Open-access OS PROCESSOS METONÍMICOS EM PUBLICIDADE VERBO-VISUAL SOB ENFOQUE DA LINGUÍSTICA CRÍTICA E DA MULTIMODALIDADE

THE METONIMMIC PROCESSES IN VERB-VISUAL ADVERTISING THROUGH THE PERSPECTIVE OF THE CRITICAL LINGUISTICS AND MULTIMODALITY

RESUMO

A publicidade tem sido representada como um continuum de funções, flutuando entre informação e manipulação, frequentemente recorrendo à comunicação implícita. Pesquisas mostram que, nesse domínio, é crucial a orientação em direção ao leitor para assegurar objetivos retóricos de persuasão. Assim, diferentes pesquisas dedicam-se à linguagem e à comunicação na publicidade, analisando o uso de estratégias de comunicação, tais como, a personificação por meio de pronomes, a intertextualidade e estratégias persuasivas de suavização por meio da modalização (hedges). Em termos do discurso publicitário, faz-se necessário ir além do uso de adjetivos e expressões explícitas, para entender que a persuasão age também na subjacência do texto e por meio de recursos imagéticos. O objetivo deste artigo é examinar, anúncios de grandes instituições financeiras veiculados em diferentes mídias, como televisão, jornais, revistas e internet para identificar a contribuição dos processos metonímicos na persuasão que percorre o gênero publicitário. Para que os objetivos sejam alcançados, as análises partem dos microelementos até atingir os macroaspectos, onde as formas linguísticas e os atos de imagem agem em conjunto para transmissão de aspectos ideológicos e hegemônicos. Além disso, as análises contam com as teorias de Halliday (1994), Kress e van Leeuwen (1996; 2006), Feng (2017) e Fairclough (1994; 1995). Os resultados indicam que, os anúncios apresentam um alto nível de informalidade e situações rotineiras. Por outro lado, as análises baseadas nos processos metonímicos demonstram os caminhos e técnicas usadas na produção dos anúncios na busca de persuadir e vender os produtos.

Palavras-chave: anúncios publicitários; multimodalidade; processos metonímicos

ABSTRACT

Advertising has been represented as a continuum of functions, fluctuating between information and manipulation, often resorting to implicit communication. Studies show that, in this field, orientation towards the reader is crucial to ensure the rhetorical goals of persuasion. Thus, different researches are devoted to language and communication in advertising, analyzing the use of communication strategies, such as personification through the use of pronouns, intertextuality and persuasive smoothing strategies through hedges. In terms of advertising speech, it is necessary to go beyond the use of adjectives and explicit expressions, to understand that persuasion also acts on the underlying text and through image resources. The purpose of this article is to examine advertisements from important financial institutions in different media such as television, newspapers, magazines and the Internet to identify the contribution of the metonymic processes to persuasion in the advertising genre. In order to achieve the aims, the analyzes will go from the micro elements to the macro aspects, in which the linguistic forms and the acts of image work together to transmit ideological and hegemonic aspects. In addition, the analyzes rely on the theories of Halliday (1994), Kress and van Leeuwen (1996; 2006), Feng (2017) and Fairclough (1994; 1995). The results indicate that the ads present a high level of informality and day by day situations. On the other hand, the analyzes based on the metonymic processes demonstrate the paths and techniques used in the production of ads to persuade the viewers and sell the products.

Keywords: advertising; multimodality; metonymic processes

INTRODUÇÃO

A publicidade tem como meta pública e institucional a venda de um produto ou serviço. Nesse sentido, Fuertes-Olivera et al (2001), estudando a publicidade na mídia, mostram que nesse domínio é crucial a orientação em direção ao leitor para assegurar objetivos retóricos de persuasão. Assim sendo, diferentes pesquisas dedicam-se à linguagem e à comunicação na publicidade, analisando, por exemplo, o uso de estratégias de comunicação, tais como, a personificação por meio de pronomes, da intertextualidade e de estratégias persuasivas de suavização a partir do uso de modalização (tradução de hedges) (PARDILLO, 1994; FORCEVILLE, 1996; RUSH, 1998; PENA PÉREZ, 1999; VELASCO SACRISTÁN, 1999 apud FUERTES-OLIVERA, et al., 2001). Para Iasbeck (2000), a linguagem da publicidade já é parte integrante de diversos discursos, tendo emigrado dos jornais, revistas, cartazes, computadores, televisão e cinema para as conversas do dia a dia.

