RESUMO:
O presente artigo, ao focar as políticas curriculares para a educação básica, teve como objetivo trazer ao debate acadêmico questões relacionadas com a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) e o Referencial Curricular Gaúcho (RCG) e suas influências no Documento Orientador Curricular de um Território Municipal (DOCT-SL/RS). Apoiado em uma abordagem qualitativa, que utiliza o recurso metodológico da análise documental associado à Análise de Redes Sociais, o estudo aqui apresentado mostrou que a participação da sociedade civil e das comunidades escolares na produção das políticas curriculares restringe-se, em geral, a algumas representações e consultas públicas. Os resultados indicaram, também, que a BNCC como estratégia macro traduz-se em um documento excessivamente prescritivo e operacional e, assim, limitado quanto à explicitação e ao delineamento de diretrizes e orientações para seus desdobramentos nas esferas estadual e municipal. A partir da leitura cuidadosa do RCG, foi possível inferir que ele é uma proposta pedagógica centrada no desenvolvimento de competências, que tem mais expressão conceitual na BNCC do que no documento municipal. Os resultados da pesquisa identificaram, ainda, a existência de aspectos que não comungam com o regime de colaboração, pois a elaboração e a produção dos textos dos referidos documentos evidenciam desarticulações entre os processos estadual e municipal, com destaque para a ausência de participação, na escrita desses textos, de ambos os entes federativos e de outros atores representativos da sociedade civil e das comunidades escolares.
Palavras-chave: Currículo; Políticas Curriculares; Base Nacional Comum Curricular; Referencial Curricular Gaúcho; Documento Orientador Curricular de um Território Municipal
RESUMEN:
El presente artículo, al centrarse en las políticas curriculares para la educación básica, busca reflexionar sobre la Base Nacional Común Curricular (BNCC) y el Referencial Curricular Gaúcho (RCG) y sus influencias sobre el Documento Orientador Curricular de un Territorio Municipal (DOCT-SL/RS). Apoyado por una investigación de abordaje cualitativo que emplea el recurso metodológico del análisis documental combinado con el Análisis de Redes Sociales, el estudio presentado aquí mostró que la participación de la sociedad civil y de las comunidades escolares en la producción de políticas curriculares, por lo general, se restringe a algunas representaciones y consultas públicas. Los resultados también indicaron que la BNCC como estrategia macro se traduce en un documento excesivamente prescriptivo y operacional y, así, limitado cuanto a la explicitación y delineamiento de directrices y orientaciones para sus desdoblamientos a niveles estatal y municipal. De la lectura cuidadosa del RCG, fue posible inferir que se trata de una propuesta pedagógica centrada en el desarrollo de competencias, tiene mayor adherencia conceptual que el documento municipal a la BNCC. También se identificaron aspectos que no coinciden con el régimen de colaboración, pues la elaboración y la producción de los textos revelan desarticulaciones entre el proceso estatal y municipal, especialmente cuanto a la ausencia de participación de ambas entidades federativas y de otros actores representativos de la sociedad civil y de las comunidades escolares.
Palabras clave: Currículo; Políticas Corriculares; Base Nacional Común Curricular; Referencial Curricular Gaúcho; Documento Orientador Curricular de un Territorio Municipal
ABSTRACT:
By focusing on curricular policies for basic education, this article aimed at bringing to the academic debate sphere questions related to the Brazilian National Core Curriculum (BNCC) and the Curricular Referential of Rio Grande do Sul (RCG) and, subsequently, its influences on the Curricular Guiding Document of a City Territory (DOCT-SL/RS). Based on a qualitative approach that uses document analysis associated with the Social Media Analysis method, this study revealed that the participation of civil society and school communities in the curricula policies production is limited to some representations and public consultations. Results also indicate that the BNCC as a macro strategy constitutes a document that has an excessively prescribing and operational nature and, thus, is limited for its explicitness and restricted as to the outlining of guidelines for its unfolding at state and city levels. From an attentive reading of the RCG, it was possible to infer that it is a pedagogical proposal centered around developing competencies with more conceptual expression in the BNCC than in the city document itself. The results of this study also identified the existence of aspects that do not comply with the collaboration regimen to elaborate and produce texts of the mentioned documents revealing the lack of articulation between state and city processes, highlighting the lack of participation, throughout the writing of these texts, of both federative entities and other representative actors of civil society and school communities.
Keywords: Curriculum; Curricular Policies; Brazilian National Core Curriculum; Curricular Referential of Rio Grande do Sul; Curricular Guiding Document of a City Territory
INTRODUÇÃO
Tendo como temática as políticas curriculares no Brasil, na perspectiva de uma educação democrática, este artigo tem como centralidade o Documento orientador do currículo do território de São Leopoldo/RS (DOCT-SL/RS) situado na Região Metropolitana de Porto Alegre, Rio Grande do Sul (RS), e suas articulações com a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) e o Referencial Curricular Gaúcho (RCG). Essa rede municipal de ensino, lócus da investigação que aqui se apresenta, situa-se, conforme dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2010), em uma cidade com aproximadamente 215 mil habitantes e, de acordo com o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP, 2019), possui 1.267 docentes e 23.603 discentes distribuídos em 49 escolas, das quais apenas uma encontra-se no meio rural, com 123 estudantes.
Mapeando a literatura do campo das políticas curriculares no Brasil, convocamos o estado da arte desenvolvido por Rosa e Ponce (2016), publicado na revista e-Curriculum, sobre as políticas curriculares para a educação básica, no período de 2010 a 2015. Os autores, nesse estudo, concluíram que vivemos atualmente um contexto educacional no qual se tornou generalizada a emergência de preocupações relacionadas às concepções marcadamente cognitivistas e produtivistas do papel da educação e da escola nas políticas curriculares no Brasil e em outros países, particularmente sobre a formação e sobre o trabalho docente. Tendo essa conclusão por referência, o estudo a que se reporta este artigo buscou promover uma discussão conceitual a partir da análise dos documentos mencionados anteriormente. Sobre essa temática, merecem também destaque alguns estudos relacionados ao Ensino Médio e à Educação Profissional (BRANCO et al., 2019; COSTA; LOPES, 2018; FERRETI; SILVA, 2017; HERNANDES, 2020; MENDONÇA; FIALHO, 2020; SILVA, M. R., 2018; SILVA, R. R. D., 2018, 2020).
Em relação às reformas curriculares, são relevantes as preocupações quanto ao não enfrentamento das desigualdades educacionais brasileiras (KOEPSEL; GARCIA; CZERNISZ, 2020), por não problematizarem as condições materiais das escolas públicas e do exercício da docência (GIROTTO, 2019), o que, na prática, responsabiliza o professor pelos resultados dos processos educativos (FREITAS; SILVA; LEITE, 2018). Para Macedo (2015, p. 94), há “no currículo, como em toda prática de significação, um desejo de controle, uma redução de uma infinidade de sentidos àqueles tornados possíveis pelos jogos de poder enquanto a justiça social não pode prescindir de sujeitos singulares em sua concretude”.
Em consonância com tais estudos, consideramos importante analisar criticamente as relações entre a política curricular municipal - Documento orientador do currículo do território de São Leopoldo/RS (DOCT-SL/RS) - e as políticas de âmbito estadual - Referencial Curricular Gaúcho - e nacional - Base Nacional Comum Curricular (BRASIL, 2017) - no cenário de implementação da BNCC. Esclarecemos que o currículo escolar não pode ser visto unicamente como documento oficial nem como texto prescrito e/ou rol de objetivos, conteúdos, metodologias e avaliações para determinado nível de ensino (FERNANDES, 2012; FERRAÇO; CARVALHO, 2012; LEITE, 2002a, 2002b), é necessário assumi-lo, também, na sua dimensão prática, ou seja, enquanto práxis capaz de assegurar uma (re)construção permanente, pois a práxis remete a um contexto prático-teórico que é dialético e, portanto, dinâmico, possibilitando gerar novas formas de experienciar a educação. Isso significa que podemos compreender o currículo enquanto práxis justamente nos contextos escolares, no cotidiano escolar e nas práticas curriculares dos professores (FREIRE, 1981, 1996, 2001, 2002, 2005), em que as recontextualizações e as ressignificações acontecem (BALL; MAGUIRE; BRAUN, 2016).
