RESUMO:
Esta pesquisa teve como principal objetivo analisar como as disciplinas relacionadas ao corpo e às práticas corporais vêm sendo tematizadas nos cursos de graduação em Pedagogia das universidades públicas paulistas, em diálogo com a área da Educação Física. Ao eleger a constituição dessas disciplinas como objeto de estudo, interessou-nos principalmente sua organização a partir das experiências, dos conhecimentos e dos saberes narrados pelos(as) docentes responsáveis pelas disciplinas e com graduação em Educação Física. Os pressupostos metodológicos do paradigma indiciário foram adotados como inspiração e perspectiva de busca, compreensão e análise das fontes, levantadas por meio dos programas das disciplinas (fontes documentais) e das entrevistas (fontes narrativas). As reflexões tomaram forma em três eixos de análise: o corpo como construção social e produção cultural; as práticas corporais como conhecimento; e a dimensão dos sentidos corporais no fazer sensível. Percebemos a presença, ainda que tímida, das temáticas sobre o corpo e as práticas corporais como conhecimentos relevantes a serem tratados na formação em Pedagogia, com maior ou menor ênfase na dimensão do fazer corporal. Nesse tipo de disciplina, defendemos aquilo que ultrapassa os textos escritos, com propostas de trabalho que perpassam as práticas corporais em vivências sensíveis, tomando o corpo como lugar privilegiado da experiência e da produção de conhecimento.
Palavras-chave:
Corpo; Práticas corporais; Formação de professores; Pedagogia; Educação Física
RESUMEN:
Esta investigación tuvo como objetivo principal analizar cómo las disciplinas relacionadas con el cuerpo y las prácticas corporales han sido discutidas en los cursos de pregrado en Pedagogía de las universidades públicas de São Paulo, en diálogo con el área de Educación Física. Al elegir la constitución de estas asignaturas como objeto de estudio, nos interesó principalmente su organización en base a las experiencias, conocimientos y saberes narrados por los docentes responsables de las mismas que cuentan con la licenciatura en Educación Física. Se adoptaron los supuestos metodológicos del paradigma de la acusación como inspiración y perspectiva para la búsqueda, comprensión y análisis de las fuentes, planteadas a través de programas de las disciplinas (fuentes documentales) y entrevistas (fuentes narrativas). Las reflexiones se formaron en tres ejes de análisis: el cuerpo como construcción social y producción cultural; las prácticas corporales como conocimiento; y la dimensión de los sentidos corporales en la sensibilización. Se percibe la presencia, aunque tímida, de los temas sobre el cuerpo y las prácticas corporales como conocimientos relevantes a ser tratados en la formación de la Pedagogía, con mayor o menor énfasis en la dimensión del hacer corporal. En este tipo de disciplina defendemos lo que va más allá de los textos escritos, con propuestas de trabajo que pasan por las prácticas corporales em experiencias sensibles, tomando el cuerpo como un lugar privilegiado de la experiencia y de la producción de conocimiento.
Palabras clave:
Cuerpo; Prácticas corporales; Formación de profesores; Pedagogía; Educación Física
ABSTRACT:
This research had as main objective to analyze how the disciplines related to body and bodily practices have been discussed in undergraduate courses in Pedagogy from public universities in São Paulo, in dialogue with the area of Physical Education. When we choose the constitution of these disciplines as an object of study, we were mainly interested in their organization based on the experiences, knowledges and acquirements narrated by the teachers who are responsible for these disciplines and who have graduation in Physical Education. The methodological assumptions of the vestige paradigm were adopted as inspiration and perspective for searching, understanding and analyzing the sources, raised through the programs of the disciplines (documentary sources) and the interviews (narrative sources). The reflections took shape in three axes of analysis: the body as a social construction and cultural production; the bodily practices as knowledge; and the dimension of the bodily senses in the sensitive doing. We have perceived the presence, even though timid, of the themes about the body and bodily practices as relevant knowledge to be treated in Pedagogy formation, with a greater or lesser emphasis on the dimension of bodily doing. In this type of discipline, we defend what goes beyond written texts, with work proposals that pass by corporal practices in sensitive experiences, taking the body as the privileged place of experience and knowledge production.
Keywords:
Body; Bodily practices; Teacher formation; Pedagogy; Physical Education
INTRODUÇÃO
O presente texto é o recorte de uma pesquisa de doutorado4 4 O projeto de pesquisa foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da Unicamp sob Parecer nº 1.769.114, em 10 de outubro de 2016. Aos(às) participantes, solicitou-se a leitura e assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). (ASSIS, 2019ASSIS, Marília Del Ponte de. Corpo e práticas corporais na formação em pedagogia: narrativas de docentes das universidades públicas paulistas. 2019. 165 f. Tese (Doutorado em Educação) - Universidade Estadual de Campinas, Campinas, SP, 2019.), que partiu de reflexões e inquietudes acerca dos conhecimentos que perpassam a formação inicial em Pedagogia, em específico no que se refere ao ensino das temáticas relacionadas ao corpo e às práticas corporais, em diálogo com a área da Educação Física.
Como docentes que trabalham em processos formativos de pedagogas5 5 A opção pela escrita no feminino vai ao encontro da realidade de que a maioria das estudantes dos cursos de Pedagogia é composta por mulheres. Adotaremos esse critério quando nos referirmos às alunas em formação, futuras pedagogas. , percebemos recorrentes estranhamentos com o fazer corporal, acompanhados de timidez e incômodo diante de propostas que envolvem expressão por meio de práticas corporais e artísticas. Determinadas vivências, que implicam o toque e o contato com o próprio corpo e com o corpo do outro, comumente, são narradas pelas estudantes como desconfortáveis ou constrangedoras, o que nos tem levado a adotar maior cautela nessas situações de aprendizado, por acreditarmos que os conhecimentos de diferentes práticas corporais possibilitam experiências sensíveis, expressivas e criativas, sendo importante vivenciá-las nas disciplinas nas quais o corpo e a gestualidade são tematizados.
Constatamos também que grande parte das pedagogas em formação almeja aprender jogos e brincadeiras que possam ser feitos com as crianças na escola, como receitas prontas de atividades para entretê-las, para serem desenvolvidas ou “aplicadas” em outros contextos, porém essa é uma visão muito reducionista acerca da amplitude dos temas que as disciplinas desse cunho podem abordar na formação inicial dessas profissionais.
Refletindo sobre como esses conhecimentos vêm se estruturando nos Projetos Político-Pedagógicos (PPPs) dos cursos de formação em Pedagogia e vêm se materializando nas matrizes curriculares do ensino superior, esta pesquisa partiu da seguinte problemática: como têm sido trabalhadas as disciplinas que tematizam o corpo e as práticas corporais na formação inicial em Pedagogia das universidades públicas do Estado de São Paulo?. Ao eleger a constituição dessas disciplinas como objeto de estudo, interessou-nos principalmente sua organização a partir das experiências, dos conhecimentos e dos saberes narrados pelos(as) docentes responsáveis por elas.
As discussões acerca dos temas corpo e Educação Física nos currículos da Pedagogia aparecem de forma aproximada ao que nos propusemos investigar nos trabalhos de Pereira e Bonfim (2006PEREIRA, Lucia Helena Pena; BONFIM, Patrícia Vieira. A corporeidade e o sensível na formação e atuação docente do pedagogo. Contexto e Educação, Ijuí, ano 21, n. 75, p. 45-68, jan./jun. 2006. DOI: https://doi.org/10.21527/2179-1309.2006.75.45-68.
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), Brustolin (2009BRUSTOLIN, Gisela Maria. Aspectos da educação do corpo no currículo de pedagogia. Dissertação (Mestrado em Educação Física) - Faculdade de Educação Física, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2009.), Isse (2012ISSE, Silvane Fensterseifer. Por um corpo pulsante: o debate sobre a educação física na formação em pedagogia. In: MUNHOZ, Angélica Vier et al. Diálogos na Pedagogia Coletâneas. Lajeado: Ed. Univates, 2012. v. 2. p. 29-38), Silva (2014SILVA, Ana Patrícia da. O corpo e o discurso: o que dizem as ementas dos cursos de licenciatura da Faculdade de Educação da UFRJ. In: Anais do XVII Encontro Nacional de Didática e Prática de Ensino. Fortaleza, 2014.), Silva (2015)SILVA, Carolina Barbosa da. A dimensão corporal na formação inicial da Pedagogia: uma análise dos currículos das universidades federais do Brasil. 2015. Dissertação (Mestrado em Educação) - Universidade do Sul de Santa Catarina, Tubarão, 2015. e Silva e Buss-Simão (2019)SILVA, Carolina Barbosa da; BUSS-SIMÃO, Márcia. O corpo na formação inicial em Pedagogia: uma análise dos currículos das universidades federais do Brasil. Pensar a Prática, Goiânia, v. 22, p. 1-12, 2019. DOI: https://doi.org/10.5216/rpp.v22.51828.
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. Entretanto, cada qual com suas especificidades, nesses escritos, não foram consideradas as dimensões narrativas de docentes que ministram disciplinas com essas temáticas, no ensino superior, como objetivamos nesta investigação.
O principal objetivo desta pesquisa foi analisar como as disciplinas relacionadas ao corpo e às práticas corporais na formação em Pedagogia vêm sendo trabalhadas por docentes cuja formação inicial é em Educação Física, sendo esse o principal critério de escolha dos(as) participantes deste estudo. Assim, este justifica-se por estar entre aqueles necessários ao aprofundamento das reflexões sobre o corpo e as práticas corporais, de forma geral, e sobre a inserção da Educação Física, de forma mais específica, nos cursos de Pedagogia, visto que são escassas as investigações que abordam essas temáticas, sobretudo envolvendo as instituições públicas do Estado de São Paulo, que compõem o recorte desta pesquisa.
CAMINHOS DA PESQUISA: DOS DOCUMENTOS ÀS NARRATIVAS
Sendo esta pesquisa de natureza qualitativa, foi adotada a proposição do paradigma indiciário, segundo Ginzburg (1989GINZBURG, Carlo. Sinais: raízes de um paradigma indiciário. In: Mitos, emblemas, sinais: morfologia e história. Tradução de Federico Carotti. 2. ed. São Paulo: Companhia das Letras, 1989.), como perspectiva de busca, compreensão e análise das fontes levantadas, a fim de responder ao principal questionamento formulado nesta investigação. Nesse processo de construção do conhecimento, dos dados e do saber, a busca e a seleção das informações necessárias e significativas - que já fazem parte do processo analítico - compreenderam basicamente duas etapas: o levantamento documental dos programas das disciplinas; e as entrevistas com os(as) docentes que as ministram, num sentido de triangulação e complementariedade das informações obtidas.