A propósito, Vivanco (2004) explora feições de mensagens de publicidade em relação a outros tipos de texto. Como a meta da publicidade é orientar as ideias do consumidor em certa direção, a intenção comunicativa restringe-se a enfocar estratégias de persuasão em que é crucial a questão da coerência. A respeito das estratégias para a realização da coerência, a autora argumenta que estudos indicam que, enquanto textos científicos e técnicos fazem grande uso de conectivos para sinalizar o tipo de relação discursiva entre elementos adjacentes, o texto da publicidade revela um número relativamente baixo de conectivos, fazendo uso de micromakers (determinantes, possessivos, dêiticos). Tais elementos, imbuídos de pequeno conteúdo semântico, dependem do conhecimento prévio que o leitor traz para o texto, para ajudar na construção das relações e manter a coerência.

Nesse contexto, inclui-se a figura da metonímia e sua atuação no processo persuasivo do leitor. Segundo pesquisadores, enquanto as metáforas conceptuais estiveram no centro do interesse dos linguistas cognitivistas, a metonímia conceptual, como um instrumento fundamental na cognição humana, atraiu a atenção dos pesquisadores somente há cerca de duas décadas (BARCELONA, 2000; PANTHER; RADDEN, 1999; PANTHER; THORNBURG, 2004). Nesse contexto, a investigação da metonímia não-verbal foi um passo lógico seguinte para os pesquisadores multimodais cognitivos (FORCEVILLE, 2009, p. 56; YU, 2009; URIOS-APARISI, 2009; EI REFAIE, 2003; FENG; O’HALLORAN, 2013a; FORCEVILLE, 1996).

A presença da metonímia na publicidade está ligada a dois fatores: (a) é praticamente impossível a reprodução de todos os aspectos da realidade tridimensional estática ou em movimento, podendo-se apenas capturar fragmentos do processo inteiro (PAINTER et al., 2013: 58); (b) teóricos cognitivistas explicam que nosso conhecimento é estocado na memória na forma de conhecimento de mundo (BARTLETT, 1932; SCHANK; ABELSON, 1977). A habilidade de inferir o todo a partir da menção de apenas uma de suas partes torna possível extrair sentido de afirmações aparentemente anômalas e desconexas. O slogan seria o resultado desses dois fatores.

Villañas e White (2013) examinam campanhas de publicidade e nelas constatam o uso sistemático de imagens pictóricas, que muitas vezes dispensam o material linguístico explanatório ad hoc. Segundo os autores, essa ausência é compensada pela percepção de um elo proporcionado pela metonímia, que leva ao mundo intencionado, fato central a todas as imagens. Isso porque, conforme Painter et al. (2013, p. 58), é praticamente impossível reproduzir todos os aspectos da realidade imagética tridimensional - estática ou em movimento - mas apenas capturar fragmentos (snapshots) do processo inteiro.

Painter et al. referem-se à natureza parcial da construção do significado visual. Esse processo de redução e de abstração é explicado, segundo os autores, da perspectiva da recepção e da produção. Em termos de recepção (isto é, o modo como os observadores constroem significado a partir das imagens visuais), os teóricos cognitivistas explicam que nosso conhecimento é armazenado na memória na forma de esquemas (por exemplo, Bartlett, 1932; Schank e Abelson, 1977). Tais esquemas consistem em cenários estruturados que descrevem situações da vida cotidiana. O conhecimento armazenado na memória de longo prazo pode ser metonimicamente referido pela mera menção de uma subparte desses eventos.

