúdio entre a eleição presidencial de 2014 e o processo de votação do impeachment da presidenta por ela consagrada, Dilma Rousseff, em 2016, evidencia o alto nível de polarização política no país em um contexto de crise. Diversos atores políticos se posicionaram a favor ou contra a deposição, tanto em veículos jornalísticos tradicionais quanto em páginas da internet, complementando (e legitimando) a atuação de movimentos sociais e demais cidadãos em manifestações de rua ou virtuais.2
Nesse meio-tempo, a produção de colunistas identificados à direita no espectro político,3 engajada contra os governos do Partido dos Trabalhadores (PT) e as figuras associadas ou próximas à esquerda, confluiu com a ocupação das ruas por grupos sem histórico de participação em movimentos sociais, quase todos identificados com o teor das mensagens propugnadas por esses colunistas (Tatagiba et al., 2015; Ortellado e Solano, 2015; Telles, 2015).4 A denominada “guinada à direita” no país passou então a instigar pesquisadores a traçar análises conjunturais, casos de Singer (2018) e Avritzer (2016), ou até mesmo propor explicações mais detidas a respeito de tal fenômeno, como o livro de Cruz et al. (2015) e os artigos de Chaloub e Perlatto (2015) e de Messenberg (2017). Ainda que tais estudos apontem para uma tentativa de sistematização das ideias defendidas por esses colunistas,5 no mais das vezes limitaram-se a tomar como objeto estruturante da análise tão somente seus discursos. Escapa-lhes, destarte, o essencial para a inteligibilidade das tomadas de posição dos agentes, qual seja, o escrutínio da organização interna e das propriedades sociais desse conjunto de colunistas identificados à direita. Âmbito que, aliás, embora amiúde ignorado pelas ciências sociais brasileiras (Fernandes; Messenberg, 2018), em muito contribui para a conformação do ideário político nacional, dada a relevância de cargos e prebendas detidas pelos intelectuais em voga, bem como os demais trunfos que conferem alta ressonância e/ou credibilidade a suas opiniões no sistema midiático e em meio a setores da sociedade civil, como empresariado, formuladores de política pública, terceiro setor etc.
Sem entrar na disputa ideológica e, assim, reverberar os lugares-comuns empregados na contenda simbólica daqueles que ocupam um ou outro lado do espectro político, por um lado, nem tomar os colunistas analisados como indivíduos singulares (Bourdieu, 2011, pp. 45-6), por outro, este artigo propõe um mapeamento analítico inicial das posições que compõem o espaço de tensões entre alguns dos principais formuladores ideológicos que atuaram em favor do impeachment. Por conseguinte, oferece-se aqui uma análise sociológica relacional das posições desses intelectuais e de suas intervenções (Bourdieu, 1996; Sapiro, 2015, p. 25). Partimos da sociologia dos intelectuais de matriz bourdieusiana para tentar compreender a forma pela qual aspectos e atributos sociais cristalizados em instituições determinadas, incorporados pelos agentes, podem vir a dirigir as representações do jogo estabelecido nas arenas política, econômica e midiática. Busca-se, assim, elaborar uma análise distinta das já empreendidas, dando o devido enfoque ao sistema objetivo de relações que enlaça as produções e tomadas de posições de importantes atores sociais.
Para tanto, selecionamos os personagens a ser analisados a partir destes critérios, cumulativos e diferentes dos adotados nos artigos mencionados: 1) ter defendido explicitamente o impeachment da presidenta Dilma Rousseff - focando no polo vitorioso da disputa aqui abordada; 2) ter atuado como colunistas em veículos de comunicação tradicionais, seja no presente seja no passado recente; 3) ter publicado livros focados em críticas à esquerda, ao PT e a seus seguidores, com propostas de salvação do país ou com a defesa de ideias conservadoras e de uma tomada de posição categórica à direita. Esses critérios permitem limitar o universo a um número razoável de investigados, qual seja, o de 24 indivíduos, entre ativistas, intelectuais midiáticos, formuladores de políticas e acadêmicos. Tal conjunto abrange nomes de variadas relevância e posição, desde os que se declaram abertamente como “de direita” até os refratários a tal caracterização - embora, em determinados momentos, contraponham-se ao que vislumbram como “esquerda”, “socialismo”, “comunismo” etc.6 A seleção foi realizada a partir de pesquisa prévia nos principais jornais, revistas e emissoras do país conjuntamente com o levantamento dos livros publicados nos últimos anos que atendessem aos princípios mencionados. Consideramos os principais veículos de comunicação nacional, tais quais Folha de S.Paulo, O Estado de S. Paulo, O Globo, A Gazeta do Povo, Veja, Época, IstoÉ, Jovem Pan, BandNews FM, CBN, Rede Globo, SBT, Record e Band. Há de se ressaltar, porém, que o conjunto não se pretendeu exaustivo, e sim sociologicamente representativo. Certamente outros recortes seriam válidos, e nomes tão ou mais relevantes que os presentes nesse universo estarão ausentes.
Cabe ainda frisar que o contencioso em torno de quem seriam os mais adequados para compor o conjunto - tanto pela definição do conceito de “intelectual” quanto do termo “direita” - remete, de certa maneira, a estratégias de distinção a que recorrem não apenas os próprios intelectuais, mas também suas clientelas. Conforme aponta Miceli, a definição de “intelectual” é um dos “móveis centrais que impulsionam a concorrência entre os diversos tipos de produtores em luta pela monopolização da autoridade de legislar em matéria cultural” (Miceli, 2001, p. 247). O incômodo gerado pela composição de um objeto de estudo com personagens dotados de diferentes níveis de prestígio e capital específico pode também dar à mostra a eficácia simbólica que essas estratégias de distinção exercem sobre alguns. Aceitar de antemão as definições que os intelectuais fazem de si próprios seria, como Miceli afirma:
lidar apenas com as representações que os intelectuais dominantes oferecem de si mesmos, logrando o tento de reduzir as relações que mantêm com seus patrocinadores e com seu público aos modelos de perfeição ética, estética e política, de que se valem no trabalho de administrar sua imagem oficial. (Miceli, 2001, p. 247)
Compõem o objeto de análise, por conseguinte, o doutor em economia Alexandre Schwartsman, o doutor em ciência política Bolívar Lamounier, o mestre em ciência política Bruno Garschagen, o doutor em geografia humana Demétrio Magnoli, o doutor em filosofia Denis Rosenfield, o escritor Diogo Mainardi, a jornalista Dora Kramer, o antropólogo Fernando Gabeira, o doutor em filosofia Fernando Schüler, o escritor Guilherme Fiuza, a jornalista Joice Hasselmann, o mestre em filosofia Leandro Narloch, o doutor em filosofia Luiz Felipe Pondé, o doutor em história social Marco Antonio Villa, o jornalista Merval Pereira, a jornalista Miriam Leitão, a doutora em economia Monica de Bolle, o doutor em estudos comparados sobre as Américas Murillo de Aragão, o escritor Olavo de Carvalho, a jornalista Rachel Sheherazade, o jornalista Reinaldo Azevedo, o economista Ricardo Amorim, o economista Rodrigo Constantino e o doutor em economia Samuel Pessôa (para a visualização dos vínculos profissionais mais relevantes desses articulistas, consultar a Tabela 1).