Sempre que falamos em políticas curriculares pensamos em implementação e, consequentemente, no papel importante tanto das redes e comunidades escolares quanto dos professores nas escolas ao colocarem tais políticas em prática. Temos como pressuposto a ideia de que cada rede de ensino e cada escola, com sua comunidade escolar, conferem sentido às políticas curriculares, reiterando-as, refratando-as, ressignificando-as (BALL; MAGUIRE; BRAUN, 2016) e alinhando-as com políticas educacionais democráticas. Nesse sentido, o estudo apresentado neste artigo responde à seguinte pergunta de pesquisa: o que ocorre nos processos de produção dos textos do campo dos estudos curriculares, relativamente às políticas do contexto municipal (DOCT-SL/RS), na sua relação com os contextos nacional (BNCC) e estadual (RCG), considerando as especificidades e peculiaridades de cada realidade e as articulações na perspectiva de uma educação democrática?
Na sua estrutura, este artigo, além da introdução, contém as seguintes seções: “Fundamentação teórica”, “Procedimentos metodológicos”, “A produção dos textos das políticas curriculares em foco”, “Visitando conceitos-chave no campo das políticas curriculares” e “Considerações finais”.
FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
Tendo como enfoque principal o campo dos estudos curriculares, é aqui apresentado um diálogo com os autores do campo educacional focado na educação democrática enquanto contribuição para a justiça social e curricular. Como nos lembrou Connell (1999), três razões justificam a importância do tema da justiça social para professores, pais, estudantes, administradores e gestores de entes federativos4. A primeira razão refere-se ao fato de que o sistema educativo é um bem público de grande importância, que tem uma distribuição desigual de recursos na educação formal e que possui resultados desiguais em termos de acesso social. A segunda concerne ao fato de o sistema educativo não ser um bem público somente hoje, mas também o será, sobretudo, no futuro, pois o conhecimento organizado, cada vez mais, tem se convertido no componente mais importante do sistema produtivo. Além disso, o sistema educativo não só distribui os bens sociais atuais como também conforma o tipo de sociedade. Assim, conseguir que a sociedade seja justa depende, em parte, do uso que fazemos do sistema educativo, de como ele é organizado e das suas prioridades.
A terceira razão que endossa a relevância do tema da justiça social refere-se ao questionamento sobre o que é educar, já que o ensino e a aprendizagem, como práticas sociais, sempre colocam questões acerca dos propósitos e critérios para a ação, da aplicação de recursos e da responsabilidade e das consequências das ações educacional e social. Nessa perspectiva, o pressuposto indica que uma maior justiça curricular (SANTOMÉ, 2013) e cognitiva (CORTESÃO, 2011) é geradora de justiça social (CONNELL, 1995, 1999, 2012). Para que isso ocorra, as políticas educativas que têm essa matriz como orientação precisam reconhecer que a escola e os seus agentes possuem poder de decisão nos processos de elaboração de um currículo que concretize os princípios de justiça social (LEITE, 2002a, 2002b, 2012; SAMPAIO; LEITE, 2017). Na verdade, esse é o pressuposto primeiro em uma escola de todos e para todos, isto é, em uma escola que busque cumprir e construir o princípio da igualdade de oportunidades para todos os grupos sociais para os quais a educação se destina.
Considerando uma educação democrática implicada em políticas curriculares sustentadas nos princípios e fundamentos de justiça social e curricular, vale destacar que a literatura acadêmica, já de longa data, reconhece tanto a não neutralidade do currículo e do conhecimento na elaboração e na construção de princípios de uma educação democrática (GIROUX, 1993; SILVA, 2004; LEITE, 2002b, 2012) quanto a importância de se contextualizar o currículo prescrito, de modo que ele contemple as situações locais e as especificidades dos distintos alunos (LEITE; FERNANDES; FIGUEIREDO, 2018, 2019). Reconhecer que a escola e o currículo não são neutros, transmitem e privilegiam valores que são influenciados e influenciam o reconhecimento social de determinados saberes e características culturais constitui uma atitude essencial para a criação de condições que promovam a igualdade de oportunidades de sucesso escolar. Ademais, sabemos que o cotidiano é um espaço privilegiado de produção de práticas curriculares, pois “os currículos avançam para muito além do que podemos compreender por meio dos textos que definem e explicam as propostas das escolas” (REIS, 2016, p. 1.334).
Nesse aspecto, compreendemos o currículo nacional como um projeto que se constrói na ação (LEITE, 2005; LEITE; FERNANDES; FIGUEIREDO, 2018, 2019), em que os professores, enquanto configuradores do currículo (LEITE; FERNANDES, 2010, 2011), fazem uso de sua autonomia para a tomada de decisões curriculares contextualizadas. Na concretização dessa ação, há que levar em consideração que “[...] o conhecimento válido para muitas crianças é o conhecimento que está diretamente relacionado com a sua própria realidade social, conhecimento que lhes permite envolver-se em atividades que são por elas valorizadas” (SMITH, 2002, p. 7). Por isso, um currículo contextualizado, pautado por uma justiça social e cognitiva que ultrapasse o que preveem os documentos curriculares (REIS, 2016), tem de trazer ao espaço escolar experiências dos cotidianos de todos os estudantes. Foi também nesse sentido que Connell (1999, p. 70) lembrou que “[...] os princípios da justiça curricular deveriam ajudar-nos a limpar um pouco a casa da educação e a identificar os aspetos do currículo que são socialmente injustos”. Para isso, é necessário considerar os seguintes princípios: o princípio dos interesses dos menos favorecidos, que é negado por práticas curriculares que confirmam essa situação; o princípio da participação, que é negado quando se incluem práticas que permitem a uns grupos terem mais participação do que outros na tomada de decisões; e o princípio da produção histórica da igualdade, que é negado quando se obstaculiza a mudança nessa direção. Ponce e Neri (2015) também apontam a busca pela justiça curricular como sendo necessária, e a prática curricular como sendo a chave desse processo nas três dimensões fundamentais do currículo: a do conhecimento requerido para que os sujeitos do currículo preparem-se para compreender o mundo; a do cuidado com esses sujeitos envolvidos no processo pedagógico, de modo a garantir que todos tenham condições dignas para se desenvolver; e a da convivência democrática e solidária, que deve ser promovida na escola.
O esforço de uma política educativa que cumpra essas condições que a tornam democrática, inclusiva e propiciadora de aprendizagens de qualidade, relaciona-se com a concepção de uma escola curricularmente inteligente (LEITE, 2003), isto é, de uma escola onde ocorrem processos de tomada de decisão coletivamente participados, que desafia continuamente a si própria a instituir uma dinâmica interna e externa conducente à melhoria da qualidade da educação dos alunos que acolhe. É nesse sentido que se considera também importante que professores, gestores e demais atores da comunidade educativa desenvolvam o poder de agência (PRIESTLEY; BIESTA; ROBINSON, 2013, 2015; SANTOS; LEITE, 2020), que lhes permitirá ter um papel ativo na tomada de decisões e na construção de positivas mudanças.
PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
Do ponto de vista metodológico, neste estudo, foi seguido um procedimento de orientação qualitativa, que recorreu à análise documental, conforme proposto por Cellard (2012), para investigar os seguintes documentos: Base Nacional Comum Curricular, em nível nacional; Referencial Curricular Gaúcho, em nível estadual; e Documento Orientador do Currículo do Território Municipal, em nível municipal. Alinhados com Cellard (2012, p. 295), reconhecemos que “o documento escrito constitui uma fonte extremamente preciosa para todo pesquisador nas ciências sociais” e que a análise documental ocorre em duas etapas: a análise preliminar e a análise propriamente dita. A análise preliminar abrange o contexto, o autor ou os autores, a autenticidade e confiabilidade do texto, a natureza do texto, os conceitos-chave e a lógica interna do texto. Segundo o autor, essas dimensões permitem ao pesquisador acessar o documento e empreender uma interpretação coerente, tendo em vista a temática ou os seus questionamentos iniciais, não se constituindo em um método rígido, mas em interpretações que “decorrem das escolhas do pesquisador com relação ao problema e ao tema de sua investigação, bem como de suas preferências teóricas” (CELLARD, 2012, p. 314). É importante destacar, ainda, que o corpus de documentos utilizados nesta pesquisa corresponde a documentos oficiais pertencentes ao campo das políticas curriculares. Tais documentos, além de propiciarem uma riqueza de dados, são fontes autênticas e confiáveis, indo ao encontro do que prevê o autor para a etapa da análise preliminar. Dessa maneira, exploramos, neste estudo, os seguintes elementos: contexto, autor(es), natureza do texto e conceitos-chave.
