Introdução
O envolvimento científico com o tema de desastres se tornou crescente a partir da segunda metade do século XX1, assim como as recomendações internacionais sobre gestão de desastres e, mais recentemente, de gestão de riscos de desastres. Dentre as principais referências da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre o tema, destacam-se a Década Internacional para Redução de Desastres (1990), o Marco de Ação de Hyogo (MAH) (2005-2015) e o Marco de Sendai para Redução do Risco de Desastres (MASRRD) (2015-2030).
O MAH esteve vigente no período 2005-2015, tinha como principal objetivo o aumento da resiliência ante desastres e possuía cinco prioridades de ação: i) fomentar uma forte base institucional para assegurar que a Redução do Risco de Desastres (RRD) fosse implementada como prioridade no nível nacional e local; ii) conhecer e monitorar riscos no curto e longo prazo; iii) usar conhecimento, inovação e educação para resiliência; iv) reduzir fatores que acentuam os riscos; e v) fortalecer a preparação para a resposta a desastres. Em cada uma dessas cinco prioridades de ação, uma série de recomendações foi feita, e era clara a importância da pesquisa científica para valorizar o conhecimento tradicional e produzir novos conhecimentos, como também para gerar subsídios às ações de planejamento e implementação. Embora o MAH tenha feito importantes recomendações – como promoção de planos multisetoriais, participação comunitária, inovação, sistemas de alerta centrados nas pessoas, valorização das dimensões de gênero, etária, étnica etc. –, a menção explícita às questões de saúde foram marginais – três menções à palavra ‘saúde’, com destaque para um dos itens da quarta prioridade de ação, que versava sobre a necessidade de integrar o planejamento de RRD no setor saúde e promover a construção e manutenção de hospitais seguros2.
O MASRRD, com início em 2015 e em vigor até 2030, expande a importância da participação de diversos setores e atores no tema, sobretudo do setor de saúde, referenciado 75 vezes ao longo do documento3. A mudança substancial do MAH para o MASRRD ocorreu na ênfase às ações de Gestão de Risco de Desastres (GRD), que incluem não só a RRD como também a prevenção para que novos riscos não sejam criados. A essa mudança de escopo, adiciona-se uma caracterização mais detalhada dos tipos de atores em RRD – uma novidade é a menção aos parlamentares –; das ações de pesquisa voltadas a soluções e de uma interface entre ciência e políticas públicas; de dados desagregados sobre vulnerabilidade e de ameaças naturais, biológicas, ambientais, tecnológicas e antropogênicas, de grande e de pequeno porte; da importância do aparato jurídico e dos regimes de governança, assim como dos meios que subsidiam a implementação; da participação não discriminatória e das tecnologias, incluindo as de baixo custo. Essas mudanças estão representadas nas quatro prioridades de ação, que recomendam estratégias diferenciadas por parte dos governos nacionais e locais, de organismos regionais e globais.
A importância da pesquisa científica e das diferentes formas de conhecimento locais, tácitos e tradicionais é reiterada na primeira prioridade: conhecer o risco de desastre. No entanto, a relevância do setor saúde também é ressaltada nas outras três prioridades: fortalecer a governança do risco de desastre, investir em RRD e melhorar a preparação para resposta e recuperação perante desastres. No que tange aos investimentos em RRD, recomenda-se a promoção da resiliência dos sistemas nacionais de saúde, integrando os princípios da GRD nos diferentes níveis de atendimento, especialmente na escala local. Para tanto, ressalta-se a necessidade de fortalecimento das capacidades dos profissionais do setor saúde para trabalharem com outros setores, assim como para envolverem as comunidades na melhoria do acesso a serviços básicos de saúde – esta compreendida em um sentido amplo ao abarcar segurança alimentar e nutricional, saúde sexual e reprodutiva, condições de moradia e educação etc. Essas ações estão previstas nas diferentes fases do ciclo de GRD, inclusive nas medidas de resposta e recuperação. Em todas essas recomendações, a participação científica é tida como fundamental para compreender os fatores de riscos, incluindo os riscos emergentes e complexos, assim como os diferentes cenários no curto, médio e longo prazo. A ciência também é convidada não só a identificar os riscos, mas também a colaborar para encontrar caminhos e formular propostas de soluções em GRD, junto com comunidades e organizações nacionais, regionais e locais.