No intento de traçar o mapeamento inicial, foram coletados dados acerca da idade, da formação acadêmica e de possíveis mensuradores das relações que tais figuras estabelecem ou estabeleceram com os poderes político e econômico, com a universidade e com think tanks, além dos livros que publicaram, dos veículos de comunicação em que trabalharam e/ou trabalham e dos prêmios que receberam. Registramos tais informações a partir das descrições fornecidas por eles mesmos em currículos online - em plataformas como Lattes ou LinkedIn -, textos de apresentação de seus blogs, em suas páginas de redes sociais ou nos veículos em que escrevem. Na próxima seção, daremos operacionalidade estatística a tais atributos, bem como esboçaremos uma análise do espaço social conformado.
2. O ESPAÇO SOCIAL DOS COLUNISTAS “DE DIREITA”
Com base nos dados e informações levantados sobre o universo de colunistas analisado, empregamos o método da análise de correspondências múltiplas, a ACM (Duval, 2015, p. 218; Bertoncelo, 2019; Le Roux; Rouanet, 2010)7 e observamos três principais polos que se organizam por meio dos princípios e atributos arrolados a seguir: 1) o polo dos especialistas, formado pelos colunistas que detêm um volume maior e mais diferenciado de capital escolar e, consequentemente, menor volume de capital midiático; 2) o polo dos polemistas, que têm formação em economia, administração ou ciências humanas, mas não dispõem do título nem do prestígio dos doutores. Eles ostentam certo capital midiático, mas não equivalente ao dos jornalistas; 3) o polo dos jornalistas, constituído por aqueles que são graduados em jornalismo ou têm anos de experiência na profissão e contam com amplo reconhecimento do público e/ou dos pares.
Esperamos deixar claro por meio dessa forma de organização o modus operandi que envolve a divisão do trabalho intelectual nesse circuito, bem como as colaborações, as detrações, os embates etc. entre os diferentes atores. Vale ressaltar que a leitura dos gráficos de acm inscreve-se em uma interpretação ideal-típica (Duval, 2015, p. 230), de modo que o fato de uma figura se situar mais próxima de determinado polo não significa que ela não possa apresentar características de outro. Além disso, a inserção de dados que não foram aqui considerados pode deslocar determinados nomes de um polo a outro. Assim, o objetivo principal deste trabalho é demonstrar como esse espaço social se estrutura, e não vincular de maneira estanque um nome a um polo ou outro. Aliás, no gráfico 1, é possível perceber que entre os jornalistas e os polemistas há certa continuidade, dificultando a distinção entre os nomes que comporiam um ou outro grupo. Já os especialistas aparecem no gráfico em posições claramente opostas aos outros dois polos.
A ACM foi elaborada por meio do programa SPAD,8 tendo como variáveis ativas a ocupação de cargos políticos (cargopol+; cargopol-: neste caso, assim como nas outras variáveis dicotômicas, o símbolo “+” indica a posse de tal propriedade e o “-”, a ausência dela); a sociedade em agências de consultoria (consult+; consult-); o vínculo com alguma emissora de TV (TV+; TV-); a passagem por empresas que adotam o viés de direita como estratégia de negócio - Gazeta do Povo, Editora Record e Jovem Pan (VPOL+; VPOL-); a atuação como colunista dos jornais Folha de S.Paulo ou O Estado de S. Paulo (FolhaEst+; FolhaEst-); a presença constante ou o vínculo com o Grupo Globo (Globo+; Globo-); a experiência como docente de ensino superior (Prof+; Prof-); o volume de seguidores no Twitter e no Facebook (A; B; C; D; E - indo dos que têm mais seguidores aos que têm menos); o prestígio, com base nos prêmios recebidos (Premio+++: prêmios acadêmicos, literários ou jornalísticos concedidos pelos pares; Premio+: prêmios de audiência; Premio-: sem prêmios relevantes). As variáveis suplementares foram: a formação acadêmica (CienHum+++: doutorado em algum curso de ciências humanas; Eco+++: doutorado em economia; EcoCH: graduação ou, no máximo, mestrado em economia, administração ou algum curso de ciências humanas; Jor+: graduação em jornalismo; Semform: sem formação superior); a idade (40+; 50+; 60+; 70+ - progressivamente conforme a faixa etária em décadas); a participação em think tanks (Think+; Think-); a atuação em bancos, na indústria ou no mercado financeiro (banco+; banco-); a posse de canal no YouTube (Youtube+; Youtube-). Foram consideradas suplementares as variáveis de caráter explicativo (como a formação acadêmica e a idade), bem como as que contribuíram menos para os eixos 1 e 2. Desse modo, seguimos um dos requisitos estatísticos da acm, qual seja, o de aplicar um número de categorias ativas inferior ao número de indivíduos.
Os critérios estatísticos comumente considerados nesse tipo de análise foram respeitados, na medida em que 97,9% de variância total foi explicada pelos primeiros dois eixos (89,2% no eixo 1 e 8,7% no eixo 2, de acordo com a taxa modificada de Benzécri), o que nos faculta desconsiderar a pertinência explicativa de um possível terceiro eixo. O eixo 1 tem como variáveis ativas mais importantes a ocupação ou não de cargos políticos, o volume de seguidores nas redes sociais, o exercício ou não da atividade de consultoria e a presença ou não em veículos polemistas, ao passo que o eixo 2 se organiza prioritariamente por meio das variáveis recebimento de prêmios (assim como tipo de premiação), volume de seguidores nas redes sociais, presença constante ou trabalho no Grupo Globo e coluna ou programa em canais de TV. A diferença entre a origem dos atributos das coordenadas das categorias ativas e a das suplementares esteve sempre acima de 0,5, o que expressa haver correlação interna satisfatória entre os atributos propostos.
Tendo como principal variável explicativa a formação acadêmica, a análise elaborada aponta para algumas relações de oposição. A mais forte delas diz respeito ao eixo horizontal, que opõe os colunistas com doutorado aos demais (Gráficos 1 e 2). Os primeiros, posicionados nos quadrantes à esquerda, são também os que ocuparam ou ocupam cargos políticos de importância; possuem agências de consultoria; são ou foram professores universitários; detêm prestígio e prêmios acadêmicos ou literários; organizam-se em think tanks; escrevem principalmente nos jornais Folha de S.Paulo ou O Estado de S. Paulo; e são frequentemente convidados dos programas e debates da Globo News. Em contrapartida, têm atuação pouco expressiva nas redes sociais e em empresas de comunicação e edição de livros que adotaram a polêmica como estratégia de negócio.
Por outro lado, os ocupantes dos quadrantes à direita do gráfico se caracterizam pela baixa ligação com cargos políticos, agências de consultoria e docência. Têm forte atuação na TV, no rádio ou em canais do YouTube; contam com mais seguidores nas redes sociais; e passaram com frequência pelos meios aqui mencionados como polêmicos.
Há ainda outra oposição, explícita no eixo vertical, entre os ocupantes dos quadrantes à direita: acima, os que atuam em canais de TV, receberam prêmios a partir da votação do público e ostentam um número elevado de seguidores no Facebook e Twitter; abaixo, os que não contam com exposição regular em emissora de televisão, têm menos seguidores nas redes sociais e também menos prêmios concedidos pela audiência. Além disso, acima, estão alguns dos jornalistas vinculados de algum modo ao Grupo Globo, ao passo que, abaixo, posicionam-se aqueles que se valem mais dos veículos polêmicos e dos canais no YouTube.9 Nos próximos subitens deste artigo, aprofundaremos a análise dos três polos desse conjunto: os especialistas versus os jornalistas versus os polemistas.
