RESUMO
A partir de um balanço da gênese da categoria setor informal, ressaltamos a importância do paralelismo entre raça e classe para as análises sobre a estrutura de ocupações. Posteriormente, examinamos a situação dos trabalhadores negros no mercado de trabalho brasileiro entre 1982 e 2022, tanto em ocupações informais como em ocupações formais de baixa remuneração, dentre as quais destacamos os entregadores de aplicativo como expressão da racialidade do processo de informalização.
PALAVRAS-CHAVE: classe; raça; emprego informal; informalização
ABSTRACT
Based on an overview of the genesis of the category informal sector, we highlight the importance of the parallelism between race and class for the analysis of the structure of occupations. Afterwards, we examined the situation of black workers in the Brazilian labour market between 1982 and 2022, both in informal occupations and in low-paid formal occupations, among which we highlighted app delivery workers as an expression of the racialityof the informalization process.
KEYWORDS: class; race; informal work; informalization
INTRODUÇÃO
No Brasil, as análises sobre o mercado de trabalho dentro do campo das ciências econômicas sempre negligenciaram o racismo como um fator organizativo da estrutura de ocupações. Na maioria das vezes, o exame não avança para além do reconhecimento de desigualdades raciais e da mera descrição de algumas variáveis selecionadas. Sobretudo quando os critérios de análise se restringem à microeconomia, como fazem Cláudio M. Castro (1973) e Gustavo Fernandes (2012),1 esvazia-se o caráter disciplinar do racismo não só na configuração do mercado de trabalho, mas também na de toda a estrutura de classes sociais. Segundo Michel Foucault (2005), a reprodução do biopoder exige um discurso científico e um conjunto de instituições que lhe deem sustentação. Nesse sentido, a produção e divulgação de determinados conhecimentos por instituições prestigiadas legitimam as regras que disciplinam a conduta social em sentido favorável ou contrário à mudança social. Como no Brasil a maior parte das análises sobre o mercado de trabalho não incorpora a fundo o racismo como estrutura estabilizadora das desigualdades, as estatísticas de emprego e renda parecem apenas revelar uma mera desigualdade entre grupos raciais, escondendo os seus mecanismos sociais, culturais e políticos de perpetuação. Perde-se de vista a gravidade do assunto, que aqui abordaremos como um sistema complexo de proscrição da população negra que perpetua o que Florestan Fernandes (2007; 2008a; 2008b) denominava segregação racial. É urgente que as investigações científicas sobre as questões sociais incorporem o racismo como um problema estrutural e dinâmico da perpetuação do passado no presente das relações de trabalho e poder, como observam Fernandes e Almeida (2018). Isto é, conhecidas essas estruturas, é preciso se antecipar a elas e proteger as populações particularmente vulneráveis.
Embora o racismo seja amplamente reconhecido no Brasil, política e cientificamente, ele não foi incorporado em sua profundidade nos estudos sobre o mundo do trabalho, o que revela os obstáculos para se avançar no combate à segregação social no país - que é herdeiro de um dos sistemas de escravidão mercantil mais longevos da história da humanidade. De maneira semelhante, Tressie Cottom (2020) chama a atenção para o fato de que o racismo também é abordado de maneira “esporádica” na academia dos Estados Unidos. Superar essa inibição é fundamental para se compreender como o paralelismo entre raça e classe permeia os processos econômicos e estabiliza uma estrutura de poder profundamente racializada.2
Essa negligência sempre esteve presente nas publicações de instituições brasileiras e agências internacionais, como a Organização Internacional do Trabalho (OIT), que se dedicam a compreender as relações de produção capitalista de economias subdesenvolvidas3 (Portugal Jr., 2012, cap. 4). Até a década de 1970, a OIT parece ter sido incapaz de compreender o peso e, até certo ponto, a particularidade das relações sociais de produção de economias subdesenvolvidas, que não necessariamente convergiam com as relações de assalariamento do setor formal das economias capitalistas centrais. Essa dificuldade ficou patente nos seus estudos sobre o desemprego disfarçado4 (Benanav, 2021), cujos desdobramentos levaram à criação da categoria emprego informal.
Embora tenha se tornado de uso corrente e se consolidado nas estatísticas oficiais em praticamente todo o mundo, essa categoria sempre conviveu com críticas às suas limitações (Barbosa, 2011). Nos últimos vinte anos, essas críticas se intensificaram em consequência das mudanças na produção de valor e gestão do trabalho (Benanav, 2021, p. 25), cujos exemplos mais recentes são a uberização e a plataformização, como destaca Ludmila Abílio (2020b; Abílio; Amorim; Grohmann, 2021). Todavia, mesmo esses trabalhos não apresentam uma preocupação mais profunda nem um método de avaliação sobre a questão racial e os seus mecanismos de reprodução, não oferecendo, portanto, subsídios a diferentes formas de atuação política e social com o intuito de enfrentar a racialização do emprego informal no Brasil.
Mesmo que as dificuldades de se apreender teórica e empiricamente o emprego informal e a necessidade de se devotar atenção especial aos trabalhadores negros tenham sido reconhecidas, os esforços para tanto ainda são insuficientes. Nesse sentido, nosso objetivo é oferecer instrumentos analíticos para o combate à informalidade, à informalização e à segregação racial no mercado de trabalho brasileiro. Destacamos que o processo de informalização corresponde ao que Ludmila Abílio (2020b) denomina uma mudança estrutural em processos que não apenas redefinem as relações sociais de produção como suscitam “uma crescente perda de formas estáveis, reguladas ou contratualizadas das regras de definição da remuneração, da distribuição do trabalho, da duração da jornada e do que é ou não tempo de trabalho” (Abílio, 2020a, p. 580), sendo que, no limite, esse processo tende a reduzir “o trabalhador a força de trabalho disponível” (Abílio, 2020a, p. 582).
