Open-access Placas de aço inoxidável 316L aplicadas no reparo de fratura experimental diafisária do rádio e ulna de cães

Reparing radial and ulnar diaphysial experimental fracture of dogs employing stainless steel plates 316L

Resumos

O objetivo do presente trabalho foi o de estudar a resistência à corrosão em placas de aço inoxidável 316L, com diferentes tipos de acabamento e tratamento superficial, e a possível interferência dessa reação corrosiva na consolidação óssea. Utilizaram-se placas semi-acabadas, polidas, tratadas com jatos de microesferas de vidro e passivadas, as quais foram aplicadas na epífise distal do rádio de cães. Foram utilizados 12 animais, divididos em dois grupos, nos quais, após osteotomia bilateral do rádio e ulna, foram realizadas osteossínteses do rádio, totalizando 24 procedimentos. Avaliou-se a evolução clínica e radiográfica das regiões que receberam os implantes aos 30, 60, 90, 180, 240 e 360 dias. Os animais do grupo 1 (GI) foram sacrificados aos 180 dias e os do GII aos 360 dias para estudo histológico e de microscopia eletrônica de varredura do local da osteotomia sob a região dos implantes metálicos e para estudo da resistência à corrosão no organismo, pelos implantes metálicos, por meio de análises química e metalográfica (microscopia óptica e eletrônica de varredura e espectroscopia de espalhamento de energia por raios X). Os animais recuperaram a função dos membros operados 24 horas após a cirurgia. Radiograficamente, verificou-se a consolidação óssea em todos os animais. Macro e microscopicamente não foram observados sinais de corrosão nos implantes metálicos, exceto em uma placa passivada, aplicada no rádio esquerdo de um animal, na qual a corrosão foi detectada pela microscopia óptica e eletrônica de varredura. Este estudo permite concluir que as placas de aço inoxidável 316L, independente do acabamento superficial a que foram submetidas, não sofreram corrosão ou reações adversas e foram efetivas no tratamento das fraturas experimentais do rádio e ulna de cães.

Cão; fratura; placas de aço inoxidável 316 L


A long-term study was carried out for evaluating 316L stainless steel plates with different types of finish used in the repair of experimetnal radial and ulnar dyaphisial fractures in dogs and the possible interference of this reaction in bone consolidation. Semi-finished, polished, blasted with glass microbeads and passivated plates were applied to the distal epiphysis of the radius of anesthetized dogs. Twelve animals were divided into two groups, GI (six dogs) and GII (six dogs), which underwent osteosynthesis (OS) in both bones, after bilateral radial and ulnar osteotomy, totaling 24 procedures. The clinical and radiographic evolution of the regions that received the implant was studied at 30, 60, 90, 180, 240 and 360 days after OS. The animals from GI were killed at 180 days and those from GII at 360 days for histopathological analysis of the bones at the implant region (optical and electronic-scanning microscopy) and to study corrosion on the metallic implants, through chemical and metallographic analysis (optical and eletronic-scanning microscopy and scattered-energy spectroscopy). Limb function was recovered 24h after surgery. Upon X-ray examination, bone consolidation was observed in all animals. Both in macroscopic and microscopically, no signs of metallic corrosion were observed, except for one passivated plate implanted in one animal of GII, in which the phenomenon was observed through optical and electronic-scanning microscopy. This study allows to conclude that 316L stainless steel plates, regardless of the surface treatment, did not undergo corrosion or adverse reactions and were effective in the treatment of experimental radial and ulnar fractures in dogs.

