Sobre implementação de políticas públicas: uma revisão sistemática da literatura e agenda de pesquisas

On public policy implementation: a systematic review of the literature and research agenda

Resumo

Estudos sobre implementação de políticas públicas têm buscado melhores formas de compreender as falhas e a própria realidade desse processo. A partir de uma revisão sistemática da literatura, que contou com análise bibliométrica, este artigo aponta a historiografia e as frentes de pesquisa sobre a temática e analisa a autoria e as redes de cocitação de autores. Posteriormente, uma metanálise das publicações que compõem o portfólio teórico final (construído por meio do ano de publicação, número de citações e fator de impacto dos periódicos) apresenta as perspectivas e os modelos teóricos prevalentes, os resultados empíricos e as lacunas de cada trabalho. Resultados apontam que temas como governança, desenvolvimento sustentável, e-government, street-level bureaucracy (burocracia de nível de rua), políticas de saúde e descentralização dos processos da administração pública trazem um cenário de pesquisas relevantes para teorizações e aplicações empíricas das discussões do campo. Por fim, apresenta-se uma agenda de pesquisa futura.

Palavras-chave:
Implementação de políticas públicas; Administração Pública; Governança; E-government; Street-level bureaucracy

Abstract

Studies on the implementation of public policies have sought better ways to understand the flaws and the reality of this process. Based on a systematic literature review that included bibliometric analysis, this article points out the historiography and research fronts on the subject and analyzes authorship and authors' co-citation networks. Subsequently, a meta-analysis of the publications that make up the final theoretical portfolio (constructed through the year of publication, number of citations and journal impact factor) presents the prevailing theoretical perspectives and models, the empirical results and the gaps of each work. Results point out that themes such as governance, sustainable development, e-government, street-level bureaucracy, health policies and decentralization of public administration processes bring a relevant research scenario to theorizations and empirical applications of the discussions of the field. Finally, a future research agenda is presented.

Keywords:
Implementation of public policies; Public administration; Governance; E-government; Street-level bureaucracy

Introdução

A implementação de uma política pública compreende o espaço temporal no qual seus resultados concretos são observáveis (Secchi, 2010). Seminalmente, Jeffrey Pressman e Aaron Wildavsky (1973: 15) a descrevem como um “processo de interação entre uma gama de objetivos e as ações definidas para atingi-los”.

Na literatura, boa parcela de estudos que priorizaram capturar as principais lacunas existentes entre o processo de construção de agenda e o efetivo sucesso de programas destinados à solução de problemas públicos culminou por considerar a etapa de implementação como uma espécie de “elo perdido” (Hargrove, 1975) do ciclo de políticas públicas. Desde então, distintos modelos de análise e abordagens compreensivas do processo de implementação puderam ser desenvolvidos, em gerações de pesquisas que enfatizam diferentes perspectivas, como, por exemplo, top-down ou bottom up (Lotta, 2019). Dito de outro modo, é importante observar que diferentes perspectivas tratam de modos diversos a relação entre objetivos definidos e resultados efetivamente alcançados pela implementação e suas distorções (Lima & D’ascenzi, 2019; Mota, 2020).

Para além da diversidade de modelos e de abordagens compreensivas relacionadas ao tema, um dos principais desafios inerentes à pesquisa sobre implementação de políticas públicas relaciona-se à versatilidade assumida pela temática, explorada em distintos campos de estudo transversais (administração pública, políticas públicas, gestão social, ciência política etc.). Além disso, um leque de atores e de fluxos decisórios envolvidos no processo de implementação em si (públicos, privados, sociedade civil organizada) torna determinados programas e iniciativas ainda mais complexos e expandem as possibilidades de teorização sobre o campo.

Tendo em vista o devido rigor metodológico demandado para explorar a temática em questão e para fornecer contribuições substanciais aos avanços de teorização, percebe-se a necessidade de vislumbrar um panorama detalhado dos estudos já realizados, abrangendo desde trabalhos seminais ao atual estado da arte do campo de pesquisas. Além disso, também acreditamos que, para uma melhor compreensão da fase de implementação de políticas públicas, importa identificar e analisar os cenários em que tal processo de teorização é possível.

Na intenção de oferecer uma compreensão preliminar desses cenários de estudos, este artigo busca analisar o percurso científico da implementação de políticas públicas por meio de uma revisão sistemática da literatura e, a partir daí, apontar contribuições sugestivas à construção de uma agenda de pesquisas futuras. Para tanto, definimos, alguns objetivos específicos: analisar as redes de core publications (historiografia e cocitação) para entender as relações entre os principais autores e os artigos seminais; apresentar as principais frentes de pesquisa que se organizaram no escopo da temática central e analisar o atual estado da arte do campo.

Para alcançar os objetivos indicados, procedemos a uma revisão sistemática da literatura sob recomendação Prisma¹ (Moher et al., 2009). Um recorte de estudos da Web of Science, base mundial de alta confiabilidade (Bar-Ilan, 2008; Dzikowski, 2018; Rossetto et al., 2018), subsidia uma análise bibliométrica seguida de discussões metanalíticas sobre a temática em apreço.

Na seção seguinte a esta, é apresentado um breve referencial teórico sobre o tema-foco da revisão sistemática da literatura realizada neste artigo. Todos os caminhos percorridos na estratégia de pesquisa encontram-se descritos em profundidade na seção de procedimentos metodológicos. Nas seções subsequentes, são apresentados os resultados obtidos mediante análise da historiografia e das redes de cocitação e a discussão sobre as principais temáticas identificadas no atual estado do campo. Por fim, são apontadas as considerações finais e sugestões de futuras pesquisas.

Implementação de políticas públicas

Dentro da chamada abordagem top-down, a implementação de políticas públicas é percebida como produto de um plano. Estudos em evidência na década de 1970 buscavam gaps ou falhas de implementação e correções em um enfoque prescritivo voltado ao cumprimento de objetivos previamente pactuados no desenho de políticas públicas até o alcance do público beneficiário (Dleon & Dleon, 2002; Lotta et al. 2018; Lotta, 2019). Nessa perspectiva, assume-se genericamente que as distorções de aderência dos efeitos e resultados de políticas em relação ao planejado decorrem de problemas hierárquicos e relativos a falhas no controle (Pressman & Wildavsky, 1973).

Em face do ceticismo quanto aos desvios de rota frequentemente observados na implementação de variados tipos de políticas (Sabatier, 1986), a saída seria aumentar a clareza dos objetivos, sendo recorrente o alto investimento em ferramentas de monitoramento e controle hierárquicos rígidos (Gomes, 2019; Lima & D’Ascenzi, 2019). Por outro lado, a aceitação do caráter político e estratégico do processo de definição de objetivos faz com que esse processo seja consensualmente aceito em detrimento de uma formulação pactuada junto aos processos táticos e operacionais que lhe dariam cumprimento (Lima & D’Ascenzi, 2019).