Quanto à produção (i.e. como as imagens visuais são criadas), Norricck (1981) apoia-se no princípio da parte-todo em sistemas de signos não-verbais, e afirma que não só um único momento pode fazer recuperar o todo, mas também que esse momento é pertinente sob uma perspectiva especial, o que faz o receptor concentrar a atenção nessa parte. Nesse sentido, Kress (2010) afirma que, na sociossemiótica, “a arbitrariedade é substituída pela motivação em todos os tipos de construção do signo” (p. 67) explica que, “a parcialidade do interesse formata o significado no momento da construção do signo” (p. 71). Tal visão corrobora as análises de Warren (2002:123) que, em seu artigo intitulado An Alternative Account of the Interpretation of Referential Metonymy and Metaphor afirma que “a essência da metonímia é o realce”, sendo ela um aspecto importante em termos de dar ênfase a determinados aspectos, aumentando a persuasão presente nos textos.

Na linguística cognitiva, a metonímia é considerada como sendo “um processo cognitivo que evoca um frame1, e não meramente uma questão da substituição de expressões linguísticas” (PANTHER; RADDEN, 1999, p. 9). Dessa perspectiva, “uma metonímia consiste de uma estrutura/conceito fonte, que via uma pista no modo comunicativo (língua, imagens, música, som, gesto, etc.), permite ao endereçado da metonímia inferir - com base em seu frame - a estrutura/conceito alvo” (FORCEVILLE, 2009, p. 58). O “endereçado” faz a inferência por meio de pistas visuais com base no seu conhecimento cultural bem como no contexto imediato de comunicação. As relações metonímicas incluem parte e todo (e.g. precisamos de mais mãos aqui), lugar pela instituição (e.g. a Casa Branca declarou guerra), artista pela obra (e.g. Ela gosta de ler Shakespeare), etc.

Villañas e White referem-se à extensa pesquisa inovadora de Forceville (1998), que estabeleceu firmemente a figuratividade, permeando não somente a dimensão linguística, mas também o pictórico estático e o visual em movimento. As propagandas fazem uso da multimodalidade combinando imagem e texto para co-construir o significado. Nesse processo, a linguística é em geral vital tanto ao elucidar aspectos subjacentes à parcialidade quanto para sugerir sua interpretação (UNGERER, 2004; KOLLER, 2009).

Neste artigo, o foco irá recair sobre seres humanos representados em anúncios da mídia para que ações e reações possam ser analisadas. Porém, o pano de fundo e os objetos com os quais eles interagem também receberão atenção especial. Objetivo é examinar, anúncios de grandes instituições financeiras veiculados em diferentes mídias, como televisão, jornais, revistas e internet para identificar a contribuição dos processos metonímicos na persuasão que percorre o gênero publicitário. Para tanto serão consideradas a relação entre as escolhas linguísticas e imagéticas e as ideologias, hegemonias e estratégias de persuasão usadas pelos produtores dos anúncios na busca de interação e aceitação dos produtos pelo público-alvo. Serão enfatizados os processos metonímicos em imagens midiáticas que buscam romper com estereótipos enraizados. Para que os objetivos sejam alcançados partimos de uma análise linguística com base na Gramática Sistêmico-Funcional de Halliday (1994) e Halliday e Matthiessen (2004; 2013), perpassando pela análise das imagens com base na Multimodalidade (KRESS; VAN LEEUWEN, 2006) para chegar a uma análise dos recursos e processos metonímicos presentes em imagens de anúncios midiáticos, com base em autores como Feng (2017), Villañas e White (2013), Vivanco (2004), Fuertes-Olivera et al (2001).

O interesse em analisar os aspectos metonímicos presentes neste tipo de anúncio surgiu devido ao fato de as empresas e produtores de imagens buscarem romper com estereótipos enraizados através de anúncios midiáticos que mostram mais pessoas comuns assumindo papéis de protagonistas. Nesse contexto, tem-se identificado cada vez mais a presença do negro em anúncios de instituições financeiras ou automóveis e de casais gays em comerciais do dia dos pais. Por outro lado, tal mudança se mostra benéfica no sentido de inclusão, mas retrata o interesse comercial de se atingir um determinado tipo de público através da integração de recursos escritos e visuais.