O setor saúde deu um passo importante para colocar em prática as recomendações supracitadas. Em 2016, adotou os Princípios de Bangkok para a implementação dos aspectos de saúde do MASRRD4. São sete princípios que podem auxiliar os países na implementação: i) promover a integração sistemática da saúde com as políticas de RRD no nível nacional e subnacional; ii) aumentar a cooperação entre autoridades de saúde e outros atores para fortalecer a capacidade dos países em GRD, com a implementação do Regulamento Sanitário Internacional (2005); iii) estimular os investimentos públicos e privados nas ações de RRD e emergências, incluindo os serviços e infraestrutura de saúde; iv) integrar a RRD nos programas de educação em saúde e fortalecer as capacidades dos trabalhadores da saúde no tema; v) incorporar, nos sistemas de alerta multiameaças, nos indicadores de saúde e avaliações de risco, dados de desastres relacionados com a mortalidade, a morbidade e a deficiência; vi) dar suporte à colaboração transfronteiriça e entre setores, com o compartilhamento de informações e de ciência e tecnologia para todos os tipos de ameaças, incluindo as biológicas; e vii) promover a coerência e desenvolvimento de políticas, estratégias, leis, instruções normativas e arranjos institucionais no nível local e nacional.
As contribuições do MAH, do MASRRD e dos Princípios de Bangkok dependem de pesquisas científicas que lhes auxiliem a encontrar os meios de implementação, isto é, o como fazer. Entretanto, como a ciência pode contribuir para esse desafio?
Ao longo dos últimos 15 anos, tenho atuado, como pesquisador, em dois ambientes que lidam com o tema dos desastres: o acadêmico e o da gestão pública. Esses universos podem interagir a partir da pesquisa transdisciplinar, que implica o envolvimento de não acadêmicos na construção e/ou desenvolvimento da pesquisa científica. A meu ver, a pesquisa transdisciplinar como suporte ao planejamento das ações de GRD pode se orientar em torno de quatro elementos: i) conceitos; ii) temas; iii) métodos; e iv) dados. Esses quatro elementos podem ajudar a estabelecer diálogos entre acadêmicos e não acadêmicos com o objetivo de coproduzir conhecimento e soluções em GRD no campo da saúde coletiva.
Conceitos
Os conceitos nos permitem analisar a realidade de diferentes maneiras e têm implicações sobre as formas de fazer ciência e políticas públicas, como também para classificar os elementos que dão sentido ao mundo social, para enquadrá-los ou não como problemas sociais. Os conceitos são objeto de disputas simbólicas em diferentes campos de poder e saber, como o científico, o político, o jurídico, o social. Desastre é um desses conceitos alvo de disputas simbólicas. Uma dessas batalhas simbólicas se circunscreve à sua qualificação ou não como algo ‘natural’. A meteorologia e os meios de comunicação, por exemplo, geralmente reiteram o uso desse adjetivo, delegando aos ‘eventos’ meteorológicos a responsabilidade pelos danos causados em alagamentos, inundações e deslizamentos5. Outras abordagens consideram que os riscos de desastres são ‘processos’ socioambientais e territorialmente produzidos, sendo possível pensar em caminhos para reduzi-los. Essas abordagens críticas convergem com muitas recomendações do MAH e do MASRRD. Entretanto, esse debate sobre o conceito de desastre precisa avançar para além dessa dicotomia ‘natural x não natural’, ‘evento natural x processo socioambiental’.
Derivada do latim dis (mau, contrário, inadequado) + aster (astro), a palavra ‘desastre’ representaria, se fiel às suas raízes etimológicas, uma desgraça ocasionada por influência danosa dos astros. Essa palavra se afastou de suas raízes etimológicas, portanto, não faria sentido utilizá-la no contexto contemporâneo se considerarmos os tipos de desafios que presenciamos diariamente. Vivemos riscos cotidianos que não são exceção, e frequentemente a técnica do estado de exceção tem sido utilizada para criar fissuras no ordenamento jurídico vigente a fim de enquadrar todos os problemas como problemas de segurança pública6.
Todavia, os riscos são produzidos no território, pela apropriação desigual de recursos por uma minoria e de limitações de acesso a eles. A escassez – de água, terra, alimentos e de outros serviços – é cada vez menos controlada pelos Estados, como mediadores dos conflitos entre cidadãos. Na ausência de conceitos que permitam caracterizar esse estado crônico de vulnerabilização, ou seja, de produção social de condições de fragilidade e proteção socioambiental desigual, continuamos a utilizar os conceitos de desastre e catástrofe. Esses dois termos podem ser distinguidos em relação à magnitude dos danos e perdas, sendo a catástrofe um megadesastre7.
Catástrofes e desastres são caracterizados por um conjunto de danos materiais, ambientais, biológicos, humanos e psicossociais que excedem a capacidade socioinstitucional local e/ou regional e/ou nacional de fazer frente à situação que, por vezes, prolonga-se por longos meses e/ou anos a fio, sem que as medidas de reconstrução material e recuperação social sejam suficientes para restabelecer as territorialidades prévias à situação de disrupção, de ruptura das relações usuais e das formas de exercê-las, ou em uma nova situação que socialmente se considere o desastre como superado. É em razão da insuficiente e, por vezes, ineficiente resposta, reconstrução e recuperação que anteriormente reportei-me a um processo de catastrofização, quer dizer, da
[...] transição paulatina do que inicialmente era tido como um desastre para uma catástrofe, prescindindo de qualquer ameaça natural, ou de qualquer ‘agente externo ameaçador’, sendo fruto sobretudo do abandono do Estado8(56).
