RESUMO
No contexto pandêmico atual, o Supremo Tribunal Federal (STF) é um rico campo de pesquisa para o entendimento de como disputas político-ideológicas se entrelaçam com questões burocrático-administrativas. Segundo autores, o STF tende a emitir decisões mais favoráveis para a União/governo federal do que para os estados e/ou municípios em casos de disputas e litígios interfederativos. Os objetivos deste artigo foram analisar e refletir sobre o impacto decisório do STF nas ações governamentais, no âmbito do debate das relações interfederativas, considerando o atual contexto e verificando se a pandemia modifica a tendência de favorecimento da União/governo federal. Levantaram-se 33 decisões colegiadas utilizando-se as palavra-chave “coronavírus” e “covid-19”; e como marco cronológico, o primeiro semestre de 2020. Para a análise, construiu-se uma tipologia: ‘Regulação e Gestão Territorial’, ‘Políticas e Serviços de Saúde’, ‘Emprego e Renda’, ‘Finanças Públicas’ e ‘Outros’. Em um contexto marcado por tensões e omissões, reforçou-se a atuação do STF na resolução de conflitos de competência interfederativa, sugerindo uma inversão da tendência centralista na jurisprudência brasileira. Por outro lado, é possível questionar até que ponto tal situação poderá significar um reforço de protagonismo dos entes subnacionais e, portanto, do federalismo no Brasil.
PALAVRAS-CHAVE
Judicialização da saúde; Pandemia; Covid-19; Federalismo
ABSTRACT
In the current pandemic context, the Supreme Court (STF) is a rich field of research for understanding how political-ideological disputes are intertwined with bureaucratic-administrative issues. Authors argue that the STF tends to issue more favorable rulings to the Federal Government than to the states or municipalities in interfederative disputes. This paper aimed to analyze and reflect on the decision-making impact of the STF on government actions within the debate on interfederative relation- ships, considering the current context and verifying whether the pandemic changes such trend of favoring the Federal Government. Thirty-three collegiate rulings were made using the keywords “Coronavirus” and “Covid-19” and the first half of 2020 as a chronological landmark. A typology was constructed for the analysis: ‘Regulation and Territorial Management’, ‘Health Policies and Services’, ‘Employment and Income’, ‘Public Finance’, and ‘Others’. In a context marked by tensions and omissions, the role of the STF in resolving conflicts of interfederative competence was reinforced, suggesting an inversion of the centralist tendency in Brazilian jurisprudence. On the other hand, we could question the extent to which this situation could reinforce the role of subnational entities and, therefore, of Brazilian federalism.
KEYWORDS
Health’s judicialization; Pandemics; Covid-19; Federalism
Introdução
A pandemia de Covid-19 é um fenômeno histórico sem precedentes em sua amplitude e profundidade de impacto nas relações humanas em todas as dimensões, desde aquelas que podem ser entendidas de um ponto de vista territorial mais macro (relações entre blocos de países, entre povos e nações situadas em regiões do mundo, distantes ou não) até aquelas que podem ser compreendidas de um ponto de vista existencial mais micro (relações entre instituições, grupos, famílias e indivíduos).
Seria lícito, portanto, afirmar que, durante a maior parte do ano de 2020 e no trimestre inicial do ano de 2021 enquanto este texto é escrito, a humanidade tem se encontrado perante uma verdadeira encruzilhada das ideias e das ações como provavelmente nunca registrada na História.
Como consequência direta e indireta do advento da pandemia, uma parcela significativa dos cidadãos e cidadãs do planeta se viu na contingência de, senão cessar completamente, pelo menos, alterar e reduzir, algumas vezes drasticamente, as suas atividades até então tidas e tomadas como normais, comuns e típicas do dia a dia, por períodos e em extensões variáveis de acordo com a realidade local e as economias, culturas e vida cotidiana dos países.
Isso não é para menos quando se considera um agente biológico que apresenta características sui generis como o novo coronavírus, como grande transmissibilidade/capacidade de contágio, assim como sintomatologia de precisão diagnóstica dificultosa, e considerável mutabilidade e letalidade nada desprezível. Também é necessário considerar as conexões e implicações da situação com outras doenças e a desigualdade e situações de vulnerabilidade, conforme atestam os índices oficiais dos organismos internacionais e nacionais de saúde. Alguns dos piores temores da literatura e da cinematografia de ficção científica em seu subgênero de catástrofe apocalíptica estão sendo bastante honrados pela realidade imposta pelo novo coronavírus; e, em determinados locais, com requintes de morbidez e ineditismo.
Esta situação tem provocado a tomada de decisões difíceis e escolhas trágicas por parte dos responsáveis pela administração pública nos países ao redor do globo. Não é diferente no Brasil, onde a responsabilidade pelo bem-estar e saúde da população recai para muito além da autopreservação da própria população em seu necessário zelo e cuidado por sua existência saudável - como se espera de uma cidadania responsável, nos indivíduos que ocupam cargos de proeminência nos âmbitos dos famosos três Poderes que remontam a Montesquieu: Executivo, Legislativo e Judiciário.