Para tanto, nosso trabalho se estrutura em três partes. Na primeira, destacamos alguns problemas relacionados à construção da categoria setor informal. Na segunda, destacamos a existência de uma associação nítida entre emprego informal, empregos formais de baixa remuneração e os trabalhadores negros no Brasil. Por fim, destacamos como o paralelismo entre raça e classe se reafirma nos novos processos de informalização, tal qual a uberização e a plataformização, definidas por Ludmila Abílio, Henrique Amorim e Rafael Grohmann (2021, p. 26) tanto como “um novo tipo de gestão e controle da força de trabalho com a consolidação do trabalho sob demanda” quanto uma “dependência de plataformas digitais para executar atividades de trabalho”.
DESCONEXÃO E PRAGMATISMO NA FORMAÇÃO DE SETOR INFORMAL PELA OIT
Ao fim da Segunda Guerra Mundial, os estudos sobre o crescimento e o desenvolvimento das economias capitalistas, as particularidades da industrialização em países subdesenvolvidos e a questão social ganharam destaque global. Nesse período, havia um grande empenho intelectual e político para a construção de um mundo livre do fascismo e do liberalismo, que conduziram às duas guerras mundiais (Hobsbawm, 1995), cabendo à recém-criada Organização das Nações Unidas (ONU) a organização e a implementação desses esforços. Suas agências foram encarregadas de fomentar discussões e elaborar medidas práticas sobre temas específicos, como comércio, educação, saúde e trabalho, entre outros. Todavia, nem todos os estudos se basearam em critérios suficientemente abrangentes nem em diálogo orgânico entre as agências. Um exemplo particularmente importante para os objetivos deste artigo é a negligência da OIT com relação às reflexões sobre o racismo em relatório coordenado por Roger Bastide e Florestan Fernandes a pedido da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco). Esse documento, apresentado no início dos anos 1950, atestou que não só a democracia racial era um mito, como o preconceito e a discriminação raciais impactavam negativamente os resultados dos trabalhadores negros no mercado de trabalho.
Além disso, em meados da década de 1960 e o início dos anos 1970, havia uma rica discussão entre sociólogos e economistas latino-americanos em torno das peculiaridades do desenvolvimento capitalista na periferia, em particular do caráter do trabalho e da profundidade das relações de trabalho típicas da modernidade capitalista. A industrialização e a urbanização promoveram uma nova forma de subdesenvolvimento, caracterizada pela existência de milhões de pessoas à margem do progresso capitalista, o qual se concentrou nas mãos das oligarquias tradicionalmente privilegiadas e de uma pequena classe média. Todavia, dentre os vários recortes que poderíamos fazer na literatura sobre a marginalidade social, o que mais nos interessa aqui é o que divide os que acreditavam e os que não acreditavam na superação do subdesenvolvimento pela via da industrialização capitalista, tal como se vinha desenrolando. Nesse sentido, Francisco de Oliveira (1972) divergiu frontalmente de posições de autores como Florestan Fernandes (2008b), Eric Hobsbawm (1969) e Lúcio Kowarick (1977). Para estes, o funcionamento normal do imperialismo em sociedades subdesenvolvidas já garantiria a conservação da marginalidade social, e Florestan Fernandes atribuiu às heranças da escravidão a rigidez social, política, econômica e cultural do Brasil. Ao contrário do que sugerira Maria da Conceição Tavares (1981), a supressão dos trabalhadores marginais não decorreria de simples ciclos de expansão de uma economia dependente, qualquer que fosse o seu grau de industrialização.
Todavia, as discussões da OIT que levaram à formulação da categoria setor informal, já no início dos anos 1970,5 não incorporaram o racismo como força estruturante das relações de ocupação e renda nem abrangeram reflexões sobre as relações de dominação e dependência externa. Focada em criar instrumentos práticos de mensuração dos impactos sociais do desenvolvimento das forças produtivas em economias capitalistas subdesenvolvidas a partir do seu próprio acúmulo científico (Benanav, 2021, pp. 8-10), a OIT diluiu particularidades que deveriam fundamentar a compreensão das realidades locais, inclusive no que toca às suas relações externas. Essas análises deformaram realidades heterogêneas e tornaram-nas meras variações do modelo capitalista de mercado (de trabalho) que vigorava em economias capitalistas desenvolvidas. Muitas ocupações do que viria a ser identificado como setor informal foram compreendidas como desemprego disfarçado, e não como atividades complementares às economias naturais que coexistiam com formas capitalistas de organizar a produção. Isto é, negligenciou-se que essas economias não podem tratar como residuais formas de ocupação que não correspondem ao assalariamento ou a desemprego típicos de economias capitalistas desenvolvidas. Existem situações de emprego e trabalho intermediárias importantes nas formações nacionais subdesenvolvidas que absorvem frações muito importantes da população.
Os problemas dessa fase inviabilizaram análises mais verossímeis sobre as transformações pelas quais as economias subdesenvolvidas passaram a partir de meados da década 1970.6 Naquele momento, a dinâmica das relações de trabalho sob o neoliberalismo se mostrou extremamente contrária às expectativas que se depositavam no desenvolvimento capitalista, o que posteriormente levou Richard Sennett (1998) a refletir sobre o caráter corrosivo do neoliberalismo sobre as relações de trabalho típicas do pós-guerra de economias capitalistas desenvolvidas. Ao invés da generalização do trabalho carregado de direitos, que sempre esteve identificado com o emprego formal, o que se viu a partir dos anos 1980 foi uma piora generalizada das relações de trabalho nas economias capitalistas desenvolvidas e subdesenvolvidas.