2.1. OS ESPECIALISTAS
A principal variável explicativa das oposições estabelecidas na nuvem de categorias (Gráfico 2) e, consequentemente, na nuvem de indivíduos (Gráfico 1) é a formação acadêmica. De um lado, prevalecem os doutores em economia ou em ciências humanas - como ciência política, sociologia, filosofia e história social - e, portanto, portadores de um capital específico para a abordagem de temas sociais; de outro, predominam os jornalistas, com formação mais generalista e sem um diploma que denote sua especialização em determinado assunto - ou ainda aqueles que não têm formação de nível superior, como os “escritores”. Se os primeiros legitimam suas opiniões com base nos diplomas - muitos deles auferidos em instituições de renome internacional - e nos cargos de importância que ocuparam em decorrência desses títulos, os segundos necessitam, em alguma medida, das explicações ofertadas pelos especialistas para basear suas análises e dependem mais diretamente do sucesso imediato de público, o que os vincula a um polo deslegitimado perante os pares (Bourdieu, 1996, pp. 162-8). Há ainda aqueles que concluíram apenas a graduação - ou, em menor número, o mestrado - em administração, economia ou cursos de ciências humanas. Por não ter a trajetória acadêmica dos primeiros - e, portanto, não deter a mesma legitimidade nos meios especializados -, situam-se mais próximo à posição da formação de jornalista, como é possível perceber pela análise do eixo horizontal dos gráficos.
A posse de um diploma de doutorado diferencia também os colunistas que ocupam ou já ocuparam a posição de professor e/ou pesquisador em instituições públicas - com destaque para Universidade de São Paulo (USP), Universidade de Brasília (UnB), Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop) e Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) - ou privadas - especialmente, a Pontifícia Universidade Católica (PUC), o Insper e a Fundação Getúlio Vargas (FGV) - dos que nunca passaram pelo exercício da docência. Tal experiência configura-se, para determinada parcela do público e dos pares, como um “selo de qualidade” ou distinção, ainda que tais professores até expressem certo antiacademicismo, com críticas frequentes às universidades - especialmente as públicas -, caracterizadas como espaços de “ideologização do ensino”, imposição do “politicamente correto” e má gestão. Tais críticas, ao fim, servem justamente para, de modo contraditório, legitimar a imagem que buscam cultivar, a de “intelectuais de direita”, um difícil equilíbrio em corda bamba que carece de racionalizações mil (Bourdieu, 1996, pp. 312-6). Atuam seja como “libertos”, isto é, professores que não se deixaram cooptar ideologicamente em um ambiente carregado de esquerdismo; seja como “autoridades”, ou pessoas que conhecem bem o que estão falando, pois convivem ou conviveram com os alvos de detração, tendo-se “redimido”, por vezes, das hostes de esquerda de que tomaram parte em suas juventudes; seja, ainda, como “especialistas neutros”, pretensamente distantes dos “engajados”, pois mais preocupados em ofertar análises puramente técnicas que posições político-ideológicas.10 Percebe-se que a repetida referência ao outro espectro ideológico é constitutiva da autoimagem cultivada por esses intelectuais, em embate e disputa direta de visões de mundo com seus pares consagrados, geralmente postados para além de suas fronteiras políticas.
Além da docência, o título de doutor suscitou que parte desses colunistas ocupasse relevantes cargos políticos e econômicos; em outras palavras, esses atores originam-se do polo economicamente dominante do espaço social, retraduzindo em meio a suas palavras e ações o desdobramento de tal pertencimento (Bourdieu, 2011). Alexandre Schwartsman foi diretor de assuntos internacionais do Banco Central durante o governo Lula, tendo sido indicado por Henrique Meirelles e Antonio Palocci; Bolívar Lamounier foi membro da comissão provisória de Estudos Constitucionais (conhecida como Comissão Afonso Arinos) nomeada pela Presidência da República, em 1985, para preparar o anteprojeto da Constituição; Denis Rosenfield presta consultorias informais a Michel Temer11 e foi cotado para ocupar o cargo de ministro da Defesa em sua gestão;12 Fernando Schüler foi secretário de estado da Justiça e do Desenvolvimento Social do Rio Grande do Sul, de 2007 a 2010; Murillo de Aragão é conselheiro do Tribunal de Contas da União (TCU), do Conselho de Comunicação Social do Congresso Nacional e do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social da Presidência da República; Monica de Bolle foi economista do Fundo Monetário Internacional (FMI), de 2000 a 2005; e Samuel Pessôa participou da formulação do programa econômico para a campanha à Presidência da República de Aécio Neves (PSDB), em 2014. Como é possível perceber no Gráfico 2, a experiência em cargos políticos é uma das variáveis mais atuantes nas oposições estabelecidas no eixo horizontal.
Seguindo a mesma lógica, os nomes citados acima mais Ricardo Amorim são/foram sócios e/ou diretores de agências de consultoria econômica e política. Fica evidente, assim, que a atuação de tais figuras não se restringe ao convencimento de seguidores na internet ou à disputa voraz por leitores de jornais e revistas, mas se produz principalmente sobre formuladores de políticas públicas, empresários e outros jornalistas - ou seja, em maior ou menor grau, tomadores de decisão e influenciadores. Ademais, a posse do diploma de economia e de administração facultou amiúde o emprego em altos cargos em bancos ou no mercado financeiro.
Essas figuras costumam, ainda, orbitar think tanks, em especial o Instituto Millenium.13 Fundado em 2005 pela economista Patrícia Carlos de Andrade, apresenta-se como uma entidade sem fins lucrativos e sem vinculação político-partidária, guiada, segundo seu site, pela garantia de “uma sociedade livre, com liberdade individual, direito de propriedade, economia de mercado, democracia representativa, Estado de Direito e limites institucionais à ação do governo”.14 Mantido por empresas de comunicação como Editora Abril, Grupo Estado, Grupo Globo e Grupo RBS - além de outros importantes conglomerados empresariais, como Gerdau -, o instituto promove palestras em redações jornalísticas e em salas de aula, visando a consolidar sua presença nesses locais.
Segundo Rocha, os think tanks podem ser caracterizados como “instituições permanentes de pesquisa e análise de políticas públicas que atuam a partir da sociedade civil, procurando informar e influenciar tanto instâncias governamentais como a opinião pública no que tange à adoção de determinadas políticas públicas” (Rocha, 2015, p. 262). Assim, os think tanks atuariam como uma ponte entre a academia e a esfera pública, traduzindo os resultados de pesquisas especializadas para uma linguagem acessível a seu público-alvo: os agentes responsáveis pela formulação e pela implementação de políticas públicas.