Dog; fracture; stainless steel plate 316 L


Placas de aço inoxidável 316L aplicadas no reparo de fratura experimental diafisária do rádio e ulna de cães

[Reparing radial and ulnar diaphysial experimental fracture of dogs employing stainless steel plates 316L]

F.B.J. Brasil1, J.G. Padilha Filho1*, A.C. Guastaldi2, I. Ramires2, M.B. Castro3

1Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias –UNESP – Câmpus de Jaboticabal

Via de acesso Prof. Paulo Donato Castelane s/n

14884-900 – Jaboticabal-SP

2Departamento de Físico – Química – UNESP – Campus de Araraquara

3Universidade de Franca -Unifran

*Autor para correspondência

E-mail: padilha@fcav.unesp.br

RESUMO

O objetivo do presente trabalho foi o de estudar a resistência à corrosão em placas de aço inoxidável 316L, com diferentes tipos de acabamento e tratamento superficial, e a possível interferência dessa reação corrosiva na consolidação óssea. Utilizaram-se placas semi-acabadas, polidas, tratadas com jatos de microesferas de vidro e passivadas, as quais foram aplicadas na epífise distal do rádio de cães. Foram utilizados 12 animais, divididos em dois grupos, nos quais, após osteotomia bilateral do rádio e ulna, foram realizadas osteossínteses do rádio, totalizando 24 procedimentos. Avaliou-se a evolução clínica e radiográfica das regiões que receberam os implantes aos 30, 60, 90, 180, 240 e 360 dias. Os animais do grupo 1 (GI) foram sacrificados aos 180 dias e os do GII aos 360 dias para estudo histológico e de microscopia eletrônica de varredura do local da osteotomia sob a região dos implantes metálicos e para estudo da resistência à corrosão no organismo, pelos implantes metálicos, por meio de análises química e metalográfica (microscopia óptica e eletrônica de varredura e espectroscopia de espalhamento de energia por raios X). Os animais recuperaram a função dos membros operados 24 horas após a cirurgia. Radiograficamente, verificou-se a consolidação óssea em todos os animais. Macro e microscopicamente não foram observados sinais de corrosão nos implantes metálicos, exceto em uma placa passivada, aplicada no rádio esquerdo de um animal, na qual a corrosão foi detectada pela microscopia óptica e eletrônica de varredura. Este estudo permite concluir que as placas de aço inoxidável 316L, independente do acabamento superficial a que foram submetidas, não sofreram corrosão ou reações adversas e foram efetivas no tratamento das fraturas experimentais do rádio e ulna de cães.

Palavras chave: Cão, fratura, placas de aço inoxidável 316 L

ABSTRACT

A long-term study was carried out for evaluating 316L stainless steel plates with different types of finish used in the repair of experimetnal radial and ulnar dyaphisial fractures in dogs and the possible interference of this reaction in bone consolidation. Semi-finished, polished, blasted with glass microbeads and passivated plates were applied to the distal epiphysis of the radius of anesthetized dogs. Twelve animals were divided into two groups, GI (six dogs) and GII (six dogs), which underwent osteosynthesis (OS) in both bones, after bilateral radial and ulnar osteotomy, totaling 24 procedures. The clinical and radiographic evolution of the regions that received the implant was studied at 30, 60, 90, 180, 240 and 360 days after OS. The animals from GI were killed at 180 days and those from GII at 360 days for histopathological analysis of the bones at the implant region (optical and electronic-scanning microscopy) and to study corrosion on the metallic implants, through chemical and metallographic analysis (optical and eletronic-scanning microscopy and scattered-energy spectroscopy). Limb function was recovered 24h after surgery. Upon X-ray examination, bone consolidation was observed in all animals. Both in macroscopic and microscopically, no signs of metallic corrosion were observed, except for one passivated plate implanted in one animal of GII, in which the phenomenon was observed through optical and electronic-scanning microscopy. This study allows to conclude that 316L stainless steel plates, regardless of the surface treatment, did not undergo corrosion or adverse reactions and were effective in the treatment of experimental radial and ulnar fractures in dogs.

Keywords: Dog, fracture, stainless steel plate 316 L

INTRODUÇAO

O alto índice de fraturas do terço distal de rádio e ulna faz com que elas sejam a terceira forma mais comum de fraturas sofridas pelos cães (Summer-Smith, 1970).