Com o advento da pandemia e a consequente reconfiguração do cotidiano de parcelas significativas da população em todas as suas dimensões, a atuação dos atores do Poder Judiciário tem adquirido mais relevância, em um tipo de movimento consideravelmente observável de utilização de aparatos, meios e processos legais, inclusive para o atingimento dos mais variados fins. Um exemplo que já existia mesmo antes da pandemia é a chamada ‘Judicialização da Saúde’ - instrumentalização de aparato jurídico-legal para pleitos de garantia de fornecimento de medicamentos ou serviços de saúde que não são fornecidos ou que são fornecidos de modo excludente no sistema de saúde11 Baptista TWF, Machado CV, Lima LD. Responsabilidade do Estado e direito à saúde no Brasil: um balanço da atuação dos Poderes. Ciênc. Saúde Colet. 2009 [acesso em 2021 jan 10]; 14(3):829-839. Disponível em: https://www.scielo.br/j/csc/a/QXStzwBwfQjFRrMqr69T35Q/abstract/?lang=pt
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2 Ventura M, Simas L, Pepe VLE, et al. Judicialização da saúde, acesso à justiça e a efetividade do direito à saúde. Physis (Rio J.). 2010 [acesso em 2021 jan 10]; 20(1):77-100. Disponível em: https://www.scielo.br/j/physis/a/35xXdQXR9JrdvpPmtkktL9F/abstract/?lang=pt
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-33 Carvalho EC, Souza PHDO, Varella TCMML, et al. Pandemia da Covid-19 e a judicialização da saúde: estudo de caso explicativo. Rev Latino-Am Enfermagem. 2020 [acesso em 2021 jan 10]; 28:1-9. Disponível em: https://www.scielo.br/j/rlae/a/Z9L5sggXdBpqM5bdcywg9xn/abstract/?lang=pt
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De fato, extrapolando as discussões inseridas no campo da saúde, autores apontam a existência de indícios claros de que já há alguns anos é cabível falar da existência de uma ‘Judicialização da Política’ mais do que uma ‘Politização da Justiça’, na linha tanto daquilo que ficou conhecido como Lawfare (uso político de manobras jurídico-legais a fim de comprometer, neutralizar e/ou eliminar adversários, substitutivas de força armada ou de processos democráticos tradicionais), quanto do que se pode entender por excessiva judicialização de ações governamentais motivadas por disputas político-partidárias e ideológicas que, nas condições normais de temperatura e pressão, seriam resolvidas por outras vias - eleitorais, primordialmente44 Maciel Neto PB. A judicialização da política conduz à politização da justiça. Conjur. 2015. [acesso em 2021 jan 10]. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2015-abr-22/pedro-maciel-judicializacao-politica-conduz-politizacao-justica
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,55 Medeiros A. Judicialização ou ativismo judicial? Entenda a diferença!. Politize!. 2016. [acesso em 2021 jan 10]. Disponível em: https://www.politize.com.br/judicializacao-e-ativismo-judicial/
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Do mesmo modo que teóricos das ciências jurídicas e econômicas, estudiosos de ciências sociais, sociologia e ciência política têm se debruçado sobre o tema da democracia em suas possíveis formas - representativa, deliberativa, participativa - enfocando papel, função, alcance, profundidade, limites e potencialidades da interpretação e aplicação das leis por parte do aparato jurídico/judicial/legal, assim como suas consequências para a sustentabilidade do sistema capitalista na dinâmica das relações entre Justiça, Política e Economia66 Barroso LR. Ano do STF: Judicialização, ativismo e legitimidade democrática. Conjur. 2008. [acesso em 2021 jan 10]. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2008-dez-22/judicializacao_ativismo_legitimidade_democratica
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7 Santos BS. Toward a New Legal Common Sense. Nova Iorque: Routledge; 1995.
8 Santos BS. A Judicialização da Política. Público. 2003. [acesso em 2021 jan 10]. Disponível em: https://www.publico.pt/2003/05/27/jornal/a-judicializacao-da-politica-201706
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-99 Silva RE. O Supremo Tribunal Federal Órgão Jurídico (não político). Rev Direito Nuvens. 2014 [acesso em 2021 jan 10]; (1):87-93. Disponível em: https://revistadireito.emnuvens.com.br/revistadireito/article/view/8
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Boaventura de Souza Santos, por exemplo, em seu livro ‘Toward a New Legal Common Sense’77 Santos BS. Toward a New Legal Common Sense. Nova Iorque: Routledge; 1995., desenvolve a ideia de que a economia global propiciada pelo Consenso Econômico Liberal hegemônico, também conhecido como Consenso de Washington, sustenta-se em quatro dimensões basilares, dentre as quais se destaca a dimensão da Regra da Lei/Consenso Judicial. Esta, resumidamente, seria a conformação de um quadro jurídico adequado às contingências geradas pelo modelo de desenvolvimento neoliberal de dependência dos mercados e setor privado que incidem no regramento básico das instituições, sejam públicas ou privadas.
A lógica inerente ao sistema diz que as mercadorias, bens de consumo e serviços, bem como as ideias e pessoas, devem fluir de forma tranquila, harmônica e pacífica. Logo, a função das leis é garantir essa lógica, que consiste no elemento constitutivo fundamental do Estado de Direito e base da boa governança na construção de uma forma de Estado enxuto e eficiente (e, por extensão, um sistema jurídico também eficiente nesse sentido), com prerrogativa regulatória ou de arbitramento de conflitos e não protagonista ou intervencionista. Daí depreende-se que a Judicialização da Política implica um movimento de despolitização da transformação social, ainda que, contraditória e dialeticamente, acarrete a assunção de interesses políticos instrumentalizadores da ação jurídica/judicial88 Santos BS. A Judicialização da Política. Público. 2003. [acesso em 2021 jan 10]. Disponível em: https://www.publico.pt/2003/05/27/jornal/a-judicializacao-da-politica-201706
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Ainda no campo da judicialização, mas em um diapasão mais fino e operativo, outro fenômeno interessante também se torna observável e tem sido recorrente na realidade brasileira sob a égide da pandemia de Covid-19. Trata-se da Judicialização das Políticas Públicas, que consiste no “[...] deslocamento do espaço decisório sobre a efetivação de direitos sociais por intermédio de políticas públicas”1010 Ximenes JM. A judicialização das políticas públicas durante e pós-Pandemia. Hoje em Dia. 2020. [acesso em 2021 jan 10]. Disponível em: https://hojeemdia.com.br/opiniao/opiniao/a-judicializac-o-das-politicas-publicas-durante-e-pos-pandemia-1.790521
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. Como conclusão, depreende-se que, quanto mais alta a Corte, mais peso tem as decisões e mais intensos os debates e os embates, bem como as consequências.
A mais alta instância do Poder Judiciário, por conseguinte, torna-se um campo de pesquisa com grande potencial de riqueza para o entendimento de como as disputas político-ideológicas se entrelaçam com as questões burocrático-administrativas no contexto atual da pandemia, pelo fato de constituir-se no locus de julgamentos e decisões finais, de modo algum isentas de interessantes polêmicas.
Neste artigo, parte-se da problematização da premissa sustentada por um conjunto de autores de que o Supremo Tribunal Federal (STF) possui uma tendência em emitir decisões mais favoráveis para a União/governo federal do que para os estados e/ou municípios, em casos de disputas e litígios entre esses entes federativos66 Barroso LR. Ano do STF: Judicialização, ativismo e legitimidade democrática. Conjur. 2008. [acesso em 2021 jan 10]. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2008-dez-22/judicializacao_ativismo_legitimidade_democratica
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,1111 Castro MF. O Supremo Tribunal Federal e a Judicialização da Política. Rev Bras Ciênc Soc. 1997 [acesso em 2021 jan 10]; 12(34):1-19. Disponível em: https://www.anpocs.com/index.php/encontros/papers/20-encontro-anual-da-anpocs/gt-19/gt03-5/5342-mfaro-o-supremo/file
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12 Anselmo JR. O Papel do Supremo tribunal Federal na concretização do federalismo brasileiro. [tese]. São Paulo: Pontifícia Universidade Católica; 2006. 248 p.