O método interpretativo do paradigma indiciário fundamenta-se em investigações baseadas no detalhe, nas manifestações de singularidade, no residual que nos permite captar uma realidade mais profunda a partir de pistas, indícios, sinais, vestígios e achados, passando de fatos aparentemente insignificantes para a realidade complexa, não diretamente observável. Assim, não apenas os fatos explícitos mas também os dados marginais podem, eventualmente, ser considerados como reveladores (GINZBURG, 1989GINZBURG, Carlo. Sinais: raízes de um paradigma indiciário. In: Mitos, emblemas, sinais: morfologia e história. Tradução de Federico Carotti. 2. ed. São Paulo: Companhia das Letras, 1989.).
Diante dos meandros encontrados nas fontes documentais e nas narrativas, detalhes puderam ser acentuados, revelando muito mais do que um dado escrito ou testemunhal nos programas e nas entrevistas podem revelar e aprofundando indícios acerca das significações que foram produzidas pelos sujeitos envolvidos no contexto da pesquisa.
Na etapa documental, levantou-se um panorama das disciplinas obrigatórias que tematizavam o corpo e as práticas corporais nos cursos de Pedagogia de cinco universidades públicas, no Estado de São Paulo, distribuídas em 12 campi, a saber: 1) Universidade de São Paulo (USP): campi de Ribeirão Preto e São Paulo; 2) Universidade Estadual de Campinas (Unicamp): campus de Campinas; 3) Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (Unesp): campi de Araraquara, Bauru, Marília, Presidente Prudente, Rio Claro e São José do Rio Preto; 4) Universidade Federal de São Carlos (Ufscar): campi de São Carlos e Sorocaba; 5) Universidade Federal de São Paulo (Unifesp): campus de Guarulhos.
Para a busca das disciplinas, foram identificados os nomes daquelas que apareciam nas grades curriculares tematizando a Educação Física e/ou a Arte, sendo levantadas aquelas cujos títulos versavam sobre as seguintes palavras: educação física, arte, corpo, cultura corporal, corporeidade, expressão corporal, movimento, linguagem, jogos, brincadeiras, lúdico e ludicidade, conforme quadroa seguir.
Disciplinas obrigatórias identificadas6 6 Após 2017, quando esse levantamento foi realizado, algumas disciplinas podem ter sofrido modificações em suas denominações, de acordo com as atualizações dos PPPs, a exemplo da disciplina da Unifesp “Fundamentos teóricos e práticos da cultura corporal na escola”, atualmente denominada “Cultura corporal na escola”.
Os programas dessas disciplinas foram levantados pelos sites de suas respectivas instituições (inseridos nos PPPs ou pelo código das disciplinas no sistema de buscas da universidade), assim como por meio do contato direto com os(as) docentes. Em seguida, foi feita uma leitura desses programas, buscando conhecer seus objetivos, os conteúdos abordados, as metodologias de ensino, os critérios de avaliação e as bibliografias utilizadas, ou seja, compreendendo os dados que lá estavam, fazendo sua triagem e considerando sua pertinência em função das necessidades desta pesquisa.
Um dos pressupostos da investigação é o de que, nem sempre, esses documentos refletem o trabalho que é exercido pelos(as) docentes no andamento de sua prática pedagógica, ficando sua elaboração, muitas vezes, restrita ao cumprimento de exigências institucionais. Com isso, sentimos a necessidade de conhecer mais profundamente os trabalhos dos(as) docentes, visando compreender, de forma mais ampla, como essas disciplinas constituíram-se, como vêm sendo trabalhadas em seus processos educativos e quais foram os caminhos percorridos por eles(as) até se tornarem docentes dessas disciplinas nos cursos de Pedagogia em que atuam, bem como quais os saberes e as experiências que mobilizam sua prática pedagógica. Neste artigo, de forma mais específica, privilegiamos as narrativas docentes no que tange às concepções de corpo, às práticas corporais como conhecimento e à dimensão dos sentidos corporais no fazer sensível.
A entrevista foi, portanto, escolhida como procedimento privilegiado do percurso investigativo, com os sujeitos tomando a palavra como narradores, pois, como afirma Bosi (2003BOSI, Ecléa. O tempo vivo da memória: ensaios de psicologia social. 2. ed. São Paulo: Ateliê Editorial, 2003., p. 15), aquilo que “se apoia unicamente em documentos oficiais, não pode dar conta das paixões individuais que se escondem atrás dos episódios”. Foram estabelecidos os seguintes critérios de inclusão dos sujeitos a serem entrevistados: que possuíssem a formação inicial/licenciatura em Educação Física; que tivessem doutorado concluído; que fossem alocados em Faculdade ou Departamento de Educação, oferecendo disciplina obrigatória para o curso de Pedagogia; que tivessem atuado na disciplina ao menos três semestres; e que aceitassem participar da pesquisa com disponibilidade para conceder entrevista em tempo hábil, para a pesquisadora. Durante a constituição da pesquisa, abrimos uma exceção nos critérios para entrevistar uma docente que já não ministrava mais a disciplina “Educação, corpo e arte”, mas que foi uma das principais responsáveis por sua criação, que vem sendo desenvolvida na Unicamp, há mais de 20 anos. Visto que, nas outras instituições - USP, Unesp e Unifesp -, os(as) docentes tinham sido também os(as) principais formuladores(as) das disciplinas tratadas, julgamos relevante complementar as narrativas com essa entrevista.
Totalizando seis participantes - dois da USP/São Paulo, dois da Unicamp, uma da Unesp/Bauru e um da Unifesp -, as entrevistas foram realizadas entre agosto de 2017 e maio de 2018, com a opção pela realização de entrevistas abertas (MINAYO, 2007MINAYO, Maria Cecília de Souza. O desafio do conhecimento. São Paulo: Hucitec, 2007., 2009MINAYO, Maria Cecília de Souza (org.) Pesquisa social: teoria, método e criatividade. 28. ed. Petrópolis: Vozes, 2009.), nas quais o sujeito discorre livremente sobre o tema, e os questionamentos feitos por quem investigava, quando aconteceram, foram no sentido de dar mais profundidade às reflexões, numa construção dialógica. Para fins de análise, todas as entrevistas foram gravadas e transcritas na íntegra, sendo disponibilizadas aos(às) entrevistados(as) para que pudessem fazer suas revisões, indicando alterações que julgassem necessárias.
A identificação dos sujeitos na pesquisa, com sua anuência e autorização, fez-se necessária uma vez que se trata de um trabalho profissional relacionado a um modo singular de atuação que não seria possível omitir. Ademais, a intenção é que, a partir das narrativas de cada entrevistado(a), os leitores possam ter acesso às minúcias das escolhas de cada docente em seu modo de atuar, e, mais do que analisar, buscamos conhecer suas histórias e experiências e compreender seus saberes, conhecimentos e suas escolhas no processo educativo. Os(as) docentes participantes foram: da USP/São Paulo: Prof. Dr. Marcos Garcia Neira e Profa. Dra. Mônica Caldas Ehrenberg, responsáveis pela disciplina obrigatória “Metodologia do ensino de Educação Física” e pela eletiva “Cultura corporal: fundamentação, metodologia e vivências”; da Unicamp: Prof. Dr. Adilson Nascimento de Jesus e Profa. Dra. Carmen Lúcia Soares, responsáveis pela disciplina “Educação, corpo e arte”; da Unesp/Bauru: Profa. Dra. Fernanda Rossi, responsável pela disciplina “Corporeidade e movimento”; da Unifesp: Prof. Dr. Adalberto dos Santos Souza, responsável pelas disciplinas “Cultura corporal na escola” e “Práticas Pedagógicas Programadas III”, na linha 6 denominada “Representações sobre o corpo e suas implicações no cotidiano do sujeito”.
No que se refere à discussão, alguns temas foram escolhidos previamente, a partir de leituras que haviam sido feitas e dos objetivos iniciais do projeto de pesquisa. Outros temas surgiram a partir das narrativas docentes e, no entrelaçamento com o referencial teórico, julgamos que mereciam ser destacados, embora nem todos(as) os(as) docentes tenham tocado, com a mesma profundidade, nas temáticas que foram elencadas para a discussão. Nesse diálogo com as narrativas e com a literatura, buscamos entrelaçar as nossas vozes às dos(as) narradores(as) - sujeitos da pesquisa - e às dos(as) autores(as) que serviram de base para nossas reflexões. Contruímos, desse modo, um processo dialógico no qual todas essas vozes se misturam, se mesclam, se entretecem.
Apresentamos, a seguir, três dessas temáticas, citadas anteriormente, que se referem às concepções de corpo, às práticas corporais como conhecimento e à dimensão dos sentidos corporais no fazer sensível.
CORPO COMO CONSTRUÇÃO SOCIAL E PRODUÇÃO CULTURAL
Muito já tem sido publicado sobre o tema “corpo” em suas relações com distintos campos: arte, medicina, psicologia, filosofia, história, sociologia, antropologia, moda, culinária, mídia, lazer, esporte, dentre outros. No campo da educação, especialmente vinculado à Pedagogia, esse tema ainda pode ser mais aprofundado, podendo ser objeto de estudos tanto na formação inicial e continuada quanto na atuação docente em diferentes níveis.
Nas tentativas de conceituação do corpo, são muito distintas as lentes usadas para enxergá-lo, pois há de considerar, como Gil (2018GIL, José. Caos e ritmo. Lisboa: Relógio D’Água, 2018.) aponta, os paradoxos e as dificuldades que acompanham os estudos sobre o corpo, especialmente desde meados do século XX. Pensar o corpo implica saber que sempre existem novas maneiras de entendê-lo e, sobretudo, de estranhá-lo, não cessando as tentativas de conhecê-lo, tanto em seus significados biológicos quanto culturais. Contudo, o conhecimento sobre o corpo é interminável. Por se tratar de uma realidade multifacetada e um objeto histórico, o corpo é algo heterogêneo, plural, (re)fabricado ao longo do tempo, um objeto de curiosidades e explorações comerciais, valorizado e explorado, impossível de ser compreendido em algumas linhas e apreendido de uma vez por todas (SANT’ANNA, 2000SANT’ANNA, Denise. As infinitas descobertas do corpo. Cadernos Pagu, Campinas, n. 14, p. 235-248, 2000. Disponível em:Disponível em:https://periodicos.sbu.unicamp.br/ojs/index.php/cadpagu/article/view/8635354 . Acesso em:9 dez. 2022.
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, 2005SANT’ANNA, Denise. Prefácio e Apresentação. In: SANT’ANNA, Denise Bernuzzi de(org.) Políticas do corpo: elementos para uma história das práticas corporais. 2. ed. São Paulo: Estação Liberdade, 2005. p. 09-18, 2006SANT’ANNA, Denise. É possível realizar uma história do corpo? In: SOARES, Carmen Lúcia(org.) Corpo e história. 3. ed.Campinas: Autores Associados, 2006. p. 03-23).