O contexto é primordial para o desenvolvimento das demais etapas, pois compreende o cenário social, cultural, econômico e político no qual uma documentação foi produzida e permite ao pesquisador, como afirma ainda Cellard (2012, p. 299), “apreender os esquemas conceituais de seu ou de seus autores, compreender sua reação, identificar as pessoas, grupos sociais, locais, fatos aos quais se faz alusão, etc.”. O autor acrescenta que “não se pode pensar em interpretar um texto, sem ter previamente uma boa ideia da pessoa que se expressa, de seus interesses e dos motivos que a levaram a escrever” (CELLARD, 2012, p. 300). Por isso, interessou-nos registrar os atores que produziram os textos/documentos e suas representatividades.
Quanto à natureza dos textos, mesmo que todos sejam documentos normativos oficiais de políticas curriculares, levamos em consideração a estrutura e a lógica interna de cada um deles e o período em que foram publicados. Relativamente aos conceitos-chave, por terem sido analisados com a intenção de compreendermos o sentido dos termos empregados pelo(s) autor(es) do(s) texto(s), eles foram discutidos na segunda etapa da análise. Por outro lado, os conceitos-chave selecionados para a análise estão também de acordo com Fujita (2004, p. 258), que os define como “uma representação do conteúdo significativo do texto” e, como nos é recordado por Ludke e André (1986), também podem ser denominados “categorias de análise”. Como bem sustentaram as duas últimas autoras, é importante considerar que “não existem normas fixas nem procedimentos padronizados para a criação de categorias, mas acredita-se que um quadro teórico consistente pode auxiliar uma seleção inicial mais segura e relevante” (LUDKE; ANDRÉ, 1986, p. 43). É tendo essa ideia por base que, neste estudo, os conceitos-chave escolhidos constituem categorias de análise para se investigar os referidos documentos (BNCC, RCG e DOCT-SL/RS), e essa escolha proveio do referencial teórico-metodológico que sustenta o estudo. Para entender e analisar em profundidade o sentido das políticas curriculares, objeto desta pesquisa, optamos pela adoção dos seguintes conjuntos de conceitos-chave, os quais se relacionam intrinsecamente com a política curricular e com os estudos da área: educação e educação escolar; currículo, ensino e avaliação; aprendizagens, aprendizagens essenciais e competências; e docente e estudante. Retomamos, aqui, as ideias de Fernandes (2012), Ferraço e Carvalho (2012) e Leite (2002a), os quais afirmam que o currículo não pode ser concebido apenas como documento oficial, pois necessita ser compreendido também como práxis, remetendo a um contexto prático-teórico, que é dialético e, portanto, dinâmico, e gerando, assim, novas formas de experimentar a educação.
A segunda etapa do método, denominada “análise” (CELLARD, 2012), propõe produzir ou reelaborar conhecimentos e criar formas de compreender os fenômenos, propiciando que o pesquisador realize uma interpretação coerente do objeto de estudo. Além disso, a “análise” permite que o pesquisador interprete documentos, sintetize informações, determine tendências e, na medida do possível, faça inferências. Como refere o autor, “as combinações possíveis entre os diferentes elementos contidos nas fontes estabelecem-se em relação ao contexto, à problemática ou ao quadro teórico, mas, também, deve-se admiti-lo, em função da própria personalidade do pesquisador, de sua posição teórica ou ideológica” (CELLARD, 2012, p. 304). Nesta pesquisa, a etapa da análise propriamente dita é denominada “análise comparativa”, que, como indica o próprio nome, consiste em fazer uma análise comparando os documentos pesquisados e mostrando como aparecem os conceitos-chaves em cada um deles. Ressaltamos, ainda, que a análise dos conceitos-chave, tanto na primeira etapa do método de análise documental de Cellard (2012), denominada “análise preliminar”, quanto na segunda etapa, denominada “análise”, ocorre, aqui, na seção “Visitando os conceitos-chave no campo das políticas curriculares”. Os conceitos-chave foram extraídos dos documentos de acordo com os propósitos da pesquisa, respeitando os passos do método adotado. Como procedimento de busca nos documentos, foi utilizado o recurso “localizar” (Ctrl/Command+F), sendo empregadas como descritores as expressões e os sinônimos das categorias de análise e registras as suas recorrências. Além disso, em relação à explicitação dos conceitos, neste estudo, optamos pelos excertos de frases, pois o uso de palavras isoladas poderia reduzir ou minimizar a interpretação do sentido expresso no texto.
Salientamos ainda que os argumentos aqui apresentados apoiam-se na abordagem do método de Análise de Redes Sociais (ARS), que, para Recuero (2017), é uma perspectiva de estudos de grupos sociais que permite a análise sistemática a partir de medidas específicas acerca da estrutura desses grupos. Trata-se de uma abordagem que tem suas raízes na Sociometria e na Teoria dos Grafos (RECUERO; BASTOS; ZAGO, 2015). Por não ser exclusivamente um método, mas também uma abordagem sobre grupos sociais, a opção pela ARS pressupõe a percepção do grupo social como uma rede, a qual pode ser analisada mediante determinadas premissas metodológicas. Referindo-se a esse método, Viseu e Carvalho (2020, p. 3) afirmam:
Foi a partir da década de 1960, sobretudo nos Estados Unidos e no Reino Unido, que emergiram as primeiras incursões dos estudos das políticas públicas sobre a fragmentação dos processos de tomada de decisão política e o papel desempenhado por determinados grupos de interesse junto das elites político-administrativas (Thatcher, 2004). Herdeiros destas primeiras investigações, os estudos sobre políticas públicas começaram a recorrer ao conceito de rede para o estudo das relações entre o Estado e determinados atores coletivos (associações profissionais, empresas, sindicatos etc.).
Podemos notar, a partir do excerto supracitado, que há uma relação simbiótica de caráter mutualístico, decorrente, sobretudo, do modo comportamental do Estado de fazer política. Quando a governança passa a substituir o governo de Estados-Nação, crescem as análises de redes. Ao encontro dessa perspectiva, Avelar e Ball (2019, p. 65) afirmam o seguinte:
A mudança nas relações entre o estado e a sociedade é um fenômeno internacional, apesar de variações consideráveis. De modo geral, os estados agora compartilham, cada vez mais, o trabalho de governar com outros atores sociais (Bevir, 2011). Os processos de tomada de decisão e os sistemas de implementação, antes executados principalmente pelo Estado, estão cada vez mais dispersos em complexas redes de instituições e agências não governamentais. Embora as fronteiras entre o estado, a economia e a sociedade civil sempre tenham sido tênues e confusas, as relações entre essas fronteiras assumiram uma nova estridência e intensidade nos últimos 30 anos.5 (Tradução nossa).
Na Figura 1, abaixo, demonstramos essa relação, que é, algumas vezes, dirigida e, outras, não dirigida, caracterizando um grafo misto formado por organismos internacionais e nacionais, entes federativos (Estados, Distrito Federal e Municípios) e empresas privadas, os quais heterarquicamente6 atuam para normatizar, em forma de educação por competência, a educação básica brasileira.
Relações heterárquicas entre Estado-Nação, organismos nacionais e internacionais, entes federativos e empresas privadas
A PRODUÇÃO DOS TEXTOS DAS POLÍTICAS CURRICULARES EM FOCO
Nesta seção, exploramos elementos acerca do contexto, dos autores e da natureza dos textos da Base Nacional Comum Curricular, do Referencial Curricular Gaúcho e do Documento Orientador do Currículo do Território Municipal.
Contexto
A Base Nacional Comum Curricular da educação básica é a política educacional do campo do currículo, orientando currículos, processos de ensino, aprendizagem e avaliação em nível nacional. A produção das políticas curriculares municipal e estadual em foco acontece no cenário educacional brasileiro de implementação da BNCC (BRASIL, 2017), sendo orientada pelo Programa de Apoio à Implementação da BNCC (ProBNCC), instituído pela Portaria nº 331, de 5 de abril de 2018, do Ministério da Educação (MEC) (BRASIL, 2018). O artigo 1º dessa Portaria institui o ProBNCC, com vistas a apoiar a Unidade da Federação (UF), por intermédio das Secretarias Estaduais e Distrital de Educação (SEDEs) e das Secretarias Municipais de Educação (SMEDs), no processo de revisão ou elaboração e implementação de seus currículos alinhados à BNCC, em regime de colaboração entre estados, Distrito Federal e municípios. Tal portaria foi alterada pela Portaria nº 756, de 3 de abril de 2019, do MEC (BRASIL, 2019), que insere aspectos específicos da implementação da BNCC para o Ensino Médio.