Hoje diria que a catastrofização é o oposto do lema positivista do ‘build back better’ contido no Marco de Sendai. Ou, ainda, que a catastrofização é o desastre em cadeia (cascading disaster9), cujos efeitos e impactos irradiam-se não só ao longo de escalas espaciais – como rompimento da barragem no distrito de Bento Rodrigues em Mariana (MG) gerando impactos para além da Bacia do Rio Doce rumo à Ilha de Abrolhos, sul da Bahia – como também em escalas temporais, de dias a décadas. A complexidade dessas catástrofes ao longo do espaço, presencial e virtual, e do tempo, presente e futuro, exige-nos rever os conceitos e as formas como planejamos as ações de GRD. Precisamos nos livrar dessas frases de autoajuda que o Marco de Sendai nos faz cativar: essa ilusão de que aprenderemos com o desastre e que essas ‘lições aprendidas’ – para usar uma expressão do próprio Marco de Sendai – serão suficientes, com a promessa de segurança se um ‘novo desastre’ se repetir. É preciso se preparar para o que até então foi impensável, como os alunos e professores de uma escola de Ensino Médio de Kamaishi, no Japão, fizeram ao perceberem que o plano de contingência não seria mais suficiente: foi necessário abandonar a cobertura do prédio escolar e correr para lugares mais altos porque o tamanho da onda do tsunami, em março de 2011, iria superar todas as previsões e análise de risco feitas anteriormente10.
Além de se debater o conceito de desastre, é preciso rediscutir o que se compreende por risco de desastre e quem se encontra sob risco. Tradicionalmente, a equação do risco de desastre disseminada na literatura científica e nos cursos de formação em defesa civil considera que o risco de desastre (R) é definido pela interação entre a ameaça (A) potencializada/multiplicada pela vulnerabilidade (V). Ou deveríamos inverter essa equação e considerar que, na verdade, a vulnerabilidade é potencializada pela ameaça? Essa equação não é passível somente de uma clássica interpretação matemática em que a mudança na ordem dos fatores não altera o produto. A alteração na ordem dos fatores faz toda a diferença para como compreendemos o risco de desastre como um problema social, e talvez seja necessário atribuir pesos diferenciados a cada um dos fatores. Sobre esse aspecto, precisamos de ‘matemáticos sociais’ dispostos a dialogar com outros especialistas da saúde coletiva, ciências humanas e sociais.
É preciso discutir mais sobre vulnerabilidade. Esta é definida como o potencial de sofrer perdas e danos e, para além da pobreza econômica, considera outras dimensões de privação, como falta de capacidade física, insegurança, isolamento social, falta de poder político11. Há diversas publicações e revisões de literatura sobre o conceito de vulnerabilidade, que destacam metodologias quantitativas e qualitativas, em diferentes escalas espaciais e temporais e fases do ciclo de GRD, algumas participativas outras não, algumas voltadas a pensar nas especificidades dos grupos sociais em relação às dimensões de gênero, etária, mobilidade, tipo de deficiência12. Outras abordagens ampliam o uso do conceito para analisar a vulnerabilidade institucional, econômica, política, educacional13. Algumas perspectivas buscam compreender ‘quem’ ou ‘o que’ está vulnerável, ‘onde’, ‘quando’. Outras abordam a vulnerabilidade como algo processual, isto é, uma análise diacrônica. Nesse caso, importa compreender: ‘por que’ algumas pessoas estão em maior condição de vulnerabilidade do que outras?
O modelo de pressão e liberação dos desastres (‘pressure and release model’) busca compreender as ‘causas básicas’ das condições de vulnerabilidade (desigualdade de renda por exemplo) e ‘pressões dinâmicas’ que as acentuam (dependência do capital financeiro, PIB dependente da flutuação dos preços das commodities) e levam à vivência em ‘condições inseguras’ (habitação em moradias precárias e suscetíveis a deslizamentos) diante das ameaças (figura 1)14.
