Open-access Efeito dos taninos condensados de forrageiras nativas do semi-árido nordestino sobre o crescimento e atividade celulolítica de Ruminococcus flavefaciens FD1

Effects of condensed tannins from northeastern semi-arid shrubs on growth and cellulolytic activity of Ruminococcus flavefaciens FD1

Resumos

Avaliaram-se o crescimento da população, a atividade in vitro da enzima 1,4-<FONT FACE=Symbol>b-</FONT>endoglucanase e a taxa de digestão de celulose em culturas de Ruminococcus flavefaciens FD1 na presença de 50, 100, 200 e 400µg/ml de taninos purificado das leguminosas Mimosa hostilis (Jurema Preta), Mimosa caesalpinifolia (Sabiá) e Bauhinia cheilantha (Mororó). O crescimento bacteriano, a atividade da endoglucanase e a digestão de celulose foram fortemente inibidos pela presença dos taninos condensados purificados das três espécies, entretanto, a intensidade da inibição foi variável em função da espécie da leguminosa e da concentração de tanino.

rúmen; atividade celulolítica; celulase; bacteria proantocianidina


The effects of tannin levels in three Brazilian browse legumes Mimosa hostilis (Jurema Preta), Mimosa caesalpinifolia (Sabiá) e Bauhinia cheilantha (Mororó) on growth and endoglucanase activity of Ruminococcus flavefaciens FD1 were evaluated. Isolated cultures of Ruminococcus flavefaciens FD1 were used to assess cellular growth, 1, 4-beta-endoglucanase activity, and cellulose digestion in the presence of 50, 100, 200 and 400µg/ml of purified tannins from the three legume species. Growth of FD1, 1, 4-beta-endoglucanase activity and cellulose digestion were highly inhibited by the presence of purified tannins of the three legume species. However, the intensity of inhibition varied in according to the legume species and tannin concentration.

rumen; cellulose digestion; cellulase; ruminal bacteria; proantocyanidin


ZOOTECNIA E TECNOLOGIA E INSPEÇÃO DE PRODUTOS DE ORIGEM ANIMAL

Efeito dos taninos condensados de forrageiras nativas do semi-árido nordestino sobre o crescimento e atividade celulolítica de Ruminococcus flavefaciens FD1

Effects of condensed tannins from northeastern semi-arid shrubs on growth and cellulolytic activity of Ruminococcus flavefaciens FD1

P.M. Guimarães-BeelenI; T.T. BerchielliII, IV; R. BuddingtonIII; R. BeelenI

ICentro de Ciências Agrárias, UFAL Campus Delza Jataí 57160-000 – Rio Largo - AL

IIUniversidade Estadual Paulista - Jaboticabal, SP

IIIMississippi State University - MS

IVPesquisador - CNPq

RESUMO

Avaliaram-se o crescimento da população, a atividade in vitro da enzima 1,4-b-endoglucanase e a taxa de digestão de celulose em culturas de Ruminococcus flavefaciens FD1 na presença de 50, 100, 200 e 400µg/ml de taninos purificado das leguminosas Mimosa hostilis (Jurema Preta), Mimosa caesalpinifolia (Sabiá) e Bauhinia cheilantha (Mororó). O crescimento bacteriano, a atividade da endoglucanase e a digestão de celulose foram fortemente inibidos pela presença dos taninos condensados purificados das três espécies, entretanto, a intensidade da inibição foi variável em função da espécie da leguminosa e da concentração de tanino.

Palavras-chave: rúmen, atividade celulolítica, celulase, bacteria proantocianidina

ABSTRACT

The effects of tannin levels in three Brazilian browse legumes Mimosa hostilis (Jurema Preta), Mimosa caesalpinifolia (Sabiá) e Bauhinia cheilantha (Mororó) on growth and endoglucanase activity of Ruminococcus flavefaciens FD1 were evaluated. Isolated cultures of Ruminococcus flavefaciens FD1 were used to assess cellular growth, 1, 4-b-endoglucanase activity, and cellulose digestion in the presence of 50, 100, 200 and 400µg/ml of purified tannins from the three legume species. Growth of FD1, 1, 4-b-endoglucanase activity and cellulose digestion were highly inhibited by the presence of purified tannins of the three legume species. However, the intensity of inhibition varied in according to the legume species and tannin concentration.