A BNCC é um documento de referência nacional que orienta a formulação dos currículos dos sistemas e das redes escolares dos estados, do Distrito Federal e dos municípios e, consequentemente, dos projetos político-pedagógicos das instituições escolares do país. Esse documento integra a política nacional da educação básica, contribuindo para o alinhamento de outras políticas e ações nos âmbitos federal, estadual e municipal referentes à formação de professores, à avaliação, à elaboração de conteúdos educacionais e aos critérios para a oferta de infraestrutura adequada para o pleno desenvolvimento da educação. A BNCC propõe ajudar a superar a fragmentação das políticas educacionais uma vez que enseja o fortalecimento do regime de colaboração entre as três esferas de governo (BRASIL, 2017).
Ao mesmo tempo, na seção que trata do pacto interfederativo e de sua implementação, esse documento explicita a autonomia dos entes federados:
No Brasil, um país caracterizado pela autonomia dos entes federados, acentuada diversidade cultural e profundas desigualdades sociais, os sistemas e redes de ensino devem construir currículos, e as escolas precisam elaborar propostas pedagógicas que considerem as necessidades, as possibilidades e os interesses dos estudantes, assim como suas identidades linguísticas, étnicas e culturais. (BRASIL, 2017, p. 15).
A esse respeito, ressaltamos que o termo “sistema” refere-se ao conjunto de instituições educativas de determinado estado ou município e o de “rede” refere-se ao conjunto de instituições de ensino subordinadas administrativamente a uma mantenedora.
No Documento Orientador de 2019, do Programa de Apoio à Implementação da BNCC (ProBNCC), são referidos e depois detalhados os seguintes apoios para as revisões curriculares:
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. Assistência financeira, via Plano de Ações Articuladas - PAR às Seduc, com vistas a assegurar: (i) a qualidade técnica na construção do documento curricular em regime de colaboração entre estados, Distrito Federal e municípios para toda a Educação Básica, e (ii) a implementação dos currículos elaborados à luz da BNCC;
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. Formação oferecida pelo MEC para equipes de currículo e gestão do Programa nos estados; e
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. Assistência técnica que contempla: (i) pagamento de bolsas de formação para os professores da equipe ProBNCC, via FNDE (ii) contratação de analistas de gestão, (iii) equipe alocada no MEC para o apoio na gestão nacional do Programa, (iv) material de apoio, e (v) plataforma digital para apoiar a (re)elaboração do currículo e as consultas públicas. (BRASIL, 2019, p.4)
No Portal do MEC, na aba “Implementação” da página acerca da BNCC, estão disponíveis os recursos e um conjunto diversificado de material de apoio (BRASIL, 2017). No documento intitulado Material complementar para a (re)elaboração dos currículos, o tópico 1 apresenta os elementos para a estrutura básica dos documentos curriculares, são eles: texto introdutório (elementos centrais); histórico curricular e descrição do processo de elaboração do documento; marcos legais que sustentam o documento curricular; definição dos sujeitos que se quer formar; definição de princípios e conceitos de ensino e aprendizagem; discussão sobre competências e habilidades; diretrizes gerais sobre o que o aluno deve saber, como ensinar e/ou como avaliar; indicação de temas transversais e integradores relacionados às temáticas contemporâneas e exigidos por legislação e normas específicas; perfil dos sujeitos nas diferentes etapas e modalidades da educação básica; considerações sobre a implementação do currículo; explicação sobre os códigos utilizados; organizador curricular (normalmente apresentado em forma de quadro); e modos de organização e de agrupamento das habilidades e/ou objetos de conhecimento (aspecto diretamente relacionado às aprendizagens que devem ser asseguradas aos estudantes).
Nesse sentido, o RCG e o DOCT-SL/RS são decorrentes do processo de implementação previsto pelo Programa ProBNCC de reelaboração dos currículos estaduais e municipais. No estado do Rio Grande do Sul, o desdobramento da BNCC levou à produção do Referencial Curricular Gaúcho, que orientou, até agosto de 2021, a implementação da Educação Infantil e do Ensino Fundamental - nesse primeiro momento, o RCG não incluiu o Ensino Médio, que está em fase de consulta pública e disponível no site da Secretaria de Educação do Rio Grande do Sul (SEDUC-RS). A Resolução nº 345/2018, elaborada pelo Conselho Estadual de Educação do Rio Grande do Sul (CEEd-RS), institui e orienta a implementação do RCG, afirmando que este deverá ser respeitado, obrigatoriamente, ao longo das etapas e modalidades da educação básica (Ensino Fundamental e Educação Infantil) e embasará os currículos escolares das redes estadual, privada e municipal no território do estado do Rio Grande do Sul (CONSELHO ESTADUAL DE EDUCAÇÃO, 2018). Assim, essa Resolução evidencia uma ideia de abrangência do RCG nas redes de ensino Gaúchas.
No âmbito dessa ideia, o artigo 3º da referida Resolução estabelece o RCG como referência obrigatória para todos os estabelecimentos de ensino presentes no território estadual, ampliando seu âmbito de abrangência. Nesse mesmo artigo, há previsão para a adequação, ou elaboração, das Propostas Político-Pedagógicas (também conhecidas como Projetos Político-Pedagógicos) e dos currículos escolares. Nas disposições finais e transitórias do artigo 21, consta o prazo para essa adequação, ou elaboração, de acordo com o que propõe o RCG - ano de 2019 -, e para a implementação desse Referencial - início do ano letivo de 2020 -, em conformidade com a autonomia dos sistemas e dos estabelecimentos de ensino. O cronograma de implementação da BNCC previa que ocorresse o processo de (re)elaboração curricular durante o ano de 2018, em regime de colaboração. Percebe-se, no entanto, que o cronograma está claramente atrasado, posto que o Ensino Médio, até o presente momento, não tem um documento orientador da mantenedora; o que ocorreu foi apenas a implantação do Novo Ensino Médio piloto em algumas escolas selecionadas.
Por sua vez, o Documento Orientador do Currículo do Território Municipal (SÃO LEOPOLDO, 2021, p. 10) “constitui-se como referência para o estabelecimento de princípios e de concepções que embasem/orientem os currículos escolares e produções administrativas correlatas, elaborados pelas instituições de ensino deste território [o RS]”. Produzido entre os anos 2018 e 2020, o contexto educacional de produção desse documento foi marcado por atrasos no cronograma de implementação da BNCC e pela pandemia de Covid-19.
Autores
Três versões distintas da BNCC foram elaboradas até a sua formulação final, o que ocorreu em um palco de disputas entre atores políticos de dois governos federais: o da presidenta Dilma Rousseff (2011-2016), pertencente ao Partido dos Trabalhadores (PT), que se posiciona como sendo da esquerda e que sofreu um golpe de Estado em 2016 (FREIXO; RODRIGUES, 2016); e o do presidente Michel Temer (2016-2019), pertencente ao Movimento Democrático Brasileiro (MDB), considerado um “centrão”, que reúne ideologias diversas com tendência mais de direita. A implementação do BNCC vem acontecendo, ainda, no governo de Jair Bolsonaro (2019-), eleito pelo Partido Social Liberal (PSL), com alinhamento ao social-liberalismo, porém, atualmente, o presidente encontra-se no Partido Liberal (PL). Nesse panorama, é forte a influência e a participação, na elaboração do BNCC, de diversos atores privados, que se apresentam como parceiros dos principais agentes públicos - Ministério da Educação, União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (UNDIME), Conselho Nacional de Secretários de Educação (CONSED) e Conselho Nacional de Educação (CNE) - e que, de acordo com Macedo (2014, p. 1540), constituem “instituições filantrópicas, grandes corporações financeiras que deslocam impostos para suas fundações, produtores de materiais educacionais vinculados ou não às grandes empresas internacionais do setor”. São exemplos desses atores privados: Gerdau, Natura, Santander, Bradesco, Fundação Roberto Marinho e Fundação Lemann, cujos discursos demarcam a defesa da importância de um currículo nacional (MACEDO, 2014).
No Brasil, país de capitalismo dependente (FERNANDES, 1976), é possível perceber, também, uma dependência quanto à elaboração, confecção e divulgação do conhecimento, que está alinhada, geralmente, ao pensamento hegemônico de países de ideologia neoliberal, sendo aqui reproduzida nas normativas educacionais dos entes federativos. Ao encontro disso, na Figura 2, gerada a partir do grafo produzido durante as pesquisas de Avelar e Ball (2019), podemos observar a dinâmica do poder do Movimento Nacional pela Base Curricular (MNBC). O MNBC pode ser considerado um conjunto de pessoas físicas e jurídicas que influenciaram a maneira gerencialista do Estado mínimo e da educação por competência tecnicista dentro do contexto da BNCC.