Como tratamento dessas fraturas estão disponíveis várias alternativas, divididas em técnicas conservativas (fechadas) e cirúrgicas (abertas). A alternativa conservadora deveria ser prioritária, pois impede agressão ao organismo, produz consolidação mais estável, evita uma segunda intervenção cirúrgica para remoção de implantes metálicos e é menos onerosa. Além disso, causa baixa incidência de osteomielite quando comparada com os tratamentos abertos (Allgöwer & Spiegel, 1979).

Dentre as opções cirúrgicas, existem vários métodos a se escolher, que variam desde o uso de pinos intramedulares até o emprego de parafusos, cerclagem, hemicerclagem, utilização de placas de fixação rígida e outros. Fixações rígidas metálicas ocasionalmente são aceitas como o melhor método para estabelecer a união óssea, quando o tratamento fechado é passível de risco (Burstein & Frankel,1971).

Com o advento da osteossíntese de compressão o tratamento cirúrgico das fraturas recebeu um grande impulso nas últimas décadas. Perren et al. (1969) demonstraram consolidação óssea primária, após fixação por placas de compressão, em osteotomias transversais no terço médio da tíbia de carneiros. Os autores não observaram necrose por pressão no local da osteotomia ou instabilidade da fixação após 12 semanas de pós-operatório.

O sistema mais avançado da "dynamic compression plate" (DCP) foi desenvolvido pelo grupo ASIF (Association for the Study of Internal Fixation) e pelo AO (Arbeitsgemein-schaft für Osteosynthesefragen) e patenteado pela Synthes, no qual o princípio básico são os parafusos com cabeças semi-esféricas, colocados em encaixes especiais excêntricos. Ao se realizar o aperto do parafuso, sua cabeça esférica desliza em direção ao centro da placa, até que a parte mais profunda do orifício seja alcançada, conseqüentemente o fragmento ósseo, no qual o parafuso penetra, é deslocado ao mesmo tempo e na mesma direção, promovendo assim a compressão interfragmentária, pelo parafusamento alternado, em cada lado da linha de fratura. Os orifícios no osso são feitos através de guias de perfuração chamados de neutro e excêntrico. O guia de sobrecarga é inserido nos oríficios da placa próximos à linha de fratura e o guia neutro é colocado nos orifícios seguintes (Müller, 1963; Allgöwer et al., 1969; Perren et al., 1969).

Os principais metais usados como implantes na rotina ortopédica são o aço inoxidável 316L (baixo teor de carbono), ligas de cobalto-cromo, titânio e sua ligas titânio-6 alumínio-4 vanádio (Ti-6Al-4V) e com menos freqüência, as ligas de tântalo e a multifase de cobalto-níquel (MP35N). De todo o material feito para implante, 75% é feito de aço inoxidável 316L AISI (American Iron and Steel Institute) e usado como implante temporário; 20% das ligas de cobalto-cromo são usadas como implante permanente e 5% do titânio e suas ligas, tântalo, utilizadas com pouca freqüência. Em face de seus custos, são usadas na confecção de fios de sutura, placas de compressão, parafusos, implantes articulares e odontológicos (Fraker & Ruff, 1977).

O aço 316L AISI é o que possui o mais baixo conteúdo de carbono em sua composição, diminuindo a reação com oxigênio, sendo o mais aceito para fabricação de implantes. Sua composição varia ao redor de 17-20% de cromo, 10-15% de níquel, 2-3% de molibdênio, 0,03-0,08% de carbono, 0,03% de fósforo, 0,75% de silício max., 2,0% de manganês max. e 0,03 de enxofre. O elemento ferro é considerado balanço para completar 100%, e a resistência à corrosão dos aços inoxidáveis é diretamente influenciada por esses elementos (Cahoon,1973; Pavón, 1975; Fraker, 1987).