É a partir de uma ética do corpo que Marzano-Parisoli (2004)MARZANO-PARISOLI, Maria Michaela. Pensar o corpo. Tradução de Lúcia M. Endlich Orth. Petrópolis: Vozes, 2004. discute a respeito desse corpo objetivado, que deve ser idealizado e perfeito, com critérios estéticos continuamente reforçados por normas culturais que se movimentam em meio a ambivalentes relações que as constituem. De fato, o corpo é um assunto controverso, que deve ser questionado e problematizado com base em uma reflexão interdisciplinar. O que vemos, porém, é que, nessa formulação baseada na interdisciplinaridade, parece, ainda, predominar a dimensão das ciências biomédicas, da tecnologia, do mercado, reduzindo o corpo a uma máquina, a um organismo apartado de uma subjetividade, destituindo o sujeito de sua singularidade, de sua unidade indissolúvel (LE BRETON, 2016LE BRETON, David. Antropologia do corpo. Tradução de Fábio Creder Lopes. 4. ed. Petrópolis: Vozes, 2016.; SILVA, 2001SILVA, Ana Márcia. Corpo, ciência e mercado: reflexões acerca da gestação de um novo arquétipo da felicidade. Campinas: Autores Associados; Florianópolis: Editora da UFSC, 2001.; SILVA; SOARES; ASSMANN, 2003SILVA, Ana Márcia; SOARES, Carmen Lúcia; ASSMANN, Selvino José. A valorização do corpo e as falácias de um novo arquétipo da felicidade humana. In: SILVA, Ana Márcia et al. Estudos interdisciplinares em ciências humanas. Florianópolis: Cidade Futura, 2003. p. 267-330).
Nossa existência é corporal e apreendemos o mundo por meio do corpo. Cada sociedade, no interior da pluralidade de visões de mundo que a constitui, confere sentidos, valores e saberes peculiares sobre os elementos constitutivos do corpo. Assim, o corpo como signo do humano, lugar de sua distinção, não é nunca algo dado indiscutivelmente, não é apreensível, não é uma realidade em si, é efeito de uma construção social, cultural e simbólica, e adquire sentido com o olhar cultural do sujeito (LE BRETON, 2016LE BRETON, David. Antropologia do corpo. Tradução de Fábio Creder Lopes. 4. ed. Petrópolis: Vozes, 2016.).
Por ser um território tanto biológico quanto cultural/simbólico, em alguns momentos, o corpo pode parecer familiar e concreto; em outros, pode parecer bastante desconhecido e abstrato. Assim como pode revelar traços de sua fisiologia e subjetividade, pode escondê-los; é nesse sentido que Sant’Anna (2006)SANT’ANNA, Denise. As infinitas descobertas do corpo. Cadernos Pagu, Campinas, n. 14, p. 235-248, 2000. Disponível em:Disponível em:https://periodicos.sbu.unicamp.br/ojs/index.php/cadpagu/article/view/8635354 . Acesso em:9 dez. 2022.
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ressalta que o corpo é sempre biocultural, ou seja, permeável às marcas da cultura. Concebido em seus vínculos com a cultura e não exclusivamente como um dado de natureza biológica, como apontou Daolio (1995DAOLIO, Jocimar. Da cultura do corpo. Campinas: Papirus, 1995.), o corpo é entendido como produto de um tempo, produzido na e pela cultura e definido pelos significados e constructos históricos e sociais a ele atribuídos. Essa operação se dá, de forma simultânea, no coletivo e no individual, revelando um eu próprio e único, que é similar a outros corpos produzidos num determinado tempo (GOELLNER, 2008GOELLNER, Silvana Vilodre. A produção cultural do corpo. In: LOURO, Guacira Lopes; FELIPE, Jane; GOELLNER, Silvana Vilodre (org.) Corpo, gênero e sexualidade: um debate contemporâneo na educação. 4. ed. Petrópolis: Vozes, 2008. p. 28-40).
Segundo as pesquisas de Soares (2006SOARES, Carmen Lúcia. Corpo, conhecimento e educação: notas esparsas. In: SOARES, Carmen Lúcia (org.). Corpo e história. 3. ed. Campinas: Autores Associados, 2006. p. 109-129, 2014), na materialidade do corpo, concentram-se e expõem-se práticas, liberdades e repressões nos processos de educação do corpo, sobre o qual incidem cuidados, intervenções e pedagogias para civilizá-lo, sexualizá-lo e erotizá-lo, ensiná-lo a ser útil e higiênico, torná-lo performático. Circunscrevendo um retrato da sociedade, essa noção de corpo educado por um conjunto refinado de pedagogias, às quais Louro (1999LOURO, Guacira Lopes. Pedagogias da sexualidade. In: LOURO, Guacira Lopes (org.). O corpo educado: pedagogias da sexualidade. Belo Horizonte: Autêntica, 1999. p. 07-34) também se refere, revela a imposição de políticas, técnicas e instrumentos de normatização para conter o corpo e fixar seus limites, inclusive no que concerne às manifestações daquilo que parece ser incontrolável, seja nos processos escolares ou não, alcançando os sujeitos e inserindo-os em redes de sociabilidades, conhecimentos, saberes e práticas. Em suas permanências, rupturas e continuidades, a historicidade de pedagogias voltadas à educação do corpo lentamente desenha modos específicos e especializados, com valores e normas daquilo que é um comportamento desejável e aceito socialmente. Essas pedagogias perpassam outras instâncias, fazendo parte de um amplo processo cultural que está para além da instituição escolar, pois incidem sobre os corpos e também nos ritmos e espaços das atividades, nas roupas, no mobiliário e na arquitetura e em tantas outras formas que estão sempre se ampliando (SOARES, 2014SOARES, Carmen Lúcia. Educação do corpo (verbete). In: GONZÁLEZ, Fernando Jaime; FENSTERSEIFER, Paulo Evaldo (org.) Dicionário crítico de Educação física. 3. ed. Ijuí: Editora da Unijuí, 2014. p. 219-225).
Considerando os saberes relacionados ao corpo como construção social e produção cultural, o trabalho desenvolvido por alguns(as) docentes tem se constituído igualmente sob essa perspectiva.
A disciplina obrigatória da USP, “Metodologia do ensino de Educação Física”, tem conceitualmente esse entendimento de corpo social e culturalmente construído, reconhecendo as ressonâncias da cultura na constituição da identidade corporal. Uma parte inicial da disciplina demanda essa discussão, pois há um pressuposto de que as estudantes chegam entendendo o corpo ainda muito biológico (Mônica), com uma fala de que a aula de Educação Física é um jogar, porque precisa melhorar a condição física ou motricidade humana (Mônica). Ao se deparar com essa perspectiva de compreensão da área, discute-se corpo para depois caminhar com a ideia de que esse corpo, inscrito social e culturalmente, é que será abordado na Educação Física.
Do mesmo ponto de vista, demarcando de que lugar da área estão falando, o docente Marcos comenta no primeiro dia de aula: você começar o curso achando que tem que trabalhar coordenação motora não tem importância; agora, você terminar achando isso tem problema. Uma das propostas dessa disciplina obrigatória da USP, como consta no programa, é “apresentar as intervenções educativas sobre o corpo e identificar alguns dos marcadores sociais que perpassam o corpo”. Sobre isso, a fala do docente Marcos corrobora o que foi narrado pela docente Mônica, circunscrevendo o trabalho desenvolvido por ambos no âmbito da cultura: Quais são as intervenções? O que a Educação Física já produziu sobre intervenção sobre o corpo? Ou a gente entende o corpo como o corpo máquina [...], ou a gente entende o corpo a partir da psicologia, ou a gente entende o corpo como uma produção cultural (Marcos). Ele procura deixar claro que isso é uma perspectiva compartilhada na disciplina em questão, na qual o corpo será abordado como texto da cultura, na sua produção, [...] marcado por signos de etnia, de classe, de gênero, e hoje, ainda mais no momento que a gente está vivendo, é evidente isso (Marcos).
Da mesma forma, na disciplina eletiva “Cultura corporal: fundamentação, metodologia e vivências”, a linguagem, na formação de professores, tem sido tematizada como lugar de investigação e problematização do patrimônio cultural corporal (EHRENBERG; NEIRA, 2018EHRENBERG, Mônica Caldas; NEIRA, Marcos Garcia. Cultura corporal como linguagem: uma experiência de formação de professores. Grad+ - Revista de Graduação da USP, v. 3, n. 2, jun. 2018. DOI: https://doi.org/10.11606/issn.2525-376X.v3i2p123-128.
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), adotando-se os pressupostos epistemológicos e metodológicos da perspectiva cultural da Educação Física (NEIRA, 2018NEIRA, Marcos Garcia. Educação Física Cultural: inspiração e prática pedagógica. Jundiaí: Paco Editorial, 2018.).
Semelhantemente, na disciplina “Cultura corporal na escola”, desenvolvida na Unifesp, o docente Adalberto aborda, basicamente, três focos: o conceito de cultura, o corpo nessa perspectiva cultural e a cultura corporal na escola, buscando mostrar para as alunas e para os alunos que a discussão do corpo na escola, feita pelos pedagogos, vai além dessa visão que é senso comum (Adalberto), com discussões acerca de padrões de beleza, estereótipos, preconceitos, considerando o corpo como elemento da cultura. Nessa disciplina, há uma preocupação narrada pelo docente de que as referências básicas perpassem leituras acerca da Educação Física, para que as estudantes, que não são da área, compreendam essa perspectiva que é apresentada.
Na Unesp, num primeiro momento da disciplina “Corporeidade e movimento”, as discussões passam pelo conhecimento das concepções de corpo ao longo da história da sociedade e do pensamento filosófico, ou seja, quais as concepções de corpo que foram construídas, que circulam e como que ainda hoje essas concepções podem influenciar as questões relacionadas ao corpo e movimento na escola (Fernanda). Nesse sentido, caminha-se depois para uma perspectiva de entender o corpo como uma produção cultural, uma produção social e cultural, superando a visão do corpo só como uma composição biológica (Fernanda). As concepções que as estudantes têm do próprio corpo são tematizadas, porque se entende que a forma como a docente se percebe, a forma com que ela se relaciona com seu corpo, com sua imagem corporal, por exemplo, ou com as práticas corporais, de certo modo, tem uma influência na prática pedagógica (Fernanda) e repercute no trabalho do cotidiano escolar. A forma como é concebido o corpo da criança na sociedade, permeando assuntos como, por exemplo, as diferenças de gênero na escola, muitas vezes, reforçadas nas práticas pedagógicas, é tema dessa disciplina nesse primeiro momento, para que, então, a ideia da ludicidade seja introduzida, pensando o ser humano, sobretudo a criança, como um ser lúdico. É nessa ocasião que o movimento é tratado como uma forma de linguagem na infância.