Podemos notar, na Figura 2, aproximações em três esferas, até a chegada ao núcleo de poder, no centro, que demonstra onde estão distribuídos os integrantes do MNBC, influenciando a elaboração de políticas públicas, notadamente a BNCC, que, por força da norma, reflete no RCG e no DOCT-SL/RS. Já na Figura 3, observamos as empresas que mantêm o apoio ao MNBC, influenciando e, quiçá, determinando os caminhos que formataram as normativas de educação por competência, as quais estão agrupadas na BNCC.
O RCG, por sua vez, foi produzido no governo de José Ivo Sartori (2015-2019), pertencente ao Movimento Democrático Brasileiro (MDB), e está sendo implementado no mandato de Eduardo Leite (2019-2022) (Governador do RS), pertencente ao Partido da Social-Democracia Brasileira (PSDB) e com posicionamento de centro-direita, apresentando uma forma de ação muita semelhante à dos atores privados no processo de implementação da RCG.
O DOCT-SL/RS, que foi produzido e está sendo implementado pelo governo de Ary José Vanazzi (2017-) (PT), o qual foi reeleito, em 2021, para um novo mandato de prefeito, tem uma característica que o distingue dos demais documentos: no seu processo de elaboração, não se tem registro da participação de atores privados, exceto as instituições escolares privadas e públicas. Salientamos que o DOCT-SL/RS teve, durante sua produção, o protagonismo da rede municipal de educação na coordenação executiva do documento, contando com atores do gabinete do secretário de educação, da diretoria de gestão básica, da assessoria pedagógica e de outras diretorias de assessoria técnica. Além desses integrantes, contou com mediadores representantes das escolas e de equipes diretivas.
Em sua introdução, esse documento apresenta a intencionalidade de uma perspectiva do diálogo com as comunidades escolares. Para tanto, “realizou-se a escrita coletiva do presente texto [do DOCT-SL/RS do município em análise], com a participação de toda a rede municipal de ensino, através de seis escolas-polo do município” (SÃO LEOPOLDO, 2021, p. 9). Nesse grupo de escolas, embora o convite para participar dessa escrita tenha sido feito ao conjunto da rede estadual e às escolas privadas do município em estudo, não houve a participação da rede estadual. Pelo regime de colaboração indicado no artigo 211 da Constituição Federal de 1988 (BRASIL, 2016), na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) de 1996 (BRASIL, 1996) e no Plano Nacional de Educação (PNE) de 2014 (BRASIL, 2014), os trabalhos de elaboração e implementação das políticas educacionais precisam ser articulados, coordenados e institucionalizados entre os entes federados (União, estados, Distrito Federal e municípios), para garantir o direito à educação básica, ou seja, todas as esferas de governo, não apenas redes ou sistemas educacionais específicos, têm, para esse fim, responsabilidade conjunta em determinado território. Entretanto, o que verificamos na prática são processos simultâneos e desarticulados, em que o ente estadual priorizou a reelaboração do currículo do estado do Rio Grande do Sul, denominado como Referencial Curricular Gaúcho (RCG), e o ente municipal priorizou a reelaboração do DOCT-SL/RS do seu território. Com certeza, essa situação revela uma educação fragmentada que repercutirá negativamente na reelaboração dos Projetos Político-Pedagógicos de todas as redes e instituições educativas que compõem os respectivos sistemas.
A rede estadual de ensino não se fez representativa na elaboração do DOCT-SL/RS, assim como não o fez um conjunto significativo de escolas e instituições que compõem o sistema de ensino da cidade em análise. Salientamos, ainda, que a ausência das escolas do estado do Rio Grande do Sul e apenas a presença de uma escola da sua rede privada de ensino podem caracterizar uma forma de fazer política. Ao não participar conjuntamente da produção do DOCT-SL/RS, a rede estadual de educação evidencia que não está de acordo com o proposto nesse documento, em uma clara manifestação de ruptura com a proposta do regime de colaboração. Para além das questões político-partidárias, percebemos que subjaz a essa ação a negação de políticas educacionais mais participativas entre os entes federativos, reproduzindo uma lógica de cunho centralizador, hierarquizada e verticalizada (Governo Federal) na execução de políticas e demandas educacionais. Há, igualmente, uma resistência dessa rede em colaborar na formulação de um documento gerenciado pela rede municipal de educação. A esse propósito, vale a pena relembrar Ball (1994, p. 20), acerca das relações de poder e política, quando afirma que o poder “é multifacetado, recoberto, interativo e complexo, textos políticos entram em vez de simplesmente mudar as relações de poder. Daí mais uma vez a complexidade da relação entre intenções políticas, textos, interpretações e reações”. Nesse sentido, a educação democrática perde com essa falta de envolvimento, participação e integração entre os sistemas e as redes de ensino, principalmente as comunidades escolares.
Ainda no que ao DOCT-SL/RS diz respeito, foi realizada uma consulta pública às escolas, por meio de um questionário via Plataforma Moodle7, muito provavelmente como estratégia devido à pandemia de Covid-19, mobilizando dois mil participantes de todas as escolas da rede municipal de ensino, dentre os quais estavam professores, estudantes e responsáveis legais pelos estudantes. Algumas escolas privadas também enviaram as suas contribuições. Na sequência, esse documento informa que,
[...] munida das sugestões advindas das equipes diretivas, a SMED constituiu um grupo de trinta mediadores para atuar no planejamento e na mediação da atividade de construção do Documento Curricular Territorial, em 10 de junho do corrente ano. O grupo, composto por professores/as do município, reuniu-se duas vezes, antes da data prevista, para treinamento e planejamento de ações e, mediante estudo dos materiais elaborados pela UNCME, UNDIME e movimento ProBNCC. (SÃO LEOPOLDO, 2021, p. 12-13).
Consta no DOCT-SL/RS que, em agosto de 2019, aconteceu uma Audiência Pública para “apresentação e recolhimento de sugestões provenientes da comunidade acerca deste produto coletivo [o DOCT-SL/RS de São Leopoldo], antes de sua redação e finalização pela SMED” (SÃO LEOPOLDO, 2021, p. 10). Esse processo evidencia novamente o protagonismo da SMED na condução da produção desse documento e indica terem sido utilizadas estratégias de ampliação da discussão no município. Relativamente à elaboração desse documento, observamos que uma participação mais ampliada e democrática pode ter sido comprometida pelo contexto da pandemia e pelo cronograma restritivo do ProBNCC. De qualquer forma, a partir da análise realizada, é possível considerar que os princípios da justiça curricular e de inclusão dos interesses dos menos favorecidos, da participação e da produção histórica da igualdade pouco se concretizaram. A maneira como os processos de elaboração da BNCC, do RCG e do DOCT-SL/RS ocorreram, com algumas consultas públicas, ou seja, com a participação muito limitada da sociedade em geral, sobretudo dos professores e demais profissionais que trabalham na área educacional, tende a produzir resistência nas escolas.
Assim, a contextualização dos autores e atores que efetivamente produziram as três políticas curriculares apresentadas permite nos afirmar que as políticas de currículo no Brasil, em seus tempos e movimentos, vêm sendo instituídas a partir de interesses de determinados grupos sociais, com processos distintos, concorrentes e concomitantes e sem aderência ao regime de colaboração entre os entes federativos, o que certamente acaba gerando efeitos negativos nas culturas escolares e barreiras à participação das comunidades escolares e dos professores (PRIESTLEY; BIESTA; ROBINSON, 2013, 2015) enquanto decisores curriculares (LEITE, 2002b; LEITE; FERNANDES, 2010). De fato, as políticas de currículo, com pouca ou restrita participação no processo de produção deste, não vêm reconhecendo o poder de decisão da escola e dos seus atores nos processos de configuração de um currículo. Desse modo, essas políticas distanciam-se da concretização dos princípios de justiça curricular em uma escola de todos e para todos, isto é, em uma escola que cumpra o princípio da igualdade de oportunidades para todos os grupos sociais a quem a educação se destina (LEITE, 2002b, 2012; SAMPAIO; LEITE, 2017).