Nessa abordagem processual, é preciso discutir a relação entre desastres, crescimento econômico e modelos de desenvolvimento. Crescimento econômico e desenvolvimento não são sinônimos. Crescimento econômico é uma variação no Produto Interno Bruto (PIB), uma mudança percentual na atividade econômica mensurada15. Desenvolvimento é um projeto social de melhoria das condições de vida, de um meio ambiente sadio, da garantia da dignidade, do exercício da cidadania, da redução da desigualdade e da miséria16. Embora haja um crescente reconhecimento científico e social de que desastres prejudicam o desenvolvimento econômico, é preciso reconhecer que desastres podem ser a consequência de maus projetos de crescimento econômico e das consequentes pressões dinâmicas que ocasionam17. Os desastres e/ou crimes e/ou acidentes de trabalho ampliado associados ao rompimento das barragens de rejeitos de mineração em Mariana (MG) (2015) e Brumadinho (MG) (2019) tiveram, como fatores de pressão dinâmica e conjuntural, os altos preços das commodities de mineração e a busca por produzir ao máximo para gerar rentabilidade, ou melhor, priorizaram o crescimento econômico a qualquer custo, mesmo com o pleno conhecimento das condições de insegurança das barragens. Os inúmeros rompimentos de barragens registrados no País18 revelam que o modus operandi é gerar e concentrar rentabilidade, criando riscos e produzindo desastres à jusante. Lamentavelmente, esse ethos está presente em outros setores econômicos, em seus investidores e acionistas que financiam atividades de empresas geradoras de riscos de desastres e de grandes passivos ambientais. A complexidade desses riscos e de danos havidos, extensivos no tempo, como continuamos a presenciar na Bacia do Rio Doce e agora na região de Brumadinho (MG), revela que é insuficiente delegar somente à proteção e defesa civil a responsabilidade pelas ações de GRD. Para além de criar unidades de defesa civil em pouco mais de 40% dos municípios em que ela sequer existe no papel, de melhorar as condições de trabalho das defesas civis municipais e de seus quadros profissionais19,20, são necessários novos mecanismos de governança do risco de desastres e da gestão das catástrofes que dividam poder e responsabilidades, como os sugeridos no relatório de mais de 100 páginas produzido pela Fundação Getulio Vargas para subsidiar o Plano Nacional de Gestão de Risco e Respostas a Desastres (2012-2014).
É preciso considerar que as intervenções sobre os territórios para apropriação dos recursos e maximização de ganhos também alteram os padrões dos fenômenos naturais, como padrão de chuvas, inundações, secas, desertificação etc. Se existem pessoas ocupando essas áreas suscetíveis, elas estão expostas e podem apresentar maior vulnerabilidade, ou seja, serem mais frágeis e propensas a sofrer danos em razão das suas condições de renda, das características da ocupação, do tipo de moradia, do grau de adensamento populacional. Por vezes, as pessoas não são vulneráveis e já convivem longos anos com aquele fenômeno ambiental. Uma inundação gradual na Amazônia ou uma estiagem não são ameaças a priori, pois fazem parte dos ciclos do clima e das águas.
Por ameaças e/ou perigos, a terminologia do escritório da ONU para RRD considera os fenômenos que podem deflagrar um provável dano21. Esses fenômenos são classificados quanto à sua origem: hidrometeorológico (chuvas, tornados, secas, inundações etc.); tecnológica (barragens mal planejadas/mal construídas, usinas nucleares entre outros); biológica (vírus, bactérias); geológica (terremotos) e ambiental (poluição do ar, aumento do nível do mar). Determinadas áreas podem apresentar maior ou menor suscetibilidade a alguns fenômenos – como, por exemplo, secas – em razão das características do clima, do solo, do relevo, da vegetação. Também podem apresentar uma combinação de ameaças que podem ser alteradas pelas intervenções antrópicas, não só na escala local. Sucessivos alteamentos de barragens de rejeitos podem estar em bacias hidrográficas suscetíveis a eventos extremos de precipitação. O eventual rompimento desses empreendimentos pode tornar inviável qualquer plano de evacuação preventiva de idosos e enfermos em virtude da velocidade e do volume da onda de lama mobilizado. É preciso reconhecer que nosso conhecimento dos riscos ainda é muito incipiente.
A adoção da equação do risco de desastre pelos gestores e/ou cientistas acaba por negar duas outras variáveis: as capacidades sociais de enfrentamento das situações de risco e a importância das políticas públicas de mitigação de riscos. Por vezes, a existência de sistemas de alerta comunitários pode ajudar a aumentar a capacidade de autoproteção, melhor dizendo, de conviver com os riscos, de saber diminuir sua exposição aos perigos. Antes do MAH, esse conceito de capacidades era tratado como oposto de vulnerabilidade e utilizado nas etapas de prevenção, preparação e resposta. Mais recentemente, o conceito de resiliência tem sido utilizado como sinônimo de capacidade, embora, originalmente, ele fosse aplicado às situações de reconstrução e recuperação – então conceituada como as estratégias sociais para enfrentar, absorver e lidar com os impactos de desastre. Atualmente, o conceito tem sido aplicado no campo de desastre para se referir não só às pessoas como também a infraestruturas, cidades22. Algumas abordagens criticam o uso do conceito de resiliência por considerarem que ele despolitiza os contextos sociais que limitam o acesso dos indivíduos aos recursos, como se estes pudessem ‘ser resilientes’ em igualdade de condições, e não existissem desigualdades e vulnerabilidades prévias ao desastre23.