Em contraposição à perspectiva top-down, estudos realizados a partir da década de 1980 analisam como a implementação acontece de fato, valorizando o resultado dos processos decisórios e a performance dos atores envolvidos na implementação, considerando as múltiplas pressões às quais estes estão submetidos (Deleon & Deleon, 2002; Lotta et al. 2018; Lotta, 2019). Essa abordagem bottom-up ressalta o papel dos burocratas e das redes de atores capazes de influenciar a modelagem da implementação de políticas públicas, levando em consideração a discricionariedade dos implementadores para modificar a política formulada (Lipsky, 1980; Lotta & Pavez, 2010; Lotta et al. 2018).

O debate polarizado entre as perspectivas top-down e bottom-up desse processo abriu espaço para reflexões importantes sobre melhores formas de compreender tanto as falhas quanto a realidade da implementação de políticas públicas (Lotta et al. 2018; Lotta, 2019), principalmente por meio de modelos que buscaram incorporar elementos alternativos e contornar os chamados vieses de implementação (Moraes Sobrinho; Helal, 2017).

Alguns desses modelos sintetizam elementos de ambas as abordagens, combinados com percepções de outras literaturas (Sabatier, 1986). Alguns incorporam elementos de distintas fases do ciclo de políticas públicas, como a formulação, atentando para a ambiguidade e o conflito inerentes a esta, como fatores determinantes da capacidade de provisão das ações a nível local (Matland, 1995); ou ressaltam os processos decisórios inerentes à implementação, a partir de coalizões (Sabatier, 1988).

Na literatura mais recente, estudos tentam avançar em direção às conexões das fases de implementação e avaliação de políticas (Lima & D’Ascenzi, 2019); nas vicissitudes decorrentes de problemas não previstos na formulação e que se tornam obstáculos a serem contornados no momento da implementação (Silva & Melo, 2000); ou na proposição de modelos de análise expandida pautados no dilema entre controle e discricionariedade de agentes implementadores no nível de rua (Tummers & Bekkers, 2014; Bonelli et al. 2019; Nothdurfter & Herman, 2018; Thomann & Van Engen; Thomann, Van Engen & Tummers, 2018; Lima-Silva et al., 2020).

Ainda de acordo com os avanços da literatura mais recente, o debate sobre a fase de implementação de políticas públicas tem se desenvolvido em torno de questões emergentes em pesquisas no campo da administração pública e da gestão social, tais como burocracia de nível rua e sua relevância para a efetividade do processo de implementação (Oliveira, 2012; Lipsky, 2019; Lotta, 2019), capacidades estatais e percepção de desempenho de políticas implementadas (Evans, 2003; Pires & Gomide, 2016; Gomide, Machado & Albuquerque, 2021; Haque, Ramesh & Puppim de Oliveira, 2021), coordenação de redes, descentralização de políticas e governança pública (Gontijo, 2012; Jaccoud & Vieira, 2020; Bichir, 2020).

Procedimentos metodológicos

Para o alcance do objetivo deste artigo, apresenta-se uma revisão sistemática da literatura sob recomendação Prisma (Moher et al., 2009). Como fonte de dados, escolheu-se a Web of Science (WoS), base internacional de confiabilidade que reúne estudos de vários países (Bar-Ilan, 2008; Dzikowski, 2018; Rossetto et al., 2018).

Justifica-se a fonte escolhida por se tratar de uma base de acesso contínuo a informações multidisciplinares das mais prestigiosas revistas científicas de alto impacto no mundo (Bar-Ilan, 2008). Frequentemente utilizada, a WoS contém um conjunto de dados de cada referência, o que permite a manipulação em softwares de pesquisa bibliométrica e posteriores análises advindas desse tipo de pesquisa, a exemplo da análise de cocitação (Rossetto et al., 2018).

A busca se deu com o termo “public polic* implementation” nos tópicos dos estudos (títulos, resumos, palavras-chaves do autor e keyword plus, que são as palavras-chave recorrentes nos textos). O asterisco (*) refere-se às variações de singular e plural que o construto pode adotar (-y ou -ies). Após a busca, que retornou 123 estudos de diversos tipos, foram filtrados 91 estudos no formato de artigo, que foram reduzidos a 85 artigos com a eliminação de artigos ainda não publicados (early access). Esses 85 artigos preliminarmente elegíveis para a pesquisa geraram a historiografia, a coocorrência de palavras-chave e a cocitação de autores da temática em uma primeira etapa.

Na segunda etapa, buscando uma maior delimitação de estudos para análise, foram selecionados apenas os artigos dos últimos cinco anos, resultando em 39 artigos. Tal delimitação teve por propósito a análise da produção internacional recente sobre o tema. Definiu-se um conjunto de 38 artigos a partir da exclusão da indexação repetida do artigo “Privacidad y derechos digitales en el escenario global: EPU 2016 y el caso ecuatoriano” (Calderon & Acuna, 2017b). Logo após, utilizou-se a methodi ordinatio, ferramenta metodológica que classifica estudos por meio do ano de publicação e do número de citações deles e do fator de impacto do periódico que o veiculou (Pagani; Kovaleski & Resende, 2015), na fórmula:

$InOrdinatio=\frac{F_i}{1000}+{\alpha }^{*}[10-(AnoPesq-AnoPub)]+{\displaystyle \sum C_i}$

F_i é o valor do fator de impacto (Journal Citation Report - JCR), fornecido em relatório da base utilizada; α (atribuído pelo pesquisador) reflete o impacto do ano de publicação (que varia de 1 a 10); AnoPesq é o ano de execução da busca do estudo; AnoPub o ano em que o estudo foi publicado; e C _i o número de citações do estudo.

Na Figura 1, segue o percurso descrito.

Figura 1
Percurso da pesquisa

Com o portfólio teórico definido, procedemos a uma análise da historiografia das principais publicações já existentes no campo, para uma descrição das principais redes de cocitação de autores, bem como de coocorrência de palavras-chave. Na sequência, apresentamos o panorama bibliométrico com o conjunto de artigos selecionados que embasaram a revisão sistemática da literatura mais recente, cuja análise é aprofundada na seção de discussão.

Resultados

No recorte de estudos analisado, o artigo de Harold Luft (1976), “Benefit-cost analysis and public policy implementation: from normative to positive analysis”, que explora a relação entre custo-benefício e implementação de políticas públicas, foi o pioneiro sobre a temática. A partir da historiografia do campo, é possível ir até as novas redes de core publications, que são aquelas que apresentam as relações mais fortes entre todos os autores.