Mesmo diante dessas transformações, o Programa Regional de Emprego para a América Latina e o Caribe (Prealc), em meados dos anos 1970 e início dos anos 1980, elaborou pesquisas sobre o desenvolvimento capitalista na América Latina e as possibilidades de geração de empregos com elevação salarial (cf. em especial Souza Tokman, 1976).7 Posteriormente, sobretudo pela pena de Paulo Renato Souza e Maria da Conceição Tavares,8 o Prealc difundiu as possibilidades de generalização do que se denominou relações de trabalho tipicamente capitalistas, o que se assemelha fortemente às definições de trabalho formal posteriormente incorporadas pelas estatísticas do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A definição de emprego formal e sua contraposição ao emprego informal que embasa a estruturação das análises sobre o mercado de trabalho no Brasil e em outros países está ancorada na interpretação de que as relações de trabalho tipicamente capitalista de uma economia dependente e subdesenvolvida - isto é, os empregos formais - serão generalizadas pela expansão do setor moderno, o que, ironicamente, aproxima Francisco de Oliveira (1972) do Prealc, Paulo Renato Souza e Maria da Conceição Tavares. De tal modo que se assume que os setores modernos absorveriam os empregos de baixa produtividade do setor informal, negligenciando os impasses de uma economia periférica.
Embora seja fundamental pensar e construir indicadores sintéticos e válidos, entendemos que a sua elaboração requer uma análise mais próxima de algumas particularidades fundamentais do subdesenvolvimento. Para tanto, entendemos que, de um lado, é importante estarmos atentos às mudanças que o tempo traz, o que se confunde, por exemplo, com os impactos do desemprego estrutural e daquilo que Paulo Arantes (2014) identifica como a emergência de um mundo de expectativas decrescentes. De outro, também é importante considerar que ainda vivemos sob o mesmo tempo histórico do capitalismo dependente e subdesenvolvido. Em outras palavras, a partir das experiências passadas, devemos aprender o que permanece das conjunturas históricas para identificar a estrutura dos mercados de trabalho capitalistas à luz das experiências periféricas e centrais, evitando horizontes que simplifiquem a complexidade da realidade.
Nesse sentido, destacamos que, desde os anos 1980, as relações informais de trabalho passaram a crescer dentro do próprio setor formal em todas as economias capitalistas (Benanav, 2021, p. 25), o que se alinha a reflexões sobre a estrutura do capitalismo em geral elaboradas por Moishe Postone (2016, pp. 83-4). Segundo esse autor, enquanto vigorar o tempo histórico do capitalismo, o desemprego e as formas precárias de trabalho continuarão a assombrar a classe trabalhadora, independentemente de não haver mais razões tecnológicas que justifiquem uma situação de escassez material. O surgimento dos entregadores por aplicativo, por exemplo, é apenas o mais recente capítulo dessa tendência de precarização e desvalorização do trabalhador (De Stefano, 2016; Abílio; Amorim; Grohmann, 2021). E destacamos que, no Brasil e em outros países de passado escravista,9 os trabalhadores negros são os mais atingidos.10
De tal modo que o que propomos é uma reflexão sobre a estrutura das relações de trabalho no capitalismo e, de modo mais amplo, das relações sociais de produção capitalistas a partir também de sua dimensão política e internacional, para que possamos avançar na elaboração de conceitos e critérios estatísticos que retratem com maior precisão a realidade do mercado de trabalho. É preciso avançar em direção a conceitos que componham uma teoria coesa e abrangente, que não se limite a compreender apenas um pequeno recorte da realidade, o que poderá viabilizar a criação de indicadores mais seguros do que os que temos atualmente. Assim, é indispensável refletirmos sobre os fundamentos da estrutura e da dinâmica de toda a economia (nacional e internacional), para o que destacamos as análises das determinações raciais do passado e do presente sobre o emprego e a renda.
Embora a OIT tenha reconhecido (apenas) em 2002-23 que o emprego informal não é transitório, o que se afirma na substituição do conceito setor informal pelo de economia informal (Hussmanns, 2004), ainda existem lacunas. Ainda não há, por exemplo, uma medida que nos ajude a compreender de maneira mais simples as relações de trabalho em vias de informalização, o que levaria a um conjunto de dados fundamental para podermos nos antecipar minimamente aos movimentos de degradação do trabalho e propor políticas mais efetivas.
PARTICULARIDADES DO EMPREGO INFORMAL NO BRASIL
Nesta seção, apresentaremos aspectos que permitem uma compreensão um pouco mais abrangente do forte vínculo entre emprego informal e racismo. Inicialmente, destacamos algumas particularidades raciais da formação da classe trabalhadora no Brasil sob o regime de classes sociais. Posteriormente, analisamos como a estrutura de poder preserva os trabalhadores negros como parcela majoritária do setor informal a partir de algumas evidências relativas a conjunturas e políticas econômicas específicas. Por último, apresentamos dados estruturais do negro no mercado de trabalho brasileiro entre 1982 e 2022.