Keywords: rumen, cellulose digestion, cellulase, ruminal bacteria, proantocyanidin

INTRODUÇÃO

As leguminosas arbóreas e arbustivas constituem o grupo forrageiro mais importante da região semi-árida, compondo até 90% da dieta dos ruminantes, principalmente durante os períodos críticos de seca (Peter, 1992). Essas plantas, a exemplo da maioria das leguminosas tropicais, apresentam significativos teores de taninos totais (Vasconcelos, 1997; Araújo Filho et al., 1998).

Os taninos, polímeros de compostos fenólicos resultantes do metabolismo secundário dos vegetais, constituem um meio de defesa contra bactérias, fungos, vírus, estresse ambiental e ingestão por herbívoros (Giner-Chaves, 1996).

A presença de taninos na dieta diminui a digestibilidade dos carboidratos fibrosos, levando a decréscimo na produção de ácidos graxos voláteis, de gases e do valor energético dos alimentos (Kumar e Singh, 1984). Esses efeitos são atribuídos às ligações dos taninos solúveis com componentes da parede celular, tendo como resultado complexos indigestíveis ou inacessíveis às enzimas bacterianas (Cano-Poloche, 1993), à redução da atividade enzimática, com inativação de importantes enzimas microbianas, ou ainda a uma modificação da microflora, devido à ação bacteriostática ou bactericida do tanino (Kumar e Vaithiyanathan, 1990; Nelson et al., 1997; Mcsweeney et al., 2001).

Os estudos do efeito das leguminosas tropicais ricas em taninos sobre os microrganismos ruminais apresentam resultados divergentes, atribuídos principalmente às variações de sua estrutura (peso molecular e composição monomérica).

Estudos in situ demonstraram que as atividades de urease, carboximetilcelulase, glutamato desidrogenase e alanina aminotrasferase diminuíram em dietas ricas em tanino (folhas de Quercus incana) se comparadas com dietas pobres em taninos (Makkar et al., 1988). Bae et al. (1993) relataram que taninos de Lotus corniculatus inibem a atividade de endoglucanases em culturas de Fibrobacter succinogenes S85 a concentrações tão baixas quanto 25µg/ml. Jones et al. (1994) observaram que taninos de Onobrychis viciifolia inibiram o crescimento e a capacidade proteolítica de Butyrivibrio fibrisolvens A38 e Streptococcus bovis 45 S1, mas tiveram pouco efeito sobre Provotella ruminicola B14 e Ruminobacter amylophilus WP225.

Nelson et al. (1997), ao estudarem as interações entre três fontes de taninos purificados e cinco tipos de bactérias ruminais, observaram variações entre os tipos bacterianos quanto à resistência aos taninos e entre as fontes de taninos quanto à quantidade requerida para a inibição do crescimento bacteriano.

Considerando a falta de estudos que investiguem os efeitos dos taninos presentes nas leguminosas do semi-árido nordestino sobre o crescimento de bactérias ruminais e sobre a atividade de enzimas bacterianas, o presente trabalho teve por objetivo: determinar o efeito dos taninos condensados purificados das espécies Mimosa hostilis (Jurema Preta), Mimosa caesalpinifolia (Sabiá) e Bauhinia cheilantha (Mororó) sobre o crescimento da bactéria Ruminococcus flavefaciens FD1, sobre a atividade da enzima 1, 4-b-endoglucanase e sobre a digestão de celulose.

MATERIAL E MÉTODOS

A cultura purificada de Ruminococcus flavefaciens FD1 foi gentilmente cedida pelo Dr. Herb Strobel da University of Kentucky, EUA.

As bactérias permaneceram em tubos1 contendo o meio de cultura descrito por Scott e Dehority (1965) e modificado por Weimer et al. (1991), denominado doravante de meio seletivo celulose, cujas principais modificações foram a substituição de caseína hidrolisada e celobiose por fluído clarificado de rúmen (2,5%, v/v) e celulose microcristalina2, adicionada na proporção de 100mg para 10ml de meio. A retirada da caseína hidrolisada foi necessária para evitar a formação de precipitados após a adição dos taninos condensados (Jones et al., 1994). A celulose substituiu a celobiose como fonte de carbono para evidenciar o caráter de adesão ao substrato insolúvel da cultura.