13 Riga MP. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal em ações referentes ao Federalismo. [monografia]. São Paulo: Escola de Formação da Sociedade Brasileira de Direito Público; 2007.
14 Oliveira VE. Poder judiciário: árbitro dos conflitos constitucionais entre estados e união. Lua Nova. 2009 [acesso em 2021 jan 10]; (78):223-250. Disponível em: https://www.scielo.br/j/ln/a/CjPhvXgGpjNSGcRvLRshYMM/abstract/?lang=pt
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15 Abrão CES. A Evolução histórica das decisões do STF: Politização e Democracia. Rev Direito Nuvens. 2014 [acesso em 2021 jan 10]; (1):142-169. Disponível em: https://revistadireito.emnuvens.com.br/revistadireito/article/view/11
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16 Camargo FS. Federalismo e Poder Judiciário: A atuação do STF nas disputas federativas. [dissertação]. Curitiba: Universidade Federal do Paraná; 2014.
17 Fonseca CO. O STF e a judicialização da política: entre a medida e o excesso. Jus Navigandi. 2018 [acesso em 2021 jan 10]; 23(5611). Disponível em: https://jus.com.br/artigos/70199/o-stf-e-a-judicializacao-da-politica-entre-a-medida-e-o-excesso
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18 Martins FJB. O federalismo brasileiro na interpretação do Supremo Tribunal Federal. [tese]. Fortaleza: Universidade de Fortaleza; 2019.
19 Mello PS, Santa Rita V. A Judicialização da Política no Brasil: os desafios, os limites na atuação do judiciário e a defesa dos princípios constitucionais. Rev Âmbito Jurídico. 2019 [acesso em 2021 jan 10]: 1-16. Disponível em: https://ambitojuridico.com.br/edicoes/revista-182/a-judicializacao-da-politica-no-brasil-os-desafios-os-limites-na-atuacao-do-judiciario-e-a-defesa-dos-principios-constitucionais
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-2020 Dantas AQ. O STF como árbitro da federação: uma análise empírica dos conflitos federativos em sede de ACO. Rev Direito GV. 2020 [acesso em 2021 jan 10]; 16(2):1-36. Disponível em: https://www.scielo.br/pdf/rdgv/v16n2/2317-6172-rdgv-16-02-e1964.pdf
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Ante tal argumento, realizou-se este levantamento das peças jurídicas publicadas pelo tribunal considerado de destaque na estrutura judicial brasileira em espaço de tempo determinado pela fase inicial de incidência da pandemia, ou seja, o STF. Os objetivos são analisar a atuação do tribunal diante do panorama pandêmico da Covid-19 e refletir sobre os possíveis impactos de suas decisões nas ações governamentais, no âmbito das relações interfederativas, verificando se a pandemia se torna um elemento de modificação da tendência de favorecimento da União/governo federal nas decisões do STF.
A partir daí e para futuros estudos, o mote poderá ser averiguar, com foco em questões mais finas e específicas, se e como os fenômenos da Politização da Justiça e, principalmente, da Judicialização da Política e de Políticas Públicas se fazem presentes nos processos que levam às decisões dos tribunais.
Este levantamento está inserido no conjunto de atividades no âmbito da pesquisa ‘Novo Federalismo no Brasil? Tensões em Tempos de Covid-19’, que está sendo realizada por um grupo de pesquisadores integrantes do Centro de Estudos Estratégicos da Fundação Oswaldo Cruz (CEE/Fiocruz). Esta pesquisa abrange simultaneamente levantamentos com os mesmos objetivos nos âmbitos das outras esferas de Poder - Executivo e Legislativo - e, também, cobre a veiculação de conteúdos de mídias corporativas e não corporativas/alternativas relacionados com o tema da pandemia de Covid-19 em seus impactos nas relações interfederativas.
Material e métodos
O levantamento foi realizado no mês de julho de 2020, tomando como campo o sítio eletrônico da mais alta corte do sistema judiciário brasileiro, o STF. Sobre as competências do tribunal que o qualificam enquanto instância importante para decisões nesta situação atual pela qual o País atravessa, é de conhecimento público que se trata de órgão cuja competência maior consiste na guarda da Constituição Federal de 1988, conforme definido no seu art. 102. Outrossim, especialmente com relação às decisões no contexto da pandemia, cabe ressaltar que:
A partir da Emenda Constitucional 45/2004, foi introduzida a possibilidade de o Supremo Tribunal Federal aprovar, após reiteradas decisões sobre matéria constitucional, súmula com efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal (art. 103-A da CF/1988)2121 Brasil. Constituição, 1988. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal; 1988. [acesso em 2021 jan 10]. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm
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Visando assegurar transparência e acesso direto a informações sobre suas ações, o STF disponibilizou ao público, a partir do dia 27 de março de 2020, um ‘Painel de Ações da Covid-19’, interessante seção de seu sítio eletrônico que traz dados atualizados automaticamente a cada cinco minutos sobre processos em trâmite na Corte e decisões proferidas pelo tribunal durante o enfrentamento da pandemia:
O Painel de Ações Covid-19, página no site do Supremo Tribunal Federal (STF) onde é possível acompanhar dados atualizados sobre todos os processos em curso relacionados à pandemia, passa a incluir as principais decisões já tomadas pela Corte a respeito da matéria. Com a medida, o STF proporciona mais transparência ao usuário, apresentando um resumo das decisões com uma linguagem simplificada, que permite ao cidadão acompanhar os processos de maior repercussão relacionados ao tema. As decisões estão organizadas por classe processual, para facilitar a pesquisa. O julgamento das questões relacionadas à pandemia foi priorizado no primeiro semestre2222 Brasil. Supremo Tribunal Federal. Painel de Ações da Covid-19. Brasília, DF: STF; 2021. [acesso em 2021 jan 10]. Disponível em: https://transparencia.stf.jus.br/extensions/app_processo_covid19/index.html
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A princípio, a utilização das informações contidas nesse painel seria um caminho atraente para efetuar o estudo. No entanto, apesar de oferecer uma planilha contendo dados sistematizados referentes aos processos relacionados com a Covid-19, não havia uma discriminação sobre as decisões que fosse totalmente adequada para os propósitos do estudo.