A situação do negro na formação da classe trabalhadora no Brasil
Segundo Florestan Fernandes (2010, cap. 2), a população negra encontrou sérios obstáculos que a impediram de aproveitar as oportunidades de ascensão social vertical durante a expansão industrial e urbana. A consolidação do regime de classes no Brasil adaptou o antigo regime de segregação racial que caracterizava a ordem senhorial e escravista, o que exigiu a substituição do racismo científico (Schwarcz, 2003) que vigorava desde a Abolição por formas mais sofisticadas de controle. Para isso, foi necessário combinar leis que disciplinaram a classe trabalhadora e mecanismos informais que tutelaram os trabalhadores negros, configurando uma dada biopolítica no Brasil (Zullo, 2019b; 2023).
Os trabalhadores negros somente passaram a ocupar postos de trabalho que ofereciam alguma valorização social no fim da década de 1930 e, ainda assim, como um subproduto do disciplinamento estatal sobre a ação sindical e grevista (Fernandes, 2007, p. 115). Contudo, os negros continuaram ausentes das ocupações que ofereciam mais possibilidades de valorização e ascensão social, inclusive ocupações sem maior prestígio social, como marceneiro e mestre de obras (Barbosa, 2008).
De modo geral, a evolução das relações raciais no Brasil se processou por uma lógica que Florestan Fernandes (1946) descreveu como um desenvolvimento acumulativo da cultura. Considerando que as relações sociais no Brasil foram fundadas num contexto profundamente racializado, os processos de modernização pelos quais o país passou essencialmente adaptaram o paralelismo entre raça e classe do antigo regime, sem grandes alterações na hierarquia e na valorização social (e o imobilismo racial da estrutura de ocupações é uma das maiores expressões disso). Embora muitos indivíduos negros tenham alcançado postos de trabalho socialmente mais valorizados durante o rápido crescimento econômico de 1930 a 1980 (Fernandes, 2005), a participação dos trabalhadores negros na estrutura ocupacional não foi, ainda hoje, fundamentalmente alterada. Isto é, a maioria da população negra não alcança os postos de trabalho de maior prestígio social e valorização econômica, muito menos postos de decisão.
Industrialização, desindustrialização e emprego informal no Brasil
Os limites da industrialização periférica restringiram a continuação da queda das ocupações de baixa produtividade. Embora tenham caído significativamente entre 1960 e 1980 (Portugal Jr., 2012, p. 254), o estoque e a participação dessas ocupações ainda eram bastante elevados em 1980.11 Mais do que isso, a elevada participação de trabalhadores ocupados em atividades de baixa produtividade estabilizou-se nas décadas seguintes, quando a desindustrialização interrompeu a lenta queda da heterogeneidade estrutural das cinco décadas anteriores (Portugal Jr., 2012, p. 280).
A industrialização brasileira contou com determinantes sociopolíticos fundamentais que favoreceram não só uma lenta redução dos empregos informais, como também uma concentração dinâmica da renda, segundo Celso Furtado (1972). A estrutura de poder fortemente racializada, que se manifestou economicamente nos gastos com consumo e investimento incompatíveis com a homogeneização das estruturas econômicas e sociais do país, preservou uma distribuição de renda e riqueza que era profundamente desigual e reafirmou a segregação de classe e raça no país.
Nesse sentido, destacamos dois fundamentos econômicos da industrialização brasileira. O primeiro foi o excedente estrutural de mão de obra. Com uma oferta de trabalho sempre superior à demanda, a massa de trabalhadores, inclusive nos setores modernos, não tinha renda adequada para participar do ciclo de consumo de bens duráveis, sendo os trabalhadores negros os mais distantes desse padrão de consumo. O segundo fundamento é que esse excedente e as suas consequências sociais e econômicas foram, em boa medida, planejadas pelo Estado (Oliveira, 1972). Para Oliveira, a participação do Estado na abertura de novas e modernas fronteiras agrícolas garantiu não só baixos salários nos setores modernos, como também uma reserva de trabalhadores ocupados nos serviços de baixa produtividade. Em outras palavras, o Estado brasileiro garantiu a heterogeneidade estrutural que caracteriza o subdesenvolvimento, contrastando frontalmente com a ideia de que a industrialização tenderia a reduzir ou mesmo eliminar a informalidade, majoritariamente composta pela população negra. E isso nos leva ao terceiro fundamento desse processo: a industrialização no Brasil caracterizou-se por uma modernização dos padrões de consumo das minorias privilegiadas, fundamentalmente brancas. Orientada a partir de princípios antissociais e racistas, ela impediu que se estabelecesse um nexo orgânico entre produção e consumo, o que desperdiçou grande parte do seu potencial econômico (Furtado, 1972, pp. 60-1). Além disso, esse processo pavimentou a partir da década de 1980 (Espósito, 2018) as vias para um processo de reversão das forças produtivas com enormes impactos sobre a população que vive do trabalho (Zullo e León, 2020), em particular sobre os trabalhadores negros.
Embora a participação de ocupações de baixa produtividade tenha se mantido estável ao longo dos últimos quarenta anos (Portugal Jr., 2012), o seu estoque cresceu significativamente. Ao longo desses anos atravessados por longos períodos de recessão e estagnação, a economia brasileira perdeu a musculatura que reunira nas décadas passadas e fomentou a reprodução ampliada de ocupações de baixa produtividade, cada vez mais frequente em atividades formais. Mais do que isso, esse processo replicou o seu padrão racializado.
A onda mais recente de declínio acentuado da economia brasileira e, pois, de deterioração das condições de trabalho e emprego teve início em 2015 e foi favorecida pelos interesses da burguesia, segundo Franklin Serrano e Vivian Garrido (2020). Para os autores, houve duas razões básicas para que a recessão não levasse a burguesia a buscar medidas para superar esse quadro. Uma delas é que, a despeito do resultado do Produto Interno Bruto (PIB) não ser promissor, a taxa média de lucro pareceu satisfatória. A segunda é que a crise restituiu parte do controle sobre o custo do trabalho que se havia perdido nos anos imediatamente anteriores.