A expressão inoxidável pode dar a idéia de um material indestrutível, mesmo quando submetido às mais violentas reações corrosivas. A denominação advém do fato de que talheres fabricados com esse material não se mancharem ao cortar limão ou substâncias corrosivas (Pavón, 1975). Entretanto, esses metais são expostos a constantes situações corrosivas quando implantados em pacientes humanos e animais (Laing & Pittsburg, 1958).

Em termos gerais todos os aços são passíveis de sofrer corrosão, e sua composição química é fundamental para diminuir esse tipo de reação, assim como a formação de uma película protetora de óxido de cromo que é formada para proteger o material do meio que o cerca, mediante submersão do implante em uma solução de ácido nítrico 20-40 v%, 600C, durante 30 minutos (Pavón, 1975).

Quando a corrosão acontece, a degradação do implante resulta em certo grau de liberação de íons do metal para os tecidos circunvizinhos ou órgãos, e cromo e níquel são os principais elementos liberados e têm sido incriminados como substâncias alergênicas ou oncogênicas (Ferguson et al., 1960; Smethurst & Waterhouse, 1978; Mayor et al., 1980; Marek & Treharne, 1982).

A corrosão pode ocorrer em todos os tipos de aço inoxidável quando eles permanecem por vários anos implantados. Seus efeitos no organismo podem ser localizados, ao redor do implante, onde se observam reações fibróticas decorrentes de material estranho ou restos de aço. Para evitar esses problemas, Black (1988) preconiza que a remoção do implante deva ocorrer em torno de um a dois anos em pacientes humanos jovens.

Na manufatura de placas e parafusos, o aço é submetido a intenso acabamento e tratamento superficial, começando pelo polimento e culminando com o processo de passivação, no qual se formam, por esse processo, filmes protetores na superfície do implante, com intuito de retardar as reações corrosivas, uma vez que no ser humano o implante pode permanecer por várias décadas.

Evidentemente todo esse esmero torna o produto final oneroso, influenciando o custo final das cirurgias ortopédicas veterinárias em hospitais-escola.

Assim, em 1994 iniciaram-se estudos com o objetivo de se utilizar placas metálicas de baixo custo, utilizando-se o aço inoxidável 304, liga de menor preço, porém menos resistente a reações de corrosão. Observou-se por estudo experimental que as placas ao serem retiradas após 150 dias não apresentavam indício de processo corrosivo.

Com base nessas observações, e em conjunto com especialistas em corrosão do Instituto de Química da UNESP, Câmpus de Araraquara – SP e com conceituada empresa fabricante de material ortopédico (BIOMECÂNICA, Jaú – SP), decidiu-se estudar o comportamento de placas de aço inoxidável 316L em quatro diferentes tipos de acabamento e tratamento superficial, quanto a resistência à corrosão e a obtenção de implante metálico de qualidade, a baixo custo.

MATERIAL E MÉTODO

Foram utilizados 12 cães machos e fêmeas, sem raça definida, adultos, porte médio, pesando entre 10 e 15kg, fornecidos pelo canil de experimentação do Hospital Veterinário da Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias - UNESP, Câmpus de Jaboticabal. Eles foram avaliados clinicamente para constatar higidez. Posteriormente, foram identificados, vacinados contra cinomose, hepatite canina, leptospirose e raiva, vermifugados e mantidos em canis individuais. Os animais foram divididos em dois grupos. No primeiro (G1) eles foram sacrificados aos 180 dias, e no segundo (G2) aos 365 dias.

Empregaram-se placas de compressão dinâmica com cinco furos (6cm ´ 1cm ´ 0,3cm), para parafusos de 3,5mm, adequadas para o porte dos animais empregados no experimento, divididas da seguinte maneira: placa semi-acabada (bruta), placa polida, placa "jateada" (tratada com jatos de microestefas) e placa passivada.