Natureza dos textos
A Base Nacional Comum Curricular é um documento de 600 páginas, homologado em 20 de dezembro de 2017 e estruturado em cinco capítulos. No primeiro deles, constam os fundamentos, os marcos legais e o processo de implementação da BNCC; no segundo, a estrutura da BNCC; no terceiro, o detalhamento dos direitos de aprendizagem na etapa da Educação Infantil; e, no quarto e quinto, os detalhamentos dos Ensinos Fundamental e Médio no contexto da educação básica. O conjunto orgânico e progressivo de aprendizagens essenciais que todos os alunos devem desenvolver ao longo das etapas e modalidades da educação básica é de caráter normativo, justificado na intenção de garantir que sejam assegurados aos estudantes os direitos de aprendizagem e desenvolvimento, em conformidade com o que estabelece o Plano Nacional de Educação (BRASIL, 2014). Esse documento normativo aplica-se exclusivamente à educação básica escolar, tal como a define o parágrafo 1º do artigo 1º da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, também conhecida como Lei nº 9.394/1996 (BRASIL, 1996), e refere os princípios éticos, políticos e estéticos que visam à formação humana integral e à construção de uma sociedade justa, democrática e inclusiva, como fundamentado nas Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Básica (DCN) (BRASIL, 2013).
Quanto ao RCG, ele está articulado às dez macrocompetências essenciais da BNCC e explicita que estas devem ser desenvolvidas ao longo da educação básica, com o objetivo de garantir as aprendizagens cognitivas, comunicativas, pessoais e sociais de forma harmônica e interligada, com foco na equidade e na superação das desigualdades de qualquer natureza. Além disso, o RCG está estruturado em seis cadernos pedagógicos: o primeiro trata da Educação Infantil, e os outros cinco estão organizados por áreas do conhecimento - Linguagens, Matemática, Ciências da Natureza, Ciências Humanas e Ensino Religioso. Em todos os cadernos, constam as seguintes partes: uma apresentação sobre o Referencial Curricular Gaúcho e o Regime de Colaboração; uma introdução, que aborda a maneira como nasceram as ideias propostas; um primeiro capítulo de princípios orientadores do RCG, que explicita as concepções de educação, aprendizagem e formação dos sujeitos no contexto escolar, o currículo, as competências gerais da base, a interdisciplinaridade, a educação integral, a ciência e a tecnologia aplicadas à Educação do século XXI e a avaliação e formação continuada de professores; um segundo capítulo, que trata das modalidades de ensino (Educação Especial, Educação de Jovens e Adultos, Educação do Campo, Educação Escolar Indígena, Educação das Relações Étnico-Raciais e Educação Escolar Quilombola); e um terceiro capítulo sobre temas contemporâneos. Os demais capítulos de cada caderno tratam das especificidades da Educação Infantil, das Linguagens, da Matemática, das Ciências Humanas, das Ciências da Natureza e do Ensino Religioso.
O DOCT-SL/RS, por sua vez, possui 87 páginas e está estruturado em dez capítulos. Na sua introdução, primeiro capítulo, como já referido, está expressa a intencionalidade de elaboração desse documento em diálogo com as comunidades escolares e são apresentados os limites que marcaram sua efetivação. Outro aspecto importante a ser observado diz respeito ao fato de que o termo “território”, presente no título, está ausente no corpo desse documento. Por isso, inferimos que o conceito de “território” está fundamentado no artigo 25 do RCG, que afirma o seguinte:
O CEEd/RS e a UNCME/RS recomendam que cada território municipal, com sistema próprio ou não, pode elaborar ou revisar documento curricular local que contemple as suas especificidades locais e regionais, agregando objetivos e habilidades à parte diversificada, para a implementação em regime de colaboração de acordo com seus Planos Municipais de Educação. (RIO GRANDE DO SUL, 2018, p. 17).
Observamos que, no RCG, o “território” é definido como “espaço apropriado e transformado pela ação humana, para além do espaço físico - município, estado e união” (RIO GRANDE DO SUL, 2018, p. 17), indicando que essa palavra é aqui empregada com o sentido de “chão” e de “identidade”. No segundo capítulo, é descrita a metodologia e, no terceiro, o histórico do município, que, segundo esse documento, conta com 33 escolas municipais de Educação Infantil, 31 escolas municipais de Ensino Fundamental (que possuem turmas de Educação Infantil) e 122 escolas da rede privada de ensino, das quais 41 são credenciadas à SMED. O texto deste terceiro capítulo, no entanto, é sintético, possuindo cinco parágrafos, e não apresenta um diagnóstico da realidade educacional no município em análise. Além disso, em nenhuma parte desse documento, foi descrita a composição do Sistema Municipal de Educação. Já no quarto capítulo, são expostos os marcos legais para a educação, abarcando os seguintes: a Constituição Federal de 1988, a LDB de 1996, os Parâmetros Curriculares Nacionais de 1997, as Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental e para o Ensino Médio de 1998, a Resolução CNE/CEB nº 4/2010 e as diretrizes específicas para o Ensino Fundamental de nove anos, a Resolução CNE/CEB nº 7/2010 e as diretrizes específicas para o Ensino Médio, expressas na Resolução CNE/CEB nº 2/2012. Todos esses documentos indicam a necessidade da criação de uma base nacional comum, considerando o Plano Nacional de Educação e o Plano Municipal de Educação.
O quinto capítulo do DOCT-SL/RS, por sua vez, aborda a educação básica e começa com uma introdução de três parágrafos, com base na Constituição Federal e na LDB, em que se descreve a educação básica. Não explicita, no entanto, os princípios, as diretrizes e os conceitos orientadores do currículo, que se apresentam com pouca evidência nas seções e nos capítulos que abordam as etapas e modalidades de ensino. Contudo, tendo em vista a natureza desse documento, consideramos que teria sido pertinente a produção de um capítulo, ou de uma seção específica, referente a esse conteúdo. A seção 5.1 aborda a Educação Infantil, trazendo um histórico desse nível educacional no município, a organização dos grupos etários da Educação Infantil, a concepção de criança na Educação Infantil, a concepção de currículo na Educação Infantil, os direitos de aprendizagem e o arranjo curricular, levando em consideração os campos de experiência, a ação docente, o acompanhamento das aprendizagens e a transição para o Ensino Fundamental. Ademais, ressaltamos que a produção de conteúdos relacionados à Educação Infantil é densa e articulada com a BNCC. Já a seção 5.2 é dedicada ao Ensino Fundamental, partindo de uma contextualização ancorada em normativas legais, o que inclui a BNCC, e, na sequência, desenvolve os seguintes tópicos: ensino-aprendizagem, educação como direito de aprendizagem e avaliação. A seção subsequente, ainda relacionada ao Ensino Fundamental, descreve os sujeitos do processo educativo, evidenciando a concepção de criança, de adolescente, de jovem, de adulto e de idoso. Observamos, assim, que o professor é invisibilizado nessa parte do DOCT-SL/RS.
O sexto capítulo, por sua vez, trata do Ensino Médio, contextualizando essa etapa educacional por meio de uma citação da BNCC em dois curtos parágrafos. Na verdade, o Ensino Médio está ausente no texto do DOCT-SL/RS, muito possivelmente pela ausência da rede estadual no seu processo de escrita, uma vez que, como já apontado, essa etapa educacional não fez parte do RCG, e pela ausência de participação das escolas da rede de educação privada que atendem ao Ensino Médio no município. Considerando que se trata de um texto orientador para o território municipal, tal ausência fragiliza e revela a incompletude desse documento.
As especificidades sobre as modalidades da educação escolar são abordadas no sétimo capítulo, com base nos seguintes temas: Educação de Jovens e Adultos, Educação Integral de tempo integral, Educação Especial na perspectiva inclusiva, Educação no Campo e Educação Escolar Indígena. O oitavo capítulo, intitulado “Transversalidades educacionais”, apresenta os temas contemporâneos transversais, tais como: educação musical, educação ambiental e sustentabilidade, educação em direitos humanos, educação para o trânsito, educação alimentar e nutricional e educação financeira. A seção 8.7 desenvolve o tema da gestão democrática, tendo como referência a Lei nº 6.134, de 20 de dezembro de 2006, e versa sobre a gestão democrática do ensino público municipal. O nono capítulo, por sua vez, discorre sobre a qualidade social da educação, da tecnologia e da inovação, abordando, como temáticas, a iniciação científica, a qualidade na educação, a tecnologia e a cultura digital. Por fim, no décimo capítulo, aborda-se o tema da formação continuada de profissionais da educação, enfocando os seguintes aspectos relativos à rede municipal: gestão democrática; qualidade social da educação, da tecnologia e da inovação; e formação continuada.