Assim, optou-se pela busca direta das peças jurídicas que estavam elencadas no sítio eletrônico do STF em sua seção ‘Estatísticas’, subseção ‘Decisões’, qualificadas como Decisões Monocráticas (do Presidente e dos Ministros, individualmente) do STF, assim como as Decisões Colegiadas (ou seja, as decisões tomadas pelo Plenário e pelas Turmas, coletivamente), a partir de 2010 e incluindo meses do corrente ano de 2020.
Considerando apenas o ano de 2020 no período compreendido entre os meses de fevereiro - a partir da data de 26 de fevereiro que marca o primeiro caso confirmado de Covid-19 no Brasil, quando surgiram as primeiras medidas relativas à pandemia - até a data de 9 de junho considerada marco cronológico para recorte do primeiro semestre da pesquisa, o STF proferiu 7.225 Decisões Colegiadas, 12.335 Decisões Monocráticas do Presidente e 19.686 Decisões Monocráticas, disponibilizadas em planilhas.
O próximo passo foi realizar uma busca nessas três planilhas a fim de identificar as peças que diziam respeito a decisões relacionadas com a eclosão da pandemia de Covid-19 em território brasileiro, no âmbito do objetivo do estudo.
Utilizando-se as palavra-chave “coronavírus” e “covid-19”, foram inicialmente encontradas 2.344 ocorrências nas Decisões Monocráticas, 145 ocorrências nas Decisões Monocráticas do Presidente, e 130 ocorrências nas Decisões Colegiadas.
Em cada planilha, há um conjunto de categorias elaboradas pelo próprio STF para sistematizar as informações sobre as decisões. São elas: ‘Classe’, ‘Número’, ‘Link’, Data de Autuação’, ‘Relator Atual’, ‘Nome Ministro(a)’, ‘Classificação STF’, ‘Tipo Decisão’, ‘Órgão Julgador’, ‘Data de Andamento’, ‘Andamento’, ‘Observação do Andamento’, ‘Preferência Criminal’, ‘Ramo Direito Novo’ e ‘Assuntos’.
Destas, a categoria preexistente ‘Observação do Andamento’ permite a identificação do tema tratado, a categoria preexistente ‘Órgão Julgador’ permite identificar se a decisão foi tomada pelo pleno do tribunal, enquanto a categoria preexistente ‘Classe’ explicita a natureza processual das peças jurídicas. Como exemplos, podem ser citados os Habeas Corpus (HC), Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI), Ação Penal (AP) etc.
A fim de atender ao objetivo do estudo, estabeleceu-se que seria focado este conjunto das decisões chamadas de ‘colegiadas’ especificamente tomadas pelo conjunto dos Ministros, ou seja, aquelas decisões identificadas na categoria preexistente ‘Órgão Julgador’ como tomadas pelo pleno do tribunal. Assim, filtraram-se aquelas que foram tomadas pelo pleno, resultando em 33 Decisões Colegiadas selecionadas para o estudo.
Procedeu-se dessa forma por dois motivos. Primeiro, porque se trata de peças jurídicas debatidas e divulgadas em público; segundo, porque elas se enquadram nas ações do tribunal em sua quintessência de atenção ao preceito democrático de salvaguarda da variedade de opinião dos Ministros e da possibilidade do contraditório.
Ainda a respeito das decisões identificadas na categoria preexistente ‘Órgão Julgador’ e como tomadas pelo pleno do tribunal, cumpre destacar que, das 33 decisões, 5 foram realizadas remotamente, por intermédio de meios eletrônico/virtuais, sendo 2 em datas ainda do mês de março e 3 em datas do mês de abril. É interessante o fato de que as outras 28 decisões foram tomadas em sessões presenciais do pleno do tribunal, tendo sido tomadas providências para atender aos protocolos sanitários preconizados pela Organização Mundial da Saúde (OMS).
Em cada uma daquelas planilhas obtidas no sítio eletrônico do STF, as informações estão dispostas em categorias produzidas pelo próprio tribunal, discriminadas e variadas de acordo com o tipo de cada peça. A fim de atender ao escopo e objetivo do estudo, foi efetuada uma recategorização estabelecendo as seguintes macrocategorias: ‘Natureza/Assunto’, ‘Temporalidade’ e ‘Situação/Status’, nas quais foram agrupadas as categorias preexistentes dos respectivos dois tipos de peças.
Algumas das categorias preexistentes foram consideradas apenas para efeito de identificação e contextualização. Foram elas: ‘Número’, ‘Link’, ‘Relator Atual’, ‘Nome Ministro (a)’, ‘Tipo Decisão’.
Para classificação, sistematização e análise efetivamente no âmbito do objetivo do levantamento, categorias preexistentes do STF restantes foram agrupadas nas macrocategorias ‘Natureza/Assunto’ (contendo ‘Classe’, ‘Classificação STF’, ‘Órgão Julgador’, ‘Preferência Criminal’, ‘Ramo Direito Novo’ e ‘Assuntos’), ‘Temporalidade’ (contendo ‘Data de Autuação’ e ‘Data de Andamento’) e ‘Situação/Status’ (contendo ‘Andamento’ e ‘Observação do Andamento’).
Especificamente quanto à macrocategoria ‘Temporalidade’ e relacionado ao recorte temporal adotado no estudo, cumpre registrar que o reconhecimento do estado de calamidade pública provocado pela pandemia de Covid-19 no País foi homologado pelo Congresso, por intermédio do Decreto Legislativo nº 6, de 20 de março de 2020 - DLG 6/20202323 Brasil. Senado Federal. Decreto Legislativo nº 6, de 20 de março de 2020. Reconhece, para os fins do art. 65 da Lei Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000, a ocorrência do estado de calamidade pública, nos termos da solicitação do Presidente da República encaminhada por meio da Mensagem nº 93, de 18 de março de 2020. Diário Oficial da União. 20 Mar 2020..
A título de esclarecimento, cabe a definição conceitual de três das categorias preexistentes nas planilhas obtidas no sítio eletrônico do STF que não são autoexplicativas ou de compreensão geral imediata.
A primeira é a ‘Classificação STF’, que apresenta as opções: ‘originária’, que se refere às ações que se originam no próprio órgão, ou seja, que não chegam como recurso contra uma decisão proferida em grau inferior de jurisdição; e ‘recursal’, que diz respeito às ações que se enquadram na outra condicionalidade citada. Na seleção feita para o presente levantamento que resultou em 33 decisões, não houve nenhuma referente a ações recursais.
A segunda é a ‘Preferência Criminal’, que apresenta as opções ‘sim’ ou ‘não’. Refere-se às decisões tomadas a partir de ações originárias que guardam relação com crimes qualificados no Código Penal e, por conseguinte, que se inserem na área do Direito Processual Penal, não se enquadrando em outras áreas como a do Direito Administrativo.