Fazem parte do Millenium Alexandre Schwartsman, Bolívar Lamounier, Denis Rosenfield, Fernando Schüler, Monica de Bolle, Murillo de Aragão, Samuel Pessôa, Demétrio Magnoli, Guilherme Fiuza, Merval Pereira, Ricardo Amorim, Bruno Garschagen, Leandro Narloch e Rodrigo Constantino. Há ainda que se ressaltar a atuação de Constantino, Fiuza e Rosenfield como cofundadores. Os especialistas e convidados do Instituto Millenium têm atuação recorrente em grandes veículos de comunicação - como os principais jornais do país, O Estado de S. Paulo, Folha de S.Paulo e O Globo, além de programas televisivos, como os telejornais e programas da Globo News. Nesses espaços, aparecem seja como fontes experts das notícias, seja como colunistas, seja, ainda, como palestrantes em eventos de formação e atualização dos profissionais da imprensa.
Um dos pontos em que esses think tanks têm se concentrado é em influenciar reformas no sistema de ensino brasileiro. No site de outra organização, o Instituto Liberal - que tem Rodrigo Constantino como presidente -, há artigos com títulos como “Empreendedorismo muda mais vidas do que a educação”, “Uma solução para salvar o país: o empreendedorismo” e “Educação para o empreendedorismo”, todos voltados à crítica ao que chamam de “estatismo” e ao elogio à educação como formação para o mercado, supostamente “neutra”, meritocrática e focada nos resultados. Esse discurso é sustentado, ainda, por instituições do terceiro setor voltadas à educação, como a Fundação Estudar, o Movimento Empresa Júnior etc. Um dos principais influenciadores de políticas públicas dentre os colunistas selecionados para esta pesquisa, Samuel Pessôa, publicou, em junho de 2014, um artigo intitulado “Universidade paga”, no qual defende que o ensino universitário não deve ser gratuito. Segundo ele, “além dos impactos orçamentários positivos, a instituição de cobrança de mensalidade para os cursos universitários públicos teria efeito importante sobre a eficiência das universidades. O tempo médio de graduação seria reduzido e a vinculação do aluno ao curso aumentaria”.15
2.2. OS POLEMISTAS
Em fevereiro de 2017, o livro O mínimo que você precisa saber para não ser um idiota - uma compilação de artigos escritos por Olavo de Carvalho e organizados por Felipe Moura Brasil - atingiu a expressiva marca de 100 mil exemplares vendidos. A obra compõe o conjunto de títulos lançados nos últimos anos pela editora Record dedicado à defesa de ideais considerados conservadores e/ou liberais, assim como à oposição ao - e até à depreciação do - Partido dos Trabalhadores (PT), à “esquerda”, ao “socialismo”, ao “marxismo” e a seus seguidores, chamados de “petralhas”, “esquerdistas”, “patrulha do politicamente correto”, “bolivarianos” etc.
O investimento da Record em obras com esse conteúdo se deve à entrada do jornalista Carlos Andreazza como editor de não ficção (desde 2012) e de literatura brasileira (desde 2013).16 Carioca, graduado em jornalismo pela PUC-Rio, Andreazza é neto de Mário David Andreazza, militar, político e militante antigetulista que foi ministro dos Transportes nos governos Costa e Silva e Médici. Ao assumir o cargo na Record, Andreazza apostou em uma fatia do mercado editorial até então pouco atendida, segundo ele: o público “de direita”. Em notícia do jornal O Globo, Sergio Machado, então presidente do Grupo Record, afirmou:
- Dá para identificar uma certa guinada para a direita - confessa, aos risos. - A teoria que a Luciana [Villas Bôas, ex-diretora editorial] defendia era que a esquerda lê mais do que a direita. E, para mim, isso sempre fez um certo sentido. O Andreazza apostou no contrário e, para nossa surpresa, deu certo. Ficou provado que a direita também lê. Ele percebeu um crescimento do pensamento liberal. Essa diversidade é boa para a democracia.17
Pela editora, além da compilação de Olavo de Carvalho, foram publicados os seguintes livros de colunistas que compõem o objeto de análise deste estudo: Pare de acreditar no governo: por que os brasileiros não confiam nos políticos e amam o Estado, de Bruno Garschagen; Não é a mamãe: para entender a era Dilma e Que horas ela vai? O diário da agonia de Dilma, de Guilherme Fiuza; Liberdade versus igualdade: o mundo em desordem e Liberdade versus igualdade: o Leviatã desafiado, de Demétrio Magnoli; A tapas e pontapés, Contra o Brasil, Lula é minha anta, entre outros, de Diogo Mainardi; Década perdida: 10 anos de PT no poder, de Marco Antonio Villa; Mensalão: o dia a dia do mais importante julgamento da história política do Brasil e O lulismo no poder, de Merval Pereira; Saga brasileira: a longa luta de um povo por sua moeda, de Miriam Leitão; O país dos petralhas i, O país dos petralhas ii e Máximas de um país mínimo, de Reinaldo Azevedo. Com títulos sugestivos, os livros constroem um balanço histórico extremamente negativo e depreciativo dos anos do PT no governo federal, assim como traçam soluções políticas, econômicas e morais para o país.
A virada à direita como tática de negócio não se restringe ao mercado editorial. Em 2015, a revista Piauí publicou uma reportagem intitulada “A nova sinfonia paulistana: como a rádio Jovem Pan se reinventou ao dar voz para o sentimento antipetista em São Paulo”,18 na qual explicitou a estratégia do empresário Antonio Augusto Amaral de Carvalho Filho, conhecido como Tutinha, neto do fundador da emissora, para alavancar sua audiência. Percebendo a existência de uma fatia do mercado que não era plenamente contemplada, a dos antipetistas, o empresário investiu na contratação de nomes como Rachel Sheherazade - autora do livro O Brasil tem cura, publicado pela Mundo Cristão - e Marco Antonio Villa para a apresentação do Jornal da Manhã, e Reinaldo Azevedo para o programa Pingos nos Is. Em 2017, Azevedo foi substituído por Joice Hasselmann - autora de Sérgio Moro: a história do homem por trás da operação que mudou o Brasil, pela Universo dos Livros - e Felipe Moura Brasil. Em 2018, Hasselmann também saiu da emissora de rádio.
A Gazeta do Povo, um dos principais periódicos do Paraná, também passou por uma reorganização institucional recente. Segundo informações do Portal Comunique-se, a empresa se reestruturou por 36 meses e investiu 23 milhões de reais no processo, adotando o conceito mobile first, que prioriza o jornalismo digital, chegando a encerrar sua versão impressa diária ao fim de maio de 2017. Dentre os investimentos, contratou articulistas como Ricardo Amorim, Rodrigo Constantino, Leandro Narloch, Demétrio Magnoli e Bruno Garschagen.
Essas estratégias de negócio, em alguma medida, expressam as transformações suscitadas no jornalismo e no mercado editorial pelo desenvolvimento da internet. As redes promoveram uma reorganização do mercado de bens simbólicos, levando tanto redações de jornais e revistas como emissoras de TV e rádio a modificar suas rotinas de produção noticiosa, suas relações com as fontes e o público, seus procedimentos de coleta, checagem e publicação de conteúdo, suas estratégias de negócio e sustentação econômica. Certamente, essas transformações não ocorreram de forma homogênea e definitiva em todos os veículos de comunicação, mas suas consequências podem ser notadas, em maior ou menor medida, em diferentes empresas e experiências individuais.