Por se tratar de um tema multidisciplinar, percebe-se que as pesquisas sobre implementação de políticas públicas permitem diversas frentes de abordagem, e aparecem em vários países do mundo. Na Figura 2, os círculos azuis apresentam os chamados core publications, artigos mais fortes devido às suas fortes relações de proximidade.

Figura 2
Historiografia de estudos sobre implementação de políticas públicas

Destacam-se os estudos de Masengesho Kamuzinzi (2016; 2021) e Masengesho Kamuzinzi e Jules Rubyutsa (2019) que discutem sobre o “imihigo”, um conceito que reflete a organização da sociedade - aldeia, município ou distrito - para o estabelecimento de metas e os prazos necessários para a consecução dos objetivos em uma espécie de contrato de desempenho criado pelo povo daquela localidade para a satisfação de suas próprias necessidades.

Importa também destacar a emergência de estudos e autores brasileiros sobre o tema. Gabriela Lotta (2012; 2020) e Gabriela Lotta et al. (2018) discutem, respectivamente, os implementadores de políticas públicas e usuários, especificamente na saúde, e uma agenda brasileira de pesquisas sobre implementação de políticas públicas, que estão principalmente voltadas aos desafios do federalismo brasileiro, à implementação em contextos de heterogeneidade e desigualdades, ao impacto da publicização de serviços, aos processos participativos e à intersetorialidade (Lotta et al., 2018).

Além dos estudos historicamente mais relevantes no recorte utilizado, importa analisar os trabalhos que fundamentam esses estudos, que formam as redes de cocitação. Analisar essas redes fornece um suporte teórico indispensável para a construção fundamentada de novos trabalhos. Eles envolvem autores que realizam desde as discussões temáticas até os principais métodos utilizados pelos trabalhos sobre implementação de políticas públicas, como é possível observar na Figura 3.

Figura 3
Cocitação de autores

Assim, as redes de cocitação mostram o quanto a literatura está condensada em torno de vários trabalhos (e de determinados autores). Na Figura 3, o tamanho dos nós indica o número de citações dos referidos trabalhos. As diferentes cores indicam os principais clusters em que os autores se citam entre si.

A partir de uma breve análise da Figura 3, tem-se como autores mais citados conjuntamente: “Robert Yin”, demonstrando a recorrência do estudo de caso enquanto estratégia de pesquisa utilizada; “Paul Sabatier”, como um dos principais teóricos sobre o assunto; e “Peter DeLeon”; o artigo DeLeon e DeLeon (2002) foi o mais citado no recorte (165 citações), servindo de referência para várias pesquisas do campo.

Peter DeLeon e Linda DeLeon (2002) escreveram um texto seminal sobre as gerações de estudos em políticas públicas, apontando estudos de primeira geração, fortemente marcados por uma orientação top-down e prescritiva; estudos de segunda geração, receptivos à perspectiva bottom-up de implementação e ao debate sobre burocracia de rua no processo de implementação, neste caso, com destaque para o também seminal de Michael Lipsky (1980) e estudos de terceira geração, que revelam um caráter integrativo, com o uso de teorias alternativas ou modelos sintéticos da literatura de implementação em políticas públicas.

Christopher Ham e Michael Hill (1993) também compõem parte da literatura fundamental sobre a temática da implementação ao fazerem uma análise sobre “o processo de elaboração de políticas públicas no Estado capitalista moderno”. Título do livro em que apontam contribuições do campo de estudo das teorias organizacionais à análise de políticas públicas e propõem um encadeamento de vários níveis teóricos de análise que serve como guia para outros contextos de pesquisa.

Paul Sabatier é um dos importantes autores a fazerem contribuições teóricas integrativas por meio de uma análise crítica a respeito das abordagens top-down e bottom-up (Sabatier, 1986). O modelo de coalizões de defesa referenciado em Sabatier (1988) e Paul Sabatier e Hank Jenkins-Smith (1993) também amplia as possibilidades de análise do processo de implementação de políticas públicas e ressalta a capacidade explicativa desse modelo sobre mudanças que ocorrem em tal processo.

Ao avançar no panorama geral, observa-se que a implementação de políticas públicas tem sido estudada em diversas frentes de pesquisa, com associação aos seguintes temas: governança, desenvolvimento sustentável, e-government, street-level bureaucracy (burocracia de nível de rua), políticas de saúde e a descentralização em todos os processos que envolvem as ações da administração pública, que serão descritos mais detalhadamente nas seções analíticas deste trabalho.

Uma breve análise da coocorrência de palavras-chave permite verificar que novos temas têm surgido em face do desenvolvimento de conceitos já importantes no campo de estudo. Por exemplo, a própria ideia de burocracia de rua, introduzida por Lipsky (1980) e recuperada em Lotta (2010; 2012; 2019; 2020) tem sido ampliada, quando associada à noção de discricionariedade administrativa, ou quando novos estudos desenvolvem noções como burocracia de nível intermediário, de alto escalão, de tela ou de sistema (Bush, 2020; Cardoso, 2020) etc. Conceitos como governança, performance e trabalho também ressaltam a natureza transversal das pesquisas na área.

Figura 4
Coocorrência de palavras-chave nos estudos sobre IPP

Por fim, o panorama bibliométrico apresenta um retrato geral da temática em análise. Para retratá-la em seu estado atual, é necessária uma delimitação de artigos mais atualizada para revisão de literatura e conseguinte contribuição teórica. Nesse sentido, construiu-se o portfólio teórico eleito pela methodi ordinatio, como apresentado no Quadro 1, a seguir:

Quadro 1
Classificação Methodi Ordinatio

Artigo	Abreviação do Periódico	Ano	JCR	Citações	InOrdinatio
Private transaction costs of water trade in the Murray-Darling Basin (Loch, Wheeler & Settre, 2018)	Ecol Econ	2018	5,389	18	53,01
When traditional principles bring coherence in complex networks management: the case of Imihigo in public policy implementation (Kamuzinzi, 2021)	Policy Stud-Uk	2021	2043	0	52,04
Does collaboration improve organizational efficiency? A stochastic frontier approach examining cities’ use of EECBG Funds (Park, Krause & Feiock, 2019)	J Publ Adm Res Theor	2019	7	8	48,01
Incorporating a resilience lens into the social and urban transformation of informal settlements: the participatory upgrading process in Villa 20, Buenos Aires (2016-2020) (Almansi, Motta & Hardoy, 2020)	Environ Urban	2020	3,2	2	47,00
Artigo	Abreviação do Periódico	Ano	JCR	Citações	InOrdinatio
Implementing public policy in a non-directive manner: capacities from an intermediary organization (Smits et al., 2020)	Can J Public Health	2020	2,448	1	46,00
An exploratory study into the understandings and awareness of leadership ethos and its inherent critical success factors by public sector officials in the Department of Trade and Industry (DTI) and the Ministry of the National Economy (Econat) (Ndalamba & Esau, 2020)	Int J Public Admin	2020	0,68	1	46,00
The implementation of emergency aid as an exceptional measure of social protection (Cardoso, 2020)	Rev Adm Publ-Rio Jan	2020	0,24	1	46,00
A public psychological pressure index for social networks (Zhang et al., 2020)	Ieee Access	2020	3,367	0	45,00
Integrating social learning into climate change adaptation public policy cycle: building upon from experiences in Brazil and the United Kingdom (Nicolletti, Maschietto & Moreno, 2020)	Environ Dev	2020	3,326	0	45,00
Health councils and dissemination of SUS management instruments: an analysis of portals in Brazilian capitals (Santos et al., 2020)	Cienc Saude Coletiva	2020	1,336	0	45,00
What makes a key player in interorganizational social policy networks? The case of Uruguay (Biosca & Galaso, 2020)	Int J Public Admin	2020	0,68	0	45,00
Crafting or mass-producing decisions: technology as professional or managerial imperative in public policy implementation (Busch, 2020)	Inform Polity	2020	0,55	0	45,00
Implementation challenges in public policies towards indigenous peoples: the impact of health policies in urban contexts (Huencho et al., 2020)	J Intercult Stud	2020	0,4	0	45,00
Categorizing easy and difficult users: everyday practices of public policy implementation and the production of social differences (Lotta & Pires, 2020)	Dados-Rev Cienc Soc	2020	0,357	0	45,00
Caracterização ambiental, uso e ocupação do solo entre os anos de 1985 e 2015, em região no sul do estado de Goiás (Carneiro, Martins & Guilherme, 2020)	Geoambiente On-Line	2020	0,05	0	45,00
Population structure of Pseudomonas aeruginosa through a MLST approach and antibiotic resistance profiling of a Mexican clinical collection (Castaneda-Montes et al., 2018)	Infect Genet Evol	2018	3,342	9	44,00
Addressing the undergraduate internship challenge in developing countries. A learning-by-doing project-based online internship model (Chand & Deshmukh, 2019)	Educ Train	2019	2,275	3	43,00
The intersection of nonprofit roles and public policy implementation (Daniel & Fyall, 2019)	Public Perform Manag	2019	2,745	2	42,00
When tradition feeds on modern accountability mechanisms in public policy implementation. The case of Imihigo in Rwanda (Kamuzinzi & Rubyutsa, 2019)	Public Perform Manag	2019	2,745	2	42,00
The role of central government and local government and the moderating effect of good governance on forest fire policy in Indonesia (Panjaitan et al., 2019)	Benchmarking	2019	0,85	2	42,00
Public policy implementation and basic sanitation issues associated with hydroelectric projects in the Brazilian Amazon: Altamira and the Belo Monte dam (Gauthier & Moran, 2018)	Geoforum	2018	3,901	5	40,00
Artigo	Abreviação do Periódico	Ano	JCR	Citações	InOrdinatio
When megaprojects meet archaeology: a research framework and case study from Yenikapi, Istanbul (Baraldi, Shoup & Zan, 2019)	Int J Cult Policy	2019	1,533	0	40,00
The human capital model or location! location! location!? The gender-based wage gap in the federal civil service (Mani, 2019)	Gend Issues	2019	0,52	0	40,00
Aplicando o quadro de referência para análise jurídica de políticas públicas: a implementação do programa Minha Casa, Minha Vida, Faixa 1, no município de São Paulo (Chilvarquer, 2019)	Rev Estud Inst-Braz	2019	0,24	0	40,00
A model of saints, wizards and demons: the dynamics of public policy implementation (Amanor-Lartey, 2019)	Ghana Soc Sci J	2019	0,05	0	40,00
Meet the local policy workers: implementation of health promotion guidelines in Denmark (Wimmelmann, Vallgarda & Jensen, 2018)	Public Policy Admin	2018	3,386	3	38,00
Compassionate bureaucracy: assuming the administrative burden of policy implementation (Wiley & Berry, 2018)	Nonprof Volunt Sec Q	2018	3,142	3	38,00
Balancing relations and results in regional networks of public-policy implementation (Klaster, Wilderom & Muntslag, 2017)	J Publ Adm Res Theor	2017	7	7	37,01
Challenges in national-level tourism strategy implementation - a long-term perspective on the New Zealand tourism strategy 2015 (Albrecht, 2017)	Int J Tour Res	2017	3,791	6	36,00
Attitudes towards citizen participation in the local decision-making process: a comparative analysis (Jurlina Alibegović & Slijepčević, 2018)	Drus Istraz	2018	0,391	1	36,00
For a Brazilian agenda of policy implementation studies (Lotta et al., 2018)	Rev Serv Publico	2018	0,05	1	36,00
Regulatory interpretation: regulators, regulated parties, and the courts (Randolph & Fetzner, 2018)	Bus Polit	2018	1,1	0	35,00
Conectividad rural y cambio social: los Infocentros Comunitarios en el Ecuador (Calderon & Acuña, 2017a)	Rev Publicando	2017	0	1	31,00
Deviations from China’s school football policies during the implementation process: signs, causes, and countermeasures (Yang & Tang, 2017)	Int J Hist Sport	2017	0,648	0	30,00
Municipal leadership of climate adaptation negotiations: effective tools and strategies in Houston and Fort Lauderdale (Williams, Green & Kim, 2017)	Negotiation J	2017	0,409	0	30,00
Public policy implementation: lessons for the design. analysis of cases of public management modernization and health care reform in Chile (Gambi, 2017)	Rev Clad Reforma Dem	2017	0,213	0	30,00
Protecting the teaching and learning environment: a hybrid model for human subject research public policy implementation (Hottenstein, 2017)	J Res Admin	2017	0,12	0	30,00
Privacidad y derechosdigitales en el escenario global: EPU 2016 y el caso ecuatoriano (Calderon & Acuña, 2017b)	Rev Publicando	2017	0	0	30,00

• Fonte: elaborado pelos autores.

Com a aplicação da methodi ordinatio, 38 artigos apresentaram uma delimitação relevante para este estudo. A metodologia foi aplicada com o sentido de selecionar estudos mais relevantes, no intuito de realizar um aprofundamento analítico, buscando apontar percursos e tendências para futuras pesquisas sobre o tema em questão. Após a escolha dos artigos mais recentes, a classificação dos estudos não excluiu nenhum artigo (não houve nenhum artigo com índice InOrdinatio negativo), preservando o número de 38 estudos eleitos.