Desta forma, análise destes recursos se mostra relevante nos dias atuais em que se busca romper com estereótipos e preconceitos e onde a mídia exerce papel de grande destaque social.

1. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

1.1. Gramática Sistêmico-Funcional

A Gramática Sistêmico-Funcional (GSF) baseia-se na concepção sociossemiótica de sistema, de Firth, de que uma teoria sistêmica é uma teoria de escolhas, em que cada escolha é avaliada em relação às que não foram feitas. Sistema, neste caso, será entendido como um conjunto de opções de significados interrelacionados, que servem de base para outros sistemas e subsistemas, formando uma rede. Cada sistema da rede representa a realização de escolhas que o locutor pode fazer em diferentes níveis para a comunicação, em que o produto final é o texto. Os elementos linguísticos são analisados em produções textuais autênticas e descritos em termos da função que eles desempenham no sistema.

Para a GSF, a língua serve para construir, simultaneamente, três significados, ou metafunções, segundo Halliday (1994) e Halliday e Matthiessen (2004). A Metafunção Ideacional representa os eventos das orações em termos de fazer, sentir ou ser, por meio do sistema da Transitividade, envolvendo: (a) Participantes; (b) Processos e (c) Circunstâncias. Em função dos diferentes processos (em número de), diferentes também serão os Participantes em cada um deles, os quais podemos resumir no Quadro 1.

Quadro 1
Relação Processos/Participantes

Na metafunção Interpessoal, segundo Halliday, a oração está organizada como um evento interativo, envolvendo falante (ou escritor) e audiência. Os tipos fundamentais de papel de fala são apenas dois: (i) dar e (ii) pedir. O falante ou está dando, ou está pedindo algo para o ouvinte (uma informação, por exemplo). Portanto, um “ato” de fala é algo que poderia ser mais apropriadamente chamado de uma “interação”: é uma permuta, na qual dar implica receber e pedir implica dar em resposta. Juntamente com essa distinção básica está uma outra distinção, igualmente fundamental, que se relaciona com a natureza do produto que está sendo permutado. Este pode ser (a) bens e serviços ou (b) informação.

Já a metafunção Textual organiza os significados ideacionais e interpessoais de uma oração. Halliday e Matthiessen (2004) afirmam que as línguas têm diferentes modos para marcar a parte da oração que é proeminente. Essa posição é chamada Tema, e sua função é ser o ponto de partida para a mensagem. A posição temática abrange até o primeiro elemento ideacional da oração. O restante é chamado de Rema. Devido ao fato de o Tema ser sempre o solo de onde a oração decola, ele também funciona como pano de fundo para a interpretação do Rema. Exemplo: Ele era um informante. “Ele” representa o Tema da oração; e “era um informante” representa o Rema, afirmação que se faz sobre o Tema2.

Essas metafunções ocorrem simultaneamente e, sendo assim, cada escolha que fazemos realiza as três metafunções. Portanto, tudo que expressamos linguisticamente contém, os três elementos: a informação (Ideacional), dita a alguém (Interpessoal), de algum modo (Textual).

A teorias da GSF (HALLIDAY 1978; 1994) são considerados marco inicial para as demais teorias apresentadas na sequência e de suma importância para a proposta deste artigo e, por tal razão, foram explicitadas em primeiro lugar. Passo a seguir às teorias que lidam com a análise dos recursos visuais.

1.2. A análise de imagens e a multimodalidade

Para a análise de imagens, Kress e van Leeuwen (2006) recorrem à teoria metafuncional de Halliday (1978; 1994; 2004), buscando apoio nas três funções da linguagem, porém eles preferem usar o termo “perspectiva”, ao invés de metafunção. Na perspectiva Ideacional, qualquer modelo semiótico deve ser capaz de representar aspectos do mundo da forma que eles são experienciados pelos indivíduos. As cores usadas na confecção de uma capa de revista e seu significado social podem ser usadas como exemplo desta perspectiva. Na perspectiva Interpessoal, o modelo semiótico deve ser capaz de projetar relações entre o produtor, o sinal e o receptor do sinal. O modelo semiótico tem a função de representar uma relação social particular entre o produtor e o telespectador ou entre o leitor e o objeto representado. O olhar dos participantes representados e os ângulos podem ser usados como exemplo. Na perspectiva Textual, o modelo semiótico tem a capacidade de formar textos pela complexidade de sinais que se conectam interna e externamente ao contexto para o qual eles foram gerados. Essa perspectiva tem relação com a organização e distribuição dos elementos dentro das imagens.