Em suma, não existia nem existe nenhum automatismo entre desenvolvimento econômico e aumento do setor formal ou, de outro modo, das atividades de alta produtividade, sobretudo em economias subdesenvolvidas, dependentes, racial e socialmente segregadas. Os elementos que apresentamos aqui reafirmam a reprodução do que se poderia identificar com um nível tradicional de vida da classe trabalhadora, da qual o racismo é uma força estruturante e um elemento histórico que perpetua a manutenção do passado escravista no presente.
O negro na informalidade12
O ajuste estrutural da economia brasileira às novas exigências da divisão internacional do trabalho, desde os anos 1980, vem rebaixando o padrão de vida da classe trabalhadora e reestruturando o baixo padrão de vida já predominante entre os trabalhadores negros.13 Com relação ao período de 1982 a 2022, que em grande medida corresponde à desindustrialização brasileira, gostaríamos de destacar três características. A primeira é que a quantidade de pessoas ocupadas no setor primário continua a ser significativo, o que faz com que o setor continue a ser um considerável reservatório de trabalhadores para as atividades urbanas informais. Uma segunda característica é a reciclagem do rebaixado padrão de vida da classe trabalhadora no Brasil, o que se conecta não apenas à tradicional relação entre o ritmo decrescente de ocupados no setor secundário e a aceleração do ritmo de crescimento de ocupados no setor terciário, mas também a um aumento das ocupações formais de baixa remuneração. Por fim, a partir das tabelas abaixo, destacamos algumas evidências raciais do setor terciário, que entre 1982 e 2022 absorveu um contingente de 10,1 milhões de trabalhadores negros em empregos informais, respondendo por 70% de todos os acréscimos do emprego informal do setor terciário.
As tabelas 1, 2, 3 e 4 mostram mudanças relevantes na composição setorial da classe trabalhadora. A dinâmica de deslocamento da força de trabalho foi diferente da dinâmica desencadeada entre 1950 e 1980, cujo movimento compeliu significativa transferência de trabalhadores das áreas rurais para as áreas urbanas em função da acumulação capitalista baseada na industrialização dependente. Embora a população rural atual seja significativamente menor e seus fluxos migratórios já não repitam as cifras impressionantes de décadas passadas, os trabalhadores do setor primário ainda compõem um reservatório relevante de força de trabalho para os setores secundário e terciário, o que normalmente é ignorado nos estudos contemporâneos sobre o mercado de trabalho (Sampaio Jr., 2013; Zullo, 2019a). Mesmo em 2022, o número total de trabalhadores ocupados em atividades primárias somava 8,7 milhões de pessoas, algo muito próximo à população urbana de Cuba (Banco Mundial, 2018). Mais do que isso, destacamos que esse contingente populacional, que em 2022 era majoritariamente negro e fundamentalmente composto por pessoas ocupadas em atividades informais, variou relativamente pouco nos últimos dez anos e evidencia a existência de um fluxo migratório para as atividades informais nos setores secundário e terciário.
O Gráfico 1 mostra a reciclagem do rebaixado padrão de vida da classe trabalhadora. A particularidade desse processo reside na combinação de recuo do emprego informal e aumento dos empregos formais de baixa remuneração no país. Na comparação dos anos 1982 e 2022, entre os trabalhadores ocupados, evidencia-se uma queda de quatorze pontos percentuais da participação do emprego informal e um aumento de cerca de treze pontos percentuais da participação dos empregos formais com até dois salários mínimos.14 Em ambos os anos, a taxa de participação da força de trabalho girava em torno de 63%.15
Evolução de empregos formais (até dois salários-mínimos) e empregos informais no Brasil (em milhões)
Além disso, é fundamental questionar a participação dos empregos informais como única métrica de análise da heterogeneidade estrutural no Brasil. Embora a taxa de trabalhadores informais com relação ao total de trabalhadores ocupados tenha caído no recorte temporal já destacado, o estoque de trabalhadores informais apresenta resultados bastante preocupantes. Se considerarmos apenas os trabalhadores informais de 2022, o que corresponde a exatos 36,1 milhões de trabalhadores, esse contingente populacional cresceu 13,1 milhões quando comparado a 1982, como sugere o Gráfico 1.
Ainda que apresente uma trajetória decrescente a partir de 2005, o estoque de trabalhadores informais voltou a crescer desde 2017, segundo o mesmo gráfico. Além disso, quando somamos os trabalhadores formais que recebem até dois salários mínimos a esses trabalhadores informais, alcançamos um total de 74,4 milhões dos trabalhadores ocupados em 2022. Isso corresponde a 74,7% da população ocupada no mercado de trabalho e mais de um terço (34,5%) de toda a população do Brasil. Caso sejam incluídos os mais de 9 milhões de desempregados e os setores inativos com pleno potencial de serem empregados no sistema produtivo, o resultado é ainda mais dramático, o que resume a monumental crise social na qual estamos enquadrados.
Por fim, o Gráfico 2 apresenta quem são os setores raciais mais afetados pela reciclagem do rebaixado padrão de vida da classe trabalhadora em curso. Em termos absolutos, em 1982, os informais brancos correspondiam a 11,2 milhões de trabalhadores, enquanto os informais negros representavam 11,6 milhões. Em 2022, enquanto os informais brancos formavam um montante de 12,8 milhões de pessoas, os informais negros quase dobraram, aumentando para 22,8 milhões de trabalhadores. Por outro lado, os trabalhadores formais que recebem até dois salários mínimos cresceram três vezes mais de 1997 a 2022, sendo esse crescimento populacional puxado sobretudo por trabalhadores negros.