A terceira é o ‘Ramo Direito Novo’, que apresenta como opções as áreas do Direito nas quais podem se enquadrar as ações. Justamente, uma das áreas ou ramos é a do Direito Processual Penal, que, entre as 33 decisões colegiadas selecionadas para este levantamento, ocorreu apenas uma vez, relativo a um HC.
A partir daí, foi construída uma tipologia de decisões dos tribunais, transversal às categorias anteriores e de acordo com o nexo relativo às medidas/ações e fatos no âmbito da pandemia, compreendendo os seguintes tipos: ‘Regulação e Gestão Territorial’, ‘Políticas e Serviços de Saúde’, ‘Emprego e Renda’, ‘Finanças Públicas’ e ‘Outros’.
Os conceitos que regem essa tipologia adotada para as decisões do STF estão especificados na seção a seguir. Nela, constam os resultados do levantamento com a proposta de um modelo analítico das decisões tomadas pelo tribunal, tomando como pano de fundo para a discussão o debate das relações interfederativas em tempos de pandemia de Covid-19 no Brasil, considerando o atual contexto político-institucional.
Resultados
No contexto atual de pandemia de Covid-19, as decisões do STF no período compreendido entre o registro do primeiro caso no Brasil e o marco cronológico de coleta de informações da pesquisa foram sistematizadas e analisadas a partir de um quadro, no qual figuram as categorias e os respectivos conceitos:
Com essas categorias em mente, procedeu-se à sistematização e à análise dos resultados do levantamento, considerando as características do conjunto de decisões.
A atuação dos tribunais em todas as suas instâncias tem sido submetida cada vez mais a demandas e pressões dos mais variados interesses, incluindo aqueles dos próprios juízes que os compõem. No caso específico do STF, tal situação adquire amplitude, importância e consequências ainda maiores. Quando se pensa sobre a natureza das decisões tomadas pela suprema corte brasileira, os tipos delas estão regidos por parâmetros que revelam potencialidades e limitações bem interessantes de um ponto de vista analítico.
As Decisões Monocráticas são julgamentos de mérito realizados por um único Ministro, sem a participação dos demais membros da Corte. A agilidade que uma decisão monocrática geralmente possui vis-à-vis o diálogo/debate e o intercâmbio de ideias de uma decisão colegiada tem como preço a concentração de responsabilidade em um indivíduo que abre brechas para dúvidas e questionamentos a respeito da parcialidade e isenção da decisão. Para além disso, as Decisões Monocráticas do Presidente do tribunal revestem-se de um peso ainda maior, dado que são julgamentos de mérito realizados pelo Ministro que encarna - e personifica, na polissemia desta palavra - a autoridade da Corte.
Finalmente, sobre as Decisões Colegiadas, é possível afirmar que constituem a quintessência da atuação de um tribunal enquanto órgão colegiado, garantindo-se legitimidade, transparência, profundidade, qualidade e espaço para o contraditório no debate a respeito das ações e recursos dos processos, um dos fundamentos da democracia. Com as decisões colegiadas, o risco de politização da atuação do tribunal concretizada nas decisões tem menor chance de ocorrência; porém, isso não significa de modo algum a total eliminação do risco, pois, sabe-se que uma assepsia analítica e decisória, uma completa isenção e uma total imparcialidade são utopias inatingíveis, dada a condição humana dos juízes - por mais que se amparem na frieza teoricamente equidistante das legislações.
Desse modo, tomando-se as 33 decisões colegiadas do STF que se enquadraram nos critérios estipulados para o estudo, chegou-se a um quadro que as distribui pelos tipos analíticos que compõem a tipologia adotada, como se vê na tabela 1 abaixo:
Em se tratando de temporalidade, uma das macrocategorias, percebeu-se que, entre o conjunto de decisões selecionadas para este estudo, cinco foram tomadas em tribunal pleno em sessão virtual: uma no mês de abril e quatro no mês de maio. Esse é um ponto interessante, visto que seria de se esperar uma quantidade maior de sessões virtuais por intermédio de videoconferência, a fim de evitar aglomeração e contato, segundo os protocolos oficialmente preconizados por órgãos de saúde nacionais e internacionais.
É digno de nota, igualmente e ainda na macrocategoria temporalidade, a ocorrência de uma decisão do tipo Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental finalizada em março de 2020 (ADPF, ação que tem como finalidade o combate a atos desrespeitosos aos chamados preceitos fundamentais da Constituição) referente a um processo que teve seu início no ano de 2015. A exceção desta, todas as outras 32 decisões selecionadas para este estudo ocorreram entre os meses de março e maio de 2020.
A seguir, estão os tipos pelos quais se distribuem as decisões.
Tipo: Outros
De início, cabe ressaltar que, entre as três ocorrências do tipo ‘Outros’, duas eram de decisões em que um dos Ministros envolvidos com o trâmite dos processos no tribunal encontrava-se impedido de trabalhar por estar infectado com o novo coronavírus na ocasião.
Uma ocorrência do tipo ‘Outros’ foi uma Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO), que teve trâmite iniciado em março e finalizado em abril. Apontava mora legislativa do presidente da República e do Congresso Nacional na instituição de renda mínima temporária durante a crise socioeconômica ocasionada pela pandemia. A ação foi considerada prejudicada, dado que, à época, estava sendo tratada pelo Executivo e pelo Legislativo.
A segunda ocorrência do tipo ‘Outros’ dizia respeito a uma ADPF com trâmite iniciado em março e finalizado em maio. Consistia em pedido de tutela provisória incidental feito pelo Instituto de Defesa do Direito de Defesa - Márcio Thomaz Bastos - (IDDD), a fim de assegurar a integridade física e moral dos custodiados no sistema penitenciário brasileiro no contexto da pandemia de Covid-19. A liminar não foi referendada.
A terceira ocorrência do tipo ‘Outros’ referia-se a um HC de natureza coletiva, requerido por causa da correlação de comorbidades de presos com a Covid-19, de trâmite iniciado em março e finalizado em abril. Como resultado, constou agravo regimental não provido (processo instaurado recusado e considerado sem efeito). Quanto a esse HC, cabe ressaltar que o Presidente do STF acumula o cargo de Presidente do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), e a Recomendação nº 62 do CNJ, editada em 17 de março de 2020, normatizava no sentido de abrir a possibilidade de soltura a todos os presos nas condições de portadores de comorbidades, considerando a pandemia.
