Acessibilidade / Reportar erro

Infecção urinária em menores de 15 anos: etiologia e perfil de sensibilidade antimicrobiana em hospital geral de pediatria

Urinary tract infection in children under 15 years: etiology and antimicrobial susceptibility in a children's hospital

Resumos

OBJETIVO: Descrever a prevalência dos principais agentes etiológicos de infecção urinária comunitária em crianças menores de 15 anos e analisar o perfil de sensibilidade antimicrobiana do principal agente, Escherichia coli. MÉTODOS: Estudo retrospectivo conduzido a partir de uroculturas com crescimento de agente único, com unidades formadoras de colônia maior ou igual a 10(5)/mL. A população selecionada foi atendida no Pronto Atendimento de Pediatria do Hospital Universitário da Universidade de São Paulo entre janeiro de 2006 e dezembro de 2007. Para analisar o perfil de sensibilidade de E. coli, foram excluídos casos com infecção urinária de repetição e/ou portadores de uropatias. RESULTADOS: Dos 176 casos de infecção urinária, 133 (76%) ocorreram no sexo feminino e 43 (24%) no masculino. A faixa etária de maior prevalência das infecções urinárias foi a de menores de dois anos, com 84 casos (48%). Escherichia coli foi o principal agente isolado (122 culturas - 69% do total). Foram encontrados altos índices de sensibilidade antimicrobiana de E. coli às cefalosporinas de segunda e terceira geração (cefuroxima e ceftriaxona, 100%), aos aminoglicosídeos (amicacina, 100%; gentamicina, 96,4%), ao ácido nalidíxico (97,3%), à nitrofurantoina (98,2%) e às quinolonas (ciprofloxacina e norfloxacina, 98,2%); sensibilidade moderada à cefalosporina de primeira geração (cefalotina, 78,4%); baixa sensibilidade à ampicilina (38,7%) e ao sufametoxazol-trimetoprim (55%). CONCLUSÕES: E. coli continua sendo a bactéria mais prevalente das infecções urinárias comunitárias. Conhecendo a baixa sensibilidade in vitro dessa bactéria à sulfametoxazol-trimetoprim e à ampicilina, recomenda-se que tais drogas não sejam eleitas para a terapêutica inicial.

trato urinário; Escherichia coli; criança


OBJECTIVE: To describe the prevalence of the most frequent etiological agents of community acquired urinary tract infection in children under the age of 15 years, as well as to analyse the antimicrobial susceptibility patterns of the most prevalent pathogen, Escherichia coli. METHODS: Retrospective study conducted from urine cultures of a single bacterial species, at a concentration > 10(5) colonies forming units/mL. The children included in the study were treated in the Pediatric Emergency Care Unit of the University Hospital of the University of Sao Paulo from January, 2006 to December, 2007. In order to analyze Escherichia coli antimicrobial susceptibility patterns, cases with recurrent urinary tract infection and/or carriers of uropathy were excluded. RESULTS: Among 176 urinary tract infection patients, 133 (76%) were females. Children less than two years old presented the highest prevalence of urinary tract infection (84 cases; 48%). E. coli was the main agent (122 cultures - 69% of the total). There were high rates of E. coli antimicrobial susceptibility to second and third-generation cephalosporins (cefuroxime and ceftriaxone, 100%), aminoglycosides (amikacin, 100%, gentamicin, 96.4%), nalidixic acid (97.3%), nitrofurantoin (98.2%) and quinolones (ciprofloxacin and norfloxacin, 98.2%); moderate susceptibility to first-generation cephalosporin (cephalothin, 78.4%); low susceptibility to ampicillin (38.7%) and sufamethoxazole-trimethoprim (55%). CONCLUSIONS: E. coli remains the most prevalent bacterial pathogen of community acquired urinary tract infection. Given the low in vitro susceptibility of these bacteria to sulfamethoxazole-trimethoprim and ampicillin, these drugs should not be elected as the initial choice for treatment.

urinary tract; Escherichia coli; child


ARTIGO ORIGINAL

Infecção urinária em menores de 15 anos: etiologia e perfil de sensibilidade antimicrobiana em hospital geral de pediatria

Urinary tract infection in children under 15 years: etiology and antimicrobial susceptibility in a children's hospital

Denise Swei LoI; Selma Lopes B. RagazziII; Alfredo Elias GilioIII; Marina Baquerizo MartinezIV

IPós-graduanda em Pediatria pela Faculdade de Medicina da USP; Médica Assistente da Enfermaria de Pediatria do HU-USP, São Paulo, SP, Brasil