Ao optar por tais estratégias de negócio, essas instituições deram primazia ao capital midiático do qual os colunistas são portadores, rebaixando, assim, ao segundo plano o prestígio alcançado na área de atuação puramente jornalística ou em instâncias intelectualmente legítimas (Bourdieu, 1997; Champagne, 1996); importam-se muito mais com o número de seguidores que seus contratados alavancam na internet. Se, por um lado, os jornalistas que ocupam o espaço opinativo dos veículos de comunicação sempre dependeram, em alguma medida, de um público leitor fiel, por outro, é possível perceber atualmente uma relação ainda mais visceral com seu alvo, muitas vezes até mesmo sem a intermediação de uma empresa de comunicação.19 O número de seguidores nas páginas do Facebook e do Twitter torna-se um ativo importante, seja na obtenção de novos empregos, na venda de seus blogs e páginas pessoais aos anunciantes, nas disputas com os pares, seja ainda na sedução de novos seguidores. A audiência nas redes se torna, em alguma medida, a garantia econômica - pois, no caso de demissão, ela tende a se transferir para os blogs pessoais “independentes” e, no caso de novas contratações, serve como moeda de troca. Ainda assim, tal dependência evidencia a instabilidade profissional que esses colunistas enfrentam, na medida em que precisam a todo tempo trabalhar para a manutenção de alto número de seguidores.
Dessa forma, a relação com esses veículos polemistas também é uma variável que opõe os principais polos de análise (Gráfico 1 e 2) e abre um flanco para visualizarmos com nitidez uma inflexão interna bem delimitada nesse espectro de intelectuais. De um lado, há os “doutos” ou especialistas, com sua polidez e neutralidade no tratamento das questões públicas, bem como no modo de se apresentarem ao público: terno e gravata, quando homens, tailleur, quando mulheres, modo sistemático e equilibrado de exposição, voz entoada sem espasmos ou berros, escrita em conformidade com a norma culta, visando ao “debate”, geralmente centrado em questões pretensamente neutras de economia, filosofia moral e história. De outro, os “polemistas”, muito mais devotados à divulgação, à radicalização da linguagem por meio da dotação de apodos, da redução a clichês e da participação em “barracos” e xingamentos, ao extremismo, ao didatismo, ao simplismo, à demonstração de virilidade, à busca de reconhecimento por um grande público, à detração pura e simples de seus inimigos e à vulgarização política, o que certamente corresponde às expectativas de seu público-alvo.20
2.3. OS JORNALISTAS
Seguindo uma lógica similar ao vínculo a empresas voltadas ao abrigo da polêmica, a investida nas redes sociais, sobretudo no Twitter e no Facebook, também constitui elemento diferenciador do conjunto de colunistas. Dentre os intelectuais midiáticos abordados, apenas Samuel Pessôa e Denis Rosenfield não possuem contas no Twitter - ambos professores de universidades, no primeiro caso, da FGV-RJ, e no segundo, da UFRGS.
Segundo consulta efetuada nas redes sociais desses intelectuais no dia 19 de abril de 2018, a apresentadora do SBT Brasil Rachel Sheherazade ostentava o maior número de seguidores no Facebook (mais de 2,2 milhões) e o segundo maior no Twitter (mais de 1,4 milhão). No microblog, quem detinha o maior número de seguidores era Miriam Leitão, com mais de 2,7 milhões. Ainda nessa rede social, Diogo Mainardi e Ricardo Amorim também têm mais de 1 milhão de seguidores.
Já no Facebook, depois da fanpage de Sheherazade, os mais seguidos são: Joice Hasselmann, quase empatada (mais de 2,2 milhões de pessoas); Ricardo Amorim (mais de 690 mil); Olavo de Carvalho (mais de 580 mil); Marco Antonio Villa (mais de 470 mil); Reinaldo Azevedo (mais de 310 mil); Luiz Felipe Pondé (mais de 240 mil); e Fernando Gabeira (mais de 160 mil). Esses números evidenciam, em alguma medida, não apenas o alcance das mensagens propaladas por esses colunistas, como a diferença entre eles no que concerne à divisão do trabalho intelectual.
A despeito da relevância das redes sociais como meio de comunicação direto entre colunistas e leitores e/ou espectadores, esses números nos mostram também como a televisão e o rádio ainda são centrais na formação de audiência. Dos mais seguidos no Twitter e no Facebook, a maior parte atua em programas de rádio e TV.21 Acima de tudo, o que se percebe atualmente é que esses canais vão se retroalimentando, de modo que as audiências obtidas nos veículos de comunicação garantem uma maior repercussão na internet, enquanto a manutenção de altos números de seguidores nas redes sociais atrai o interesse das empresas de mídia.
Associada às crises financeiras e às mudanças contemporâneas no mercado editorial, a rotatividade nos quadros de colunistas dos veículos impressos torna-se cada vez maior. Depois de se consolidarem em órgãos de imprensa e serem dispensados deles, esses colunistas tendem a migrar para blogs e outros espaços da internet, nos quais se tornam mais independentes de uma cultura organizacional; em contrapartida, acabam mais atrelados a seu público e, em alguma medida, mais dependentes da polêmica e do extremismo como formas estratégicas de marketing - seja para os seguidores seja para os concorrentes. Apesar de, por um lado, tais colunistas exaltarem essa independência, por outro, ainda valorizam o vínculo empregatício com grandes veículos de comunicação.
A tensão entre a busca por uma suposta independência e a garantia do vínculo empregatício perpassa a trajetória de muitos deles. De maneira geral, esses jornalistas - em especial os não consagrados - lidam constantemente com as oscilações do mercado de trabalho. Essa situação, porém, não afeta de maneira tão direta - ou, ao menos, não da mesma maneira - jornalistas consagrados, como Miriam Leitão. Ela é a jornalista mais premiada do Brasil, ao lado da repórter Eliane Brum, segundo o Portal dos Jornalistas.22 De acordo com as informações do site, somam-se na trajetória de Miriam Leitão 31 prêmios - destes, treze do Portal Comunique-se, nove do Mulher Imprensa, um do Clube dos Correspondentes de Imprensa Estrangeira (ACIE) e um Personalidade da Comunicação. Ela já recebeu também o Maria Moors Cabot (2005), da Columbia Journalism School, o mais antigo prêmio internacional de jornalismo. Além disso, conquistou, em 2012, o Prêmio Jabuti de não ficção; em 2013, o Prêmio Esso de Informação Científica; e, em 2012, o Prêmio Vladimir Herzog, na categoria Reportagem de TV. O volume de premiações pode ser considerado um dado objetivo e um indício significativo do prestígio que esses colunistas detêm diante de seus pares.
Estão em condição análoga os jornalistas Merval Pereira, Dora Kramer e Fernando Gabeira. No ranking elaborado pelo Portal dos Jornalistas, +Premiados Jornalistas da História, de 2017, com mais de 8 mil profissionais, Merval Pereira ocupa o 117-º lugar. Em 2009, ele recebeu o Maria Moors Cabot e, em 1979, o Prêmio Esso, além de fazer parte da Academia Brasileira de Letras. Dora Kramer, na 271-ª posição nesse ranking, ficou em 3-º lugar no Troféu Mulher Imprensa, de 2014. Outros nomes que aparecem na lista são os de Joice Hasselmann, em 2.354-º, e Diogo Mainardi, em 7.239-º. Já o jornalista Guilherme Fiuza se destaca na área de cinema: conquistou o Grande Prêmio do Cinema Brasileiro, na categoria Melhor Roteiro Adaptado, em 2009, e foi indicado ao Emmy Internacional, na categoria Melhor Série Dramática, em 2013, com a minissérie O brado retumbante, da qual foi coautor.