No entanto, no início do último trimestre de 2020, houve a troca regimental de presidência do STF e, consequentemente, do CNJ. No que tange ao HC em questão, foi emitida a Recomendação nº 78 do CNJ, pela qual pessoas acusadas de corrupção, lavagem de dinheiro, crimes hediondos e violência doméstica não poderão ser beneficiadas com a revisão da prisão provisória ou do regime de cumprimento de pena em função da pandemia, restringindo o que versava a Recomendação nº 62 do CNJ.
Tipo: Finanças Públicas
As três decisões do tipo ‘Finanças Públicas’ constituíram ADI:
O trâmite da ADI 6329/20 iniciou-se em março e concluiu-se em maio. Consistia no questionamento feito pela Confederação Nacional das Carreiras Típicas de Estado (Conacate) sobre a validade da Lei estadual nº 11.087/2020, de Mato Grosso (MT), que trata da criação de Vantagem Indenizatória (VI) a diversos agentes públicos em atividades de controle externo, com pedido de liminar, a fim de racionalizar a remuneração no contexto da pandemia. Liminar deferida.
O trâmite da ADI 6364/20 iniciou-se em abril e, também, concluiu-se em maio. Consistia no questionamento feito pelo Procurador-Geral da República da Lei estadual nº 11.087/2020 de Mato Grosso, que estabelece verba indenizatória mensal a integrantes do Tribunal de Contas do estado (TCE-MT) com acréscimo de 50% para o presidente da corte, e no processo, o requerente solicitava que os recursos destinados ao pagamento da verba fossem usados em ações de enfrentamento da pandemia em Mato Grosso. Liminar deferida.
O trâmite da ADI 6357/20 iniciou-se em março e concluiu-se em maio. Consistia em pedido de medida cautelar, ajuizada pelo Presidente da República, com o objetivo de conferir interpretação conforme a Constituição aos arts. 14, 16, 17 e 24 da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), e ao art. 114, caput, in fine, e § 14, da Lei de Diretrizes Orçamentárias do ano de 2020 (LDO/2020), a pretexto de gerenciar recursos voltados para o enfrentamento da pandemia. Liminar referendada.
Tipo: Emprego e Renda
As nove decisões do tipo ‘Emprego e Renda’ guardam relação entre si pelo fato de que resultaram de ADI propostas por diferentes entidades que questionavam a validade da Medida Provisória (MP) nº 927/2020, que flexibiliza a legislação trabalhista durante o estado de calamidade pública decorrente da pandemia:
A ADI 6375/2020 foi proposta pela Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho (ANPT) e apontava, entre outros pontos, ausência de razoabilidade da norma na parte em que autoriza a antecipação do gozo de férias ainda não adquiridas pelo empregado, em períodos ilimitados. Argumenta que, a pretexto de possibilitar ao trabalhador o isolamento no período de quarentena imposto pela pandemia, a medida confere ao empregador o direito de pagar as respectivas remunerações de férias no mês seguinte, bem como pagar a gratificação de férias no mesmo prazo de pagamento do 13º salário. Essa decisão tramitou entre abril e maio e teve liminar deferia em parte.
A ADI 6377/2020 foi proposta pela Confederação dos Trabalhadores em Turismo e Hospitalidade (Contratuh) e pedia a suspensão da eficácia do dispositivo da MP que prevê a prevalência do acordo individual sobre a negociação coletiva a critério exclusivo do empregador, na preservação/proteção de direitos adquiridos considerando o contexto da pandemia. Essa decisão tramitou entre abril e maio e teve liminar indeferida.
A ADI 6380/2020 foi impetrada pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Saúde (CNTS) e pela Federação Nacional dos Enfermeiros (FNE), que questionaram dispositivo que autoriza o empregador a determinar a suspensão das exigências administrativas em segurança e saúde no trabalho, o que desconsidera as orientações das autoridades da saúde e das autoridades sanitárias. Essa decisão tramitou entre abril e maio e teve liminar deferida em parte.
As seis decisões restantes desse tipo tramitaram entre março e abril e tiveram liminar deferida em parte. A ADI 6342/2020 foi ajuizada pelo Partido Democrático Trabalhista (PDT); a ADI 6344/2020, pela Rede Sustentabilidade (Rede); a ADI 6346/2020, pela Confederação Nacional dos Trabalhadores Metalúrgicos (CNTM); a ADI 6348/2020, pelo Partido Socialista Brasileiro (PSB); a ADI 6352/2020, pelo partido Solidariedade (Solidariedade); e, finalmente, a ADI 6354/2020, pela Confederação Nacional dos Trabalhadores da Indústria (CNTI).
Como resultado, foram suspensos o art. 29 da MP 927/2020, que não considera doença ocupacional os casos de contaminação de trabalhadores pelo novo coronavírus, e o art. 31, que limitava a atuação de auditores fiscais do trabalho à atividade de orientação.
Cabe ressaltar que, no caso dessas decisões, em que pese a pertinência de comporem o período escolhido no artigo para análise e adentrarem o domínio do que se convenciona chamar ativismo político do Judiciário, o sentido dos temas envolve tensões entre a União e os interesses atrelados à relação entre patrões e empregados. Ou seja, essas decisões do STF não chegam a afetar diretamente a relação da União com estados e municípios.
Tipo: Políticas e Serviços de Saúde
As nove decisões do tipo ‘Políticas e Serviços de Saúde’, do mesmo modo que as decisões do tipo ‘Emprego e Renda’, também decorreram de ADI.
Três das decisões - referentes às ADI 6347/2020 impetrada pelo Rede; 6351/2020, pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB); e 6353/2020, pelo PSB - versavam sobre dispositivo da MP 928/2020, que muda as regras dos pedidos de acesso à informação de órgãos públicos, anteriormente previstas na Lei de Acesso à Informação (LAI), Lei nº 12.527, de 18 de novembro de 2011, de modo a limitar o acesso às informações prestadas por órgãos públicos durante a emergência de saúde pública decretada em razão da pandemia. As três ADI tiveram liminar referendada.
A ADI 6359/2020 foi ajuizada pelo Partido Progressistas (PP), recebendo prioridade por tratar do calendário eleitoral, com pedido de suspensão por 30 dias dos prazos de filiação partidária, domicílio eleitoral e desincompatibilização para as eleições municipais de outubro desse ano, diante da situação de calamidade pública decretada em função da pandemia. Liminar referendada.
A ADI 6363/2020 foi impetrada pelo partido Rede, e tinha por objeto a MP 936/2020, referente aos acordos individuais de redução de jornada de trabalho e de salário ou de suspensão temporária de contrato de trabalho. Liminar não referendada.