Evolução de empregos formais (até dois salários-mínimos) e empregos informais, segundo raça/cor, no Brasil (em milhões)
Em 1982, também segundo o Gráfico 2, os trabalhadores negros representavam 50,7% da população informal. Já em 2022, esse percentual aumentou para 63,9%, crescendo cerca de treze pontos percentuais em comparação com 1982. O período histórico analisado termina com 44,4 milhões de trabalhadores negros classificados como informais ou empregados formais de baixa remuneração, o que corresponde a 45% do total de ocupados na economia brasileira. A maioria dos trabalhadores negros informais encontra-se nos setores de comércio e serviços.
O processo de reversão estrutural em curso - o grande deslocamento de trabalhadores para empregos formais em vias de informalização ou, de outro modo, a piora da qualidade média dos empregos formais, e o aprofundamento da racialização do emprego formal e informal - não foi resolvido ao longo dos anos. Trata-se da forma que assume o rebaixamento do padrão de vida da classe trabalhadora estruturado a partir dos baixos padrões de vida já predominantes entre os trabalhadores negros.
EMPREGO INFORMAL E RAÇA NAS PLATAFORMAS DIGITAIS
As últimas quatro décadas foram marcadas por ampla e intensa degradação das condições de vida da classe trabalhadora. A emergência de um conjunto de mudanças, como o deslocamento do Ocidente para a Ásia de muitas cadeias produtivas e serviços de alta, média e baixa intensidade tecnológica, normalizou a terceirização de contratos de trabalho esvaziados de direitos trabalhistas (De Stefano, 2016). Esses anos testemunharam processos de informalização de ocupações que se pensavam ser tipicamente capitalistas, como Paulo Renato Souza (1999) definia as ocupações em estabelecimentos que tinham condições de valorizar seu capital e assegurar direitos trabalhistas.
De forma geral, os processos de informalização se caracterizam por relações de trabalho intermediadas por contratos de prazo determinado que desobrigam os empregadores de arcar com os riscos do trabalho e transferem estes últimos para o trabalhador. Mais recentemente, essa situação foi ainda mais deteriorada por novas formas de gestão do trabalho nas quais os trabalhadores são contratados para demandas específicas e gerenciados por aplicativos, aumentando a impessoalidade e a desobrigação de cumprimento dos direitos e aproximando-se de expectativas que até pouco tempo atrás pareciam um sonho para toda sorte de empregador. Nesse sentido, a afirmação do CEO da CrowdFlower é sintomática: “Antes da internet, seria muito difícil encontrar alguém, sentá-lo dez minutos, fazê-lo trabalhar para você e, após esses dez minutos, despedi-lo. Mas com a tecnologia é possível encontrar essas pessoas, pagar uma quantia pequena de dinheiro e depois se livrar delas quando já não precisar mais” (De Stefano, 2016, p. 4; tradução nossa).
A revolução das tecnologias de informação e comunicação viabilizou a emergência de formas muito mais fluídas ou, como diria Zygmunt Bauman (2021), gerou modernidades líquidas. Ao contrário do véu ideológico que superestimava características como flexibilidade, liberdade e autonomia, as plataformas digitais (sobretudo as que contratam motoristas, como Uber e Lyft) aproveitaram-se da precarização de diferentes mercados de trabalho nacionais para contratar mão de obra barata (Schor, 2020, pp. 108-9). A baixa demanda de trabalho levou a uma relação de dependência entre os trabalhadores e a plataforma digital, na medida em que a maior parte ou a totalidade da renda da maioria desses trabalhadores provinha das horas despendidas a serviço desses aplicativos. Mais do que isso, Juliet Schor (2020, pp. 172-5) aponta que, mesmo nos Estados Unidos, entre 2014 e 2018, à medida que mais trabalhadores eram absorvidos pelas plataformas, diminuíam os direitos, a liberdade e a renda do trabalho.
Outro elemento comum encontrado na literatura internacional se refere à racialização dos trabalhadores explorados pelas plataformas digitais, sobretudo das plataformas intensivas em trabalho (Schor, 2020, p. 169). As diferenças relacionadas a fatores demográficos e educacionais são patentes quando comparamos plataformas como Uber e TaskRabbit.
Niels van Doorn (2023, p. 158-9) constata que a racialização de trabalhadores de plataforma é a extensão de processos mais antigos que associavam imigrantes ou minorias racializadas a trabalhos informais e regulações frouxas ou inexistentes. Mais do que isso, o autor é bastante enfático no que se refere às facilidades oferecidas pelas autoridades para que as plataformas se aproveitem largamente da insegurança de imigrantes, muitos deles ilegais, para garantir a estabilidade do trabalho barato. A facilidade de entrada e saída que os aplicativos oferecem a trabalhadores recém-chegados a um país são bastante atraentes para quem necessita de dinheiro de imediato, ainda que a ocupação seja inadequada às suas necessidades e exija sacrifícios morais e físicos elevados.