Os escritos apresentam vários métodos e enfoques, cujos temas puderam ser organizados em: atores envolvidos na implementação de políticas públicas; redes em implementação de políticas públicas; tecnologias de informação e comunicação; organizações sem fins lucrativos; implementação de políticas públicas de educação; implementação de políticas públicas voltadas ao meio ambiente natural; implementação de políticas públicas voltadas à assistência social; e implementação de políticas públicas de saúde, bem como outros temas transversais.

Discussão

Atores envolvidos na implementação de políticas públicas

Estudos sobre os atores envolvidos na implementação de políticas públicas apresentam modelos de categorização do papel exercido por eles e suas implicações, bem como discussões que ressaltam a importância de traços específicos presentes em determinados atores, sejam implementadores ou usuários (público-alvo) de políticas públicas.

Sob a perspectiva dos implementadores, Ken Kalala Ndalamba e Michelle Esau (2020) examinam compreensões de líderes de diferentes níveis gerenciais do setor público sobre o “ethos de liderança” e seus respectivos fatores críticos de sucesso. Já Ebenezer Amanor Lartey (2019) apresenta um modelo de “santos, magos e demônios” para avaliar os papéis dos stakeholders envolvidos no processo de implementação, sendo os “santos”, representados por aqueles que desempenham papel de reformadores ativos do governo, os “magos”, representados por analistas de políticas públicas, com competências para disponibilizar informações relevantes e confiáveis do processo de implementação, e os “demônios” por grupos antagônicos ou letárgicos ao ciclo de políticas públicas. Estes últimos são os que atrapalham o trabalho de santos e magos e obstruem ou corrompem os processos que levariam a políticas bem sucedidas. Adiciona ao modelo o conceito de sistema, definido como o contexto político, social e econômico dentro do qual o ciclo de políticas públicas se encontra situado.

O texto de Kamuzinzi e Rubyutsa (2019), por sua vez, aborda uma discussão em torno da responsabilização de atores implementadores, dentro da tradicional abordagem do “Imihigo”, em Ruanda, na África. O artigo propõe a análise de como este tipo de responsabilização se posiciona vis-à-vis à responsabilização burocrática, aos pares e à democracia na implementação de políticas. O termo “Imihigo”, advindo de tempos pré-coloniais, é tradicionalmente associado à bravura para superar desafios nacionais, a “compromissos coletivos” compartilhados por um grupo de atores (afetados por um problema específico) para alcançar resultados excepcionais ou enfrentar a vergonha pública em caso de fracasso, ou mesmo a uma ferramenta de inovação que amplie a criatividade de uma comunidade em busca de novas soluções para novos problemas.

Dos estudos relacionados à perspectiva dos atores beneficiários de políticas, observa-se uma recorrência de artigos que enfatizam a importância da participação social no processo de implementação.

Dubravka Jurlina Alibegović e Sunčana Slijepčević (2018), mediante pesquisa empírica sobre o envolvimento de cidadãos em processos de tomada de decisão por deliberação, da perspectiva de vereadores de municipalidades de 16 países europeus, chamam atenção para a relevância da participação cidadã em modelos de governança pública. As autoras indicam que tal participação pode conduzir à melhoria no atendimento de necessidades dos usuários, mais qualidade e eficiência no uso de recursos públicos para a prestação de serviços públicos.

Já em Florencia Almansi, Jorge Martín Motta e Jorgelina Hardoy (2020), acompanha-se o progresso de experiências de integração só-urbana da Villa 20, um assentamento informal localizado na parte sul da cidade de Buenos Aires. Neste texto, destaca-se como o tratamento de problemas urbanos complexos por meio da participação do cidadão contribui para melhorar a governança urbana, e para o fornecimento de respostas abrangentes capazes de garantir a sustentabilidade de longo prazo das mudanças introduzidas.

Por fim, o trabalho de Gabriela Lotta e Roberto Pires (2020) situa-se entre ambas as perspectivas de atores envolvidos no processo de implementação para apontar práticas de categorização e julgamento dos usuários dos serviços no decorrer do processo, e descrever como as diferenças sociais penetram o mundo das políticas públicas. Com foco na atuação de agentes comunitários de saúde, o estudo mostra como a diferenciação social produzida por profissionais da burocracia de rua mescla elementos de natureza funcional com elementos morais associados a uma avaliação sobre a (in)adequação do comportamento dos beneficiários de serviços de saúde, potencializando implicações para dinâmicas mais amplas de reprodução de desigualdades sociais.

Redes em implementação de políticas públicas

Alguns estudos abordam a implementação que distingue a articulação de redes constituídas por configurações regionais ou interorganizacionais, suas relações e os desafios de governança a elas inerentes. Percebe-se que a temática das redes se encontra por vezes associada a abordagens multisetoriais ou sistêmicas na implementação de políticas públicas.

Olga Biosca e Pablo Galaso (2020) tratam do papel de organizações envolvidas com redes de implementação de políticas sociais multisetoriais no Uruguai. A natureza do financiamento (público ou privado) e as atribuições de atividades dessas organizações determinam sua influência e importância dentro dessas redes. Também apontam que a posição da organização depende do nível de intensidade de suas interações dentro da rede.

Em Esther Klaster, Celeste Wilderom e Dennis Munstlag (2017), é abordada a tensão entre os objetivos de curto prazo e a intenção de estabelecimento de relações duradouras em redes regionais de políticas públicas de educação e emprego na Holanda. Os resultados obtidos revelam que tais tensões estão especialmente presentes em redes mais jovens, uma vez que as mais maduras tendem a demonstrar maior equilíbrio na relação entre alcance de metas e relacionamentos dentro da rede. A governança da rede também é pontuada como um quesito fundamental nesse processo; aquela que dispunha de uma organização administrativa com papel puramente facilitador demonstrou melhor desempenho em ambos os aspectos.

Em relação à menção de desafios inerentes à gestão de redes, Julia Albrecht (2017) realiza um estudo pautado em análises de trabalhos anteriores sobre implementação de estratégia de turismo para avaliar as redes de partes interessadas na implementação da “Estratégia de turismo da Nova Zelândia 2015”. O artigo oferece contribuições explicativas sobre dilemas relacionados ao tipo e número de partes interessadas envolvidas na implementação da estratégia desse tipo de política e sobre questões sistêmicas inerentes à colaboração do setor público-privado.

Kamuzinzi (2021), por sua vez, debruça-se novamente sobre o sistema de implementação de políticas públicas em Ruanda, país africano com recursos escassos e que se inspirou na tradição do “Imihhigo” para facilitar a coordenação de iniciativas políticas diversificadas e superar barreiras burocráticas de desempenho relativas ao gerenciamento de redes complexas.

Já Gregory Randolph e James Fetzner (2018), foi utilizada literatura sobre implementação de políticas públicas e pesquisas sobre redes para explorar os desafios inerentes à interpretação e a iniciativas regulatórias. Tecem considerações a respeito de entidades regulatórias, partes reguladas e o sistema de tribunais.