Para além dessa capacidade individual, as políticas públicas de mitigação de riscos em larga escala são importantes, pois envolvem ações estruturais que contribuem para reduzir não só a exposição, mas também a vulnerabilidade, por meio de políticas de acesso e distribuição de água, de geração de renda, de garantia de soberania alimentar e nutricional, de provimento de moradia em local seguro. Em geral, a adoção da equação tradicional do risco concebe o desastre como um ‘evento pontual’, ou seja, não considera a importância das políticas públicas de mitigação de riscos em larga escala, tampouco os fatores sociais que levaram ao processo de produção social das condições de vulnerabilidade. Outro aspecto importante é que a GRD é guiada por problemas a serem reduzidos e/ou evitados, e não pela promoção de outros valores como a sustentabilidade.
Considerar uma versão ampliada da equação do risco, representando-a mnemonicamente como Risco de Desastre = Ameaça x [(Vulnerabilidade/Capacidade)-Mitigação]14, implica refletir e atuar sobre a produção social do risco. A partir dessa equação ampliada, também se pode dialogar sobre as instituições que devem ter responsabilidades diferenciadas pelas ações de RRD, agregando novas organizações com competências, em um sistema descentralizado de GRD. As ações de GRD envolvem atividades não estruturais, como a adoção de sistemas de alerta, de políticas educativas, de códigos de construção que considerem os riscos, como também medidas estruturais, por meio de obras de drenagem urbana, provimento de moradias resistentes em áreas não suscetíveis a perigos e/ou ameaças etc. Esse conjunto de medidas demanda mecanismos de governança. No âmbito da GRD, compreende-se por governança o processo de definição de competências e coordenação de organizações, atores públicos e privados, leis, regulamentos e normas com objetivo de reduzir os riscos de desastres e seus impactos24.
Para além dos conceitos discutidos anteriormente, a pesquisa transdisciplinar pode se nutrir de conceitos oriundos de outras áreas do conhecimento, além de pensá-los a partir dos diferentes temas e fases da GRD. Do ponto de vista de minha atuação prática no Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres ‘Naturais’ (Cemaden), o conceito de sistema de alerta e sua concepção a partir de quatro eixos – conhecimento do risco, monitoramento, comunicação/educação e capacidade de resposta25 – têm sido importantes para a pesquisa entre áreas do conhecimento (interdisciplinar) e aquelas envolvendo agentes de defesa civil, jovens e outros atores e setores não acadêmicos (transdisciplinar).
Temas
Em um único desastre, podem ser encontrados diversos temas de pesquisa científica: sociais, ambientais, políticos, econômicos, éticos, culturais, empresariais, religiosos etc. Um único desastre pode gerar múltiplos impactos em diversas escalas espaciais e temporais, e demandar projetos de pesquisa que extrapolem os convencionais anos de duração adotados pelas agências de fomento à pesquisa.
Como muitos atores convergem para a cena de emergência e desastre, uma necessidade fundamental é estabelecer um código de conduta; e há necessidade de pesquisas sobre isso. Organizações não governamentais que lidam com ações de resposta, provimento de abrigos temporários e estruturação de acampamentos de refugiados estabeleceram, por meio do Projeto Esfera, uma Carta Humanitária com uma série de recomendações no tema, a fim de evitar a adoção de critérios de referência diferenciados por parte das instituições, como, por exemplo, espaço mínimo de abrigo para cada família ou grupo doméstico26. Algumas edições anteriores do manual do Projeto Esfera possuíam versão em português e poderiam ser complementadas com outros materiais documentais, como o ‘Manual de Abrigos da Defesa Civil do Estado do Rio de Janeiro’27, e publicações científicas no tema28. Mais pesquisas sobre abrigos temporários e campos de refugiados no Brasil são necessárias. Mesmo internacionalmente, o reconhecimento do tema é incipiente, e sua valorização oscila na agenda de discussão. Apesar da publicação, na década de 1970, do livro ‘Shelter After Disasters’29, é surpreendente verificar que o MAH não mencionava a palavra abrigo e que o atual Marco de Sendai reporte o tema somente uma vez, sem citar a Carta Humanitária.
O código de conduta também é necessário para pesquisadores(as) que atuam em cenários de emergências e desastres. Em um recente artigo publicado na ‘Nature’, pesquisadores reportaram os impactos que a vinda de pesquisadores externos às localidades atingidas pode ocasionar, como, por exemplo, a fadiga ocasionada pelos pedidos de entrevistas e preenchimento de questionários30. Esses códigos de conduta também poderiam ser aplicados às organizações atuantes em resposta, sobretudo quando envolvem organizações civis e militares – equipes de saúde, assistência social, bombeiros militares e civis –, voluntários, órgãos de imprensa. Esse código também é necessário entre organizações militares atuando conjuntamente – Corpo de Bombeiros, Polícia Militar Ambiental, Forças Armadas –, pois também possuem conflitos entre si, como verificado no desastre do Vale do Itajaí (SC)31. Como a saúde coletiva poderia contribuir com pesquisas para formulação desses códigos de conduta?