IIMestre em Pediatria pela Faculdade de Medicina da USP; Chefe da Enfermaria de Pediatria do HU-USP, São Paulo, SP, Brasil

IIIDoutor em Pediatria pela Faculdade de Medicina da USP; Diretor da Divisão da Clínica Pediátrica do HU-USP, São Paulo, SP, Brasil

IVDoutora em Ciências Biológicas pela USP; Diretora do Laboratório Clínico do HU-USP, São Paulo, SP, Brasil

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Denise Swei Lo Avenida Professor Lineu Prestes, 2.565 CEP 05508-000 – São Paulo/SP E-mail: deswlo@ig.com.br

RESUMO

OBJETIVO: Descrever a prevalência dos principais agentes etiológicos de infecção urinária comunitária em crianças menores de 15 anos e analisar o perfil de sensibilidade antimicrobiana do principal agente, Escherichia coli.

MÉTODOS: Estudo retrospectivo conduzido a partir de uroculturas com crescimento de agente único, com unidades formadoras de colônia maior ou igual a 105/mL. A população selecionada foi atendida no Pronto Atendimento de Pediatria do Hospital Universitário da Universidade de São Paulo entre janeiro de 2006 e dezembro de 2007. Para analisar o perfil de sensibilidade de E. coli, foram excluídos casos com infecção urinária de repetição e/ou portadores de uropatias.

RESULTADOS: Dos 176 casos de infecção urinária, 133 (76%) ocorreram no sexo feminino e 43 (24%) no masculino. A faixa etária de maior prevalência das infecções urinárias foi a de menores de dois anos, com 84 casos (48%). Escherichia coli foi o principal agente isolado (122 culturas - 69% do total). Foram encontrados altos índices de sensibilidade antimicrobiana de E. coli às cefalosporinas de segunda e terceira geração (cefuroxima e ceftriaxona, 100%), aos aminoglicosídeos (amicacina, 100%; gentamicina, 96,4%), ao ácido nalidíxico (97,3%), à nitrofurantoina (98,2%) e às quinolonas (ciprofloxacina e norfloxacina, 98,2%); sensibilidade moderada à cefalosporina de primeira geração (cefalotina, 78,4%); baixa sensibilidade à ampicilina (38,7%) e ao sufametoxazol-trimetoprim (55%).

CONCLUSÕES:E. coli continua sendo a bactéria mais prevalente das infecções urinárias comunitárias. Conhecendo a baixa sensibilidade in vitro dessa bactéria à sulfametoxazol-trimetoprim e à ampicilina, recomenda-se que tais drogas não sejam eleitas para a terapêutica inicial.

Palavras-chave: trato urinário; Escherichia coli; criança.

ABSTRACT

OBJECTIVE: To describe the prevalence of the most frequent etiological agents of community acquired urinary tract infection in children under the age of 15 years, as well as to analyse the antimicrobial susceptibility patterns of the most prevalent pathogen, Escherichia coli.

METHODS: Retrospective study conducted from urine cultures of a single bacterial species, at a concentration > 105 colonies forming units/mL. The children included in the study were treated in the Pediatric Emergency Care Unit of the University Hospital of the University of Sao Paulo from January, 2006 to December, 2007. In order to analyze Escherichia coli antimicrobial susceptibility patterns, cases with recurrent urinary tract infection and/or carriers of uropathy were excluded.

RESULTS: Among 176 urinary tract infection patients, 133 (76%) were females. Children less than two years old presented the highest prevalence of urinary tract infection (84 cases; 48%). E. coli was the main agent (122 cultures - 69% of the total). There were high rates of E. coli antimicrobial susceptibility to second and third-generation cephalosporins (cefuroxime and ceftriaxone, 100%), aminoglycosides (amikacin, 100%, gentamicin, 96.4%), nalidixic acid (97.3%), nitrofurantoin (98.2%) and quinolones (ciprofloxacin and norfloxacin, 98.2%); moderate susceptibility to first-generation cephalosporin (cephalothin, 78.4%); low susceptibility to ampicillin (38.7%) and sufamethoxazole-trimethoprim (55%).

CONCLUSIONS:E. coli remains the most prevalent bacterial pathogen of community acquired urinary tract infection. Given the low in vitro susceptibility of these bacteria to sulfamethoxazole-trimethoprim and ampicillin, these drugs should not be elected as the initial choice for treatment.

Key-words: urinary tract; Escherichia coli; child.