Enquanto alguns jornalistas se consagram por colegas e organizações ligadas à profissão, outros são notabilizados pelos telespectadores ou seguidores da internet. Se, em alguns campos, o sucesso de público se opõe ao prestígio perante os pares (Bourdieu, 1996), no jornalismo - marcado pela heteronomia - a aclamação pelo público pode, em alguns casos e até certa medida, contribuir para a legitimação dos profissionais diante de seus colegas. Miriam Leitão e Dora Kramer, por exemplo, são premiadas nos dois sentidos. Já Joice Hasselmann, Rachel Sheherazade e Ricardo Amorim se destacam especialmente nas premiações advindas da votação do público. Em 2017, Joice ganhou o prêmio de principal influenciadora digital na categoria Economia, Política e Atualidades, pelos votos técnico e popular. Rachel Sheherazade foi eleita melhor apresentadora de telejornal pelos votos dados via internet para o Troféu Imprensa do SBT. E Ricardo Amorim recebeu o prêmio de maior influenciador do LinkedIn, além de ter sido escolhido como um dos mais admirados da Imprensa de Economia, Negócios e Finanças.
Os nomes que se situam no quadrante superior direito do Gráfico 1 destacam-se também por, em sua maioria, trabalhar no Grupo Globo. Além dos experts com presença garantida nos programas e debates da Globo News, Miriam Leitão, Fernando Gabeira, Alexandre Schwartsman, Monica de Bolle e Merval Pereira atuam como comentaristas da cbn. Outro programa de encontro é o Manhattan Connection, apresentado por Lucas Mendes, Caio Blinder, Pedro Andrade, Ricardo Amorim e Diogo Mainardi. Nesse último programa, Fernando Gabeira já foi entrevistado. No braço impresso do Grupo Globo estão presentes os colunistas Miriam Leitão, Merval Pereira, Demétrio Magnoli, Fernando Gabeira, Denis Rosenfield e Murillo de Aragão, no jornal O Globo, e Fernando Schüler e Guilherme Fiuza, na revista Época. Premidos pela organização institucional, os personagens que ocupam esse polo tendem a censurar o polemismo puro e simples na medida em que seus patrões e o campo jornalístico permitem, extravasando quanto mais inexperientes e outsiders forem na empresa jornalística ou à medida que conquistam a condição de “radical” consentido, controlado e aceito pela instituição. Já os mais assentados tendem a demonstrar certo equilíbrio e distanciamento nas análises, aproximando-se muitas vezes dos especialistas tanto no afã de legitimar suas posições como para confirmar intelectualmente seus vereditos.
3. OS ADVERSÁRIOS CÚMPLICES
A análise apressada da conjuntura política brasileira, bem como da atuação dos atores referidos contra o PT e a esquerda e a favor da destituição de Dilma Rousseff, fez saltar aos olhos dos acadêmicos e do público em geral a abordagem de apenas uma parte desse conjunto de colunistas, qual seja, a mais polêmica e barulhenta, portanto, a socialmente mais evidente. Desse modo, oculta-se uma série de figuras que compõem a rede de relações e os intercâmbios que ocorrem entre essas posições e que dão inteligibilidade a esse subcampo como um todo. Os polemistas atuam na ponta de lança do processo, transformando diagnósticos econômicos e políticos pretensamente especializados em clichês e lugares-comuns que passam a ser repetidos em forma de artilharia a atingir inimigos irreconciliáveis nas redes sociais. Os jornalistas, em especial os mais prestigiados, ocupam uma posição intermediária, falando para públicos específicos - principalmente, assinantes de jornais, revistas e canais a cabo - e negando qualquer proximidade com os polemistas.23 Por fim, no polo mais intelectual desse sistema de relações, estão aqueles que, detendo posições mais elevadas de poder - por atuarem diretamente na formulação de planos e estratégias políticas e econômicas -, agem no intuito de influenciar formuladores políticos e outros jornalistas.
Como é possível notar nos gráficos apresentados, o espaço social que esses colunistas ocupam se estrutura a partir do volume e do tipo de capital que tais figuras detêm - especialmente a partir da oposição capital acadêmico versus capital midiático. Do lado esquerdo do Gráfico 1, estão situados os colunistas que trilharam uma carreira para além dos veículos midiáticos, tanto em universidades quanto em agências de consultoria, bancos e cargos políticos de escol; do lado direito, localizam-se aqueles cujas carreiras se atrelam à atuação midiática. Essa distinção pode ser compreendida também pela divisão entre aqueles cuja formação foi mais prolongada - com doutorado - e aqueles sem formação especializada, com o diploma de jornalista ou apenas graduação em economia, administração ou ciências humanas, conforme pode ser verificado na Tabela 1. Os primeiros, em sua maioria, atuam pouco nas redes sociais ou mesmo estão ausentes delas, ao passo que os segundos ostentam números elevados de seguidores em suas páginas ou perfis.
Tais distinções sociais engendram posicionamentos divergentes, os quais configuram diferentes modos de expressão de uma “direita” - tanto ideológica como performaticamente. Não temos espaço aqui para aprofundar a divisão social do trabalho nas fileiras pensantes identificadas à direita. No entanto, sublinhamos que, no polo mais intelectualizado, os agentes defendem que seus posicionamentos constituem uma análise técnica, neutra, embora empreguem adjetivações morais; no polo polemista, valem-se de posturas mais agressivas, ainda que levantem alguns argumentos. No discurso destes últimos, é mais comum observar o desprezo por questões relacionadas aos direitos humanos e a ênfase em políticas de segurança pública; já os outros se ocupam predominantemente com a defesa do Estado mínimo e de valores como meritocracia. A defesa de ideias, de um lado, ligadas aos princípios denominados neoliberais e, de outro, associadas a um conservadorismo moral foi, aliás, observada por Messenberg (2017). Isso não significa, porém, que as agências em torno de tais questões ou as formas de seu exercício sejam excludentes.
Ademais, essas distinções não eliminam o fator que os enlaça: o antipetismo renitente (Messenberg, 2017, p. 634). A repetição de lugares-comuns demonstra quanto o discurso intelectual midiático se recicla com diferentes aparências e em variados espaços. Certamente, a forma de oposição ao PT não é homogênea entre esses colunistas. Por um lado, percebe-se que alguns deles sugerem processos de autocrítica e renovação da esquerda, em geral, e do PT, em particular, assim como outros toleram, em alguma medida, a figura do contraditório, aceitando, por exemplo, que o PT teve acertos - como Miriam Leitão considerou24 - e que “há gente decente no PT, capaz de revigorar a legenda” - como afirmou Dora Kramer.25 Por outro, os mais polemistas veem o PT como espécie de mal maior, que deveria, portanto, ser eliminado em suas mais diferentes formas de expressão.26
A despeito dessa diferença de tomada de posição, o discurso dos primeiros embasa e, muitas vezes, legitima a posição dos segundos. As ideias de que o governo Dilma foi o pior da história; de que o PT é um antro de roubalheira e corrupção; de que o partido, Lula e Dilma seriam autoritários, antidemocráticos, mentirosos e arrogantes; de que os eleitores e simpatizantes do PT seriam ingênuos, manipulados e ignorantes ou cúmplices e criminosos perpassam os discursos dos intelectuais mais prestigiados do grupo e, em alguma medida, reforçam as ideias dos mais extremistas. Assim, esses intelectuais estudados conquistam corações e mentes entre o conjunto de leitores, espectadores e seguidores, bem como empreendem investidas no campo do poder, seja na política, na economia ou no judiciário.