Para além das ações de resposta às emergências e desastres, são imprescindíveis pesquisas no campo da reconstrução e recuperação. Em desastres, configuram-se novas territorialidades precárias, isto é, novas formas de apropriação do espaço, de organização e significação do seu lugar no mundo social32. A precariedade dessas territorialidades permite identificar que o desastre pode ter uma continuidade se as políticas públicas de resposta, reconstrução e recuperação em desastres forem aquém do mínimo necessário à vida social dos sobreviventes33. De sobreviventes em situações de inundação e deslizamento, tornam-se abandonados nos desastres à medida que as políticas de assistência social, de atendimento psicossocial, de reconstrução de moradias, de geração de empregos não são implementadas. À minha memória pululam as imagens das cerca de 60 famílias desabrigadas durante inundação de junho de 2010 em União dos Palmares (AL), vivendo em cerca de 140 barracas erguidas sobre uma área às margens da rodovia BR-104, distante de postos de saúde e escolas, sob o calor diurno das barracas de lona, sem sanitários apropriados e sem iluminação adequada, esgoto a céu aberto etc. Esses casos de territorialidades precárias e de abandono social em desastres se replicam de norte a sul do País34. Quais tipos de pesquisa transdisciplinares a saúde coletiva tem realizado no decorrer dos processos de reconstrução e recuperação? Em que medida os resultados dessas pesquisas têm aperfeiçoado as políticas públicas e outros campos do conhecimento, como o direito dos desastres?
Para além das pesquisas em desastres e sobre o tema, são indispensáveis pesquisas no campo da prevenção e RRD. São fundamentais pesquisas inter e transdisciplinares para elaboração de modelos conceituais e de governança para riscos de desastres associados a diferentes tipos de ameaça. Em relação às secas, as ações científicas e institucionais não se restringem ao monitoramento da seca e às políticas de respostas, como o provimento de carros-pipa, mas incluem uma série de atividades em relação ao conhecimento do risco, de ações de mitigação entre diferentes organizações35. Em relação aos incêndios, o conhecimento sobre os riscos, as formas de monitoramento e comunicação, assim como as políticas públicas de mitigação, geram diversas oportunidades de pesquisa transdisciplinar36. No estado do Acre, por exemplo, as queimadas e os incêndios florestais registrados em 2005 acarretaram impactos em diversos setores. No setor saúde, foram mais de 400 mil pessoas atingidas pela poluição atmosférica e fumaça37. Em vez de somente apagar queimadas e incêndios florestais e/ou punir os infratores, também se buscaram políticas alternativas para facilitar a limpeza do pasto para uso na agricultura. Em vez do fogo, uso subsidiado de tratores de pequeno porte para auxiliar na limpeza. Para além das queimadas e incêndios florestais, o estado do Acre também tem que lidar com outras ameaças: o estado registrou inundações recorrentes em 2012, 2014 e 2015, com casos que impactaram diversos setores, incluindo a saúde pública. A complexidade e, por vezes, a combinação dessas ameaças, associadas a vulnerabilidades crescentes no território, demandam a discussão de agendas de pesquisa transdisciplinar em GRD.
Os desafios trazidos pelos desastres demandam que cientistas, gestores, terceiro setor, sociedade civil priorizem iniciativas em rede em um horizonte de curto (próximos 2 anos), médio (5 anos) e longo prazos (10 anos). Cidadãos, gestores e cientistas podem evocar uma grande diversidade de temáticas que se relacionam com os riscos e desastres. No contexto brasileiro, redes de pesquisadores em RRD realizam esforços para construção de áreas temáticas38. Outros exemplos de redes colaborativas – algumas interdisciplinares outras transdisciplinares – são a Rede de Gestão de Riscos da Bacia de Córrego Dantas (Reger-CD)39, o Grupo Independente de Avaliação do Impacto Ambiental (Giaia)40 e a ComRIOComMAR, estes dois últimos criados após o rompimento da barragem em Mariana (MG). Essas redes colaborativas envolvem profissionais de saúde coletiva? Apesar desses esforços, é interessante destacar que a ciência do desastre não é uma área temática do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), que não existe uma linha regular de financiamento e que a produção científica ainda é incipiente no Brasil41. A construção de agendas de pesquisa transdisciplinar pode ajudar a planejar a formação de recursos humanos no tema, permitir a organização e compartilhamento de séries históricas de bancos de dados, além de ajudar na gestão do conhecimento científico sobre temas de interesse nacional. Essa gestão pode auxiliar na busca rápida por especialistas que possam subsidiar a discussão sobre temas emergentes e emergenciais, como verificado na catástrofe de Brumadinho (MG) em 2019, quando técnicos tiveram que se deslocar de Israel até o Brasil para auxiliar nos resgates dos soterrados pela lama da barragem da empresa Vale. Pensar em ‘com quem’ dialogar para identificar ‘o que’ é necessário pesquisar são passos importante para encontrar caminhos sobre ‘como fazer’.