As culturas cresceram a 39ºC e foram transferidas para novos tubos contendo meio seletivo celulose a cada três dias por um período de duas semanas antes dos experimentos com taninos condensados. As técnicas anaeróbicas de Hungate (1950), modificadas por Bryant (1972), foram utilizadas durante o experimento.

Os taninos das espécies estudadas foram purificados de acordo com a metodologia descrita por Terrill et al. (1992). A partir de amostras de, aproximadamente, 20g de folhas liofilizadas, os taninos condensados, extraídos com solução de acetona a 70% e ácido ascórbico a 0,1%, foram purificados em coluna de 25 x 5cm contendo 60ml de Sephadex LH-20 em suspensão com metanol a 50%, recuperados da coluna com acetona a 70%, liofilizados e armazenados a 4°C ao abrigo da luz até o momento do seu uso.

No momento dos ensaios, os taninos purificados foram dissolvidos em tampão fosfato (pH 6) de forma que a adição de 0,5ml a 9,5ml do meio de cultura resultasse em concentrações de 0, 50, 100, 200 e 400µg/ml de meio.

Para o estudo do crescimento bacteriano, 0,5ml de FD1 foi inoculado em duplicata, em 9ml do meio seletivo celulose contendo 1µl de 3H-timidina por mililitro de meio. Após 8h de crescimento, 0,5ml das respectivas diluições dos diferentes taninos foram adicionadas, após filtro-esterilização (22µm), ao meio visando atingir as concentrações de 0, 50, 100, 200 e 400µg/ml de meio.

O efeito dos níveis de tanino sobre o crescimento bacteriano foi monitorado, em duplicata, às 0, 4, 8, 12, 24 e 48h de incubação; 100µl da cultura, coletados por meio de seringas hipodérmicas, adicionados a 3ml de TCA, foram então filtradas em filtro de fibra de vidro3 (0,45µm). Cada filtro, lavado três vezes com metanol para remover toda a timidina aderida, foi colocado em um frasco de vidro, seco por 15min em estufa a 60ºC e adicionados de cintilante4.

A radioatividade, correspondente ao crescimento bacteriano (incorporação da timidina pelas bactérias durante a divisão celular) foi medida em desintegração por minutos (DPM) usando contador de cintilação líquida. A atividade radioativa no tempo zero hora foi utilizada como branco para corrigir a radioatividade obtida pela timidina marcada não incorporada ao DNA bacteriano, porém não removida nas lavagens com metanol.

O protocolo de cultivo e as concentrações dos taninos utilizados no estudo da influência dos taninos sobre a atividade de 1, 4-b-endoglucanase produzida pela bactéria FD1 foram os mesmos do estudo do crescimento bacteriano, excluindo-se a adição de 3H-timidina ao meio de cultura.

Após 48h de incubação a 39ºC, as culturas foram congeladas a -80ºC por 2h e, em seguida, as enzimas foram solubilizadas em tratamento ultra-sônico5 , sob gelo, por 30seg a 70% out put e recuperadas por centrifugação a 15.000 x g por 15min a 4ºC (Michalet-Doreau et al., 2001).

O ensaio enzimático seguiu o protocolo descrito por Megazyme (2000). O tampão acetado de sódio pH 4,6 foi trocado pelo tampão fosfato pH 6 com o objetivo de se aproximar das condições ruminais. As quantidades de reagentes e substrato foram reduzidas proporcionalmente a microlitos, a fim de possibilitar a utilização de micro-placas de 96 poços.

Para o ensaio, 100µl do sobrenadante (solução contendo enzimas), adicionado a 100µl da solução de substrato6 em tampão fosfato pH 6 foi homogeneizado em vortex e incubado em banho-maria a 39ºC por 10min. A reação foi paralisada e o substrato de alto peso molecular precipitado pela adição de 500ml de solução precipitante (200ml de solução de acetato de zinco (4g) e acetato de sódio trihidratado (40g) pH 5, em 800ml de etanol a 95% v/v). Após homogeneização, os microtubos contendo as reações permaneceram em temperatura ambiente por 10min e depois foram centrifugados a 1000 x g por 10min. Assim, 100µl do sobrenadante foi recuperado e a absorbância lida em leitor de microplacas7 a 590nm contra o branco. O branco consistiu da adição da solução precipitadora ao substrato, antes da adição da solução enzimática.