As quatro ADI restantes desse tipo foram, respectivamente, propostas pelo Conselho Federal da OAB (ADI 6387), pelo Partido da Social Democracia Brasileira - PSDB (ADI 6388), pelo PSB (ADI 6389), pelo Partido Socialismo e Liberdade - PSOL (ADI 6390). Foram ajuizadas contra a MP 954/2020, que prevê o compartilhamento de dados de usuários de telecomunicações com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) para a produção de estatística oficial durante a pandemia. As quatro ADI tiveram liminar referendada.
Nota-se que algumas decisões enquadradas nesse tipo, à semelhança do que ocorreu com aquelas apontadas no tipo ‘Emprego e Renda’, não afetam diretamente a relação da União com estados e municípios. Já outras estão vinculadas ao desafio de compreender as possíveis transformações do STF em relação ao pacto federativo brasileiro - União, estados e municípios em casos de disputas e litígios interfederativos.
Tipo: Regulação e Gestão Territorial
A ADI 6341/2020 foi impetrada pelo PDT. O STF confirmou o entendimento de que as medidas adotadas pelo governo federal na MP 926/2020 para o enfrentamento da pandemia não afastam a competência concorrente nem a tomada de providências normativas e administrativas pelos estados, pelo Distrito Federal e pelos municípios. Liminar referendada.
A ADI 6343/2020 foi ajuizada pelo partido Rede, e visava à suspensão parcial da eficácia de dispositivos das MP 926/2020 e 927/2020. O STF decidiu que estados e municípios, no âmbito de suas competências e em seu território, podem adotar, respectivamente, medidas de restrição à locomoção intermunicipal e local durante o estado de emergência decorrente da pandemia, sem a necessidade de autorização do Ministério da Saúde para a decretação de isolamento, quarentena e outras providências. Liminar referendada em parte.
As sete ações restantes desse tipo foram ajuizadas pelo partido Rede (ADI 6421), pelo Cidadania (ADI 6422), pelo PSOL (ADI 6424), pelo Partido Comunista do Brasil - PCdoB (ADI 6425), pela ABI (ADI 6427), pelo PDT (ADI 6428) e pelo Partido Verde (6431). Todas as ADI iam contra a MP 966/2020, que prevê, entre outros pontos, que os agentes públicos somente poderão ser responsabilizados nas esferas civil e administrativa se agirem ou se omitirem com dolo ou erro grosseiro pela prática de atos relacionados com as medidas de enfrentamento da pandemia e aos efeitos econômicos e sociais dela decorrentes. Todas as sete ADI tiveram liminar deferida em parte.
Conclusões
A infalibilidade das decisões judiciais é um mito, uma imagem/ideia/discurso/narrativa construída sobre algo ou alguém, subjetiva, mas que tem por base uma realidade concreta, objetiva e material. Além disso, sabe-se que mitos caem, mais cedo ou mais tarde, ainda que em alguns casos persistam no imaginário das pessoas provocando impactos e efeitos nefastos no mundo real, seja por ações, seja por inação ou omissão.
O mito da invulnerabilidade humana de determinados grupos tidos como ‘escolhidos’ ou ‘eleitos’ em razão da proteção conferida por um ou mais de um agente ou entidade sobrenatural e o mito do negacionismo científico, por exemplo, subsistem na mente de todos e todas que se recusam a admitir a seriedade e a gravidade da pandemia, naquilo que se chama de obscurantismo. Já quanto a outros mitos, de cunho mais político, somente o tempo dirá se terão sobrevida e consequências de longa duração.
No contexto pandêmico atual, a observação das respostas dadas pelas autoridades, em especial das ações do governo federal no que se referem às relações entre os poderes, sugere um direcionamento marcado por tensões e mesmo omissões. Ante o esvaziamento de ações, programas e políticas (não apenas de saúde, como de outras áreas como educação, transporte, emprego e renda etc.), cuja formulação, implementação e execução são de responsabilidade do Poder Executivo, os outros Poderes, forçosamente, foram impulsionados a se movimentar mais proativamente, haja vista o quadro pandêmico. No caso do STF, reforçou-se sua atuação na resolução de conflitos de competência entre os entes da federação, conforme a análise das decisões trouxe à luz.
De fato, a Constituição institui um pacto federativo cuja atualização se impõe como desafio inerente à natureza polissêmica de órgãos como o Congresso (especialmente o Senado) e o STF, ainda mais em um contexto de imprevistos calamitosos, como é este da pandemia de Covid-19. A essas instâncias, cabe a responsabilidade pela regulação de direitos originários de autonomia e das prerrogativas de exercício das competências de cada esfera de Poder, sob pena de realçar as dicotomias, os dissensos, as questões epidérmicas e profundas, assim como as contradições e os questionamentos do federalismo no Brasil.
O estímulo ao protagonismo advindo da conjuntura de pressão sentida e produzida, por ação e omissão, por uns e outros atores e arenas políticas da federação, coloca ao STF a necessidade de tomada de decisões que extrapolam o âmbito jurídico exclusivamente técnico em direção a uma tentativa de balanceamento e calibragem do equilíbrio federativo. Isso significaria uma inversão da tendência centralista na jurisprudência brasileira marcada por favorecimento do governo central nos litígios e disputas, apontada por autores1212 Anselmo JR. O Papel do Supremo tribunal Federal na concretização do federalismo brasileiro. [tese]. São Paulo: Pontifícia Universidade Católica; 2006. 248 p.
13 Riga MP. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal em ações referentes ao Federalismo. [monografia]. São Paulo: Escola de Formação da Sociedade Brasileira de Direito Público; 2007.-1414 Oliveira VE. Poder judiciário: árbitro dos conflitos constitucionais entre estados e união. Lua Nova. 2009 [acesso em 2021 jan 10]; (78):223-250. Disponível em: https://www.scielo.br/j/ln/a/CjPhvXgGpjNSGcRvLRshYMM/abstract/?lang=pt
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,1616 Camargo FS. Federalismo e Poder Judiciário: A atuação do STF nas disputas federativas. [dissertação]. Curitiba: Universidade Federal do Paraná; 2014.,1818 Martins FJB. O federalismo brasileiro na interpretação do Supremo Tribunal Federal. [tese]. Fortaleza: Universidade de Fortaleza; 2019.. Por outro lado, a situação de pandemia abre a possibilidade de questionar até que ponto a atuação do STF traz um reforço de competências dos entes subnacionais e, portanto, do federalismo no Brasil2020 Dantas AQ. O STF como árbitro da federação: uma análise empírica dos conflitos federativos em sede de ACO. Rev Direito GV. 2020 [acesso em 2021 jan 10]; 16(2):1-36. Disponível em: https://www.scielo.br/pdf/rdgv/v16n2/2317-6172-rdgv-16-02-e1964.pdf
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Não se pode deixar de lado a percepção do caráter político extremista em um sentido anti-institucionalista que as diretrizes do atual governo federal têm apresentado. Tal condição política torna-se parte constitutiva importante do problema aqui proposto para análise. Esforços analíticos futuros sobre essa variável política contribuirão para tornar mais robusta a compreensão alternativa do STF em relação ao que tem sido afirmado pela literatura em tela. Para além do contexto pandêmico, a conjuntura e a natureza política da coalizão governativa vigente também compõem o quadro explicativo das decisões do STF.