Para Kress e van Leeuwen, o que na língua é categorizado como “verbos de ação”, na linguagem visual pode ser chamado de “vetor”. O que na língua é entendido como preposição lugar, é visualmente entendido como pano de fundo da imagem. Em vez de objetos ou elementos, usa-se o nome de “participantes” para designar os elementos ou pessoas que constituem um ato semiótico.

Há dois tipos de participantes envolvidos em qualquer ato semiótico: os interativos e os representados. Os primeiros são aqueles que fazem as imagens ou aqueles que as leem; já os segundos são as pessoas, lugares e coisas representadas, aquilo do qual se fala.

A composição relacionada aos significados representacionais e interativos da imagem é agrupada em três sistemas interrelacionados:

  1. Valor da informação: colocação dos elementos (esquerda, direita, em cima, em baixo).

  2. Saliência: os elementos atraem o público em diferentes graus (pano de fundo, frente, tamanho, contrastes de cor etc.).

  3. Moldura: conexão de elementos na figura.

Quanto ao posicionamento dos elementos nas imagens, Kress e van Leeuwen (2006) salientam que aqueles elementos que estão colocados à esquerda da imagem podem ser entendidos como “o Dado”, ou seja, elementos sobre os quais o público já tem conhecimento; já os elementos colocados à direita da imagem representam “o Novo”, ou seja, elementos que estão sendo apresentados ao consumidor.

Em uma composição visual há elementos colocados no topo e outros colocados na parte inferior da imagem. Os elementos colocados na parte superior representam o “Ideal”, e os elementos colocados na parte inferior representam o “Real”.

O Real apresenta informações detalhadas e práticas próximas da realidade. Se a composição visual faz uso significativo do centro, colocando certo elemento no centro e os demais à sua volta ou às margens, o que se encontra no centro representa, na maioria das vezes, o núcleo da informação.

Independentemente do local em que o elemento é colocado, a saliência cria uma hierarquia de importância, valorizando alguns elementos em relação aos demais.

Kress e van Leeuwen (2006) afirmam que na interação do dia a dia as relações sociais determinam a distância que será mantida em relação ao outro. Para eles, existem diferenças, também, no campo das imagens. De uma distância íntima, por exemplo, podemos ver todo o rosto ou a cabeça. Mas a partir de uma distância pública distante, vê-se o dorso de pelo menos quatro ou cinco pessoas.

Já os ângulos altos fazem com que o sujeito pareça pequeno e insignificante; sendo assim, o participante interativo tem poder sobre participante representado. Nos ângulos baixos há impressão de superioridade e triunfo do representado sob o interativo.

As análises de Kress e van Leeuwen (2006) se mostram de extrema importância uma vez que buscamos entender a interação entre as mensagens escritas e as imagens na formação de um todo coerente na busca de persuadir os leitores. Sob tal perspectiva, busca-se identificar e, sobretudo, entender quais e como os recursos imagéticos usados pelos produtores impactam na aceitação dos produtos e serviços.

1.3. Metonímia e análise de imagens

Feng (2017) modela a realização visual da metonímia com base na teoria sociossemiótica de Halliday (HALLIDAY, 1978; HALLIDAY; MATTHIESSEN, 2004) e na Gramática do Design Visual (GDV), de Kress e van Leeuwen (1996; 2006), unindo assim os demais aspectos teóricos previamente discutidos neste artigo. De acordo com Kress e van Leeuwen, a imagem visual, assim como a língua, preenche as três metafunções, ou seja, as representações do mundo e as experiências (significado representacional), a interação entre os participantes representados no design visual e seus observadores (significado interativo) e os arranjos composicionais dos recursos visuais (significado composicional).