Num segundo momento dessa disciplina, o trabalho é direcionado às discussões sobre corpo e movimento na escola, sobretudo na educação infantil, considerando a ação pedagógica no contexto educacional. Para tal, um aspecto interessante é o de que as dificuldades corporais das próprias estudantes compõem elementos que a docente Fernanda traz para a discussão, ao apresentar conhecimentos como aqueles relacionados aos princípios do desenvolvimento motor. Para ela, esse conhecimento também é importante para compreender o desenvolvimento da criança, aliado à abordagem cultural e social que predomina na disciplina. Porém, com o propósito de refletir sobre a importância do corpo em movimento desde a infância, a docente procura deixar bem claro que cada criança tem seu desenvolvimento específico e que embora a gente se desenvolva por um processo de crescimento, de desenvolvimento maturacional, a gente precisa do meio, precisa do estímulo, e esse estímulo é cultural, produzido num determinado ambiente (Fernanda).
Pela maneira como o corpo é socialmente construído, o papel do outro é fundamental na relação estabelecida entre o ser humano e o mundo, e a presença do outro na interação dá-se corporalmente (LE BRETON, 2009LE BRETON, David. As paixões ordinárias: antropologia das emoções. Tradução de Luís Alberto Salton Peretti. Petrópolis: Vozes, 2009.). Estamos permanentemente sendo tocados por acontecimentos e circunstâncias que repercutem em atitudes afetivas, sensivelmente diferentes quando estamos sozinhos, ou num grupo de pessoas próximas ou desconhecidas. Nossas experiências em grupo são moduladas por meio das trocas com os outros, os quais são a condição do sentido, o fundamento do vínculo social, pois “um mundo sem outrem é um mundo sem vínculo, fadado ao não sentido” (LE BRETON, 2016aLE BRETON, David. Antropologia do corpo. Tradução de Fábio Creder Lopes. 4. ed. Petrópolis: Vozes, 2016., p. 32).
O corpo é, portanto, um ponto de partida para refletirmos acerca do humano; e defendemos que as práticas corporais podem se constituir como experiências mais delicadas, respeitosas, criativas e solidárias, que considerem a inteireza humana e possibilitem a construção de conhecimentos mais significativos, permitando-nos reconhecer a diversidade e a pluralidade das pessoas que se apresentam a nós por meio de seus corpos.
PRÁTICAS CORPORAIS COMO CONHECIMENTO
Na relação com as ciências humanas e sociais, o conceito de práticas corporais está relacionado ao conceito de corpo e tem sido adotado num contraponto às pesquisas das ciências biológicas e exatas que operam com o conceito de atividade física (SILVA et al., 2009SILVA, Ana Márcia et al. Corpo e experiência: para pensar as práticas corporais. In: FALCÃO, José Luiz Cirqueira; SARAIVA, Maria do Carmo (org.). Práticas corporais no contexto contemporâneo: (in)tensas experiências. Florianópolis: Copiart, 2009. p. 10-27; SILVA, 2014aSILVA, Ana Márcia. Entre o corpo e as práticas corporais. Arquivos em Movimento, Rio de Janeiro, Edição Especial, v. 10, n. 1, p. 5-20, jan./jun. 2014a. Disponível em: Disponível em: https://revistas.ufrj.br/index.php/am/article/view/9228 . Acesso em: 9 dez. 2020.
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). Ao mesmo tempo que consideramos o biológico como constitutivo do sujeito, concordamos com Silva e Damiani (2005SILVA, Ana Márcia; DAMIANI, Iara Regina. As práticas corporais na contemporaneidade: pressupostos de um campo de pesquisa e intervenção social. In: SILVA, Ana Márcia; DAMIANI, Iara Regina (org.) Práticas corporais: gênese de um movimento investigativo em Educação Física. Florianópolis: Naemblu Ciência & Arte, 2005. v. 1. p. 17-27) quando salientam que se faz justo e necessário nos livrarmos das amarras que nos subordinam ao modelo biomédico reducionista no trato com o corpo e as práticas corporais, condicionando o ser humano a uma dimensão biológica restritiva em detrimento da consideração do sujeito de modo mais amplo, que se faz presente no processo de educação.
Explicitadas por meio do corpo ou do movimento corporal, focando, portanto, essa dimensão do fazer, as práticas corporais mostram “o sentido de construção cultural e linguagem presentes [sic] nas diferentes formas de expressão corporal” (SILVA; DAMIANI, 2005SILVA, Ana Márcia; DAMIANI, Iara Regina. As práticas corporais na contemporaneidade: pressupostos de um campo de pesquisa e intervenção social. In: SILVA, Ana Márcia; DAMIANI, Iara Regina (org.) Práticas corporais: gênese de um movimento investigativo em Educação Física. Florianópolis: Naemblu Ciência & Arte, 2005. v. 1. p. 17-27, p. 24), as quais, por vezes, apresentam, como finalidade, uma educação para a sensibilidade com um componente lúdico, sendo organizadas a partir de uma lógica específica. Essa discussão está para além de uma questão meramente terminológica; ela nos insere numa intrínseca concepção teórico-prática e numa forma de intervenção educacional, social, profissional e política, posicionamento que tanto nos é caro na atualidade.
Portanto, no âmbito das práticas corporais, o conhecer requer um entregar-se à experiência de movimento (ALMEIDA; FENSTERSEIFER, 2011ALMEIDA, Luciano de; FENSTERSEIFER, Paulo Evaldo. O lugar da experiência no âmbito da Educação Física. Movimento, Porto Alegre, v. 17, n. 4, p. 247-263, out./dez. 2011. DOI: https://doi.org/10.22456/1982-8918.20918.
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). Refletir sobre a fruição das experiências, com as práticas corporais como base de saberes e conhecimentos, numa dimensão mais abrangente e sensível não só do lazer e da saúde mas principalmente da educação, permite-nos alargar os olhares a respeito da formação em Pedagogia.
Como conhecimento a ser estudado nas diferentes disciplinas que compõem esta investigação, as práticas corporais aparecem com mais ou menos espaço para o fazer corporal nas propostas de trabalho dos(as) participantes desta pesquisa.
Quando a disciplina “Educação, corpo e arte” foi criada na Unicamp, em 1998, o que se almejava era que houvesse contribuições tanto do campo da Educação Física quanto do da Arte, envolvendo um leque de conhecimentos que passava pelo jogo, pela ginástica, pela dança, pelo teatro, pela música e pelas artes plásticas, numa interlocução que era o mote do processo educativo. Para tal, essa disciplina era desenvolvida por docentes das áreas da Educação Física e da Arte, que compartilhavam as aulas ao longo do semestre. Nas práticas corporais, que passavam por aquilo que a docente Carmen chamou, à época, de consciência corporal, as propostas de conhecimento do corpo englobavam temas como respiração, técnicas de massagem e automassagem, jogos de movimento, exercícios com os olhos vendados, exploração do corpo no espaço, bem como em variados ritmos corporais e musicais, em atividades individuais e em grupos.
Nas dinâmicas de ritmo e expressão, as discussões de Émile Jacques-Dalcroze (1865-1910) e o que ele convencionou chamar de Rítmica também compunham esse trabalho, especificamente na partilha de aulas com a Eliana Ayoub, também docente da área da Educação Física que atua nessa disciplina. Pensando no corpo como um meio para expressão de sentimentos e estados afetivos, Jacques-Dalcroze (2010JACQUES-DALCROZE, Émile. Os estudos musicais e a educação do ouvido. Pro-Posições, Campinas, v. 21, n. 1, p. 219-224, jan./abr. 2010. DOI: https://doi.org/10.1590/S0103-73072010000100015.
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) defendia que, nos estudos musicais, fosse dada uma atenção também à dimensão do movimento corporal dos(as) estudantes de música. Para ele, o sujeito deve escutar não apenas com o ouvido mas também com todo o seu ser, sentindo a música corporalmente; não somente a voz e os ouvidos devem ser exercitados como também aquilo que envolve o corpo, o gesto e a expressividade de uma forma mais ampla, em vivências com o mover-se ritmicamente, nas quais o corpo inteiro colabora com a educação musical.
A ginástica era igualmente tematizada quando havia uma problematização das acrobacias, dos limites corporais, dos medos, de tudo que entra em jogo para um adulto fazer uma cambalhota, mas que também entra em jogo para uma criança fazer uma cambalhota (Carmen). A interface da ginástica com o circo também era discutida, uma vez que a docente estudava tais relações em suas pesquisas a respeito da ginástica e das imagens da educação do corpo (SOARES, 2005SOARES, Carmen Lúcia. Imagens da educação no corpo: estudo a partir da ginástica francesa no século XIX. 3. ed. Campinas: Autores Associados, 2005.). O corpo expressado e representado nas imagens, nos quadros, ou nas esculturas, por exemplo, era uma forma de se abordar as artes plásticas e de se trabalhar em grupos, algo que acontecia em, praticamente, todas as aulas. Estudantes de distintos cursos da Unicamp integravam-se nas turmas da disciplina “Educação, corpo e arte”, e essa diversidade aparecia na avaliação final, na qual os grupos deveriam produzir um texto e uma composição em que expressassem o conjunto das linguagens que as professoras trabalharam na disciplina ao longo de um semestre (Carmen).
Atualmente, o trabalho desenvolvido pelo docente Adilson, no contexto da disciplina “Educação, corpo e arte”, parte dos seus estudos de processos de criação (JESUS, 2012JESUS, Adilson Nascimento de. Dança, corpo e educação. In: OLIVEIRA JUNIOR, Wenceslao Machado de; MARTINS, Maria do Carmo (org.). Educação e cultura: formação de professores e práticas educacionais. Campinas: Alínea, 2012. p. 99-113) e das ressonâncias de sua pesquisa de mestrado (JESUS, 1992JESUS, Adilson Nascimento de. Vivências corporais: proposta de trabalho de auto-conscientização corporal. 1992. Dissertação (Mestrado em Educação Física) - Faculdade de Educação Física, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 1992.), na qual tem todo um protocolo de atividades que servem como uma possibilidade de trabalho; e, a partir dos quais, o docente compõe suas aulas. Essas vivências corporais referem-se principalmente aos três primeiros itens de seu programa de ensino: consciência corporal por meio de técnicas de respiração, relaxamento, massagem/toque e estruturação postural; técnicas de movimento por meio de elementos de diferentes linguagens de dança; e improvisação como forma de criação.
A estrutura de sua aula, normalmente, começa com um relaxamento, que é importante porque baixa a atividade mental e ajuda a pessoa a entrar num estado de conexão com esse mundo interno e com essa qualidade de energia (Adilson). Associadas a esse relaxamento, são trabalhadas, com as estudantes, algumas técnicas de toque terapêutico, massagem/automassagem e conhecimento do próprio corpo, que, como comenta o docente, é uma coisa que eu senti que faltava para elas aqui: apesar de lidarem com gente, não conheciam o corpo, e precisam conhecer (Adilson). Além de conhecimentos da medicina tradicional chinesa e de técnicas de massagem, como o shiatsu e o do-in, percebe-se, no desenvolvimento das aulas desse docente, que é forte a influência dos escritos de Montagu (1988MONTAGU, Ashley. Tocar: o significado humano da pele. Tradução de Maria Silvia Mourão Netto. São Paulo: Summus, 1988.), em seu extenso trabalho sobre a pele e a cultura do contato e sobre como a experiência tátil - ou a ausência dela e a negligência dos sentidos - afeta o desenvolvimento do comportamento.
