CORRELAÇÃO CLÍNICO-CIRÚRGICA
Caso 1/2005 - Serviço de Cirurgia Cardíaca Pediátrica - Hospital de Base da Faculdade Estadual de Medicina de São José do Rio Preto
Ulisses Alexandre Croti; Domingo Marcolino Braile; Marcelo Felipe Kozak; Ana Carolina Leiroz Ferreira Botelho Maisano Kozak
Endereço para correspondência Endereço para correspondência Ulisses Alexandre Croti Hospital de Base - FAMERP Av. Brigadeiro Faria Lima, 5416 CEP 15090-000 - São José do Rio Preto - SP. E-mail: uacroti@uol.com.br
DADOS CLÍNICOS
Criança com 7 meses, 5,3 kg, sexo feminino, branca, nascida a termo. Aos dois meses de vida, foram observados ruídos cardíacos à direita do tórax, suspeitando-se de dextrocardia e sendo encaminhada ao cardiologista para investigação. Nesta ocasião, diagnosticou-se cardiopatia congênita e foi iniciado tratamento com digital e diurético. Na evolução, apresentou quadro clínico de pneumonia, necessitando internação hospitalar por um período de 30 dias. Bom estado geral, corada, hidratada, taquipnéia discreta, acianótica. Tórax simétrico, ictus cordis e frêmito palpáveis no 5° espaço intercostal direito em linha hemiclavicular. Ritmo cardíaco regular em dois tempos, segunda bulha hiperfonética e sopro sistólico em regurgitação de 4+/ 6 em borda esternal direita baixa. Ausculta pulmonar simétrica, sem ruídos adventícios. Fígado palpável a 3 cm do rebordo costal esquerdo. Extremidades com pulsos palpáveis e simétricos sem diferencial pressórico entre os membros.
ELETROCARDIOGRAMA
Sugestivo de dextrocardia com onda P negativa na derivação DI no plano horizontal. Ritmo sinusal, freqüência 136 bat/mim, SÂP + 60°, eixo elétrico do complexo QRS no 1° quadrante (SÂQRS + 60°), PR 0,16, QR 0,04, QT 0,24 (QTc 0,36). Sobrecarga biventricular (Figura 1).
RADIOGRAMA
Área cardíaca aumentada com índice cardiotorácico de 0,58 e dextrocardia. Proeminência vascular pulmonar moderada. Situs inversus visceral evidenciado por imagem compatível com fígado à esquerda e "bolha" gástrica à direita (Figura 2).
ECOCARDIOGRAMA
Situs inversus totalis em dextrocardia. Conexões venoatrial, atrioventricular e ventrículo-arterial concordantes. Aumento discreto de átrio direito e moderado de átrio esquerdo, insuficiência discreta da valva atrioventricular esquerda e moderada da valva atrioventricular direita. Dilatação moderada de tronco e ramos pulmonares. Presença de comunicação interventricular muscular trabecular com extensão para via de saída do ventrículo direito, com diâmetro de 14 mm2. Ao Doppler, a pressão sistólica no ventrículo direito era de 98 mmHg e a pressão média na artéria pulmonar de 50 mmHg, sugerindo hipertensão arterial pulmonar importante por hiperfluxo com Qp/Qs de 2,8.
DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL
Deve ser pensado em doenças com hiperfluxo pulmonar, como comunicação interventricular, comunicação interatrial, defeito septal atrioventricular e persistência do ducto arterial. Algumas vezes, a presença de situs inversus totalis e dextrocardia representa a possibilidade de cardiopatia complexa, porém nem sempre significa obrigatoriedade de doença cardíaca, sendo necessário lembrar de outras causas como atelectasia, hérnia diafragmática e pneumotórax.
DIAGNÓSTICO
O ecocardiograma foi imperioso e definitivo no diagnóstico, não sendo necessário estudo cineangiocardiográfico. O diagnóstico de situs inversus totalis, dextrocardia, comunicação interventricular muscular trabecular com extensão para via de saída do ventrículo direito foi confirmado durante a operação.
OPERAÇÃO
Toracotomia transesternal mediana, posicionamento do cirurgião à esquerda do paciente para instalação do circuito de circulação extracorpórea convencional e realização da operação. Hipotermia a 28ºC, cardioplegia sangüínea anterógrada intermitente a 4ºC, 20ml/kg em intervalos de 15 minutos. O tempo de perfusão foi de 72 minutos e de isquemia miocárdica de 57 minutos. O tronco pulmonar foi aberto acima da valva pulmonar e através desta incisão a comunicação interventricular foi fechada com placa de pericárdio bovino, fixada com pontos separados de polipropileno 6-0 ancorados também em pequenos remendos de pericárdio bovino (Figura 3). No pós-operatório, apresentou infecção pulmonar inespecífica, recebendo antibioticoterapia de amplo espectro. Evoluiu com insuficiência renal necessitando diálise peritoneal durante três dias. Recebeu alta hospitalar com 21 dias de internação em bom estado geral e com ecocardiograma demonstrando correção do defeito.
Artigo recebido em dezembro de 2004
Artigo aprovado em janeiro de 2005
Endereço para correspondência
Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
11 Set 2007 -
Data do Fascículo
Mar 2005