Os resultados foram apresentados em atividade relativa da enzima na presença de diferentes concentrações de taninos, comparadas à atividade da enzima na ausência de tanino, considerada 100%. O protocolo de cultivo e as concentrações dos taninos utilizados no estudo da influência dos taninos sobre a digestão de celulose pela bactéria FD1 foram os mesmos do estudo atividade enzimática.

Após 48h de incubação a 39ºC, as culturas foram filtradas em filtro de fibra de vidro8 pré-secos e pesados, lavadas com tampão fosfato pH 6 e secas em estufa a 105ºC por 24h.

Os filtros foram pesados, e a digestão da celulose foi estimada, subtraindo-se o peso resíduo do peso da celulose incubada (100mg).

RESULTADOS

O resultado do efeito dos níveis de taninos condensados purificados e dos tempos de incubação sobre o crescimento da bactéria Ruminococcus flavefaciens FD1, avaliado pelo nível de radioatividade, é apresentado na Fig.1.


A exposição de culturas de Ruminococcus flavefaciens aos taninos de Jurema Preta e Mororó inibiu drasticamente o crescimento bacteriano, que foi menos afetado pelo tanino de Sabiá, quando em baixa concentração. A concentração de 50µg/ml pelo tanino de Jurema Preta e Mororó foi suficiente para reduzir o crescimento em 80,3 e 78,0%, respectivamente, contra apenas 24,0% para o tanino de Sabiá. Contudo, observou-se intensa inibição do crescimento celular pelos taninos das três espécies estudadas quando em concentrações a partir de 100µg/ml.

A atividade da endoglucanase também foi fortemente inibida pela presença dos taninos purificados de todas as espécies estudadas, entretanto, a exemplo do que ocorreu com o crescimento bacteriano, a intensidade da inibição foi variável em função da espécie e da concentração de tanino no meio (Fig. 2). Todas as comparações foram feitas em relação à atividade enzimática observada no tratamento-controle (culturas crescendo em ausência de tanino).


O maior grau de inibição foi observado com o tanino de Jurema Preta, em que 400µg/ml resultaram no declínio de 96,5% da atividade da endoglucanase produzida por FD1. Porém, na concentração de 50µg/ml de tanino, a atividade celulolítica foi 17,5, 36,1 e 55,5% da atividade apresentada por culturas que cresceram na ausência de taninos das espécies Jurema Preta, Mororó e Sabiá, respectivamente. O menor grau de inibição foi observado em presença do tanino condensado de Sabiá a 50µg/ml (44,5%). Entretanto, 100µg/ml desse mesmo tanino reduziu em 81,0% a atividade da endoglucanase.

Os resultados do efeito dos taninos condensados de Jurema Preta, Sabiá e Mororó sobre a digestão da celulose por FD1 são apresentados na Fig. 3.


Provavelmente, em conseqüência da inibição do crescimento bacteriano e da atividade da endoglucanase, também foi observada redução acentuada na digestão da celulose quando em presença dos taninos condensados. Desse modo, 50µg/ml de tanino de Jurema Preta reduziu a digestão da celulose em 82,5%. A redução chegou a 97,4% quando se usou 400µg/ml do mesmo tanino. O tanino de Mororó e o de Sabiá reduziram a digestão da celulose em 66 e 50%, na concentração de 50µg/ml, porém a inibição chegou a 87 e 81%, respectivamente, na dose de 100µg/ml.

DISCUSSÃO

A maioria das pesquisas que envolveram taninos condensados foram dedicadas ao estudo das interações entre taninos e os constituintes da dieta. Pouca atenção foi dada à interação entre os taninos e os microrganismos ruminais (McSweeney et al., 2001).

Ruminococcus flavefaciens é considerada, juntamente com Fibrobacter succinogenes e Ruminococcus albus, uma das principais espécies celulolíticas do rúmen (Weimer, 1996). Elas pertencem ao grupo das bactérias que aderem firmemente ao substrato e são responsáveis por até 91% da atividade endoglucanase no rúmen (Miron et al., 2001).

A exemplo de Fibrobacter succinogenes e Ruminococcus albus (Bae et al., 1993; Nelson et al., 1997), FD1 foi fortemente inibida pela presença de taninos condensados solúveis no meio. A concentração de 50µg/ml de taninos condensados das três espécies estudadas foi capaz de reduzir a atividade da endoglucanase em, pelo menos, 44,5%.