As demais linguagens, como os desenhos, o cinema e a dança, são abordadas de forma que as estudantes compreendam que o corpo é esse caminho de autoconhecimento (Adilson) e que cada sujeito tem em si um potencial criativo que pode ser fomentado com o uso das imagens. Os desenhos são utilizados como recurso para dar forma às possíveis imagens que surgem no estado de relaxamento, sejam estas oriundas de sensações, visões, imaginações, sonhos, sons, cheiros, sabores, audições. Trechos de filmes de cineastas como Andrei Tarkovsky, Akira Kurosawa, Michelangelo Antonioni e Bernardo Bertolucci são utilizados como elementos que sugerem abertura, para estimular, abrir o núcleo, sendo muito mais contemplação do que divertimento, entretenimento, o que às vezes é difícil para as pessoas (Adilson).
A dança, em suas aulas, parte do trabalho com algum tema feito em movimento, que pode ser a imagem de um sonho, o desenho de uma mandala, a escritura do próprio nome. Assim, são proporcionados pequenos processos de criação a cada aula, que vão dando cada vez mais soltura e mais possibilidade [...] de sempre esgarçar esse tecido da criação (Adilson). Normalmente, essas criações são individuais, mas elas podem até se transformar num processo de criação que culmina numa composição feita pelo grupo inteiro, num espetáculo que só acontece ali, naquele instante, com aquelas presenças, no ritual daquele encontro em sala de aula.
Percebe-se que os trabalhos desenvolvidos na Unicamp e na USP - no contexto da disciplina eletiva “Cultura corporal: fundamentação, metodologia e vivências” -, claramente, têm interlocuções mais fortes com a arte.
Em relação à dança, parece haver um reconhecimento, entre as estudantes de Pedagogia da USP, de que ela está presente na escola, porém sua compreensão nesse contexto é muitas vezes equivocada. Há um esforço da docente Mônica para desconstruir determinada perspectiva de dança que não leva em conta as possibilidades criativas e corporais das crianças na escola, até porque muitas estudantes de Pedagogia já trabalham na educação infantil, na qual a dança está muito presente naquele contexto da professora que ensina e a criança copia, tem o ‘xizinho’ no chão com a fita crepe e a criança não sai do ‘xizinho’ (Mônica). Para além da dança que se faz apenas nas festividades, a dança na escola e a composição coreográfica são pensadas na perspectiva do não bailarino, abordando a expressão em cena de modo a trabalhar de outras formas que não demarcando, com um “xizinho” no chão, o lugar daquela criança que se apresenta na escola. Nesse sentido, essa é uma ideia forte na disciplina eletiva. Há uma busca por construções coreográficas que não partam somente do(a) professor(a) que está na escola mas também dos(as) alunos(as), num sentido de coletividade, de forma que as ideias e propostas de cada um(a) também se façam visíveis na composição.
Vale destacar a pouca expressividade que a dança tem tido nos cursos de Pedagogia, segundo pesquisa de Souza e Ferreira (2015SOUZA, Ana Paula Abrahamian de; FERREIRA, Mirza. Um olhar sobre o ensino da dança nos cursos de Pedagogia. Revista Trama Interdisciplinar, São Paulo, v. 6, n. 2, p. 130-144, maio/ago. 2015. Disponível em: Disponível em: http://editorarevistas.mackenzie.br/index.php/tint/article/view/8345 . Acesso em: 9 dez. 2020.
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). Baseadas numa análise de ementas e bibliografias de disciplinas que oferecem - ou ao menos mencionam - a dança em seus planos de curso, as autoras constataram que, como linguagem artística, a dança vem sendo negligenciada nos currículos dos cursos de Pedagogia que compuseram o escopo de sua pesquisa. Ademais, parece haver um vácuo conceitual acerca do ensino da dança nesses cursos, sendo observado aquilo que, comumente, é levantado sobre a presença da dança nas escolas: docentes pouco preparados(as) “para atuar com essa linguagem, que tendem a perpetuar práticas já cristalizadas como as ‘dancinhas’ com movimentos estereotipados e repetitivos que são produzidas nas diferentes comemorações durante todo o ano letivo” (SOUZA; FERREIRA, 2015SOUZA, Ana Paula Abrahamian de; FERREIRA, Mirza. Um olhar sobre o ensino da dança nos cursos de Pedagogia. Revista Trama Interdisciplinar, São Paulo, v. 6, n. 2, p. 130-144, maio/ago. 2015. Disponível em: Disponível em: http://editorarevistas.mackenzie.br/index.php/tint/article/view/8345 . Acesso em: 9 dez. 2020.
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, p. 132), como a própria docente Mônica havia narrado.
Ainda no contexto dessa disciplina, a proposta da composição coreográfica em dança relaciona-se à ginástica para todos(as)7 7 A inserção de “as” na terminologia ginástica para todos(as) tem sido defendida por Ayoub (2021), sobretudo por conta dos trabalhos que envolvem, majoritariamente, mulheres nos contextos de formação docente inicial e continuada. , cujos trabalhos acerca dessa prática alinham-se com a proposta desenvolvida pelo Grupo Ginástico Unicamp, que pode ser conhecida em Paoliello et al. (2014PAOLIELLO, Elizabeth et al. Grupo Ginástico Unicamp: 25 anos. Campinas: Editora da Unicamp, 2014.), Graner, Paoliello e Bortoleto (2017GRANER, Larissa; PAOLIELLO, Elizabeth; BORTOLETO, Marco Antonio Coelho. Grupo Ginástico Unicamp: potencializando as interações humanas. In: BORTOLETO, Marco Antonio Coelho; PAOLIELLO, Elizabeth (org.). Ginástica para Todos: um encontro com a coletividade. Campinas: Editora da Unicamp, 2017. p. 165-198.) e Ayoub (2003AYOUB, Eliana. Ginástica geral e educação física escolar. Campinas: Editora da Unicamp, 2003., 2021AYOUB, Eliana. Ginástica Geral na formação em Pedagogia. In: PAOLIELLO, Elizabeth (org.). Ginástica Geral: experiências e reflexões. São Paulo: Phorte, 2008. p. 37-54.), dentre outras produções. Assim, muito do que é trabalhado na dança é levado para a ginástica, com um enfoque maior para a exploração e utilização de materiais não convencionais. Além dos elementos específicos que são vivenciados na ginástica, as estudantes têm contato com alguns aparelhos de pequeno e grande porte, passando a outros materiais não convencionais, que são utilizados para a criação coletiva de uma composição coreográfica a ser apresentada no final da disciplina.
Outro tema trabalhado pela docente Mônica é o circo. Num levantamento feito no início do semestre, muitas estudantes relataram já ter trabalhado, em suas escolas, com projetos de circo, porém, a docente relata que o projeto era tenda, palhaço, mas será que circo é isso? Vamos mergulhar nesse universo que está tão presente na escola, principalmente na educação infantil, mas que elas [crianças] conhecem tão pouco, tão superficialmente, conhecem só o que a televisão está falando (Mônica).
As composições finais a serem apresentadas na disciplina eletiva da USP são criações coletivas que contemplam as práticas corporais tematizadas ao longo do semestre, aparecendo aí, muitas vezes, as experiências prévias que as estudantes já têm. E, como se trata de uma disciplina que recebe estudantes de vários cursos da USP, os contextos das composições acabam variando por contemplarem diferentes linguagens, sejam estas ligadas à dança, ao teatro, à música, à percussão corporal etc.
Elencar conteúdos como a dança, a ginástica para todos(as) e o circo, por exemplo, para serem trabalhados com um pouco mais de profundidade, foi uma escolha que levou em consideração aquilo que as estudantes desconheciam ou conheciam tão superficialmente que merecia ser vivenciado na disciplina (Mônica). Para essa docente, o esporte em si, a princípio, não é um conhecimento elencado na disciplina, quando esta é desenvolvida por ela, apesar da conversa aparecer de maneira transversal em alguns momentos; a não ser que haja uma demanda da turma, a docente afirma: vôlei, basquete, futebol, handebol, foi uma opção clara de excluir do meu cronograma (Mônica).
Ao encontro desse tema do esporte, o docente Marcos comenta que, se defendemos uma sociedade para todos e todas, também precisamos fazer uma pedagogia que incorpore todos e todas, embora as pedagogias que vemos nas escolas queiram produzir um tipo determinado de corpo ideal e de práticas que se tornaram hegemônicas, como os esportes. Assim, deixando claro, no primeiro dia de aula, o combinado de que a disciplina, no caso a optativa “Cultura corporal: fundamentação, metodologia e vivências”, é de vivência, o programa desenvolvido por esse docente passa pela abordagem do esporte assim como da brincadeira, da ginástica, da luta e da dança, contando com a colaboração - especialmente para tematizar a luta e a dança - de estudantes do Programa de Aperfeiçoamento de Ensino (PAE) da USP, desenvolvido com a participação de mestrandos e doutorandos.
Na Unifesp, no contexto da disciplina “Cultura corporal na escola”, as vivências conduzidas pelo docente Adalberto e também por convidados(as) são feitas após a fundamentação acerca das temáticas da cultura e do corpo, sendo desmistificadas no sentido de fazer as estudantes compreenderem que não há uma forma padronizada de entendimento do corpo e do movimento. O docente busca trabalhar um pouquinho com tudo (Adalberto), para que, dentre as práticas vivenciadas, cada estudante consiga elencar aquela que melhor se adequar, posteriormente, ao contexto de seu trabalho, o que parece ser um eixo do curso.
Um dos focos da disciplina “Corporeidade e movimento”, na Unesp, é o trabalho com a consciência corporal. Ele acontece ao longo da disciplina, em vivências que vão sendo trazidas conforme as temáticas de discussão da corporeidade. São vivenciadas algumas práticas relacionadas à yoga, ou de percepção corporal, algumas capacidades perceptivas para despertar para essa consciência corporal aliada ao estudo do que é essa consciência, qual a importância de pensá-la e trabalhá-la na escola (Fernanda). Como a disciplina trata, sobretudo, da educação infantil, um dos princípios trabalhados em aula é o elemento da diversidade, por isso, as vivências perpassam diferentes práticas, não buscando a especialização de nenhuma delas. A consciência corporal, aqui, apesar de ser um foco, é pensada num conceito bem mais amplo de prática, pois, quando cita o yoga, por exemplo, a docente trabalha com brincadeiras e atividades lúdicas que trazem elementos do yoga, numa perspectiva de vivência que não é o tradicional dessa prática, mas, sim, que se fundamenta na ludicidade ao trazê-la como tema.