Em termos de conteúdo, observamos que o DOCT-SL/RS descreve, substancialmente, os seguintes tópicos: o processo de sua elaboração; os marcos legais que o sustentam; os sujeitos que quer formar; os temas transversais e integradores relacionados a temáticas contemporâneas e exigidos por legislação; e as normas específicas que regulamentam o campo educacional. É perceptível, nesse documento, a ausência de um diagnóstico educacional mais detalhado e profundo do município em análise, o que fragiliza a aderência ao conceito de território e a ideia de um currículo contextualizado (REIS, 2016). Além disso, observamos que o DOCT-SL/RS é frágil nos seguintes conteúdos que constam na estrutura proposta pelo ProBNCC: histórico educacional do território; discussão sobre competências e habilidades; considerações sobre a implementação do currículo; explicação sobre os códigos utilizados; organização curricular (normalmente apresentada em quadros); e formas de organização e agrupamento das habilidades e/ou dos objetos de conhecimento (aspecto diretamente relacionado às aprendizagens que devem ser asseguradas aos estudantes).
Já no que concerne à BNCC, consideramos que se trata de um documento excessivamente prescritivo, detalhista e operacional, que extrapola sua natureza como currículo nacional e “vai além de parâmetros, diretrizes ou meras orientações” (BIONDO, 2019, p. 22). Contraditoriamente, esse documento apresenta-se restrito e limitado quanto ao delineamento de diretrizes e conceitos fundantes. A natureza prescritiva, a padronização e o excesso de instrumentalização da BNCC podem ter provocado um efeito de estreitamento dos currículos dos territórios estadual e municipal. Reforçamos, ainda, a ausência de entes representativos no processo de elaboração/escrita da BNCC (especificamente do estado do Rio Grande do Sul e de escolas da rede estadual e privada) e a importância de contextualizar o currículo que é prescrito em nível nacional (LEITE; FERNANDES; FIGUEIREDO, 2018, 2019).
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Nesta seção, analisamos conceitos-chave presentes nos documentos em análise, que são basilares no campo de formulação de políticas de currículo, tais como: educação e educação escolar; aprendizagem, aprendizagens essenciais e competência; currículo, ensino e avaliação; e docente e estudante.
Educação e educação escolar
Na perspectiva da BNCC (BRASIL, 2017, p. 10), a educação “deve afirmar valores e estimular ações que contribuam para a transformação da sociedade, tornando-a mais humana, socialmente justa”. Também está vinculada aos “direitos e objetivos de aprendizagem, competências e habilidades” (BRASIL, 2017, p. 14). Aparece, ainda, como “formação e desenvolvimento humano global” e como espaço de aprendizagem e de democracia inclusiva voltada ao acolhimento, ao reconhecimento e ao desenvolvimento pleno (BRASIL, 2017, p. 16). No RCG (RIO GRANDE DO SUL, 2018, p. 21), a concepção de educação é, em parte, semelhante à da BNCC, sendo apresentada como “desenvolvimento integral do sujeito”. Também é compreendida como “bem público e de direito social”, com “caráter emancipatório” (RIO GRANDE DO SUL, 2018, p. 15-21). No DOCT-SL/RS (SÃO LEOPOLDO, 2021, p. 40-41), por sua vez, a educação é vista de forma similar ao que consta no RCG, ou seja, como um “direito de aprendizagem” e um “pleno desenvolvimento de si”, tratando-se “de um direito social e um processo de vida”. Nesse sentido, esta noção de educação diferencia-se das demais concepções à medida que destaca o social como uma escolha epistemológica na perspectiva da educação dialógica, libertadora, cidadã e voltada aos direitos humanos. Percebemos, assim, que, nos três documentos, as concepções de educação mostram similitudes, sendo mais próximas aquelas presentes no RCG e no DOCT-SL/RS. Na BNCC, há uma concepção mais centrada no sujeito, possuindo, sob certa perspectiva, um cunho individualista, bastante diferente do enfoque de comprometimento social constante no RCG e no DOCT-SL/RS.
No que diz respeito à definição de educação escolar, é possível notar, tanto na BNCC quanto no RCG, um foco na aprendizagem dos estudantes - apesar de tais semelhanças, na BNCC (BRASIL, 2017, p. 14), aparece certo aspecto legalista e generalista, ainda que se fale de educação integral como “uma educação voltada ao seu acolhimento, reconhecimento e desenvolvimento pleno, nas suas singularidades e diversidades”. Já no DOCT-SL/RS (SÃO LEOPOLDO, 2021, p. 39-40), consta uma concepção de “educação cidadã”, que “pretende formar/educar com vistas à integralidade” e que está comprometida com a “transformação da realidade de cada ser humano”, devendo, por isso, investir na autonomia dos discentes, potencializando seu desenvolvimento, como “protagonista[s] da própria história”. Desse modo, esse documento municipal assume claramente a perspectiva dialógica do pensamento de Paulo Freire, mostrando uma concepção de educação emancipatória e libertadora, capaz de “promover a transformação dos sujeitos ao estimular a práxis (ação e reflexão) em um processo de experimentação da própria história” (SÃO LEOPOLDO, 2021, p. 7), contrapondo-se, assim, à lógica dos documentos estadual e federal.
Aprendizagem, aprendizagens essenciais e competência
Quanto ao conceito de aprendizagem, observamos que, na BNCC, não há uma elaboração conceitual propriamente dita sobre o tema, havendo apenas uma associação com a ideia de qualidade e de direito. Fala-se de redes de aprendizagem e da escola como um espaço de aprendizagem e de democracia inclusiva, bem como do protagonismo do estudante em sua aprendizagem e no seu projeto de vida. Já no RCG (RIO GRANDE DO SUL, 2018, p. 22-23), a aprendizagem aparece como “resultado da interação entre estruturas mentais e o meio” e “como participação, mediação e interatividade”. No DOCT-SL/RS (SÃO LEOPOLDO, 2021, p. 26-36), por sua vez, a aprendizagem é conceituada como um direito do estudante e como “processo contínuo que envolve o meio e a realidade nos quais o/a estudante está inserido”, e este é visto como sujeito “do próprio processo de construção de conhecimento”. Dessa maneira, no RCG e no DOCT-SL/RS, percebemos, mais nitidamente, o enfoque da aprendizagem na pessoa do estudante e nas suas interações.
Já as aprendizagens essenciais assumem uma concepção bastante similar nos três documentos, fazendo referência a competências e habilidades a serem desenvolvidas. E a palavra competência possui a mesma concepção na BNCC e no RCG, concernente à mobilização de conhecimentos, habilidades e atitudes. Já o DOCT-SL/RS não apresenta uma definição de competência, fazendo apenas menção à BNCC quando esta aborda a Educação de Jovens e Adultos (EJA) e relaciona tal modalidade à ideia de aprendizagens essenciais.
Currículo, ensino e avaliação
A concepção de currículo, na BNCC (BRASIL, 2017, p. 18), é relacionada a “aprendizagens que se materializam como um conjunto de decisões e que estejam de acordo com o interesse dos estudantes e suas identidades”. No RCG, o termo aparece definido com vários enfoques, sendo compreendido como “experiências escolares que se desdobram em torno do conhecimento, em meio a relações sociais, e que contribuem para a construção das identidades dos estudantes”, como um conjunto de “esforços pedagógicos com intenções educativas”, como um “dispositivo em que se concentram as relações entre a sociedade e a escola, entre os saberes e as práticas socialmente construídos e os conhecimentos escolares” e como “um conjunto articulado e normalizado de saberes, definido por uma determinada ordem, onde se produzem significados sobre o mundo” (RIO GRANDE DO SUL, 2018, p. 26-27). O DOCT-SL/RS, por sua vez, apresenta, com pouca ênfase e evidência textual, a definição de currículo. Como mencionado anteriormente, os conceitos estruturantes para orientar os currículos no DOCT-SL/RS estão situados nas seções que tratam especialmente da Educação Infantil e do Ensino Fundamental. Entretanto, chama a atenção a referência a uma prática de currículos flexíveis e à priorização da estratégia do ensino pela pesquisa (SÃO LEOPOLDO, 2021). Tendo em vista tais aspectos, assim como entende Biondo (2019), percebemos, na BNCC, uma concepção instrumental de currículo. Trata-se de uma política de homogeneização curricular, voltada a atuar sobre diferentes componentes da educação, com o objetivo de alcançar a normatização que propõe.
Quanto à concepção de ensino, a BNCC cita-o como competências e como ação de “criar e disponibilizar materiais de orientação para os professores, bem como manter processos permanentes de formação” (BRASIL, 2017, p. 15). Já o RCG menciona um ensino que concentre “suas ações na busca de uma aprendizagem significativa, atentando para as diferentes experiências de vida de cada um” (RIO GRANDE DO SUL, 2018, p. 23). Diferentemente dessas duas concepções, que têm como centralidade o ensino por e para competências e aprendizagens significativas, o DOCT-SL/RS (SÃO LEOPOLDO, 2021, p. 38) afirma que o “centro do processo de ensino-aprendizagem é deslocado dos conteúdos para os sujeitos”, mostrando a “Educação pela pesquisa como uma das possibilidades de construção de conhecimentos”.