A abordagem cirúrgica foi feita no rádio e na ulna obedecendo à técnica descrita por Piermattei (1993). A placa semi-acabada foi aplicada no rádio direito e a placa polida no rádio esquerdo dos animais 1, 3 e 5 do G1. Os animais 2, 4 e 6 do mesmo grupo receberam no rádio direito a placa "jateada" e no esquerdo a placa passivada. A mesma distribuição das placas nos respectivos rádios foi realizada nos animais do grupo G2.

As análises radiográficas foram feitas aos 30, 60, 90, 180, 240 e 360 dias. No GI o exame foi realizado até 180 dias para coleta do material (ossos e placas). Todos os rádios foram radiografados na posição mediolateral e evitou-se a projeção anteroposterior devido a placa recobrir a linha de osteotomia.

O material colhido nos vários tempos (180 e 360 dias) foi processado de acordo com a rotina histológica para tecido ósseo. O rádio foi seccionado transversalmente entre os orifícios centrais e longitudinalmente no sentido anteroposterior.

Duas amostras do material ósseo de cada grupo foram colhidas para exame por microscopia eletrônica de varredura.

Após a remoção, todos os implantes metálicos passaram por análise química e análise metalográfica, na qual se observou a estrutura metálica, microscopia óptica (MO) e eletrônica de varredura (MEV) das superfícies das placas. Durante a MEV, realizou-se análise qualitativa dos elementos químicos do aço usado como implante por meio de espectroscopia de energia dispersiva (EDS).

RESULTADOS

Todos os animais apresentaram bom estado geral, exceto um animal do G2 que aos cinco dias de pós-operatório apresentou claudicação do membro operado e sensibilidade à palpação, que perduraram por 10 dias. No início dos sintomas constataram-se, por meio de exame radiográfico, sinais de osteomielite. Esse problema foi tratado imediatamente com antibioticoterapia adequada e específica, eliminando a sintomatologia clínica, alcançando a cura do processo. Nos outros animais de ambos os grupos não foram observadas alterações sistêmicas ou locais que pudessem estar associadas a insucessos cirúrgicos. Os animais apoiaram e deambularam com os membros operados no primeiro dia de pós-operatório.

Os aspectos radiográficos obtidos foram semelhantes para os dois grupos até os 180 dias. No entanto, houve discreta mudança no padrão radiográfico nas avaliações posteriores, exceção apenas de um animal do grupo G2, no qual foram observados sinais de osteomielite no rádio direito, que culminou com a eliminação de um parafuso proximal, posicionamento incorreto dos demais parafusos, consolidação óssea tardia e discreto desvio do eixo ósseo.

O estudo radiológico do pós-operatório imediato em todos os animais mostrou que as placas estavam bem posicionadas e as linhas de osteotomia estavam coaptadas. Aos 30 dias, os implantes encontravam-se bem posicionados, com manutenção do eixo ósseo, ausência de reação periosteal e endosteal, presença de linha radioluscente representada pela osteotomia. Aos 60 dias, os implantes permaneceram bem posicionados, com ausência de reação periosteal e endosteal, ausência de calo ósseo e diminuição da visualização da linha de osteotomia em conseqüência do início da união das corticais. Aos 90 dias, a linha de osteotomia mostrava-se imperceptível e observou-se união direta das corticais opostas à placa sem presença de calo exuberante. Aos 180 dias, verificou-se desaparecimento das linhas de osteotomias e união completa das corticais oposta à placa. Aos 240 e 360 dias, as imagens radiográficas eram semelhantes e observou-se união completa das corticais como resultado da remodelação óssea.

Após incisão da pele para remoção da placa, observou-se que no rádio esquerdo de um animal do G2 o implante estava recoberto por material granuloso semelhante a grânulos de corrosão, de coloração escura, que recobria principalmente as bordas da placa. Esse mesmo material recobria a superfície óssea, tornando-a enegrecida. A consolidação óssea, porém, estava normal. Relembrando, tratava-se de uma placa passivada. Em relação aos outros animais, verificou-se que os implantes aplicados permaneceram estáveis. Tecido fibroso recobria parcialmente as superfícies das placas e notava-se a presença de neoformações ósseas ao redor das placas, não se observando sinais de corrosão após as remoções.