Introdução

Infecção do trato urinário (ITU) é a infecção bacteriana grave mais frequente da infância, acometendo aproximadamente 9% de crianças menores de 15 anos(1). Em lactentes com febre sem sinais localizatórios, a prevalência média de ITU é de 7%, sendo maior no sexo feminino e na raça caucasiana(2). Estudo realizado nos Estados Unidos(3) revelou que, anualmente, as ITUs são responsáveis por 0,7% das consultas ambulatoriais e de 5 a 14% das consultas em prontoatendimentos pediátricos. O diagnóstico preciso da ITU tem importantes implicações clínicas, pois a maior parte dos lactentes febris portadores de ITU demonstra evidência de comprometimento do parênquima renal (pielonefrite)(4). O retardo no diagnóstico e tratamento da pielonefrite aumenta o risco de lesão renal e pode levar a sequelas graves como insuficiência renal e hipertensão arterial sistêmica(5).

Em crianças maiores, é possível encontrar os sintomas clássicos de ITU como disúria, polaciúria, urgência miccional, dor lombar, alterações de cor e odor urinário. Em lactentes, porém, o quadro tende a ser inespecífico e a febre, muitas vezes, é o único sinal. A urocultura quantitativa é o padrão-ouro no diagnóstico de ITU. Após a coleta da urina de maneira asséptica, o tratamento empírico inicial é preconizado nos casos suspeitos, baseado na clínica associada a alterações encontradas nos exames de microscopia urinária (presença de leucocitúria ou bacteriúria) ou alterações nos testes rápidos de fita diagnóstica (presença de leucócito-esterase ou nitrito).

O conhecimento dos agentes etiológicos da ITU e o perfil de sensibilidade antimicrobiana são fundamentais na escolha do antimicrobiano empírico inicial. Os objetivos do presente estudo foram: relatar os agentes mais prevalentes de ITU comunitária em menores de 15 anos e descrever o perfil de resistência antimicrobiana do principal agente, Escherichia coli (E.coli). Para tanto, foi realizado levantamento retrospectivo das ITUs atendidas no Pronto-Atendimento de Pediatria do Hospital Universitário da Universidade de São Paulo, no período de 1º de janeiro de 2006 a 31 de dezembro de 2007, em menores de 15 anos.

Métodos

O Hospital Universitário da Universidade de São Paulo (HU-USP) é um hospital geral de nível secundário, cujo volume de consultas em pronto atendimento pediátrico varia entre 5.000 a 9.000 por mês. A população atendida compreende preferencialmente os moradores do Distrito de Saúde do Butantã, além da Comunidade Universitária da USP e seus dependentes.

A partir da hipótese clínica de infecção urinária, foram coletados de rotina Urina Tipo 1 e urocultura. A forma habitual de coleta das amostras em crianças sem controle esfincteriano (geralmente menores de dois anos) foi a sondagem vesical, enquanto, em crianças com controle esfincteriano, o método adotado foi a coleta por jato médio. A assepsia foi realizada com clorexidine degermante em recém-nascidos até 28 dias e com iodopovidona tópico em crianças maiores de 28 dias.

Definiu-se ITU como a presença de urocultura positiva com bactéria única e contagem de unidades formadoras de colônia maior ou igual a 105/mL. Após a coleta, as amostras foram imediatamente encaminhadas ao laboratório de microbiologia do HU-USP e cultivadas em meio de ágar sangue e ágar MacConkey (Plastlabor®, Rio de Janeiro), sendo a identificação e sensibilidade das cepas isoladas determinadas pelo sistema Vitek (Bio-Mérieux®). Para a análise do perfil de sensibilidade de E. coli, foram excluídos os casos com infecções urinárias de repetição e/ou as crianças portadoras de uropatias.

Este protocolo de pesquisa foi aprovado pelas Comissões de Ensino e Pesquisa e de Ética Médica do HU-USP.

Resultados

Nesse período de dois anos foram colhidas 5.300 uroculturas no Pronto-Atendimento, sendo registrados 176 casos de ITU. Nesta casuística, houve predomínio no sexo feminino (n = 133 - 76%) e 43 culturas no sexo masculino (24%). A maior prevalência das infecções esteve concentrada na faixa etária de dois anos ou menos, com 84 casos (48%). Na faixa etária entre dois e dez anos obtiveram-se 75 casos (42%) e, em maiores de dez anos, houve 17 casos (10%).