Métodos
À riqueza de temas, podem-se adicionar formas alternativas de abordá-los, com métodos que combinem o diálogo entre formas de conhecimento e saberes – tradicionais, tácitos, científicos – em torno de desafios em comum. As diferentes áreas da ciência precisam reconhecer os saberes tradicionais e tácitos como uma forma de conhecimento, além de reduzir as desigualdades de poder entre as áreas da ciência e no interior de uma mesma área, com as hierarquias e mecanismos de distinção que se criam. Esse campo de poder se torna ainda mais complexo diante da demanda por projetos de pesquisa que envolvam atores de países desenvolvidos e em desenvolvimento, de organizações públicas e privadas, ao que se adiciona a cobrança por produção de artigos, definição de autoria, propriedade intelectual, e de projetos que tenham impacto, embora ainda não se tenha clareza sobre o que este significa42. Nessas hierarquias que se criam, a definição de métodos é influenciada. Nos EUA, é comum que os projetos interdisciplinares da ciência do sistema terrestre sejam coordenados por cientistas da área de exatas, que estes definam as questões de pesquisa e, a partir disso, inclua-se um profissional das ciências humanas ‘para fazer a parte social do projeto’, em uma clara relação de subordinação entre as ciências43. Como reduzir desigualdades de poder entre ciências e entre as formas de conhecimento tradicionais e científicas com vistas a formular métodos de pesquisa?
No campo da ciência dos desastres, existem alguns métodos interdisciplinares como a Investigação Forense dos Desastres, que propõe questões de pesquisa comuns para serem respondidas de forma interdisciplinar44,45. Entretanto, os métodos também podem ser transdisciplinares, ou seja, envolverem a participação de não cientistas em diferentes etapas da pesquisa, ou mesmo na construção da pesquisa e de suas fases. Sobre esse aspecto, metodologias de pesquisa-ação buscam construir prioridades de pesquisa a partir dos desafios práticos apresentados pelos interlocutores em seu dia a dia46. A pesquisa-ação é um tipo de pesquisa social
[...] concebida e realizada em estreita associação com uma ação ou com a resolução de um problema coletivo e no qual os pesquisadores e os participantes representativos da situação da realidade a ser investigada estão envolvidos de modo cooperativo e participativo47(14).
Esses métodos de pesquisa-ação podem ser desenvolvidos em diferentes fases do desastre e da GRD. Maquetes interativas, como tecnologias sociais para representação das relações sociais em um território miniaturizado, já foram utilizadas para discutir educação e prevenção de desastres48, para discussão e organização das regras de convivência em abrigos temporários, formulação de planos de adaptação às mudanças climáticas49. Diversas iniciativas em mapeamento participativo de riscos também já foram utilizadas50, assim como metodologias envolvendo jogos cooperativos, teatro, fotografias, história oral, histórias em quadrinhos, simulados51. Um desafio é como construir metodologias participativas de avaliação de danos e perdas52, inclusive para quantificação de mortes ocorridas na continuidade do desastre53 ou para coletar dados perecíveis, em outras palavras, que precisam ser coletados in loco antes que sejam perdidos.
Por vezes, os métodos permitem que não cientistas sejam envolvidos na etapa de coleta e análise de dados para fins científicos, em uma modalidade conhecida como ciência cidadã. Bem difundida em algumas áreas do conhecimento como biologia e ecologia, a abordagem de ciência cidadã está se popularizando no Brasil54. No âmbito da ciência dos riscos e desastres, ainda são poucos estudos utilizando a abordagem desse método55. Os potenciais são diversos. No Zimbabwe, por exemplo, essa abordagem foi utilizada para construção de um sistema comunitário de alerta de malária, conectando agentes de saúde e pessoas das comunidades56. No Brasil, ela tem sido utilizada para conectar escolas do ensino médio, defesas civis e representantes da comunidade em atividades de geração de conhecimento sobre o risco e proposição de pequenas intervenções em RRD57,58. Como cientistas e profissionais da saúde coletiva poderiam colaborar para a construção desses métodos?
Dados
Métodos permitem criar oportunidades de produção de dados, informações e conhecimento. Dados, informações e conhecimento não são sinônimos. Por exemplo: é comum que escutemos “foi uma chuva de 80 milímetros em 24 horas”. O que significa esse dado de 80 mm em 24 horas? Dados podem ser uma medida ou uma representação, ou seja, são de natureza quantitativa e/ou qualitativa. Uma forma de medir a chuva é em milímetros. Quando tais dados são interpretados pelas pessoas envolvidas na pesquisa, eles passam a ser dotados de sentido/significado, isto é, tornam-se informação. Quando compreendo que 80 milímetros são 80 litros por metro quadrado, tenho uma informação. Quando adoto um método para coletar sistematicamente esses dados e informações, por exemplo, diariamente, às 9 horas ao longo de um ano, e identifico que, ao longo desse período de análise, foram 120 ocorrências de chuvas acima de 80 mm em 24 horas, gerei um conhecimento sobre a distribuição e intensidade da chuva ao longo de um período. Se optar por associar esses valores de chuva à ocorrência de alagamentos, inundações e/ou deslizamentos e os danos havidos – como casos de leptospirose no pós-inundação, pode-se também produzir conhecimento sobre os impactos em eventos hidrometeorológicos, além de se discutir formas de reduzi-los. Dados, informações e conhecimento são fundamentais para diagnosticar os principais problemas, entendê-los e dialogar sobre quais ações de planejamento em GRD são necessárias.