Tecnologias de informação e comunicação

Alguns estudos destacam o papel desempenhado pela tecnologia e sua influência sobre o processo decisório na implementação de políticas públicas. Nessa concepção, tecnologias de informação e comunicação podem ser entendidas como instrumentos mediadores, facilitadores, ou mesmo como elementos que contextualizam situações em que a implementação de determinadas políticas demanda medidas regulatórias.

Peter Busch (2020) realiza entrevistas com profissionais denominados “burocratas de nível da tela” na Noruega - trabalhadores do serviço público cujo trabalho é consideravelmente influenciado por ferramentas digitais. Para os sete subestágios da implementação identificados, são descritos os principais impactos da tecnologia sobre as normas profissionais e os objetivos gerenciais dos entrevistados.

María José Calderon e Javier Acuña (2017a) analisam o impacto do uso extensivo de tecnologias de comunicação no espaço rural equatoriano. Os autores realizam uma análise das políticas desenvolvimentistas e sua correlação ao desenvolvimento social no país na última década. Dentro dessa perspectiva, analisam a disseminação da conectividade a partir de infocentros comunitários, as políticas públicas de difusão digital no país, bem como o papel de agências estatais de controle das telecomunicações e a criação do Ministério de Telecomunicação na implementação de políticas regulatórias relativas à nova lei especial de telecomunicações.

O trabalho de Hong-Li Zhang e equipe (2020) se volta à compreensão da opinião pública por meio de índices de avaliação quantitativos e métodos de computação social de análise de redes sociais. Os autores propõem o conceito de índice de pressão psicológica pública e seu método de cálculo, aplicando-o, ao final do artigo, a uma seleção de nove eventos públicos ocorridos entre julho e agosto de 2012 na China. O texto indica que a análise da opinião pública por meio de dados de redes sociais traz contribuições importantes em vários campos, incluindo ciência política, economia, comércio, finanças, comércio internacional, implementação de políticas públicas etc.

Por fim, em torno do debate sobre vigilância estatal e uso de dados de usuários, e da implementação de políticas regulatórias, Calderon e Acuña (2017b) fazem uma descrição da situação global face aos dilemas sobre privacidade em fóruns internacionais para o caso do Equador, e como o país encontra-se situado na agenda global.

Organizações sem fins lucrativos

Também é possível identificar artigos que fazem apontamentos interessantes sobre implementação de políticas públicas de alguma forma relacionadas ao trabalho desenvolvido por organizações sem fins lucrativos. Tais artigos situam a discussão sobre implementação de modo a ressaltar peculiaridades referentes à prestação de serviços pelo terceiro setor.

Jamie Daniel e Rachel Fyall (2019) apresentam uma visão geral da prática de implementação de políticas por meio da prestação de serviços sem finalidade lucrativa, abordando funções em torno de quatro tópicos: simultaneidade de funções sem fins lucrativos, assimetria perceptiva de implementação de políticas ou de entrega de serviços, funções sem fins lucrativos ao longo do tempo e participação na rede.

Kimberly Wiley e Frances Berry (2018), por sua vez, analisam como organizações sem fins lucrativos, ao implementarem políticas públicas sob a forma de certos serviços públicos, absorvem os custos da prestação de contas, e a conformidade com a qual essas organizações respondem a medidas burocráticas e exigências de relatórios requeridos por entidades públicas financiadoras. O estudo foi pautado em entrevistas realizadas com líderes de organizações sem fins lucrativos relacionadas à defesa contra violência doméstica nos Estados Unidos, dependentes de financiamento público.

Implementação de políticas públicas de educação

Três dos artigos elencados dedicam-se a análises sobre implementação de políticas públicas no campo da educação. Nestes estudos, estuda-se desde o âmbito escolar até o nível superior.

Chengwei Yang e Yan Tang (2017) analisam a implementação de políticas públicas de futebol escolar, vinculadas a uma estratégia nacional para desenvolvimento do esporte na China, e os principais desvios de implementação identificados. Vijaya Chand e Ketan Deshmukh (2019) tratam das dificuldades enfrentadas para encontrar oportunidades adequadas de estágio no ensino superior, sobretudo em países em desenvolvimento, e apresentam um modelo de estágio on-line capaz de estimular os estudantes a se engajarem em projetos de aprendizagem reflexiva. O modelo aborda, na perspectiva dos autores, uma barreira fundamental na implementação de políticas relativas a tecnologias de informação e comunicação na educação pública - a escassez de conteúdo audiovisual em línguas locais.

Por último, Kristi Hottenstein (2017) discute o papel de Conselhos de Revisão Institucional (IRB) em pesquisas de nível de graduação financiadas pelo governo federal envolvendo seres humanos. O estudo de caso buscou analisar como regulamentos são implementados por um IRB em uma instituição onde esse tipo de pesquisa constitui parte significativa da experiência de graduação de estudantes do centro-oeste norte-americano.

Implementação de políticas públicas voltadas ao meio ambiente natural

Dos artigos dedicados à análise da implementação de políticas relacionadas ao meio ambiente natural, verifica-se a incidência de estudos sobre a conservação de recursos que podem ser caracterizados como bens públicos, assim como uma preo­cupação recorrente com mudanças climáticas globais. Percebe-se que os artigos tratam tanto de abordagens locais quanto de análises comparativas. Além disso, também se observa que temáticas referentes à implementação de políticas públicas para o meio ambiente natural são objeto de investigação em contextos brasileiros diversos.

Dentre as pesquisas que abordam o contexto nacional, o texto de Steffan Carneiro, Alécio Martins e Frederico Guilherme (2020) objetivou avaliar as alterações ambientais em variáveis do meio físico, em um intervalo de 30 anos, nos municípios de Aporé e Itajá, na mesorregião sul goiana.

Já em outra pesquisa, por meio da análise das políticas nacionais (Política Nacional de Recursos Hídricos e Lei Federal de Saneamento Básico) e do uso de informações publicamente disponíveis, Cristina Gauthier e Emilio Moran (2018) analisam como algumas práticas de saneamento básico associadas a projetos hidrelétricos na Amazônia revelam questões que podem impactar o meio ambiente e a saúde pública da população. Neste estudo, os autores apontam que as condições exigidas e ditadas pelas políticas nacionais discutidas diferem da realidade local e parecem estar desconectadas. Identificam, ainda, uma série de discrepâncias entre a realidade de Altamira e as políticas públicas nacionais existentes no Brasil.

Mariana Nicolletti, Fernanda Maschietto e Thais Moreno (2020), por fim, fazem um estudo de caso múltiplo, abrangendo 18 experiências do Reino Unido e do Brasil, para discutir contribuições da aprendizagem social para questões de governança socioambiental e políticas públicas relacionadas a problemas perversos, como mudanças climáticas.