Em relação à noção de avaliação, a BNCC (BRASIL, 2017, p. 19) enfoca as avaliações em larga escala, enquanto “procedimentos formativos de processo ou de resultado”. Distinta é a concepção do RCG, que vê a avaliação “como algo inerente aos processos cotidianos e de aprendizagem, em que todos os sujeitos estão envolvidos”, cujo foco consiste em “fornecer informações acerca das ações de aprendizagem, ela [a avaliação] diz respeito à construção da autonomia por parte do estudante, na medida em que lhe é solicitado um papel ativo em seu processo de aprender” (RIO GRANDE DO SUL, 2018, 2018, p. 32-34). Já o DOCT-SL/RS (SÃO LEOPOLDO, 2021, p. 41) explicita a avaliação como um “processo contínuo, diagnóstico, horizontal e processual”, afirmando que os processos avaliativos devem “contemplar as diferentes dimensões do sujeito, utilizando-se de diversas metodologias”, e que a “avaliação deve estar sincronizada com os direitos e objetivos de aprendizagens reflexivas, humanizadoras e contextualizadas”.
Docente e estudante
A definição de docente e de estudante não consta na BNCC de forma clara, posto que esses termos aparecem uma única vez, estando relacionados à Educação Infantil. No RCG, por sua vez, o professor é conceituado como mediador, porém não há uma referência à definição de estudante. Já no DOCT-SL/RS (SÃO LEOPOLDO, 2021, p. 40), o professor é entendido como “referência principal no processo de aprendizagem”, e o estudante, como “protagonista de sua própria história”. Registramos, ainda, que tanto a BNCC como o DOCT-SL/RS destacam o estudante como sujeito de aprendizagem, mas o DOCT-SL/RS vai além, explicitando que o discente tem um papel mais do que central, com protagonismo, autonomia e participação no projeto da escola. Tal definição contempla a proposta de uma educação dialógica, que é defendida por Paulo Freire e assumida como referencial epistemológico, teórico e metodológico no documento municipal.
É importante salientar, igualmente, que esses documentos oficiais podem ter um poder limitado nas práticas curriculares e pedagógicas praticadas pelas escolas, as quais, por múltiplas razões, resistem e ressignificam as políticas educacionais (BALL; MAGUIRE; BRAUN, 2016). Examinando os conteúdos dos textos e o que anunciam em termos de conceitos e de práticas curriculares, é possível afirmar que tais práticas acontecem instituídas por processos políticos e temporais distintos, podendo não representar as culturas escolares e o poder de agência dos docentes (PRIESTLEY; BIESTA; ROBINSON, 2013, 2015; SANTOS; LEITE, 2020). Contudo, sabemos que, nos contextos escolares, mostra-se fundamental que gestores, técnicos e professores exerçam um papel de decisores curriculares (LEITE, 2002b; LEITE, FERNANDES, 2010; LEITE; FERNANDES; FIGUEIREDO, 2018, 2019).
Mesmo que tenhamos identificado no texto do DOCT-SL/RS, especialmente no que concerne à Educação Infantil, a incorporação de conceitos sob uma perspectiva mais alinhada a uma educação democrática, não significa que tal perspectiva efetive-se nas escolas e nas práticas curriculares: faz-se necessário considerar que é na prática que se desvelam os conflitos, os retrocessos, os avanços e os recuos (BACHELARD, 1996). Além disso, a partir da leitura do DOCT-SL/RS, percebemos que existe a necessidade de amadurecimento na construção de identidade desse documento no que diz respeito a avanços, limites e possibilidades em processos formativos colaborativos, priorizando a formação de docentes e gestores, o que não exclui todos os outros atores implicados na comunidade escolar.
No contexto educacional brasileiro, em meio ao cenário de alternâncias de ideologias políticas nos poderes nacional, estadual e municipal, sobretudo a partir de 2016, quando tivemos um golpe na democracia institucional, estamos retrocedendo no que diz respeito aos esforços e às lutas por políticas educativas mais democráticas e inclusivas que propiciem aprendizagens de qualidade social para todos e que se relacionem com a concepção de uma escola com autonomia e curricularmente inteligente (LEITE, 2003). Vivemos um retrocesso imensurável, com governos e poderes que mesclam tons e características de despotismo, de autoritarismo, de arbitrariedade, de conservadorismo e de dogmatismo. Assim, está claramente em risco a educação pública como direito social subjetivo para todas as pessoas, que tenha qualidade social e que seja financiada pelo Estado na perspectiva de uma educação democrática pautada pelas justiças social e curricular (CONNELL, 1999, 2012; DUBET, 1996, 2008, 2011; SANTOMÉ, 2013; SAMPAIO; LEITE, 2017).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Como foi referido na apresentação deste artigo, ele dá conta de um estudo que, focado nas políticas curriculares no Brasil, pretendeu trazer ao debate acadêmico as características dos documentos que enunciam essas políticas e o modo como apontam os procedimentos que se alinham a uma educação democrática. Os dados da análise documental realizada revelam que as orientações de uma educação democrática, nomeadamente no que implicam a participação da sociedade civil e das comunidades escolares na produção das políticas curriculares, são, em geral, restritas a algumas representações e consultas públicas. Como foi mostrado, a BNCC como estratégica macro constitui um documento excessivamente prescritivo e operacional, produzido por um grupo restrito de atores. É limitada quanto à explicitação e ao delineamento de diretrizes e orientações para seus desdobramentos em níveis estadual e municipal, com ampla participação e protagonismo das comunidades escolares. De toda forma, é possível, na leitura do RCG, inferir uma proposta pedagógica centrada no desenvolvimento de competências, que tem uma expressão conceitual na BNCC maior do que no DOCT-SL/RS.
Além disso, identificamos aspectos que não comungam com o regime de colaboração, pois a elaboração e a produção dos textos analisados evidenciam desarticulações entre o processo estadual e o municipal, com destaque para a ausência de participação de ambos os entes federativos e de outros atores representativos da sociedade civil e das comunidades escolares. No DOCT-SL/RS, encontramos vestígios de esforços de ampliar essa participação por meio da representatividade e das devolutivas de uma consulta pública feita às escolas, mobilizando professores, gestores e diferentes entidades educacionais do município e demonstrando, desse modo, um forte propósito dialógico. Mesmo assim, podemos inferir que o DOCT-SL/RS não atingiu o propósito de abarcar o território, como propõe esse documento em sua seção introdutória, ficando mais circunscrito à rede municipal de educação, visto que, apesar dos esforços, não obteve a participação das outras redes de ensino.
Por fim, ressaltamos que a BNCC, como currículo nacional orientador para a reelaboração das políticas curriculares dos sistemas, das redes e das instituições escolares do país, pauta-se por uma concepção de desenvolvimento de competências de natureza instrumental e normatizadora, coerente com os interesses dos agentes e das instituições empresariais privadas que atuaram fortemente na produção desse documento e distante de uma proposta de educação democrática.
Essas constatações mostram a necessidade de as comunidades acadêmicas continuarem com seus esforços para a concretização de medidas de recontextualização curricular capazes de concretizarem os processos de uma educação democrática a qual não deixe ninguém para trás.
Preprint
DOI: https://preprints.scielo.org/index.php/scielo/preprint/view/3009
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Ressaltamos que a menção, em todo o artigo, aos atores envolvidos com a comunidade escolar, independentemente do termo utilizado para isso, leva em consideração sujeitos de todos os gêneros.
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Texto original: “Changing relationships between the state and society are an international phenomenon, in spite of considerable variation. Generally speaking, states now increasingly share the work of governing with other social actors (Bevir, 2011). Decision making processes and implementation systems that used to be mainly executed by the state are increasingly dispersed in complex networks of non- governmental institutions and agencies. While the boundaries between the state, economy and civil society have always been thin and fuzzy, relations across those boundaries have assumed a new stridency and intensity in the past 30 years”.
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O conceito de “heterarquia” rompe com os paradigmas de hierarquia e linearidade relacionados à gestão e se associa à Nova Gestão Pública e à Governança.
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A Plataforma Moodle é um sistema de código aberto para a criação de cursos on-line. É também conhecida como Ambiente Virtual de Aprendizagem (AVA).
Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
19 Dez 2022 -
Data do Fascículo
2022
Histórico
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Recebido
05 Out 2021 -
Aceito
28 Jun 2022