Pensando tanto na consciência corporal das estudantes como na das crianças, parece haver, no percurso dessa disciplina, a preocupação em entender como o que é vivenciado na formação inicial pode ecoar futuramente na escola, por isso o componente lúdico parece estar fortemente enraizado na constituição da referida disciplina. Após um direcionamento maior por parte da docente no início da disciplina, num segundo momento, são as estudantes que começam a construir as suas perspectivas de ensino na escola, de como fazer uma releitura dessas discussões, dessas reflexões, para levar até a criança (Fernanda). As vivências passam a ser coordenadas pelas próprias alunas, que elaboram planos de ensino e desenvolvem as atividades planejadas com o restante da turma, proporcionado uma participação mais ativa das estudantes.
Os aspectos do termo consciência corporal apareceram em algumas narrativas dos(as) entrevistados(as), embora sem nenhuma explanação mais específica do que venha a se tratar esse conjunto de conhecimentos. Shusterman (2012SHUSTERMAN, Richard. Consciência corporal. Tradução de Pedro Sette-Câmara. São Paulo: Realizações, 2012.) avalia que esse é um termo com muitos significados e empregado de diversas formas, sendo mais do que a simples consciência do corpo, à medida que o corpo é mais do que um invólucro físico de carne e osso. O autor se reporta ao corpo como “soma”, imbuído de percepções sensoriais, como outras maneiras de sentir o mundo e a realidade. Nessa perspectiva, interessa-nos o corpo que percebe pelos sentidos e que tem sentimentos, sensibilidades e subjetividades. Tratamos, a seguir, das configurações desses sentidos corporais, em especial o do toque, buscando compreender o fazer sensível nos trabalhos desenvolvidos pelos(as) docentes desta pesquisa.
DIMENSÃO DOS SENTIDOS CORPORAIS NO FAZER SENSÍVEL
As investigações de Sennet (2008SENNET, Richard. Carne e pedra: o corpo e a cidade na civilização ocidental. Tradução de Marcos Aarão Reis. Rio de Janeiro: BestBolso, 2008., p. 13) sobre o corpo e a cidade indicam que a civilização ocidental “não tem respeitado a dignidade dos corpos humanos e a sua diversidade”, encaminhando-nos para algumas questões acerca de nossas experiências corporais: como “devolver” nosso corpo aos sentidos e vice-versa?; como tornar as pessoas mais conscientes de si na relação com as outras, para expressar corporalmente seus afetos?. Obviamente, lembra-nos o autor, as reações mútuas dos sujeitos e os modos como se veem, se tocam e se distanciam são constituídos nas relações entre seus corpos no espaço.
Conforme Le Breton (2016)LE BRETON, David. As paixões ordinárias: antropologia das emoções. Tradução de Luís Alberto Salton Peretti. Petrópolis: Vozes, 2009., importar-se com o corpo implica o emprego de uma sensibilidade, e, por isso, esse tema nos é tão caro; considerando nossa condição humana corporal, sob a forma do sensível, estamos imersos num banho sensorial ininterrupto e, a princípio, jamais cessamos de ver, de escutar, de tocar, de sentir o mundo que existe, cotidianamente, no nosso entorno e no qual estamos imersos.
De forma clássica, os sentidos compreendem a audição, o paladar, o olfato, o tato e a visão, com funções bem circunscritas, como informar sobre os acontecimentos do mundo e alertar o corpo dos perigos externos que o ameaçam, o que Vigarello (2016VIGARELLO, Georges. O sentimento de si: história da percepção do corpo, séculos XVI-XX. Tradução de Francisco Morás. Petrópolis: Vozes, 2016.) chamou de vigias, sentinelas e servidores do corpo. Para esse autor, havia uma visão tradicional da consciência, bem como da sensibilidade, que reservava pouco espaço a representações interiores do corpo. As sensações internas, por muito tempo, foram negligenciadas, com exceção daquelas que se referem à dor.
Em suas pesquisas, Vigarello (2003VIGARELLO, Georges. A história e os modelos de corpo. Pro-Posições, Campinas, v. 14, n. 2, maio/ago. 2003. Disponível em:Disponível em:https://periodicos.sbu.unicamp.br/ojs/index.php/proposic/article/view/8643881 . Acesso em: 9 dez. 2020.
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, 2016VIGARELLO, Georges. O sentimento de si: história da percepção do corpo, séculos XVI-XX. Tradução de Francisco Morás. Petrópolis: Vozes, 2016.) revê o passado do que ele chamou de “invenção” ou “obrigação” de ouvir o corpo, para uma melhor compreensão do “sentimento de si” na atualidade. Assim, tais percepções do experimentar o corpo e seus efeitos de experimentar-se, de sentir-se, têm não somente um passado mas também uma história e uma significação, com suas progressivas e complexas descobertas, conquistas e transformações (VIGARELLO, 2016VIGARELLO, Georges. O sentimento de si: história da percepção do corpo, séculos XVI-XX. Tradução de Francisco Morás. Petrópolis: Vozes, 2016.; RODRIGUES, 1999RODRIGUES, José Carlos. O corpo na história. Rio de Janeiro: Fiocruz, 1999.).
Não existem alternativas senão experimentar o mundo, sendo por ele atravessado e transformado permanentemente e, ao mesmo tempo, atravessando-o e transformando-o continuamente. O mundo, diz Le Breton (2016aLE BRETON, David. As paixões ordinárias: antropologia das emoções. Tradução de Luís Alberto Salton Peretti. Petrópolis: Vozes, 2009., p. 11), “é a emanação de um corpo que o penetra”, e os sentidos possibilitam o elo instaurado entre a sensação das coisas e a sensação de si. É nisso que implica a antropologia dos sentidos: não num estar diante do mundo, mas num estar dentro, imerso, considerando o corpo como a profusão do sensível, ou seja, ele “é incluído no movimento das coisas e se mistura a elas com todos os seus sentidos” (LE BRETON, 2016LE BRETON, David. Antropologia do corpo. Tradução de Fábio Creder Lopes. 4. ed. Petrópolis: Vozes, 2016.a, p. 11).
Essa perspectiva pressupõe a relevância do olhar, do ouvir, do tocar, e, para além disso, pressupõe um sentido que é o cinestésico, cujas percepções se dão à medida que vemos, ouvimos, sentimos, tocamos, saboreamos, experimentamos a temperatura ambiente, percebemos o murmúrio interior do corpo em suas relações com o mundo. Assim, fazemos do mundo uma medida de nossa experiência, tornando-o comunicável aos outros, que também estão, como nós, imersos num sistema de referências sociais e culturais que nos constituem (LE BRETON, 2009LE BRETON, David. As paixões ordinárias: antropologia das emoções. Tradução de Luís Alberto Salton Peretti. Petrópolis: Vozes, 2009., 2016aLE BRETON, David. Antropologia do corpo. Tradução de Fábio Creder Lopes. 4. ed. Petrópolis: Vozes, 2016.)
O corpo e os sentidos fazem a mediação da nossa relação com o mundo: o ser humano toma consciência de si por meio do sentir, experimentando a sua existência pelas distintas ressonâncias sensoriais e perceptivas que não cessam de nos atravessar, conferindo importância e significação a cada um dos sentidos conforme cada cultura, que, por sua vez, implica em outras maneiras de sentir o mundo. Ainda de acordo com Le Breton (2009LE BRETON, David. Antropologia do corpo. Tradução de Fábio Creder Lopes. 4. ed. Petrópolis: Vozes, 2016., 2016aLE BRETON, David. Antropologia dos sentidos. Tradução de Francisco Morás. Petrópolis: Vozes, 2016a.), vivemos diferentes sensorialidades segundo nosso lugar de existência, nossa educação, nossa história de vida. Essa pertença cultural e social marca nossa relação sensível com o mundo diante do qual não somos um olho, um ouvido, uma boca, um nariz, uma mão, mas somos um olhar, uma escuta, uma gustação, uma olfação, um tato, ou seja, somos sentidos que se misturam e convergem a todo momento ao sentimento de existir num mundo concreto, palpável, degustável, audível, visível, olfativo.
Duarte Júnior (2001DUARTE JÚNIOR, João Francisco. O sentido dos sentidos: a educação (do) sensível. Curitiba: Criar, 2001.) também ocupou-se do saber sensível ao tratar do “sentido dos sentidos” e das significações que esse termo carrega, insistindo na necessidade de darmos uma atenção maior a uma educação do sensível. Essa temática, portanto, dos sentidos do corpo e do fazer corporal, ou ainda dos sentidos corporais e do fazer sensível, apresenta-se como um ponto problematizado nas disciplinas investigadas nesta pesquisa, tendo em vista que a dimensão prática do fazer corporal está intimamente relacionada com uma atividade de reflexão a respeito desse fazer em interlocução com as teorias que lhe dão suporte, como podemos vislumbrar no que foi narrado pelos(as) docentes participantes desta investigação.
Desse modo, reafirmamos a importância de se experimentar no corpo, com o corpo, pelo corpo, aquilo que não é possível encontrar em livros: a exploração sensorial, a ampliação dos sentidos do corpo todo, a oportunidade de tocar e ser tocado, de se expressar e ser visto, o que implica processos de ensino-aprendizado que passam pela dimensão da prática, do fazer, do experimentar e experimentar-se por meio de diferentes linguagens que ultrapassam, por exemplo, a leitura e a discussão de textos escritos (STRAZZACAPPA, 2012STRAZZACAPPA, Márcia. Invertendo o jogo: a arte como eixo na formação de professores. In: Anais da 35ª Reunião Anual da ANPEd. Porto de Galinhas: [s. n.], 2012., 2015STRAZZACAPPA, Márcia. Pensando sobre o corpo (ou dando corpo ao pensamento) na formação de professores. In: Anais do Simpósio Internacional Formação de Educadores em Arte e Pedagogia. São Paulo, 2015.; AYOUB, 2008AYOUB, Eliana. Ginástica Geral na formação em Pedagogia. In: PAOLIELLO, Elizabeth (org.). Ginástica Geral: experiências e reflexões. São Paulo: Phorte, 2008. p. 37-54., 2012AYOUB, Eliana. Gestos, cartas, experiências compartilhadas. Leitura: Teoria & Prática (suplemento), Associação de Leitura do Brasil, Campinas, n. 58, p. 274-283, jun. 2012. Disponível em:Disponível em:https://alb.org.br/wp-content/uploads/2015/11/ltp_58_suplemento_18cole.pdf . Acesso em: 9 dez. 2020.
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, 2021AYOUB, Eliana. Memórias da educação física na escola: cartas de professoras. Campinas: Pontes Editores, 2021.).