Dentre os artigos que abordam contextos internacionais, Raffles Panjaitan e equipe (2019) avaliam a relação entre a boa governança e a política de gestão de incêndios florestais na Indonésia. Já Adam Loch, Sarah Wheeler e Claire Settre (2018) se dedicam a investigar os impactos dos custos de transação sobre o sucesso ou o fracasso da implementação de políticas relacionadas ao comércio de água na Austrália.

Por fim, o texto de Mark Williams, Alex Green e Ella Kim (2017) descreve estratégias e táticas adotadas em âmbito municipal nos Estados Unidos - em Houston, Texas, e Fort Lauderdale, Flórida -, objetivando identificar quais métodos os líderes dessas cidades empregaram para conduzir negociações a fim de implementar políticas de adaptação ao clima e avaliar se tais métodos foram eficazes.

Implementação de políticas públicas voltadas à assistência social

Os dois artigos sobre a temática da assistência social dedicam-se à análise de programas sociais específicos e remetem à implementação de políticas no contexto brasileiro. Cardoso (2020) faz uma análise sobre o processo de implementação do Auxílio Emergencial face às consequências trazidas pela pandemia do coronavírus (Covid-19) para as parcelas mais vulneráveis da população, dentre as quais os beneficiários do Programa Bolsa Família (PBF), os inscritos no Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal (CadÚnico) ou cidadãos que já tinham algum tipo de relacionamento com políticas de assistência social. O texto aborda, no âmbito do arranjo estabelecido pelo Ministério da Cidadania (MC), as estratégias para identificação dos públicos-alvo, os conceitos de burocracia de rua, de tela e de sistema para discorrer sobre a implementação do auxílio.

Por sua vez, Chilvarquer (2019) apoia-se em um quadro de referência para análise jurídica de políticas públicas, para fazer uma análise da implementação do Programa Minha Casa Minha Vida Faixa 1 na cidade de São Paulo entre os anos de 2009 e 2018. O estudo visa contribuir para o desenvolvimento da abordagem do direito e das políticas públicas, indicando ganhos analíticos e dificuldades na utilização do método para outros pesquisadores do campo.

Implementação de políticas públicas de saúde

Em comparação às outras temáticas, os artigos que versam sobre implementação de políticas no campo da saúde pública demonstram relativa coesão em relação aos objetivos de pesquisa propostos. De maneira geral, em um primeiro plano, aproveitam-se do caso de uma política pública de saúde específica para analisar como ocorre o processo de implementação, considerando, por exemplo, fatores como coparticipação social, publicização e monitoramento de dados, uso de diretrizes, intermediação no processo de implementação e contextos de diversidade. Em um segundo plano, pode-se apontar artigos que buscam analisar como resultados característicos do processo de implementação podem vir a contribuir para um melhor desenho da política em si.

No primeiro plano, pode-se citar o trabalho de Christiane Santos e equipe (2020), que destaca o papel dos Conselhos de Saúde enquanto espaços de coparticipação na atuação, planejamento e controle da execução de políticas públicas. Os autores buscaram investigar como os portais das prefeituras das capitais brasileiras têm divulgado seus Conselhos de Saúde e em que medida cumprem o disposto na legislação quanto à publicização dos respectivos instrumentos necessários para análise, monitoramento e acompanhamento da política de saúde. Já Pernelle Smits e equipe (2020) descrevem um conjunto de capacidades críticas de uma organização em um contexto de intermediação de implementação top down de uma política pública de saúde na província de Quebec, no Canadá.

Ao investigar o referido contexto de implementação, coube à organização intermediadora integrar as instruções advindas da lei referente à política de saúde a ser implementada à realidade advinda da base dos trabalhadores do sistema de saúde junto à população. Os autores apontam para capacidades que podem vir a permitir aos governos disponibilizarem um estoque de recursos a fim de apoiar outros contextos de implementação ou reformas.

Ainda no plano dos estudos que se preocupam em uma melhor compreensão do processo de implementação, Camilla Wimmelmann, Signild Vallgårda e Anja Jensen (2018) observam variações nas estratégias de implementação de diretrizes em políticas de saúde, com base em estudos realizados mediante entrevistas e observações em municípios dinamarqueses e, introduzindo os conceitos de “tradução” e “interiorização” para compreender como e por que indivíduos que trabalham nas mesmas posições e recebem as mesmas diretrizes, implementam-nas de formas diferentes.

Por sua vez, Verónica Huencho e equipe (2020) investigam como políticas de saúde pública indígena são implementadas em contextos de diversidade. O estudo de caso é relativo à área urbana no Chile, a partir da realização de entrevistas com gestores, profissionais de saúde, lideranças indígenas e usuários que desempenharam um papel em diferentes estágios do processo de implementação do Programa Especial de Saúde para os Povos Indígenas.

No plano de estudos voltados para a compreensão de resultados de certas políticas (ou de suas falhas), pode-se citar o texto de F. Castañeda-Montes e equipe (2018), que realiza investigações sobre patógenos de uma coleção clínica da Cidade do México, juntamente com um perfil de resistência a antibióticos de microbiologia clássica. Este trabalho abre espaço para reflexões sobre as causas que tornam os países menos desenvolvidos hotspots de resistência aos antibióticos, considerando-se aspectos multifatoriais de um contexto sociopolítico que inclui o modelo de implementação de políticas públicas e a fiscalização em relação ao acesso a antibióticos nesses países.

Outros temas

Neste último tópico, elencam-se os artigos que versam sobre outras temáticas, distintas entre si, e que não se repetem em estudos anteriores. Pontua-se que alguns destes artigos dizem respeito a temáticas transversais - como gênero no universo de trabalho - ou interdisciplinares, como gestão de projetos.

Bonnie Mani (2019), por exemplo, usa o Modelo de Capital Humano para fazer uma análise sobre diferenças salariais baseadas em gênero. O estudo de caso é relativo a funcionários públicos federais dos Estados Unidos, e foi realizado mediante dados de acesso público do Escritório de Gestão de Pessoas do governo, obtidos em 2014. A pesquisa revela existir espaço para melhorias nas políticas públicas implementadas no país com intuito de mitigar diferenças salariais entre homens e mulheres.

Sara Baraldi, Daniel Shoup e Luca Zan (2019) investigam escavações de resgate, em Yenikapi, Istambul, em uma abordagem de pesquisa baseada em fenômenos para a gestão de projetos de patrimônio arqueológico e cultural. A estrutura analítica utilizada pelos autores - Cadeia do Patrimônio e Análise do Desempenho da Conduta da Estrutura - destaca o papel crucial da adoção de práticas (ou estratégias emergentes) na implementação de políticas públicas. O caso também destaca como o ambiente jurídico incerto da Turquia para a arqueologia de resgate levou a soluções emergentes e ad hoc de gerenciamento e financiamento que mesclam o envolvimento estatal e privado de maneira inovadora por meio de terceirização de vários níveis.