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1
O título faz referência ao artigo em que Pierucci (1989) denominava os direitistas da época como os que “moram do outro lado da cidade”, ou seja, longe da zona central paulistana, repleta de aparelhos culturais, ou mesmo da Universidade de São Paulo (USP), conforme sua análise deixava clara. Salientamos a possível mudança ocorrida nesse ínterim, com o título-homenagem.
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2
A polarização política se expressou também na forma de se referir ao processo de deposição da presidenta Dilma Rousseff, pois o polo contrário ao impeachment nomeou-o como “golpe”, muitas vezes acrescido das qualificações “midiático”, “parlamentar” e “jurídico”. Ver, por exemplo: Luis Felipe Miguel, “Golpe”, disponível em: <https://jornalggn.com.br/noticia/golpe-por-luis-felipe-miguel>; <https://jornalggn.com.br/tag/blogs/golpe-juridico-midiatico>. Acesso em 06/12/2018. Já aqueles que se manifestaram a favor da destituição da presidenta se empenharam em defender que não se tratava de um golpe. Ver: Bolívar Lamounier, “Lula e Dilma, uma farsa em cinco atos”, disponível em: <https://opiniao.estadao.com.br/noticias/geral,lula-e-dilma--uma-farsa-em-cinco-atos,10000049737>. Acesso em 06/12/2018.
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3
Adotamos neste artigo um sentido relacional dos termos “direita” e “esquerda”. Nesse sentido, não nos interessa tomar parte na infindável e costumeira discussão sobre conceitos substancialistas de esquerda e direita. Consideramos tais categorias agregadoras de polos em disputa de um campo de força, englobando diferentes correntes de pensamento e grupos — como conservadores, neoliberais, anarquistas, socialistas, comunistas etc. Desse modo, não nos referimos a um conjunto homogêneo, mas às posições relacionais que vão desde um extremo até o centro, variando de acordo com o referencial tomado, construído a posteriori à pesquisa. Conforme Bourdieu (2012, p. 439), “as técnicas modernas de análises de correspondências [múltiplas] são muito úteis para estudar ao mesmo tempo esses espaços ideológicos, vagos e frouxos, e no entanto nem um pouco indeterminados, e também os grupos correspondentes”. É justamente o que propomos neste artigo. Para um inventário das diferentes formas de construir o conceito de direita, ver Morrei (2015). Para discussões tradicionais sobre o assunto, ver Messenberg (2017, pp. 622-3) e a definição clássica de Bobbio (1995).
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4
A ocupação das ruas por movimentos identificados como à direita do espectro político remonta em alguma medida às manifestações de 2013 no Brasil. Os protestos inicialmente organizados pelo Movimento Passe Livre contra o aumento das tarifas de transporte público se transformaram em grandes manifestações com demandas, teor ideológico e composição diversos, a ponto de o fenômeno se tornar alvo de disputas discursivas acerca de seu significado. Naquele momento, surgiu, por exemplo, o Movimento Brasil Livre (MBL), autodefinido como de direita.
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5
Messenberg (2017) analisou os discursos proferidos por agentes associados à direita, como movimentos sociais (MBL, Vem Pra Rua e Revoltados Online), líderes desses movimentos (Kim Kataguiri, Fernando Holiday, Rogério Chequer, Marcello Reis e Beatriz Kicis), jornalistas (Olavo de Carvalho, Reinaldo Azevedo, Rachel Sheherazade, Felipe Moura Brasil e Rodrigo Constantino) e políticos com mandato (Jair Bolsonaro e Marco Feliciano). A partir da sistematização do que chamou de “ideias-força”, a autora propôs três principais campos semânticos que organizam o conjunto desses discursos: o antipetismo, o conservadorismo moral e os princípios neoliberais, sendo o primeiro priorizado por esses agentes.
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6
Além da referência constante à esquerda, esses colunistas também recorrem a artigos em jornais e revistas para estabelecer oposições a nomes identificados àquele polo do espectro político. Para citar um exemplo, há os debates entre o economista Samuel Pessôa e o filósofo Ruy Fausto e a detração do economista Alexandre Schwartsman contra Laura Carvalho. Ver: Samuel Pessôa, “A armadilha em que a esquerda se meteu”, Piauí, n. 123, dez. 2016, disponível em: <https://piaui.folha.uol.com.br/materia/armadilha-em-que-esquerda-se-meteu>; idem, “Utopia e pragmatismo”, Piauí, n. 126, mar. 2017, disponível em: <https://piaui.folha.uol.com.br/materia/utopia-e-pragmatismo>; Ruy Fausto, “Ainda a esquerda”, Piauí, n. 125, fev. 2017, disponível em: <https://piaui.folha.uol.com.br/materia/ainda-a-esquerda>; Alexandre Schwartsman, “Quando a conclusão precede a análise, a lógica é sempre sacrificada”, Folha de S.Paulo, 19/6/2017, disponível em: <www1.folha.uol.com.br/colunas/alexandreschwartsman/2017/07/1902219-quando-a-conclusao-precede-a-analise-a-logica-e-sempre-sacrificada.shtml>. Acesso em 06/12/2018.
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7
A ACM é um método de análise fatorial, utilizado para a construção de “zonas teóricas”. Muito utilizado por Bourdieu, em livros como Homo academicus, A distinção, La Noblesse d’État, esse tipo de estatística se relaciona com a teoria dos campos e possibilita “‘representações estenográficas’ de regiões do ‘campo social’ (A distinção) ou ‘microcosmos’” (Duval, 2015, p. 218). Como Bertoncelo afirma: “Uma das principais vantagens dessa técnica está na minimização dos riscos de uma leitura substancialista da relação entre uma dada prática e uma dada categoria social […]. Em vez disso, e por permitir reconstruir indutivamente as principais divisões que estruturam o espaço social e o espaço simbólico, essa abordagem é mais adequada a uma leitura relacional (por meio da observação das proximidades ou distâncias relativas das modalidades no espaço de correspondências) do sentido e do valor, sempre mutáveis porque disputados, das propriedades e das práticas dos agentes” (Bertoncelo, 2019, p. 236). Para uma explicação detalhada da técnica, ver Le Roux e Rouanet (2010).
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8
Coheris SPAD é um programa largamente empregado na sociologia para a análise de correspondências múltiplas. Os dados empregados na análise foram coletados até maio de 2018, sendo possível que tenham sofrido variações desde então, sem, no entanto, trazer prejuízos para a argumentação geral.
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9
Há que se ressaltar novamente que a acm trabalha por meio de relações. Sendo assim, uma figura como Joice Hasselmann — a despeito de não trabalhar no Grupo Globo nem em outro canal de TV, valendo-se atualmente apenas de veículos polêmicos e canais no YouTube para sua sobrevivência, o que certamente a auxiliou a se eleger deputada federal em 2018 — localiza-se no eixo de cima, dada a determinação do seu número de seguidores ao estabelecimento de sua distância em relação aos demais colunistas. Além disso, Joice Hasselmann já atuou em veículos da grande mídia, como SBT, e na revista Veja.