O exame histológico dos tecidos ósseos desmineralizados mostrou aspectos semelhantes em termos de consolidação aos 180 e 360 dias, observando-se união óssea em todos os cortes histológicos.

Aos 180 dias, nas corticais sob todas as placas observou-se predomínio da atividade osteoclástica, caracterizada por discreta reabsorção óssea, e apenas em um animal notou-se moderada reabsorção na cortical sob a placa polida.

Nas corticais contralaterais, no mesmo período, observou-se menor atividade osteoclástica e conseqüentemente ausência da reabsorção óssea. Porém, em dois animais do G1, no fragmento correspondente ao rádio direito, onde foi implantada a placa semi-acabada, e no fragmento correspondente ao rádio esquerdo, onde foi implantada a placa polida, verificou-se discreta reabsorção em ambas as corticais. No período de 180 dias não se observou calo ósseo.

Aos 360 dias, nas corticais sob as placas foi notada ausência de reabsorção óssea, observando-se osteócitos em grande quantidade e discreta reabsorção em três animais, no rádio direito que estava sob as placas semi-acabada e "jateada".

Fragmentos ósseos semelhantes aos encaminhados para exame histológico foram colhidos aleatoriamente de dois animais de ambos os grupos. As corticais ósseas apresentaram-se consolidadas e, conseqüentemente, com ausência da linha de osteotomia.

Segundo a análise química apresentada e comparando-se com as normas pré-estabelecidas pelo AISI, as placas e parafusos eram de aço inoxidável 316L, e as pequenas variações dos elementos químicos encontrados estavam dentro dos limites estabelecidos pelas normas do referido instituto, confirmando a não corrosão desse metal.

A análise metalográfica obtida por microscopia óptica demonstra a distribuição, a quantidade e o tamanho das inclusões ou dos grãos que formam o aço. As estruturas das placas eram típicas de aço inoxidável austenítico e sua forma estrutural apresentou-se com grãos poligonais irregulares.

As superfícies das placas utilizadas neste experimento não apresentaram sinais de corrosão, exceção apenas na placa passivada implantada em um animal do grupo GII que mostrou sua superfície atacada em excesso, demonstrando os contornos de grãos.

DISCUSSÃO

Em relação à técnica cirúrgica empregada, optou-se por dois acessos cirúrgicos simultâneos no rádio, pois assim pôde-se avaliar um número satisfatório de placas com vários acabamentos, utilizando-se poucos animais.

Pela técnica empregada foi observado que em 24 horas os animais apresentaram apoio e função dos membros, semelhante ao observado por Anderson (1965), quando realizou osteotomia transversa bilateral de fêmures de cães para verificar o comportamento de placas com e sem compressão interfragmentar. As mesmas observações foram feitas por Olerud & Lillieström (1968) quando realizaram osteotomia de ambos os rádios em seis cães, porém com intervalo de um mês entre uma intervenção e outra, para avaliar a consolidação óssea mediante osteossíntese por compressão.

A osteomielite observada em um animal do G2 deveu-se talvez ao tempo prolongado de exposição cirúrgica. Esse tipo de osteomielite aguda aparece em cinco dias, principalmente quando ocorre reparação cirúrgica por tempo prolongado (Boudrieau, 1992). De acordo com Allgöwer & Spiegel (1979), o tratamento cirúrgico das fraturas contribui em 7% dos casos de infecções ósseas quando comparados com tratamentos fechados.

Avaliações radiográficas que seguiram o pós-operatório imediato revelaram consolidação óssea primária em decorrência da estabilização da linha de osteotomia, pois não se observou formação de calo ósseo exuberante no local da fratura experimental. Além da linha de osteotomia ser visível aos 30, 60 e 90 ela desapareceu totalmente aos 180 dias, semelhante às observações feitas por Perren (1996).