Em boa medida, essas características levantadas pela bibliografia especializada no exterior aderem à realidade das relações de trabalho e à situação dos trabalhadores por aplicativo no Brasil, mas a isso se adicionam outros ingredientes políticos importantes. Concretamente, os danos causados pelo avanço dos aplicativos também são creditados ao avanço da ideologia do empreendedorismo, própria da fetichização das relações de trabalho que decorre do aumento da produtividade e da renovação do valor como forma de dominação social (Filgueiras; Cavalcante, 2020; Postone, 2016), e à ascensão da extrema direita (Safatle, 2023).16 Dentre seus impactos negativos sobre o trabalho e o trabalhador, destacamos dois desdobramentos legais com fortes expressões concretas. O primeiro foi a aprovação de uma legislação trabalhista que assegurou juridicamente um vasto processo de informalização no Brasil, na medida em que criou o contrato de trabalho intermitente e estendeu a uberização aos trabalhadores formais (Antunes, 2020). O segundo é que o lobby das plataformas digitais de transporte e entrega por aplicativos - carros, motocicletas e bicicletas - tem sido particularmente intenso nos últimos anos, sendo que, em março de 2024, conseguiu a aprovação do projeto de lei que regulamenta o trabalho de motoristas por aplicativo de acordo com seus interesses.17
Essas medidas precarizam o mercado de trabalho como um todo e rebaixam com maior intensidade as categorias mais frágeis, como são os entregadores por aplicativos. Segundo Ludmila Abílio (2000, p. 584), as plataformas oferecem incentivos financeiros para que entregadores trabalhem na chuva, pressionando pela manutenção da oferta do serviço em situações adversas. Nessas situações, o algoritmo da plataforma distribui as corridas de maneira uniforme entre todos os entregadores disponíveis. Essa estratégia reduz o número de entregadores que alcança essas oito corridas e que, portanto, recebe o incentivo, de apenas cinquenta reais. Embora o valor seja extremamente baixo, a maioria dos entregadores tende a aceitar todas as corridas que lhes oferecem tanto pelo medo de serem bloqueados pelo aplicativo, caso recusem as chamadas, como pela esperança de auferir uma renda um pouco mais elevada, evidenciando os abusos a que se submetem os que não têm direito a férias, auxílio-saúde, seguro-desemprego etc.
Além disso, uma característica fundamental dessa categoria é que ela é majoritariamente composta por homens negros. Um estudo da OIT, feito em parceria com o Instituto Observatório Social (IOS) e a Central Única dos Trabalhadores (CUT), identificou que 68% das pessoas ocupadas como entregadoras de aplicativo em Brasília eram homens negros (OIT; IOS; CUT, 2021, p. 64). De forma análoga, Ludmila Abílio (2020) destacou que 75% dos bikeboys entrevistados por ela na cidade de São Paulo eram homens negros de até 27 anos. Ademais, para reafirmar a precariedade que caracteriza essa categoria de trabalho tão racializada, Geraldo Góes et al. (2023, p. 1) identificaram que 77% dos trabalhadores daquilo que os autores identificam como gig economy são informais.
Outra característica fundamental desse processo é o fato de que a maioria desses trabalhadores não tinha experiência prévia com o serviço de transporte e entrega. Segundo Victor Callil e Monise Picanço (2023, p. 31), 61% desses trabalhadores estavam previamente ocupados ou continuavam também ocupados em trabalhos formais, o que converge com os resultados de outras pesquisas (Abílio, 2020). A socióloga Ludmila Abílio menciona em entrevista o relato de um entregador que não só revela a degradação da economia brasileira, como também mostra que as plataformas digitais são um espaço ambíguo. Se, de um lado, elas se impõem como um grande espaço de valorização de capital, de outro, constituem-se como uma estratégia de sobrevivência para uma massa de trabalhadores que não têm trabalho formal ou gostariam/precisariam trabalhar mais horas. A ideia de que o trabalho de entregador, fundamentalmente formado por homens negros, virou um “bico” é sintomático dos processos racializados de informalização e ampliação do emprego informal.
Segundo a Fairwork, projeto internacional que monitora as condições de trabalho nas plataformas digitais em 27 países de todos os continentes, a situação dos entregadores por aplicativo no Brasil apenas não é pior do que em Bangladesh. Isso revela uma situação mais ampla que facilita que as condições de trabalho no nosso país permaneçam presas a um padrão histórico de dominação social e superexploração de um trabalho profundamente racializado. A história recente do Brasil reafirma, portanto, o racismo como uma força estruturante das condições de trabalho e poder típicas de uma economia subdesenvolvida e dependente.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Pensar sobre os processos que reproduzem o emprego informal em escala simples ou ampliada exige pensar mais do que apenas na profundidade das relações salariais em uma economia. É preciso considerar que as estruturas de poder, diante do processo de valorização de capital, sobretudo em capitalismos selvagens (Fernandes, 2005, p. 340), sempre buscaram o rebaixamento do estatuto do trabalho. Por isso, é fundamental compreender que as tendências de longo prazo no capitalismo dependem fundamentalmente da correlação de forças sociais, o que nas últimas décadas significou um fortalecimento unilateral de estruturas (racializadas) de poder que impõem condições de trabalho (assalariado) extremamente precárias a um número cada vez maior de pessoas.
Pensar no emprego informal apenas como um marcador das relações de classe em um sistema que tenda à disseminação de relações assalariadas em que o trabalhador goza de todos os seus direitos é um grande equívoco. A partir da análise da realidade brasileira, compreende-se como operam as tendências históricas relacionadas à estabilização das estruturas de poder que pressionam para que sejam mantidos os privilégios de raça e classe, com óbvios reflexos sobre a estrutura de ocupações, que a um só tempo espelha e estrutura a hierarquia social brasileira (Zullo, 2015; Almeida, 2021).