A governança dos dados é considerada como um aspecto fundamental para ações de GRD. Em 2017, a ONU publicou um relatório global que forneceu um diagnóstico da disponibilidade de dados para monitoramento de indicadores do Marco de Sendai59. O documento se centrou em quatro aspectos principais: i) disponibilidade dos dados; ii) qualidade; iii) acessibilidade; e iv) aplicabilidade para tomada de decisões. Há necessidade de que esses dados tenham consistência, confiabilidade, comparabilidade e formatos padronizados para permitirem o acompanhamento das metas do Marco de Sendai no intuito de que, assim, também contribuam para os indicadores dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS). Nesse relatório supracitado, 87 estados-membros – 17 no continente americano, sendo o Brasil um deles – analisaram a disponibilidade de seus dados, as necessidades de aperfeiçoamento e os recursos necessários para implementá-las. Desse conjunto de países, 26 (30%) utilizam o DesInventar, uma metodologia com ferramenta computacional para construção de bases de dados sobre desastres60, incluindo, como recomendado pelo Marco de Sendai, os recorrentes ‘pequenos’ desastres. O Brasil é o único país da América do Sul que ainda não adota essa metodologia.
Outro ponto ressaltado pelo relatório é a existência de dados desagregados, tida como fundamental para compreender o risco de desastre, primeira prioridade do Marco de Sendai. Quase a totalidade dos países participantes (90%) reportou possuir dados por tipo de ameaça. A disponibilidade de dados desagregados piora quando a necessidade é compreender os danos humanos por idade, sexo, deficiência, renda. No Brasil, por exemplo, a mudança do Formulário de Avaliação de Danos (Avadan) para o Formulário de Informações sobre Desastres (Fide) acarretou a supressão dos danos humanos por faixa etária. Quais foram as implicações dessa mudança para o planejamento das ações de GRD no campo da saúde coletiva?
A acessibilidade aos dados foi outro desafio identificado. Dados podem existir, mas o acesso a eles pode ser difícil em razão de conflitos, disputa de poder, personalização, falta de confiança etc. Somente 38% dos países reportaram que suas bases de dados sobre perdas são de acesso público, enquanto 45% deles simplesmente não responderam a essa questão. Em relação ao histórico do banco de dados, 41% dos países indicaram possuir registros para o período 2005-2015.
Outros problemas apontados foram o formato dos dados, a existência de protocolos para padronização e compartilhamento de dados, a disponibilidade de dados geoespaciais com respectivos metadados. No Brasil, a Infraestrutura de Dados Espaciais (Inde) já abriga algumas bases e documentos sobre o tema de desastres, mas ainda há necessidade de criar ‘interoperabilidade’ com outras plataformas, como o Sistema de Informações sobre Desastres (S2ID), os bancos de dados do Serviço Geológico do Brasil (CPRM), do Cemaden, do Ministério da Saúde. O desafio é ainda maior se pensarmos nos potenciais bancos de dados que as dissertações e teses poderiam fornecer ao término de seus trabalhos, assim como os dados colaborativos que podem ser fornecidos via aplicativos e outros sistemas crowdsourcing. Quais setores poderiam se beneficiar desse compartilhamento? Qual seria a redução de custos para coleta e análise? Que tipos de informações e conhecimento poderiam ser gerados?
Dados podem gerar a oportunidade de fomentar uma cultura de tomada de decisões baseadas em evidências, com o aprendizado gradativo sobre os procedimentos de coleta e análise dos dados, aumentando o engajamento de não cientistas em etapas da pesquisa transdisciplinar. Entretanto, é preciso evitar uma visão romantizada da pesquisa transdisciplinar, e garantir mecanismos de independência e autonomia científica sobre os dados, informações e geração do conhecimento, evitando a interferência política sobre os resultados da pesquisa transdisciplinar. Para tanto, é preciso não só trabalhar a cultura organizacional para o aprendizado da lei de acesso à informação como também criar mecanismos e modelos de pesquisa transdisciplinar que permitam ambientar-se à crítica construtiva.
Agradecimentos
Agradeço à Fundação de Apoio à Pesquisa do Estado de São Paulo. As opiniões, conclusões e recomendações expressas neste material são do autor e não necessariamente refletem as visões das instituições de financiamento e à qual pertence.
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Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
05 Jul 2021 -
Data do Fascículo
Jul 2020
Histórico
-
Recebido
24 Jul 2019 -
Aceito
13 Jan 2020