E. coli foi o agente mais prevalente, encontrado em 122 culturas (69% do total), seguido por Proteus mirabilis, identificado em 33 culturas (19%). Foram observados sete casos de infecção urinária por Staphylococcus saprophyticus, todos em maiores de dez anos. As outras 14 culturas identificaram: Klebsiella pneumoniae (cinco casos), Enterobacter aerogenes (dois casos), Citrobacter freundii (dois casos), Enterobacter cloacae (um caso), Candida parapsilosis (um caso), Pseudomonas aeruginosa (um caso), Serratia marcescens (um caso) e Staphylococcus coagulase negativo (um caso). A distribuição dos agentes por sexo dos pacientes encontra-se na Tabela 1.

Tendo em vista que E.coli é a bactéria mais prevalente e responsável por 69% das infecções, foi realizada a análise de seu perfil de resistência antimicrobiana, sendo excluídas desta análise dez crianças com infecções urinárias de repetição e/ou portadoras de uropatias. O resultado dessa análise encontra-se na Figura 1.


Discussão

A definição de bacteriúria sugestiva de ITU, quando a urina é coletada de maneira asséptica por cateterismo vesical, varia nos diversos trabalhos entre 10 a 50 mil UFC/mL(5-6). Na coleta por jato médio, o valor considerado pelos diversos autores é de 105 UFC/mL(5-6). No presente estudo, foi adotado, independentemente do método de coleta, o valor igual ou superior a 105 UFC/mL, evitando assim a análise de bactérias que poderiam ser contaminantes do trato geniturinário.

Com objetivo de auxiliar na introdução do antimicrobiano empírico inicial, foi realizada a análise do principal agente etiológico (E. coli), responsável por 69% das infecções na presente casuística, dado semelhante ao de outros estudos(7-11). Foram excluídos também os pacientes sabidamente portadores de uropatias e/ou de infecções urinárias de repetição, pois estes frequentemente fazem uso de antimicrobianos, o que leva à seleção bacteriana e ao perfil de resistência antimicrobiana diferente daquele observado nas infecções comunitárias.

A Figura 1 mostra o perfil de sensibilidade in vitro da E.coli. Na prática clínica, mesmo diante de uma infecção por bactéria resistente in vitro a um antimicrobiano, pode haver eficácia terapêutica in vivo; visto que a concentração urinária dos diversos antimicrobianos de metabolismo renal pode ser maior in vivo, levando à erradicação da bactéria do trato geniturinário(12). Porém, em estudo realizado por McNulty et al(13) com tratamento empírico com trimetoprim em 497 mulheres de 18 a 70 anos com ITU não-complicada adquirida na comunidade, observou-se uma significativa persistência de sintomas urinários e bacteriúria no grupo com agente etiológico resistente a trimetoprim. Assim, os resultados aqui relatados podem ser de auxílio clínico na escolha do antimicrobiano empírico inicial. Nessa casuística, foram observados altos índices de resistência antimicrobiana de E. coli à ampicilina (61,3%) e sufametoxazol-trimetoprim (45%), antimicrobianos estes que, no passado recente, eram frequentemente a escolha terapêutica inicial. Por outro lado, as cepas de E. coli isoladas mostraram baixa resistência às cefalosporinas de segunda geração (cefuroxima-0%) e de terceira geração (ceftriaxona-0%), aos aminoglicosídeos (amicacina-0% e gentamicina-2,7%), ao ácido nalidíxico (2,7%), à nitrofurantoina (0%) e às quinolonas (ciprofloxacina e norfloxacina-1,8%), essas últimas pouco usadas na faixa etária pediátrica.

Comparando esses dados com o estudo desenvolvido no Hospital das Clínicas de Porto Alegre (1986-1997), em crianças brasileiras de um mês a 12 anos(10), é possível observar que a sensibilidade da E.coli ao longo dos anos à nitrofurantoina e ao ácido nalidíxico se manteve estável e acima de 90%, enquanto a sensibilidade à sulfametoxazol-trimetoprim e à cefalosporina de primeira geração naquele estudo foi inferior à encontrada na presente casuística.

Estudo em pacientes ambulatoriais de todas as faixas etárias, conduzido no Hospital Universitário de Brasília (2001-2005) em 1.517 amostras de E. coli, mostrou ótima sensibilidade aos aminoglicosídeos e à nitrofurantoina (>95%), baixa sensibilidade a sulfametoxazol-trimetoprim, cefalotina e ampicilina (<50%)(11).