Embora o capitalismo tenha sido obrigado a fazer um desvio de rota após a Segunda Guerra Mundial, período em que alguns países perseguiram o pleno emprego, o estágio atual mostra que o assim chamado “Anos Dourados” não irá se repetir. O horizonte de ascensão material se esvaiu e as relações de trabalho assalariado não asseguram direitos nem estabilidade no emprego. Em uma era de expectativas decrescentes (Arantes, 2014), isso significa que os empregos informais, empregos formais de baixa remuneração e os processos de informalização continuarão a aprisionar a classe trabalhadora e, em escala crescente, os trabalhadores negros. A nova quadratura do trabalho é de rebaixamento do padrão de vida da classe trabalhadora, sobretudo da população negra. Está em curso um grande deslocamento de trabalhadores para atividades formais em vias de informalização e um aprofundamento da racialização do emprego formal de baixa remuneração e do emprego informal.
Essas são questões importantes para refletirmos sobre os processos que degradam o estatuto do trabalho não só no Brasil, mas, se não em todas as sociedades, ao menos naquelas atravessadas por alguma questão racial que estruture as relações de poder. Além disso, é importante refletirmos sobre a necessidade de ampliação do leque de categorias usadas para compreender a estrutura e a dinâmica do mercado de trabalho e, de modo mais amplo, das relações de classe. Nesse sentido, avançar nas reflexões sobre o processo de informalização é uma senda fecunda para novas sínteses analíticas sobre o mercado de trabalho à luz das estruturas do capitalismo tal como ele é racialmente fundamentado e dotado de uma complexidade que vai além da formalidade ou informalidade.
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-
1
Ainda que a análise clássica de Paulo Renato Souza (1980) sobre a dinâmica do mercado de trabalho seja mais sofisticada que esses exemplos, sua fundamentação microeconômica de corte schumpeteriano acarreta sérios problemas à análise de economias periféricas, cujas capacidades de absorver a força de trabalho em meio à modernização dependente são superestimadas. Para uma crítica a essa abordagem, ver Zullo (2014, cap. 2).
-
2
Embora não seja o foco deste trabalho, existe uma vasta literatura que analisa criticamente as tímidas políticas públicas no Brasil, das quais destacamos Michel França e Alysson Portella (2023) e Milena Santos (2018).
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3
O uso dos termos desenvolvido, subdesenvolvido e subdesenvolvimento é baseado em Celso Furtado (1980).
-
4
A maneira como o desemprego disfarçado foi inicialmente utilizado por Joan Robinson (1937) era sinônimo do termo subemprego. Todavia, na medida em que a análise foi adaptada para realidades de países subdesenvolvidos, o termo subemprego ganhou diferentes acepções, por exemplo, em Octavio Rodríguez (1985), OIT e IBGE (Portugal Jr., 2012, pp. 389-93).
-
5
Aqui, a referência é o famoso relatório da OIT sobre o Quênia (OIT, 1972).
-
6
Para uma análise do endividamento externo da economia brasileira em meio à crise de Bretton Woods e da estagnação decorrente mais diretamente da crise do petróleo, ver Celso Furtado (1980).
-
7
Para uma crítica favorável aos trabalhos do Prealc, ver Maria Cristina Cacciamali (2007).
-
8
Ver Paulo Renato Souza (1980); Maria da Conceição Tavares e Paulo Renato Souza (1981).
- 9
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10
Para a sistematização de elos importantes desse debate, ver Cadernos Cemarx, n. 14, 2021.
-
11
Como os dados sobre empregos informais só passaram a ser elaborados e divulgados no Brasil em 1980, a captação estatística da estrutura e da dinâmica do mercado de trabalho desse período requer o uso de metodologia desenvolvida por Octavio Rodríguez (1985) e José Geraldo Portugal Jr. (2012). Nessa metodologia, a heterogeneidade social é captada pela baixa produtividade do trabalho, mesmo critério usado pela metodologia aplicada pelo IBGE, embora a captação seja diferente. Para uma comparação entre estas metodologias, ver Zullo (2019a).
-
12
Os dados apresentados a seguir foram extraídos da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (pnad) e da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (pnadc) a partir de anos selecionados entre 1982 e 2022. A compatibilização entre as bases foi possível graças àquilo que Bruno Vaz e Tiago Barreira (2021) denominam retropolação. Para o uso de critérios metodológicos sobre emprego formal e emprego informal, ver Wilson Menezes e Cláudio Dedecca (2012). Uma breve discussão sobre o assunto pode ser vista em Luiz Antônio Filgueiras, Graça Druck e Manoela Amaral (2004).
-
13
Para as evidências empíricas sobre a desigualdade racial no mercado de trabalho anterior à década de 1980, ver Carlos Hasenbalg (1979).
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14
Tanto José Geraldo Portugal Jr. (2012) como Carlos Medeiros (2015) usam dois salários mínimos como critério básico para identificar os trabalhos mais precários, com capacidade para no máximo repor os bens de subsistência e/ou o material de trabalho.
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15
Em 1982, a taxa de participação no mercado de trabalho estava em 60,3%, enquanto em 2022 a mesma taxa estava em 62,9%.
-
16
Para uma reflexão sobre a ideologia do empreendedor e a ascensão do fascismo contemporâneo como expressões do neoliberalismo em escala mundial, ver respectivamente Pierre Dardot e Christian Laval (2016) e Clara Mattei (2023).
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17
Para uma crítica ferrenha a esse projeto de lei, ver Valdete Souto Severo e Jorge Luiz Souto Maior (2024). Para a resistência de outros governos, na Europa, a regular as plataformas, ver Gig Economy Project (2024).
Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
28 Out 2024 -
Data do Fascículo
May-Aug 2024
Histórico
-
Recebido
22 Nov 2023 -
Aceito
08 Maio 2024