Nos primeiros semestres de oferecimento da disciplina eletiva “Cultura corporal: fundamentação, metodologia e vivências” da USP, muitas estudantes matriculavam-se sem saber mais claramente do que ela se tratava; e, quando a docente Mônica solicitava que tirassem os sapatos e se sentassem no chão, por exemplo, havia estranhamentos que fizeram ela se questionar se não estaria sendo muito invasiva, pois, como ela disse: parece que a relação de corpo que eu tenho não é a deles [das estudantes]. Já nas turmas seguintes, o perfil de quem se matriculou mudou bastante, havendo uma disponibilidade maior para o trabalho corporal, especialmente pelo fato de as estudantes já saberem do que se tratava a disciplina e que seu percurso seria eminentemente prático, implicando uma disponibilidade do grupo todo para fazer as vivências corporais. Atualmente, as próprias estudantes, ao chegarem à sala, já arrastam as cadeiras e se sentam no chão, por já terem uma noção maior da disciplina e saberem previamente o que vai ser desenvolvido. Entretanto, podemos dizer que algumas estudantes que já cursaram a disciplina obrigatória e, por algum motivo, escolheram não fazer essa eletiva não foram tocadas, de forma mais profunda, em suas vivências corporais.
Os constrangimentos e desconfortos que uma disciplina com essas características práticas pode ocasionar remetem-nos aos cuidados que devemos ter acerca desse fazer corporal, principalmente quando são trabalhados temas relacionados ao conhecimento de si e do outro, em que se faz presente o toque no próprio corpo e no corpo do outro, o que nem sempre é confortável para um grupo que ainda não se conhece tão bem. Assim, a docente Mônica começou a ficar mais atenta às emoções que afloram durante suas aulas e a entender como isso tem afetado as estudantes. E ela se questiona: O que está tocando nessas pessoas que um chora, o outro ri, o outro fica bravo, o outro se irrita, mas chega no final do curso todo mundo quer fazer festa e fala que tem que ter a optativa dois? O que está pegando? (Mônica). Aos poucos, a docente tem observado algumas transformações enunciadas pelos(as) estudantes, os(as) quais passaram a expressar o quanto se sentem tocados e percebem que algumas coisas que eles desconheciam neles como potência, eles percebem que têm potencial para vivenciar muito mais e eles percebem que, tudo aquilo, se ele levar para escola, ele tem uma outra qualidade (Mônica). A docente narrou estar convencida de que quer sensibilizar as professoras com esse tipo de disciplina, pois tem percebido que, quando as estudantes se sentem tocadas, partícipes desse processo, sendo potencialmente afetadas por ele, as reverberações acabam acontecendo na escola sem que seja necessário ficar ensinando “receitas” do que fazer nesse espaço educativo. Dessa forma, os temas da cultura corporal, elencados na disciplina, vão sendo vivenciados e sentidos, de forma que as estudantes reconheçam a sua importância, ou seja, essa experiência que fica, de fato, no corpo do aluno da Pedagogia é que é discutida depois, com esse enfoque do tocar o aluno, ativar a sensação corporal (Mônica).
Na Unicamp, uma das proposições iniciais da disciplina “Educação, corpo e arte” é que ela tinha que ser uma disciplina com características práticas. Ela não seria uma disciplina em que o(a) aluno(a) vai estudar alguma coisa e fica sentado(a) (Carmen). As aulas dessa docente eram sempre práticas, com começo, meio e fim bem nítidos e definidos, e, ao final, havia uma conversa de retomada do que tinha sido trabalhado e qual a finalidade daquela proposta. Essa disciplina tinha uma ideia muito séria do trabalho prático, o trabalho prático não é qualquer coisa. O trabalho prático tem método, tem procedimentos, tem tempos específicos para cada atividade, tem uma organização do espaço, então ele também tem procedimentos didáticos, materiais que são usados, como organizar aquela sala daquele jeito (Carmen).
Após uma primeira aula de apresentação da disciplina, a segunda aula era um pouco mais difícil (Carmen), como a docente conta, pois as estudantes iriam começar a compreender a ideia de que o aprendizado é no corpo e com o corpo, e algumas pessoas tinham dificuldades, inclusive, de fechar os olhos, o que exigia o estabelecimento de um acordo constante, aula a aula, para que as estudantes tivessem uma atitude corporal necessária para frequentar uma disciplina desse tipo. Até o fato de solicitar que as pessoas se deitassem no chão era um problema, mas, ao mesmo tempo, uma importante interpelação do corpo, já que estamos tão acostumados ao corpo em pé ou, ainda mais, ao corpo sentado. Parece que muitos desconfortos estavam ligados a descobertas nunca antes vivenciadas pelas estudantes.
Dentro das possibilidades e limites corporais de cada pessoa, esse fazer corporal é importante por ser uma forma de experiência e de formação, imprescindível para que você experiencie os desafios que são lidar com o seu corpo e o corpo do outro. Porque é isso que o professor faz o tempo inteiro, seja ele de matemática ou de educação física, ele está sempre lidando com seu corpo e o corpo do outro (Carmen), sendo o(a) docente confrontado(a) com isso no momento de sua atuação. As aulas na “Educação, corpo e arte” propiciavam às estudantes um interesse maior pelo próprio corpo, suscitando-lhes uma autocrítica da sua própria educação, em que um corpo expressivo, dinâmico, vivo, ficou de lado, ficou abandonado (Carmen).
De acordo com o docente Adilson, o fazer corporal de uma disciplina como essa, num curso como o de Pedagogia, implica confrontos do sujeito consigo mesmo, em que o(a) docente e as estudantes procuram lidar com as dificuldades que surgem. Como ele narra, é comum as alunas falarem que não conseguem fazer alguma coisa, que têm dificuldade em tal trabalho corporal. Há aquelas, a maioria, que realmente se dispõem a fazer o proposto, mas também acontece de algumas se recusarem a fazê-lo, por considerar alguma proposta, de certa forma, invasiva ou constrangedora, ou que toca em coisas delicadas. Para esse docente, isso é algo que acontece, pois a pessoa que apresenta alguma resistência não está preparada, não é o momento (Adilson), e, por isso, ele não costuma obrigar sua participação, respeitando os limites pessoais para o envolvimento em cada processo.
Uma proposta de trabalho comumente feita no início das aulas desse docente envolve a respiração, o toque sutil e a massagem, como dito anteriormente. Ele narrou uma situação, por exemplo, em que isso foi feito, e uma aluna, que participou da vivência até o fim, relatou, ao final, que detestava que pegassem em suas mãos e que fizessem massagem em seus ombros, sendo exatamente isso o que havia sido feito. Nesses momentos, entram algumas discussões familiares e desdobramentos que tocam em coisas sensíveis, sendo uma oportunidade de abordá-las a partir, justamente, de uma recusa.
Montagu (1988MONTAGU, Ashley. Tocar: o significado humano da pele. Tradução de Maria Silvia Mourão Netto. São Paulo: Summus, 1988.) cita que as palavras, muitas vezes, são proferidas ocupando o lugar dos relacionamentos pessoais sensoriais e das experiências táteis sentidas por nós. Diante disso, o docente Adilson tem defendido que, para trabalhar com o corpo de outras pessoas, temos de conhecer o nosso próprio corpo, sendo a dimensão do toque uma perspectiva desse conhecimento. Além disso, esse docente propõe o seguinte:
Tem que conhecer, de alguma perspectiva você tem que conhecer. [...]. Através de alguns sinais, alguns sintomas, alguns rastros, que aí é um trabalho também intuitivo, você cultivar a intuição nesse trabalho tête-à-tête com o outro, você aprende coisas que necessariamente não estão escritas em lugar nenhum, mas é do contato direto com o outro. (Adilson).
Com base no que foi narrado anteriormente e ancoradas nos estudos de Le Breton (2016a) e Vigarello (2016VIGARELLO, Georges. O sentimento de si: história da percepção do corpo, séculos XVI-XX. Tradução de Francisco Morás. Petrópolis: Vozes, 2016.), acreditamos ser possível atingir o objetivo de tornar a interioridade corporal menos obscura e negligenciada. O tato, por exemplo, poderia ser demandado menos como um indício de alerta ou de perigo e mais como uma vertente profunda que propicia sensibilidades outras na totalidade do corpo, possibilitando uma consciência corporal como lugar privilegiado da experiência, da fruição, do sentimento de si, do autoconhecimento e do conhecimento do outro.
A pele é um território sensível “que reúne em seu entorno o conjunto dos órgãos sensoriais sobre o fundo de uma tatilidade que frequentemente nos foi apresentada como a nascente de todos os outros sentidos” (LE BRETON, 2016LE BRETON, David. Antropologia do corpo. Tradução de Fábio Creder Lopes. 4. ed. Petrópolis: Vozes, 2016.a, p. 60). A partir disso, observamos que as crianças, geralmente, tocam-se com mais espontaneidade, ainda despreocupadas com alguns ritos corporais socialmente produzidos. Mas, aos poucos, esses contatos vão diminuindo e sendo substituídos pela palavra, pela troca de olhares, por gestos mais distantes. De acordo com o autor, os “contatos físicos outrora descontraidamente buscados tornam-se ambivalentes, sujeitos à deliberação. Vindos de pessoas próximas, eles continuam sendo valorizados, mas, procedendo de estranhos, causam mal-estar, ou um sentimento de violação da intimidade” (LE BRETON, 2016aLE BRETON, David. Antropologia do corpo. Tradução de Fábio Creder Lopes. 4. ed. Petrópolis: Vozes, 2016., p. 269-270).
Tocar o outro é sentir-se à beira de um abismo aberto por sua presença, uma vez que a tolerância “aos contatos físicos é primeiramente cultural, ligada à educação recebida, mas ela se modula segundo a sensibilidade individual e de acordo com as circunstâncias” (LE BRETON, 2016LE BRETON, David. Antropologia do corpo. Tradução de Fábio Creder Lopes. 4. ed. Petrópolis: Vozes, 2016.a, p. 271). O toque de uma massagem, por exemplo, induz a ressonâncias ligadas à história pessoal de quem é tocado, aspecto que esteve presente na narrativa do docente Adilson.