De acordo com Lippuner (1992), Gautier et al. (1995) e Schatzker (1995), quanto maior a superfície de contato entre placa e osso maior será a incidência de distúrbio vascular na cortical óssea e, conseqüentemente, maior reabsorção óssea, observada histologicamente após quatro semanas de remoção das placas metálicas. No presente trabalho observou-se, histologicamente, que aos 180 dias todas as corticais, principalmente sob a placa, apresentaram discreta reabsorção atribuída ao distúrbio vascular iniciado pela osteotomia e remoção do periósteo e agravada pela compressão da placa sobre o osso, confirmando as observações dos autores citados anteriormente.

Porém aos 360 dias a análise histológica evidenciou discreta reabsorção no rádio direito de três animais, pelo fato de haver compressão circulatória da superfície da placa sobre a superfície da cortical e ausência de reabsorção nos outros ossos em decorrência da remodelação haversiana, conforme observado por Perren et al. (1969). Em ambos os grupos ocorreu união óssea, confirmando as observações da análise radiográfica. A microscopia eletrônica de varredura dos fragmentos ósseos reforçou as observações feitas referentes à consolidação óssea na análise histológica.

Os implantes metálicos utilizados foram confirmados por meio da composição química como sendo aço inoxidável 316L e apresentaram biocompatibilidade durante o período de observação, pois os elementos químicos que compõem esse aço estavam todos presentes. As pequenas variações da composição química do aço foram as mesmas observados por Uhthoff et al. (1981) e por Barbeiro et al. (1994), os quais implantaram fios de aço inoxidável 316L na musculatura de ratos por 120 dias. A espectroscopia de energia dispersiva realizada forneceu observação qualitativa dos elementos químicos do aço, reforçando os resultados da análise química.

Após a remoção de todas as placas pôde-se verificar pela microscopia óptica e eletrônica de varredura que a placa passivada implantada em um animal do G2 sofreu corrosão. O aparecimento dessa reação deveu-se talvez ao fato de ter sido implantada já com problemas, possivelmente por falha de fabricação, como a submersão desse metal por tempo prolongado na solução ácida utilizada no processo de passivação. Chegou-se a esta hipótese pelo fato de as outras placas passivadas não terem apresentado corrosão. Entretanto, conforme informa Pávon (1975), a película protetora formada pela passivação pode ser quebrada por ranhuras provocadas pelo material cirúrgico, torcedura da placa, estampa de marca do fabricante, número de série e falhas de fabricação, favorecendo o surgimento da corrosão.

Neste estudo as avaliações macro e microscópicas não revelaram sinais de corrosão nas outras placas analisadas, independente do tipo de acabamento a que foram submetidas. Para melhor avaliação da corrosão, talvez seja interessante dados com tempos mais longos.

Apesar de as reações corrosivas surtirem efeito no organismo a longo prazo, ao término deste estudo pôde-se observar que a avaliação radiográfica demonstrou que os ossos estavam consolidados, justificando a remoção do implante, pois ele se apresentava sem função, respeitando as recomendações de Black (1988), que preconiza a remoção dos implantes metálicos de um a dois anos, principalmente quando se refere ao aço 316 L, por ser mais susceptível à corrosão, quando se realizam comparações com ligas de titânio.

CONCLUSÕES

A corrosão observada na placa implantada em um animal do grupo G2 não interferiu na consolidação do osso e, independentemente do tipo de acabamento a que foram submetidas as outras placas, elas não demonstraram sinais de corrosão, avaliada pelas análises macro e microscópica no período estudado. Isto possibilita diminuir os custos desse implante metálico, pois os acabamentos que são aplicados na superfície desse aço elevam o preço do produto final.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    26 Jun 2001
  • Data do Fascículo
    Fev 2001

Histórico

  • Recebido
    28 Set 2000
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