Não é pretensão deste texto esgotar esse interessante debate que se abre. Contudo, parece lícito dizer que, como parece ser usual em toda crise, a conjuntura traz também a possibilidade de vislumbrar modos criativos de superação de conflitos, espontâneos ou induzidos, e desenvolver inovações e trilhar caminhos que não signifiquem a estagnação e o pior dos mundos, o retrocesso das instituições - entre estas, a maior de todas, o Estado Democrático de Direito e de fato.
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Suporte financeiro: não houve
Referências
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1Baptista TWF, Machado CV, Lima LD. Responsabilidade do Estado e direito à saúde no Brasil: um balanço da atuação dos Poderes. Ciênc. Saúde Colet. 2009 [acesso em 2021 jan 10]; 14(3):829-839. Disponível em: https://www.scielo.br/j/csc/a/QXStzwBwfQjFRrMqr69T35Q/abstract/?lang=pt
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4Maciel Neto PB. A judicialização da política conduz à politização da justiça. Conjur. 2015. [acesso em 2021 jan 10]. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2015-abr-22/pedro-maciel-judicializacao-politica-conduz-politizacao-justica
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5Medeiros A. Judicialização ou ativismo judicial? Entenda a diferença!. Politize!. 2016. [acesso em 2021 jan 10]. Disponível em: https://www.politize.com.br/judicializacao-e-ativismo-judicial/
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6Barroso LR. Ano do STF: Judicialização, ativismo e legitimidade democrática. Conjur. 2008. [acesso em 2021 jan 10]. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2008-dez-22/judicializacao_ativismo_legitimidade_democratica
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7Santos BS. Toward a New Legal Common Sense. Nova Iorque: Routledge; 1995.
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8Santos BS. A Judicialização da Política. Público. 2003. [acesso em 2021 jan 10]. Disponível em: https://www.publico.pt/2003/05/27/jornal/a-judicializacao-da-politica-201706
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9Silva RE. O Supremo Tribunal Federal Órgão Jurídico (não político). Rev Direito Nuvens. 2014 [acesso em 2021 jan 10]; (1):87-93. Disponível em: https://revistadireito.emnuvens.com.br/revistadireito/article/view/8
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12Anselmo JR. O Papel do Supremo tribunal Federal na concretização do federalismo brasileiro. [tese]. São Paulo: Pontifícia Universidade Católica; 2006. 248 p.
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13Riga MP. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal em ações referentes ao Federalismo. [monografia]. São Paulo: Escola de Formação da Sociedade Brasileira de Direito Público; 2007.
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14Oliveira VE. Poder judiciário: árbitro dos conflitos constitucionais entre estados e união. Lua Nova. 2009 [acesso em 2021 jan 10]; (78):223-250. Disponível em: https://www.scielo.br/j/ln/a/CjPhvXgGpjNSGcRvLRshYMM/abstract/?lang=pt
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15Abrão CES. A Evolução histórica das decisões do STF: Politização e Democracia. Rev Direito Nuvens. 2014 [acesso em 2021 jan 10]; (1):142-169. Disponível em: https://revistadireito.emnuvens.com.br/revistadireito/article/view/11
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16Camargo FS. Federalismo e Poder Judiciário: A atuação do STF nas disputas federativas. [dissertação]. Curitiba: Universidade Federal do Paraná; 2014.
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17Fonseca CO. O STF e a judicialização da política: entre a medida e o excesso. Jus Navigandi. 2018 [acesso em 2021 jan 10]; 23(5611). Disponível em: https://jus.com.br/artigos/70199/o-stf-e-a-judicializacao-da-politica-entre-a-medida-e-o-excesso
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18Martins FJB. O federalismo brasileiro na interpretação do Supremo Tribunal Federal. [tese]. Fortaleza: Universidade de Fortaleza; 2019.
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19Mello PS, Santa Rita V. A Judicialização da Política no Brasil: os desafios, os limites na atuação do judiciário e a defesa dos princípios constitucionais. Rev Âmbito Jurídico. 2019 [acesso em 2021 jan 10]: 1-16. Disponível em: https://ambitojuridico.com.br/edicoes/revista-182/a-judicializacao-da-politica-no-brasil-os-desafios-os-limites-na-atuacao-do-judiciario-e-a-defesa-dos-principios-constitucionais
» https://ambitojuridico.com.br/edicoes/revista-182/a-judicializacao-da-politica-no-brasil-os-desafios-os-limites-na-atuacao-do-judiciario-e-a-defesa-dos-principios-constitucionais -
20Dantas AQ. O STF como árbitro da federação: uma análise empírica dos conflitos federativos em sede de ACO. Rev Direito GV. 2020 [acesso em 2021 jan 10]; 16(2):1-36. Disponível em: https://www.scielo.br/pdf/rdgv/v16n2/2317-6172-rdgv-16-02-e1964.pdf
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21Brasil. Constituição, 1988. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal; 1988. [acesso em 2021 jan 10]. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm
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22Brasil. Supremo Tribunal Federal. Painel de Ações da Covid-19. Brasília, DF: STF; 2021. [acesso em 2021 jan 10]. Disponível em: https://transparencia.stf.jus.br/extensions/app_processo_covid19/index.html
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23Brasil. Senado Federal. Decreto Legislativo nº 6, de 20 de março de 2020. Reconhece, para os fins do art. 65 da Lei Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000, a ocorrência do estado de calamidade pública, nos termos da solicitação do Presidente da República encaminhada por meio da Mensagem nº 93, de 18 de março de 2020. Diário Oficial da União. 20 Mar 2020.
Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
11 Abr 2022 -
Data do Fascículo
2022
Histórico
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Recebido
14 Abr 2021 -
Aceito
05 Out 2021