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10
Tais posturas podem ser claramente conferidas nos excertos de alguns artigos publicados por esses colunistas doutores, como em Luiz Felipe Pondé, “Algoritmos e idiotas corretos”, Folha de S.Paulo, 26/3/2018, disponível em: <www1.folha.uol.com.br/colunas/luizfelipeponde/2018/03/algoritmos-e-idiotas-corretos.shtml>, acesso em 27/4/2018; Marco Antonio Villa, <www.facebook.com/villamarcoantonio/videos/1326325700734513>, acesso em 27/4/2018; Bolívar Lamounier, “Parece loucura, mas tem método”, O Estado de S. Paulo, 16/7/2016, disponível em: <http://opiniao.estadao.com.br/noticias/geral,parece-loucura-mas-tem-metodo,10000063209>, acesso em 27/4/2018; Fernando Schüler, “A universidade e o espírito de partido”, Folha de S.Paulo, 7/3/2018, disponível em: <www1.folha.uol.com.br/colunas/fernando-schuler/2018/03/a-universidade-e-o-espirito-de-partido.shtml>, acesso em 27/4/2018.
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11
Ver: <www1.folha.uol.com.br/poder/2018/04/temer-escala-consultor-pessoal-para-ter-linha-direta-com-cupula-militar.shtml>. Acesso em 26/4/2018.
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13
Segundo o 2016 Global Go To Think Tank Index Report, o Instituto Millenium está entre os cinquenta principais think tanks da América Latina (34º lugar). Esse ranking é elaborado pelo Think Tanks and Civil Societies Program da Universidade da Pensilvânia, cuja proposta, segundo o site do programa, é estudar o papel dos think tanks nos governos e na sociedade civil de diferentes países, fortalecendo a rede de instituições e ampliando a conexão entre o conteúdo produzido por elas e as políticas públicas implementadas nesses países. Assim, esse ranking ao mesmo tempo confere certo prestígio às instituições perante a rede de think tanks e contribui para a própria formação dessa rede.
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14
Cf. site oficial do Instituto em: <www.institutomillenium.org.br/institucional/quem-somos>. Acesso em 20/6/2017.
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15
Os artigos citados encontram-se disponíveis nos seguintes links: <www.institutoliberal.org.br/blog/empreendedorismo-muda-vidas-mais-que-educacao>; <www.institutoliberal.org.br/blog/uma-solucao-para-salvar-o-pais-o-empreendedorismo>; <www.institutoliberal.org.br/blog/educacao-para-o-empreendedorismo>; <www1.folha.uol.com.br/colunas/samuelpessoa/2014/06/1478158-universidade-paga.shtml>. Acesso em 10/5/2018.
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16
Cf. reportagem de Mateus Campos, “Editor de nomes conservadores, Carlos Andreazza se firma como voz dissonante do mercado de livros”, O Globo, Rio de Janeiro, 31/7/2015, disponível em: <https://oglobo.globo.com/cultura/livros/editor-de-nomes-conservadores-carlos-andreazza-se-firma-como-voz-dissonante-do-mercado-de-livros-17021179#ixzz4kvpH3GUJ>. Acesso em 24/6/2017.
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17
Idem.
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18
Julia Duailibi, “A nova sinfonia paulistana: como a rádio Jovem Pan se reinventou ao dar voz para o sentimento antipetista em São Paulo”, Piauí, n. 106, jul. 2015.
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19
Esse novo empreendedorismo midiático, aliás, já atraiu antigos nomes de peso de redações glamorosas, como Diogo Mainardi — que foi colunista da revista Veja e tornou-se responsável pelo site O Antagonista — e Joice Hasselmann, entre outros
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20
Há inúmeros exemplos de discussões grosseiras entre essas figuras. Algumas célebres são as que envolvem Reinaldo Azevedo, Rodrigo Constantino, Olavo de Carvalho e Joice Hasselmann. Geralmente eles se insultam uns aos outros de forma extremamente agressiva e disputam quem é mais conhecido e seguido pelo grande público, quem é mais consistentemente de direita, quem é mais liberal, quem é mais conservador etc. Disponíveis em: <www.youtube.com/watch?v=teCUtnKpk3s>, acesso em 20/6/2017; <www.youtube.com/watch?v=0SMtivjsUzg>, acesso em 20/6/2017; <https://youtu.be/i8_U5GGekYo>, acesso em 14/5/2018; <www.gazetadopovo.com.br/rodrigo-constantino/artigos/olavo-de-carvalho-mente-meu-respeito-uma-vez-mais-nao-passa-de-um-embusteiro>, acesso em 14/5/2018.
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21
Miriam Leitão é comentarista do Bom Dia, Brasil, da Rede Globo, e da Rádio CBN, além de comandar um programa de entrevistas na Globo News. Rachel Sheherazade é apresentadora do SBT Brasil, principal telejornal do sbt. Ricardo Amorim e Diogo Mainardi participam do Manhattan Connection, da Globo News. Fernando Gabeira comanda um programa especial na Globo News. Marco Antonio Villa e Luiz Felipe Pondé são comentaristas do Jornal da Cultura, da tv Cultura. Além disso, Villa apresenta um programa na Jovem Pan, por onde Reinaldo Azevedo e Joice Hasselmann também já passaram.
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22
Informações disponíveis em: <http://maispremiados.com.br/eliane-brum-e-miriam-leitao-entram-2017-como-as-premiadas-da-historia>. Acesso em 20/6/2017.
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23
Em artigo publicado em 3 de novembro de 2013, intitulado “A miséria do debate”, Miriam Leitão fez referências indiretas a Reinaldo Azevedo e Rodrigo Constantino, depois de ambos terem publicado críticas a ela. No artigo, chamou-os de “direita hidrófoba”. Ver <https://blogs.oglobo.globo.com/miriam-leitao/post/miseria-do-debate-513932.html>. Acesso em 20/6/2017.
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24
Ver Miriam Leitão, “PT e suas fases”, disponível em: <https://blogs.oglobo.globo.com/miriam-leitao/post/PT-e-suas-fases.html>. Acesso em 20/6/2017.
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25
Ver Dora Kramer, “Cena de cinema”, O Estado de S. Paulo, 28/8/2016, disponível em: <https://politica.estadao.com.br/noticias/geral,cena-de-cinema,10000072474>. Acesso em 20/6/2017.
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26
Ver Bruno Garschagen, “O necessário processo de despetização”, Gazeta do Povo, 15/5/2016, disponível em: <www.gazetadopovo.com.br/opiniao/colunistas/bruno-garschagen/o-necessario-processo-de-despetizacao-adn13q3hbfxhpikqv5jcnqlhi>, acesso em 20/6/2017; Olavo de Carvalho, Facebook, 2/12/2014, disponível em: <www.facebook.com/carvalho.olavo/posts/411842038967876:0>, acesso em 20/6/2017.
Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
06 Maio 2019 -
Data do Fascículo
Jan-Apr 2019
Histórico
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Recebido
29 Maio 2018 -
Aceito
30 Nov 2018