Outro estudo inglês retrospectivo, com dados relativos a cinco anos, comparou a suscetibilidade antimicrobiana de microrganismos isolados em 2.815 episódios de ITU em crianças advindas da comunidade com a de bactérias isoladas em 1.314 episódios de ITU em crianças portadoras de uropatias, sendo constatada maior resistência antimicrobiana no último grupo(7). Neste estudo, cerca de um terço das crianças do primeiro grupo e dois terços do segundo apresentavam, na urocultura, E. coli resistente a sulfametoxazol-trimetoprim.

No presente estudo, os índices de resistência de E. coli aos diversos antimicrobianos tende a ser menor do que os relatados em trabalhos nacionais anteriormente publicados, provavelmente pela exclusão de pacientes sabidamente portadores de uropatias e/ou com histórico de ITU de repetição. Assim, provavelmente o perfil de sensibilidade aqui obtido reflete melhor a situação epidemiológica de crianças e adolescentes com infecção urinária comunitária.

Vale ressaltar que, em crianças menores de dois anos, nas quais frequentemente há pobreza de sintomas urinários, foi observada alta prevalência de casos (48%), provavelmente devido a protocolos estabelecidos no Serviço: é preconizada a pesquisa laboratorial de infecção urinária em crianças menores de três anos que apresentam queixa de febre acima de 39ºC e que não mostram sinais localizatórios na anamnese e exame físico.

Pode-se notar que, mesmo em pacientes maiores de dez anos, a E. coli continua sendo o principal agente etiológico da ITU. Porém, destaca-se a importância do Staphylococcus saprophyticus nessa faixa etária, na qual ocorreram todos os sete casos de infecção urinária por esse agente, três no sexo feminino e quatro no masculino, fato esse já observado por Guidoni e Toporovski(14).

Vários fatores clínicos devem ser considerados na escolha do tratamento ambulatorial ou hospitalar da infecção urinária como: faixa etária, avaliação clínica do estado geral, sinais de toxemia, vômitos ou intolerância à medicação oral, condições sociais, imunodepressão, histórico de ITU pregressa ou uropatias, falha à terapia ambulatorial(5,15). O antimicrobiano escolhido deve ser preferencialmente de excreção renal, com boa concentração sérica na suspeita de pielonefrite, espectro adequado para os prováveis agentes etiológicos e possuir baixa toxicidade. Assim sendo, atualmente há vários protocolos de terapia empírica inicial, variando de acordo com a sensibilidade antimicrobiana local(8-9,16-20).

Este estudo teve como limitação a descrição da sensibilidade in vitro da E. coli, não sendo avaliada a resposta in vivo dos pacientes com ITU por E. coli tratados com antimicrobianos resistentes a este agente. Além disso, em portadores de uropatias e histórico de ITU de repetição, provavelmente deve existir sensibilidade antimicrobiana mais baixa. Vale ainda lembrar que a população atendida, na sua maioria, é de baixa renda, podendo haver diferenças no perfil epidemiológico em outros estratos sociais e provenientes de outras regiões geográficas.

Pode-se, entretanto, concluir que E. coli continua sendo a bactéria mais isolada nas ITU comunitárias. O conhecimento atualizado de seu perfil de sensibilidade antimicrobiana é fundamental para a escolha da antibioticoterapia empírica inicial. Conhecendo a alta taxa de resistência in vitro dessa bactéria à sulfametoxazol-trimetoprim e à ampicilina (acima de 40%), recomenda-se que tais drogas não sejam eleitas para a terapêutica inicial. A cefalosporina de primeira geração pode ainda ser a primeira escolha para o tratamento da infecção, porém é preciso considerar que sua resistência in vitro já está próxima a 20%. A E. coli tem mostrado, ao longo dos anos, sensibilidade estável acima de 90% aos aminoglicosídeos, ao ácido nalidíxico, à nitrofurantoina e às cefalosporinas de segunda e terceira gerações. Estudos periódicos como este são necessários para verificar possíveis mudanças na prevalência e no perfil de sensibilidade antimicrobiana dos agentes etiológicos.

5. [No authors listed]. Practice parameter: the diagnosis, treatment, and evaluation of the initial urinary tract infection in febrile infants and young children. American Academy of Pediatrics. Committee on Quality Improvement. Subcommittee on Urinary Tract Infection. Pediatrics 1999;103:843-52.