A propósito, com relação à tipologia de signos de Peirce (1955 [1902]), as imagens discutidas por Feng (2017) são primeiramente ícones (i.e., assemelham-se à realidade de modo direto); elas incluem publicidade impressa, imagens em movimento, gibis e outras. Contudo, além da iconicidade, as imagens são também índices de duas maneiras:

  1. as imagens visuais nunca são réplicas exatas da realidade, podendo ser apenas sua representação;

  2. as representações visuais de conceitos abstratos, que são invisíveis (e.g. emoção), podem ser representadas apenas por meio da representação de objetos visíveis (e.g. sintomas da emoção) a eles relacionados.

1.3.1. Relação entre imagens visuais e a realidade

Em termos sociossemióticos, a experiência humana é construída por meio de diferentes tipos de processos (HALLIDAY; MATTHIESSEN, 2004). Sendo assim, há dois tipos de processos em termos de representação visual: narrativos e conceptuais (KRESS; VAN LEEUWEN, 2006, p. 59).

No processo narrativo, há quatro tipos principais de processos: ação, reação, verbal e mental. O processo de ação trata da ação do participante (e.g. correr, abraçar e socar); o processo reacional trata das reações do participante em geral formadas por expressões faciais (e.g. sorrir, chorar e franzir a testa); processos verbais e mentais são construídos por balões de diálogo e bolhas de pensamento respectivamente (e.g. em gibis).

No processo conceptual, os participantes são relacionados por meio de relações taxonômicas (processo classificatório); parte-todo (processo analítico); e simbólicas (processo simbólico; associação cultural):

  1. o processo classificatório relaciona os participantes representados entre si em termos de taxonomia, com esses participantes como subordinados a outro participante, que é seu superordenado (semelhante à relação de hiponímia entre conceitos linguísticos);

  2. o processo analítico relaciona os participantes com base na estrutura parte-todo (e.g. aparência ou roupa como parte de uma pessoa). Os dois tipos de participantes representados envolvidos no processo analítico são: Portador (i.e., o todo) e Atributos Possessivos (i.e., as partes que constituem o todo).

  3. o processo simbólico relaciona o participante com base na identidade representado por meio de certas associações culturais (e.g. uma cruz no lugar de igreja ou do cristianismo).

Esses processos podem construir dois tipos de significados, que contemplam o representacional e o atitudinal:

  1. quanto ao significado representacional, os processos registram e reconstroem a realidade. Mais importante, os marcadores de signos visuais fazem sempre uma série de escolhas disponíveis motivadas pelo seu interesse (KRESS, 2010);

  2. quanto ao significado atitudinal/avaliativo, Feng (2017) recorre ao sistema de avaliatividade (tradução de appraisal), de Martin e White (2005), cujo subsistema de atitude inclui três subcategorias: respostas emocionais (afeto), valores pelos quais os comportamentos humanos são avaliados socialmente (julgamento), e valores que se referem às qualidades estéticas de objetos e entidades (apreciação).

1.3.2. Parcialidade no significado representacional
Quadro 2
Resumo dos processos

A parcialidade é realizada de vários modos em diferentes processos na estrutura representacional de imagens visuais. Em processos analíticos, dois tipos de parcialidade podem ser identificados: framing e abstração. No framing, escolhas diferentes do posicionamento da câmera resultam em representações parciais diferentes e, em geral, implicam em mudança na saliência ou perspectiva. Como afirma Forceville (2009, p. 58), “a escolha da fonte metonímica torna saliente um ou mais aspectos do alvo que de outro modo não, ou não tão claramente, perceptível e, assim, dá acesso ao alvo sob uma perspectiva específica.

