Plantas medicinais de Minas Gerais, Brasil
Telma Sueli Mesquita GrandiI; Jorge Antônio da TrindadeII; Marcio José Filardi PintoII; Liliana Lobo FerreiraIII; Agostinho Carlos CatellaIII
IProfessor Adjunto do Departamento de Botânica UFMG
IIEstudantes de Farmácia da UFMG - monitores do Depto. de Botânica - UFMG
IIIBiólogos pela UFMG. Bolsistas do CPq-UFMG
IVAgência financiadora CPq/UFMG
RESUMO
Esse trabalho foi baseado em entrevistas junto às pessoas e raizeiros que fazem uso de plantas medicinais em Minas Gerais, sudoeste do Brasil, e as comercializam, de 1983 a 1988. Tem a finalidade de preservar o conhecimento popular. Foram registradas a profissão, idade, e condição social dos entrevistados. Foram visitadas 84 cidades mineiras onde, por indicação ou doação, foram coletadas 5000 exsicatas, que foram reunidas em 84 famílias, 246 gêneros e 311 espécies, depois de examinadas e determinadas, dentro das referências mais atualizadas possíveis. Para cada espécie foram anotadas em fichas os nomes vulgares, partes usadas e indicações medicinais, e o número de vezes que foram citadas no total de entrevistas realizadas. O trabalho é cumulativo, podendo ser constantemente ampliado com a reunião e sistematização de novas informações, servindo como base para escolha das espécies a serem estudadas no campo da fitoquímica, farmacologia e parasitologia.
Palavras-chave: Plantas medicinais - uso popular - Minas Gerais.
ABSTRACT
This study is based on interviews during 1983-1988 of people who use and market medicinal plants in the state of Minas Gerais in south east on Brazil. The aim is to preserve popular local knowledge regarding the use of plants for medicinal purposes. The popular common name, the medical prescription and methods of preparation, the plant part use and the frequency with each plant was cited in the interview samples, are described for each species. The profession, age and social condition are given for each interviewee. A total of 84 cities were visited, resulting in the collection of 5000 dried herbarium specimes which have been classified into 311 species of 246 genera and 84 families, according to the most recent taxonomic nomenclature. This study permits constant revision and updating and serves as a basis for the choice of species with pharmacological, parasitological and therapeutic potential.
Key words: Medicinal plants - Popular knowledge - Minas Gerais.
Introdução
O uso das plantas medicinais começou com a própria historia do homem, como coloca Stuart (1979), através de experiências de ensaio e erro. No Brasil, o uso de plantas medicinais está muito ligado à cultura indígena, como nos relata Martius (1844).
Mas a influência européia é inegável, visto a grande quantidade de plantas introduzidas em nossas hortas e largamente utilizadas não somente como medicamento mas também como ervas aromáticas. Nas cidades históricas de Minas Gerais, às vezes encontramos algumas espécies introduzidas, ocorrendo como subespontâneas nos terrenos baldios e muros de pedras, completamente adaptadas ao nosso clima.
Muitas plantas foram trazidas da África pelos negros e, além de serem usadas como medicinais, fazem parte dos ritos afro-brasileiros e, para grande parte da população, têm poderes mágicos.
O objetivo principal desse trabalho é a preservação do conhecimento popular sobre o emprego das plantas como medicamento, pois, com o advento dos medicamentos industrializados, o interesse por esse conhecimento foi diminuindo e muitos raizeiros desapareceram sem deixar registradas suas experiências, que são fonte importante parte os trabalhos de fitoquímica, farmacologia e parasitologia. Outros objetivos procurados foram, um maior conhecimento sobre os nomes vulgares das plantas em Minas Gerais, seu emprego e parte das plantas empregadas. Para isso, usamos o trabalho de nossos alunos, permitindo uma amostragem maior em Minas Gerais e além disso, servindo como estímulo ao desenvolvimento e curiosidade deles como também dispensando a ajuda financeira de órgãos de pesquisa.
Metodologia
Os alunos da Universidade Federal de Minas Gerais, das disciplinas Plantas Medicinais e Botânica Aplicada à Farmácia, no período de 1982 a 1986, seguindo a orientação do Professor da disciplina, entrevistaram mais de 500 populares que utilizam plantas como medicamento em todo o Estado de Minas Gerais, percorrendo 84 cidades, sendo a pesquisa mais intensa na região metalúrgica do Estado.
Foram coletadas mais de 5500 exsicatas para identificação no laboratório, porém 10% das mesmas foram eliminadas por estarem incompletos ou serem de impossível identificação botânica. As espécies muito conhecidas, apesar de imcompletas, foram consideradas. A identificação foi realizada de acordo com a metodologia usual em botânica, usando chaves de identificação para famílias e gêneros. Um exemplar de cada exsicata foi depositado no herbário BHCB , sendo que alguns ainda estão em estudo, e foram colocados no trabalho apenas a nível de gênero.
Foram encontradas, até o momento 84 famílias, 246 gêneros e 311 espécies que podem ser aumentadas à medida que novas entrevistas e observações forem sendo registradas, pois o trabalho é cumulativo.
Para que as informações populares recebessem um tratamento uniforme, as indicações medicinais foram incorporadas na linguagem científica, mas se procurou fazer um glossário das mais usadas para facilitar a leitura do trabalho.
Dados sobre o tipo de entrevistados foram acrescentadas ao trabalho por acreditarmos que é importante conhecermos as pessoas que utilizam plantas como medicamento. Além disso, foi verificado o número de vezes que a planta foi citada como medicinal. Dados sobre nomes vulgares, partes usadas, e indicação medicinal foram coletados em todo o estado.