Recebido em: 9/9/2009

Aprovado em: 26/1/210

Conflitos de interesse: nada a declarar

Instituição: Hospital Universitário da Universidade de São Paulo (HU-USP), São Paulo, SP, Brasil

  • 1. Heale WF, Weldon AP, Hewstone AS. Reflux nephropathy. Presentation of urinary infection in childhood. Med J Aust 1973;1:1138-40.
  • 2. Shaikh N, Morone NE, Bost JE, Farrell MH. Prevalence of urinary tract infection in childhood: a meta-analysis. Pediatr Infect Dis J 2008;27:302-8.
  • 3. Freedman AL; Urologic Diseases in America Project. Urologic diseases in North America Project: trends in resource utilization for urinary tract infections in children. J Urol 2005;173:949-54.
  • 4. Hoberman A, Charron M, Hickey RW, Baskin M, Kearney DH, Wald ER. Imaging studies after a first febrile urinary tract infection in young children. N Engl J Med 2003;348:195-202.
  • 6. Hoberman A, Wald ER, Reynolds EA, Penchansky L, Charron M. Pyuria and bacteriuria in urine specimens obtained by catheter from young children with fever. J Pediatr 1994;124:513-9.
  • 7. Ladhani S, Gransden W. Increasing antibiotic resistance among urinary tract isolates. Arch Dis Child 2003;88:444-5.
  • 8. Prais D, Straussberg R, Avitzur Y, Nussinovitch M, Harel L, Amir J. Bacterial susceptibility to oral antibiotics in community acquired urinary tract infection. Arch Dis Child 2003;88:215-8.
  • 9. Pahl MM, Ejzenberg B, Ragazzi SL, Machado BM, Pedra CA, Baldacci ER et al Treatment of pediatric outpatients with complicated urinary tract infections. J Pediatr (Rio J) 1996;72:303-10.
  • 10. Goldraich NP, Manfroi A. Febrile urinary tract infection: Escherichia coli susceptibility to oral antimicrobials. Pediatr Nephrol 2002;17:173-6.
  • 11. Pires MC, Frota KS, Martins Jr PO, Correia AF, Cortez-Escalante JJ, Silveira CA. Prevalence and bacterial susceptibility of community acquired urinary tract infection in University Hospital of Brasília, 2001 to 2005. Rev Soc Bras Med Trop 2007;40:643-7.
  • 12. McCabe WR, Jackson GG. Treatment of pyelonephritis: bacterial, drug and host factors in success or failure among 252 patients. N Engl J Med 1965;272:137-44.
  • 13. McNulty CA, Richards J, Livermore DM, Little P, Charlett A, Freeman E et al Clinical relevance of laboratory-reported antibiotic resistance in acute uncomplicated urinary tract infection in primary care. J Antimicrob Chemother 2006;58:1000-8.
  • 14. Guidoni EB, Toporovski J. Urinary infection in adolescents. J Pediatr (Rio J) 2001;77 (Suppl 2):S165-9.
  • 15. Chang SL, Shortliffe LD. Pediatric urinary tract infections. Pediatr Clin North Am 2006;53:379-400.
  • 16. Hoberman A, Wald ER, Hickey RW, Baskin M, Charron M, Majd M et al Oral versus initial intravenous therapy for urinary tract infections in young febrile children. Pediatrics 1999;104:79-86.
  • 17. Allen UD, MacDonald N, Fuite L, Chan F, Stephens D. Risk factors for resistance to "first-line" antimicrobials among urinary tract isolates of Escherichia coli in children. CMAJ 1999;160:1436-40.
  • 18. McLoughlin TG Jr, Joseph MM. Antibiotic resistance patterns of uropathogens in pediatric emergency department patients. Acad Emerg Med 2003;10:347-51.
  • 19. Lutter SA, Currie ML, Mitz LB, Greenbaum LA. Antibiotic resistance patterns in children hospitalized for urinary tract infections. Arch Pediatr Adolesc Med 2005;159:924-8.
  • 20. Hoberman A, Wald ER. Treatment of urinary tract infections. Pediatr Infect Dis J 1999;18:1020-1.
  • Endereço para correspondência:
    Denise Swei Lo
    Avenida Professor Lineu Prestes, 2.565
    CEP 05508-000 – São Paulo/SP
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      04 Jan 2011
    • Data do Fascículo
      Dez 2010

    Histórico

    • Recebido
      09 Set 2009
    • Aceito
      26 Jan 2010
    Sociedade de Pediatria de São Paulo R. Maria Figueiredo, 595 - 10o andar, 04002-003 São Paulo - SP - Brasil, Tel./Fax: (11 55) 3284-0308; 3289-9809; 3284-0051 - São Paulo - SP - Brazil
    E-mail: rpp@spsp.org.br