Angela Park, Rachel Krause e Richard Feiock (2019) utilizam a abordagem de análise de fronteira estocástica para avaliar a eficiência do uso de fundos do Energy Efficiency Conservation Block Grant (EECBG) em cidades dos Estados Unidos na implementação de programas de sustentabilidade, e o nível de influência da colaboração sobre os níveis de eficiência organizacionais.

Mauricio Gambi (2017), por sua vez, faz uma análise comparativa entre as escolas do federalismo norte-americano e as escolas que se debruçam em estudos comparativos, indicando como estes podem contribuir para aqueles da escola norte-americana. Ao longo do texto são apresentadas diferentes abordagens para tópicos comuns a ambas as escolas, incluindo descentralização, partidarismo político, representação, federalismo fiscal, relações intergovernamentais, compliance e implementação.

Por fim, Lotta e equipe (2018) propõem uma agenda de estudos no campo de implementação de políticas públicas à luz de análises das lacunas da literatura nacional e de correntes analíticas internacionais a respeito. A implementação é abordada sob diversas perspectivas e modelos analíticos, sendo ressaltadas, dentre as temáticas identificadas, pesquisas referentes a accountability e transparência, estruturas de governança, envolvimento de atores não estatais, burocracia, discricionariedade e autonomia, valores e comportamentos de burocratas, resultados de incentivos, estratégias de enfrentamentos de pressões, efeitos sociais da implementação etc.

Caminhos e tendências na produção científica sobre implementação de políticas públicas

Nesta seção, apresentamos caminhos, tendências e lacunas de pesquisas sobre implementação de políticas públicas, podendo servir à comunidade científica como bússola para o fomento de debates e teorizações no campo.

A prevalência de estudos de caso permite apontar a implementação de políticas públicas como fenômeno essencialmente teórico-empírico. Boa parte das pesquisas buscam analisá-lo sob a perspectiva de uma situação prática para propor teorizações ou sugestões referentes a distorções no processo.

A despeito da riqueza inerente à transversalidade da temática, percebe-se uma carência de teorizações com enfoques comparativos. Os artigos que se apoiam em modelos ou frameworks o fazem de forma pontual e não de forma a propor novas teorizações a partir de modelos sintéticos ou de abordagens integrativas.

Ao analisar o cenário bibliométrico da temática, observamos que os assuntos governança, desenvolvimento sustentável, e-government, street-level bureaucracy (burocracia de nível de rua), políticas de saúde e a descentralização de processos da administração pública inspiram de modo recorrente as pesquisas do campo. É possível inferir que o debate sobre esses assuntos têm ganhado relevância, tanto no âmbito acadêmico como no âmbito público e social, repercutindo, assim, em iniciativas de pesquisa que buscam captar a proeminência de novos fluxos decisórios, mais participativos, horizontais e intersetoriais no processo de implementação. Do mesmo modo que novos termos e conceitos ganham espaço na agenda de pesquisa científica, a complexificação das demandas sociais centradas nos usuários de serviços públicos tem requerido problematizações atualizadas e concernentes a tais demandas.

Por fim, percebe-se que uma parcela significativa dos temas (os que designam áreas consolidadas de cobertura em políticas sociais) evidencia a natureza setorial ainda pujante nos estudos sobre implementação. Os estudos que evidenciam esse traço tendem a preservar uma perspectiva estadocêntrica do processo de implementação e da política pública de forma geral, a qual, por muitas vezes, ainda é referenciada como ação ou programa necessariamente revestido do caráter imperativo de autoridade do poder público. Por outro lado, os demais temas mesclam perspectivas multicêntrica e estadocêntrica e ilustram muito bem como diversos atores podem estar inseridos dentro do debate da implementação de políticas.

Considerações finais

Este estudo analisou o percurso científico da implementação de políticas públicas. Utilizando a methodi ordinatio na construção do portfólio teórico para análise, direcionamos o entendimento do chamado “estado da arte” da temática às pesquisas que envolvem saúde, educação, meio ambiente natural, tecnologias de informação e comunicação, assistência social, redes, organizações sem fins lucrativos, atores e outros temas transversais à implementação de políticas públicas.

Uma observação pertinente ao agrupamento dos artigos é que, mesmo que categorizados sob temáticas distintas, é possível assumir que alguns trabalhos estejam conectados a mais de uma categoria. Em Busch (2020), por exemplo, o estudo focado em atores é limitado a dois tipos de profissionais do serviço público (juízes do Tribunal Distrital Norueguês e profissionais de um escritório de administração tributária da Noruega), ou seja, burocratas de nível de rua que lidam com tecnologias relativas a e-government. É relevante investigar como habilidades tecnológicas e treinamento influenciam o impacto tecnológico na implementação de políticas públicas.

Um segundo exemplo é o estudo realizado por Lotta e equipe (2018), que traz uma agenda de pesquisas destinadas à apropriação dos novos paradigmas do campo com aplicações na realidade complexa da implementação no contexto brasileiro e seus desdobramentos, sugerindo, dentre possibilidades temáticas a serem consideradas, os desafios do federalismo brasileiro, a implementação em contextos de heterogeneidade e desigualdades, o impacto da publicização de serviços, processos participativos e intersetorialidade.

Daniel e Fyall (2019) sugerem que pesquisas futuras podem se aprofundar nos temas identificados para responder a questões sobre intersecção das funções das organizações sem fins lucrativos e políticas públicas, bem como explorar aspectos diversos da multidimensionalidade dessas organizações. São várias as possibilidades de pesquisa sobre a implementação, uma vez que ela se traduz em processos passíveis de melhoria constante e aplicáveis em vários contextos. Desse modo, as discussões deste estudo trazem um panorama atual da área e podem direcionar várias pesquisas.

As contribuições teóricas e empíricas deste estudo são, respectivamente, a apresentação do cenário bibliométrico e o estado da arte com vista ao fomento da literatura sobre o tema e à compreensão de diversas aplicações do tema como inspiração para novos modelos baseados em experiências de vários países. Reforça-se que este artigo é fundamentado em um recorte da literatura, o que seria uma possível limitação. Contudo, modelos teóricos podem ser construídos a partir deste estudo, incentivando pesquisadores e atores de implementação de políticas públicas.

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• 1
  Recomendação acerca dos itens a serem considerados na construção de revisões sistemáticas e metanálises (Moher et al., 2009).

Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  01 Ago 2022
• Data do Fascículo
  May-Aug 2022

Histórico

• Recebido
  15 Set 2021
• Aceito
  09 Maio 2022