Resultados
Tabela 1 - Clique para ampliar
As localidades que não foram numeradas, não estão localizadas no mapa, por sua proximidade com outra cidade.
Discussão
Pelos dados acima obtidos podemos concluir que o uso de plantas medicinais é largamente difundido em Minas Gerais, conhecendo-se até o presente momento plantas de 84 famílias diferentes e que são usadas para os mais diversos fins curativos.
Como muitas vezes o vegetal coletado estava incompleto, muitas espécies que são usadas como medicinal não foram computadas no trabalho, por não ter sido possível, determiná-las botanicamente.
Como foram encontradas muitas espécies botânicas com o mesmo nome científico, é perigoso propagar o uso de plantas medicinais, usando-se somente o nome vulgar. Muitas espécies têm também muitos nomes vulgares, variando de região para região em Minas Gerais. O macaé, por exemplo, é conhecido em Minas por 13 nomes vulgares diferentes.
As pessoas, que fazem uso de plantas medicinais são quase sempre de baixa renda e pouca instrução. Aprenderam sobre elas com seus pais e avós, estando sobretudo na faixa etária compreendida entre 50 e 70 anos. Com 19 anos, encontramos apenas 1 indivíduo.
Existem muitos raizeiros vivendo da comercialização das plantas medicinais, em todas as regiões de Minas Gerais.
As famílias botânicas, onde encontramos o maior número de espécies medicinais, em Minas Gerais até o presente momento são: Compositae, Leguminosae, Labiatae e Solanaceae.
Os gêneros, onde encontramos maior número de espécies medicinais em Minas Gerais até o presente momento, são: Solanum, Ocimum, Allium, Mikania, Citrus e Maytenus.
Esse trabalho deve servir como base para os estudiosos de química, farmacologia e parasitologia, como um trabalho de ensaio e erro feito pela população durante muitos anos de experiência com as plantas, e que, espera um retorno, em bases científicas para consagrá-lo.
Glossário
Formas farmacêuticas mais comuns
Alcolatura - Fragmentos frescos da planta extraídos com álcool.
Infuso-obtido, vertendo-se água fervendo sobre fragmentos da planta.
Decocto - Chá, obtido pelo cozimento da planta.
Emplastro - Em uso popular, é o uso da planta fresca sobre o local doente.
Maceração - Forma farmacêutica, obtida por extração com água fria.
Vinho - Forma farmacêutica cujo veículo é o vinho.
Termos farmacêuticos menos conhecidos usados no trabalho.
Abcesso - Acúmulo de pús em uma cavidade.
Adstringente - Contrai os tecidos.
Afonia - Perda da voz, rouquidão.
Afrodisíaco - Provoca excitação sexual.
Albuminúrico - Presença de albumina na urina.
Anti-helmíntico - Contra vermes helmintos.
Anúria - Diminuição ou supressão da secreção urinária.
Béquico - Contra tosse.
Blenorragia - Doença sexualmente transmissível.
Carminativo - Impede ou expulsa os gases intestinais.
Cefaléia ou cefalalgia - Dor de cabeça.
Cistite - Inflamação da bexiga.
Colagogo - Desperta a secreção biliar.
Depurativo - Libera o organismo de substâncias nocivas.
Diaforético - Produz sudação.
Disenteria - Evacuação acompanhada de cólicas, catarros e sangue.
Dispnéia - Respiração difícil.
Eczemas - Afecção da pele com vesículas serosas e transparentes.
Edulcorante - Adoçante, ou que mascara o sabor desagradável de outros compostos.
Emenagogo - Que estimula a menstruação.
Emético - Vomitivo.
Emoliente - Amolece os tecidos inflamados, favorecendo a circulação.
Escrofuloses - Inflamação dos gânglios.
Espasmódicos - Rigidez muscular.
Galactagogo - Estimula a secreção láctea.
Hemostático - Que estanca hemorragia.
Hidropsia - Acúmulo anormal de líquidos nos tecidos.
Histeria - Crise de nervos, antigamente, relativa apenas às mulheres.
Icterícia - Presença de bile no sangue, tornando a pele amarela.
Leucorréia - corrimento branco.
Litagogo - Expulsa cálculo.
Litíase - Formação de pedras nas vias urinárias.
Prurido - Coceira.
Sialagogo - Provoca secreção salivar.
Sinapismo - Cataplasma de Mostarda na linguagem oficial, mas o povo usa esse termo de modo diferente, significando o uso ao natural sobre o ferimento ou órgão doente.
Sinusite - Inflamação da mucosa dos sinus.
Vermífugo - Que expulsa os vermes.
Vulnerário - Que cura feridas.
Agradecimentos
Aos raizeiros e populares que nos transmitiram seus conhecimentos e plantas.
Aos colegas do Departamento de Botânica, pelo incentivo diário.
Aos alunos do IV período de Farmácia que cursaram a disciplina Botânica Aplicada à Farmácia de 1982 a 1986, e alunos de Plantas Medicinais do Curso de Ciências Biológicas, de igual período, pelas entrevistas e coletas junto aos raizeiros de Minas Gerais, sem os quais essa pesquisa não seria realizada.
Aos monitores Carla Trópia Requena, Railson Warnel Kfuri e às alunas Jacqueline Aparecida Takahashi e Raquel Gouveia dos Santos, pela ajuda prestada, quando da elaboração desse trabalho.
À Helen Mesquita Grandi, pela revisão de Português e ao Anthony Brome Rylands, pela revisão do Inglês.
Ao CPq/UFMG, pela ajuda financeira.
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Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
15 Jun 2011 -
Data do Fascículo
1989