Retornando às discussões do fazer corporal que constitui a prática na disciplina “Corporeidade e movimento” da Unesp, é interessante notar as falas das estudantes na narrativa da docente Fernanda ao expressar que ela poderia usar menos slides, por exemplo, já que é uma disciplina mais teórico-prática, ou ainda que deveria ter mais espaço pra prática [...] mais esse momento de vivenciar (Fernanda). Esse diálogo entre a teoria e a prática é necessário, segundo a docente, porém com a devida atenção que uma disciplina como essa implica: não dá pra ficar só no praticismo, como diria Paulo Freire, mas também ficar só na teoria às vezes a gente não chega naquilo que quer (Fernanda). Obviamente que há de considerar o tempo escasso de uma disciplina dessas no currículo do curso que, como um todo, poderia ter mais momentos de produção de conhecimento que passa pelo corpo que não aquele sentado em sala de aula (Fernanda). Aqui, o cuidado com o fazer corporal relaciona-se com a não instrumentalização das atividades, pois não adianta apresentar somente conteúdos e sequências para serem desenvolvidas na escola se a estudante não tiver essa compreensão da importância desse movimento para a criança e se ela não sentir no próprio corpo o que esse movimento pode provocar (Fernanda). E a docente reitera:
Então parto dessa dupla perspectiva, de pensar tanto a formação profissional - como que eu posso atuar com o corpo e movimento na infância - mas pensar numa formação pessoal dessas futuras docentes também. Ou seja, discutir sobre corpo, pensar sobre corpo, pensar sobre o movimento, trazer experiências de movimento, então a disciplina é teórico-prática, trazemos algumas questões relacionadas às vivências de diferentes naturezas para propiciar o despertar também para o próprio corpo. Na medida em que ela se desperta para o seu próprio corpo, entendo que fortalece a relação entre a formação pessoal e a profissional. (Fernanda).
Outras falas das estudantes no final da disciplina, expressas pela docente, como, por exemplo: eu não imaginava que era isso que ia encontrar, ou a forma de perceber a mim mesma mudou de quando eu entrei nessa disciplina (Fernanda), dão a dimensão do quanto esse retorno positivo em relação ao trabalho - embora recente - que é desenvolvido na disciplina “Corporeidade e movimento” traz pontos que chamam a atenção da docente. Ela narra que algumas estudantes que já estão atuando nas escolas relataram, por exemplo, que nunca se sentavam no chão com as crianças e que, agora, se sentem mais disponíveis corporalmente para se envolver com elas.
Entendemos que esse modo de pensar sobre a dimensão pessoal da formação dessas futuras professoras ancora-se em propostas nas quais o fazer corporal passa pela prática justamente nesse sentido de elas perceberem pelo/no/com o próprio corpo os prazeres e as dificuldades que também estão presentes no contexto escolar. Isso vai ao encontro do que também considera o docente Adalberto, na disciplina “Cultura corporal na escola”:
O que acontece, principalmente quando é aula de dança ou alguma atividade que elas [as estudantes] têm menos habilidade, no início elas ficam constrangidas, com vergonha, mas depois quando elas percebem que ninguém está ali para julgá-las, elas acabam participando e até brincam com a falta de habilidade delas, sem problema nenhum. E aí a gente pega esse gancho para tentar mostrar que isso pode ser feito com as crianças, que é desarmá-las do preconceito em relação à falta de habilidade do outro. E acaba sendo mais tranquilo esse trabalho. (Adalberto).
No início desse processo, parece sempre haver um receio inicial, de tal forma que sejam proporcionadas dinâmicas de trabalho que, conforme salienta o docente, não necessitam tanta habilidade, e aos poucos a gente vai modificando (Adalberto). Práticas que demandam o andar, o correr, o saltar, por exemplo, vão se tornando mais complexas e, de acordo com a afirmação do docente, quando elas apresentam essas dificuldades, a gente coloca justamente isso, se você que está bem desenvolvida tem dificuldade, imagina uma criança. Pra gente compreender que o limite da criança também deve ser respeitado (Adalberto).
O docente comenta que um ponto interessante é quando as estudantes vivenciam práticas por meio das quais se percebem corporalmente e entendem as dificuldades do outro nesse fazer corporal. Assim, no momento da prática pedagógica delas, após essa compreensão do próprio corpo, elas passam a considerar o trabalho corporal com as crianças na escola, mediando e intervindo de forma mais adequada em determinadas situações, ocupando outros espaços além da sala de aula (quadra, pátio, parque), fora do horário do recreio em que, normalmente, o fazer corporal já está mais presente.
As ressonâncias no cenário escolar relacionam-se com esse fazer corporal, o que consideramos diferente do caráter meramente instrumental de atividades a serem “aplicadas” em outros contextos, e esse é um trabalho a ser construído coletivamente, com as turmas. O docente Adalberto relata que essa foi uma visão aos poucos modificada no curso de Pedagogia da Unifesp, isto é, muitas estudantes ingressavam no curso com certa resistência, achando que iam ter aula de práticas corporais específicas, como dança, ginástica, esportes, e que iam aprendê-las para “aplicá-las” nas escolas, ou seja, foi uma desconstrução que ocorreu aos poucos.
Observamos que as narrativas docentes a respeito dos trabalhos que são desenvolvidos nas disciplinas pesquisadas revelam a singularidade de cada percurso formativo e a autonomia docente em suas propostas didático-metodológicas, as quais expressam o entrelaçamento das experiências e dos saberes docentes constituídos em sua formação e atuação profissional, numa constante busca por meios que possibilitem a construção de modos outros de compreender os sentidos corporais no fazer sensível e de conceber o corpo e as práticas corporais.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Na Apresentação do Dossiê Corpo e Educação, publicado no Caderno Cedes, Soares (1999SOARES, Carmen Lúcia. Apresentação Dossiê Corpo e Educação. Caderno Cedes, Campinas, ano XIX, n. 48, ago./1999. DOI: https://doi.org/10.1590/S0101-32621999000100001.
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) havia apontado a pouca consideração da temática “corpo” no campo da educação, citando, como exemplo, sua quase total ausência nos currículos dos cursos de Pedagogia, tanto na forma de disciplinas quanto como conhecimento compreendido como necessário à formação de professores. Atualmente, passados mais de 20 anos dessa publicação, parece que já é possível vislumbrarmos um cenário um pouco mais positivo. Ao apresentarem a produção da revista Pro-posições, relacionada aos estudos e às pesquisas do e sobre o corpo, Ayoub e Soares (2019AYOUB, Eliana; SOARES, Carmen Lúcia. Estudos e pesquisas do e sobre o corpo: a produção da Pro-Posições (1990-2018). Pro-Posições, Campinas, v. 30, 2019. DOI: https://doi.org/10.1590/1980-6248-2019-0077.
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) constataram que esse importante periódico da área da educação tem publicado um conjunto significativo de textos concernentes a essa temática, o que pode ser reconhecido como um avanço para o campo educacional.
Por outro lado, pensamos que, se outras pesquisas como a nossa fossem realizadas com outros(as) docentes de cursos de Pedagogia de universidades de outros estados brasileiros, talvez, seria possível encontrar esse conhecimento que tem o corpo, as práticas corporais ou a Educação Física como tema a ser discutido no campo da educação, em disciplinas compreendidas como necessárias à formação inicial de pedagogas e pedagogos. Ademais, consideramos que a confluência das fontes documentais e das narrativas levantadas nesta investigação permitiu que não só refletíssemos sobre essa temática na formação inicial das pedagogas mas também observássemos suas possíveis repercussões didáticas no processo educativo que acontece na educação básica.
Vale ressaltar que nem os programas das disciplinas e nem as narrativas das experiências docentes substituem o que acontece durante a prática pedagógica, na aula em acontecimento. Como fontes de pesquisa, esses programas e essas experiências são dimensões outras que revelam, por vezes, algumas intenções do processo educativo que está continuamente em transformação. Contudo, pensamos que um programa bem elaborado e interpelado a cada aula caracteriza-se como um projeto que se materializa nas relações educativas, sendo que essa preocupação de interrogar-se parece-nos fundamental para que, a cada semestre de oferecimento das disciplinas, o trabalho desenvolvido possa ser reformulado no sentido de propiciar propostas formativas cada vez mais significativas, acolhedoras e inclusivas.
Explicitamos, ainda, um ponto que foi mencionado acerca das composições corporais que são criadas em grupo e apresentadas ao final de algumas disciplinas, as quais consideramos que, para além de uma forma de avaliação do processo, também proporcionam que as estudantes sejam protagonistas do percurso educativo do começo ao fim. Essa ideia se afina, por exemplo, com a proposta de ginástica para todos(as) desenvolvida pelo Grupo Ginástico Unicamp (PAOLIELLO et al., 2014PAOLIELLO, Elizabeth et al. Grupo Ginástico Unicamp: 25 anos. Campinas: Editora da Unicamp, 2014.; SARÔA; AYOUB, 2018SARÔA, Giovanna; AYOUB, Eliana. A constituição e o processo coletivo de criação do Grupo Ginástico Unicamp pelas vozes de seus coordenadores. Conexões - Educação Física, Esporte e Saúde, Campinas, v. 16, n. 4, p. 414-432, out./dez. 2018. DOI: https://doi.org/10.20396/conex.v16i4.8653984.
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). Conceber as composições corporais como processos coletivos de criação, nos quais todas as pessoas envolvidas participam de forma efetiva e oferecem suas contribuições, implica reconhecê-las como uma possibilidade de fruição do corpo, como uma narrativa corporal que pretende dizer algo para o outro em nosso tempo. Esses processos criativos fazem circular, igualmente, diversos sentidos que são mobilizados tanto entre aqueles que se apresentam corporalmente de forma expressiva e criativa quanto entre aqueles que são espectadores. Caracterizam-se como criações que nos permitem tocar e sermos tocados, uma vez que o ritual do olhar faz parte dessa interação, igualmente, como uma dimensão do contato, pois, como diz Le Breton (2009, p. 12), contemplar o outro “é como tocá-lo de maneira simbólica”.
Acreditamos que essa exploração sensível de cada pessoa na relação consigo mesma e com os outros também é conhecimento que se produz, que se inscreve em nós por meio de práticas corporais que podem ser pensadas como fontes de resistência e de emancipação. Assim, o que se propõe é a valorização de cada estudante como pessoa, como sujeito que participa ativamente do mundo por sua própria experiência e por meio de seu corpo, partindo desse autoconhecimento no encontro com o outro e nos laços de confiança que se estabelecem nos compartilhamentos de humano com humano, de docente com estudante.
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4
O projeto de pesquisa foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da Unicamp sob Parecer nº 1.769.114, em 10 de outubro de 2016. Aos(às) participantes, solicitou-se a leitura e assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE).
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5
A opção pela escrita no feminino vai ao encontro da realidade de que a maioria das estudantes dos cursos de Pedagogia é composta por mulheres. Adotaremos esse critério quando nos referirmos às alunas em formação, futuras pedagogas.
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6
Após 2017, quando esse levantamento foi realizado, algumas disciplinas podem ter sofrido modificações em suas denominações, de acordo com as atualizações dos PPPs, a exemplo da disciplina da Unifesp “Fundamentos teóricos e práticos da cultura corporal na escola”, atualmente denominada “Cultura corporal na escola”.
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7
A inserção de “as” na terminologia ginástica para todos(as) tem sido defendida por Ayoub (2021), sobretudo por conta dos trabalhos que envolvem, majoritariamente, mulheres nos contextos de formação docente inicial e continuada.
Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
22 Jul 2022 -
Data do Fascículo
2022
Histórico
-
Recebido
10 Dez 2020 -
Aceito
30 Nov 2021