Na abstração, ocorre uma redução de traços analíticos. Kress e van Leeuwen (2006) discutem esse fenômeno sob a noção de “modalidade”, que, numa orientação naturalística de codificação, refere-se à proximidade da representação em relação à realidade. Na esteira de Painter et al. (2013), Feng (2017) distingue entre representação “naturalística” e “minimalista”, dependendo da qualidade de detalhes incluídos. Por exemplo, se tirarmos uma fotografia de um rosto sorridente teremos um conjunto rico em recursos analíticos; já os sorrisos nas revistas em quadrinhos só fazem uso de alguns dos recursos essenciais (por exemplo, cantos dos lábios retrocedendo e subindo, bochechas levantando e assim por diante). Num emoticon, a representação é mais abstrata à medida que as características faciais são reduzidas a lábios estilizados. Dessa forma, obtemos uma escala de abstração de acordo com os recursos representados, cuja escolha depende do interesse do criador de sinais no contexto da criação.

1.3.3. Emoção e Atitude no significado atitudinal

Há dois tipos de significados atitudinais construídos metonimicamente por meio de processos visuais: (1) inferência das emoções dos participantes com base nas reações às condições desencadeadoras (eliciting conditions); (2) inferência dos atributos dos participantes (capacidade, moralidade) com base em suas ações, feições analíticas (e.g. roupa, acessórios) e identidade social (e.g. médico, estudante).

As emoções e atributos são metonímicos porque são inferências feitas pelos observadores com base em pistas (bem como em outros fatores contextuais). Assim, os significados atitudinais discutidos aqui são “evocados” pela audiência, em vez de serem “inscritas” sem ambiguidade. Há um alto grau de compartilhamento de inferência de atitude e isso indica que, através disso, podemos geralmente reconhecer as emoções do outro com bastante certeza.

1.3.4. Construção da emoção do participante por meio do significado representacional

Como a emoção é um conceito abstrato, em imagens visuais ela só pode ser representada metonimicamente pela reação comportamental do emocionado (o efeito) ou pela descrição da condição desencadeadora (a causa) (FENG; O’HALLORAN, 2012, 2013b).

A primeira metonímia, REAÇÃO POR EMOÇÃO é comum tanto em imagens estáticas quanto em movimento. A expressão não-verbal da emoção pode ser reconhecida com alto grau de precisão. Na mídia visual, como filmes, propagandas e gibis, as reações comportamentais, especialmente expressões faciais, são o recurso primeiro para a construção de significado.

A segunda metonímia é DESENCADEANDO CONDIÇÕES POR EMOÇÃO. Os escritores podem, com alto grau de confiança, produzir nos leitores a consciência de estados afetivos dos personagens. A razão para isso é que, em termos da avaliatividade, a condição de extração da avaliação é geralmente compartilhada entre os membros e grupos de uma sociedade. A condição de extração pode ser representada visualmente por meio de vários processos: uma pessoa pode ficar aterrorizada por um esqueleto (feição analítica); desgostosa por um mau comportamento (processo de ação); entristecida pelo choro do outro (processo reacional); ou alegre por um beijo (processo de ação).

Em formas multimodais de representação como os filmes, os cineastas são capazes de prever, na maioria das vezes, corretamente, as reações emocionais dos espectadores com base no conhecimento cultural. Assim, é possível que os cineastas ‘projetem’ emoções para otimizar o envolvimento com os espectadores. Já nos casos de comerciais de TV e anúncios impressos, os anunciantes geralmente apresentam um problema para obter emoções negativas de personagens e telespectadores e, em seguida, apresentam o produto como uma solução para obter emoções positivas, o que é comum nos tipos de anúncios analisados neste artigo.

1.3.5. Construção do atributo do participante por meio do processo de ação

O foco dirige-se para a avaliação do observador sobre os atributos do participante por meio de processos de ação, de análise e de classificação. De acordo com Van Dijk (1976, p. 291), a ação envolve um ser consciente que percebe alguma mudança (em seu corpo, em um objeto, em uma situação) com um dado propósito, sob certas circunstâncias. Na representação visual, as ações de um personagem representam o recurso principal para construir suas atitudes, e.g. como herói ou vilão, com base na relação metonímica AÇÃO POR ATRIBUTO. Certas ações, além de contribuir para o enredo, são especificamente designadas para evocar o julgamento do observador, por exemplo, para reforçar a simpatia pelo herói e antipatia pelo vilão.