O crescimento celular foi ainda mais influenciado pelos taninos de Jurema Preta e Mororó. Contudo, a total ausência de crescimento de Ruminococcus flavefaciens FD1 em presença de 200µg/ml de tanino de Jurema Preta, contrastando com o relativo crescimento celular quando incubado em meio contendo 400µg/ml de tanino de Sabiá indicou que houve diferenças, provavelmente na composição dos taninos, que determinaram o poder bacteriostático deles sobre essa espécie.

Os taninos são geralmente tidos como inibitórios para crescimento dos microrganismos, porém o mecanismo envolvido ainda não é bem conhecido. Nas bactérias, o retardo do crescimento tem sido associado à formação de complexos entre os taninos e a parede celular das bactérias ou enzimas extracelulares secretadas, fazendo com que ocorra a inibição do transporte de nutrientes para a célula (McSweeney et al., 2001). Bae et al. (1993) e Jones et al. (1994) relataram que, em presença de taninos, algumas bactérias são submetidas a modificações morfológicas tais como elongação das células, presença de grande quantidade de material extracelular e formação de microcolônias aderentes.

O comportamento da digestão da celulose foi semelhante ao do crescimento bacteriano e ao da atividade da 1, 4-b-endoglucanase. Contudo, a queda no percentual de digestão menos abrupta que a observada no crescimento bacteriano, aliada à existência de atividade enzimática a 200µg/ml, concentração que inibiu totalmente o crescimento celular no caso dos taninos de Jurema Preta e de Mororó, sugere que o efeito bacteriostático desses taninos sobre Ruminococcus flavefaciens FD1 foi mais intenso que a inativação da endoglucanase através da formação de complexos tanino-enzima.

Bae et al. (1993) observaram a existência de grande quantidade de material extracelular na superfície de Fibrobacter succinogenes S85 e a ocorrência de invaginações na superfície da celulose, onde a bactéria penetrava quando em presença de taninos. Esses fenômenos poderiam estar criando um micro-ambiente entre a superfície da bactéria e o substrato, prevenindo, assim, a inativação das enzimas bacterianas pelo tanino. Este trabalho não contemplou nenhum tipo de análise que pudesse atestar a existência de mecanismo semelhante em Ruminococcus flavefaciens, apesar de ter constatado relativa preservação da atividade endoglucanase se comparada ao crescimento celular.

A celulose é o mais abundante componente da parede celular dos vegetais e, por isso, os microrganismos celulolíticos são fundamentais na nutrição de ruminantes, que ingerem dietas à base de forragens.

As três espécies estudadas são amplamente utilizadas como forrageiras no semi-árido nordestino. Por esse motivo, a ação altamente inibitória demonstrada pelos taninos dessas plantas sobre o crescimento e a atividade enzimática de Ruminococcus flavefaciens FD1, uma das principais bactérias celulolíticas ruminais, pode estar acarretando importantes perdas nutricionais para os ruminantes que as ingerem.

As concentrações observadas para a inibição de Ruminococcus flavefaciens FD1 por esses taninos devem ser provavelmente inferiores àquelas necessárias para as condições ruminais, em razão de os taninos formarem complexos com uma série de compostos orgânicos provenientes da dieta, notadamente as proteínas, que foram excluídas do meio in vitro utilizado. Existe também a possibilidade de respostas adaptativas dos animais, como secreção de saliva rica em prolina e em amônia, dois inibidores da ação dos taninos. McSweeney et al. (2001) sugeriram que o efeito do tanino de Calliandra calothyrsus sobre a digestão ruminal foi mais ligada a formação de complexos com os nutrientes do que a inibição direta dos microrganismos ruminais.

Mesmo que os efeitos dos taninos de Jurema Preta, Sabiá e Mororó sobre Ruminococcus flavefaciens FD1 sejam menos intensos no rúmen que o observado in vitro, a população microbiana é dependente dos nutrientes, indisponíveis quando ligados a taninos, o que indica a necessidade de futuros estudos visando à redução da concentração de taninos nessas plantas.

Recebido em 12 de maio de 2004

Aceito em 7 de agosto de 2006

Apoio: CAPES - FAPESP

*Autor para correspondência (corresponding author)

E-mail: pbeelen@cca.ufpb.br

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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      15 Jan 2007
    • Data do Fascículo
      Out 2006

    Histórico

    • Recebido
      12 Maio 2004
    • Aceito
      07 Ago 2006
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