Além de se manifestar por meio de traços visuais, os atributos abstratos dos participantes podem também ser construídos pelos traços visuais de outras entidades/pessoas que são afetadas pelos atributos. Por exemplo, o efeito de pílulas de emagrecimento por meio do corpo magro do personagem; o efeito do shampoo pelo cabelo macio e brilhante. Os atributos avaliativos de uma pessoa são construídos em geral por traços analíticos.

1.3.6. Construção de estereótipos sociais na representação geral

Em representações gerais, o membro não significa apenas a categoria, mas pode também envolver um conhecimento estereotipado mais abstrato da categoria. Como Lakoff (1987, p. 79) mostra, “um membro ou uma subcategoria pode significar metonimicamente toda a categoria para o propósito de fazer inferências ou julgamento”. Por exemplo, o estereótipo do vendedor de carro de segunda mão em algumas culturas é eloquente e desonesto, mas o estereótipo do médico é confiável. Assim, tem-se a metonímia IDENTIDADE PELO ATRIBUTO ESTEREOTIPADO (DA CATEGORIA). Como Lakoff (1987, p. 79) afirma, os estereótipos são casos de metonímia - em que um membro ou subcategoria tem um status socialmente reconhecível como representante de toda uma categoria, geralmente com o objetivo de fazer julgamentos rápidos sobre as pessoas. Por exemplo, um médico é percebido como especialista e honesto e seu comentário sobre um produto medicinal usa, em geral, recursos representativos para atribuir a identidade ficcional do médico aos produtos, em particular, por meio de processos de ação (e.g. checkup médico) e processos analíticos (e.g. traje médico).

O estudo de Feng (2017) além de propor que a metonímia é fundamental para a criação de significado visual, oferece um arcabouço com base na semiótica social capaz de elucidar como as metonímias conceituais são apresentadas em imagens estáticas e em movimento. O estudo demonstra ainda que as imagens também são indexais (ou seja, metonímicas), em termos de representação de objetos/eventos e conceitos abstratos. Com base nas teorias de Halliday (1978; 1994) e na Gramática do Design Visual, de Kress e van Leeuwen (2006), são apresentados os processos metonímicos (acionais, reacionais, classificatórios e analíticos) para mapear os tipos de metonímias presentes nas representações visuais, o que apresenta suma importância para as análises do anúncios de instituições financeiras focalizados neste artigo.

1.4. A Análise Crítica do Discurso (ACD)

A Análise Crítica do Discurso (ACD) está interessada no questionamento das relações entre signo, significado e o contexto sócio histórico que governam a estrutura semiótica do discurso, usando um tipo de análise linguística. Ela procura, estudando detalhes da estrutura linguística à luz da situação social e histórica de um texto, trazer, para o nível da consciência, os padrões de crenças e valores codificados na língua - que estão subjacentes à notícia e que são invisíveis para quem aceita o discurso como algo “natural”. A meta de uma análise linguística crítica de um texto é desemaranhar os significados ocultos em suas estruturas lexicais, semânticas e sintáticas conforme elas gradualmente mediam o significado geral e ver como esses significados ajudam a construir o conteúdo ideológico, de tal forma que em última análise esse conteúdo seja não somente captado, mas também conquistado.

A visão de Fairclough (1994) acerca do discurso e das relações de poder que através dele se estabelecem é de natureza linguística, e ele usa a palavra “discurso” de forma mais restrita do que os cientistas sociais, limitando o termo ao uso falado ou escrito da língua. Porém, ele considera esse uso uma prática social, ao invés de uma atividade puramente individual. Isso gera duas implicações: em primeiro lugar, o discurso é visto como uma forma de ação sobre o mundo e; em segundo lugar, isso faz com que exista uma relação dialética entre discurso e estrutura social. Se por um lado o discurso é moldado e limitado pela estrutura social no mais amplo sentido e em todos os níveis, através de sistemas de classificação, normas e convenções de natureza discursiva e não discursiva; por outro lado, ele é constituinte de todas as dimensões da estrutura social que, direta ou indiretamente, molda e limita. Fairclough (1994) busca analisar o discurso frente às mudanças que têm ocorrido no mercado de consumo globalizado e, consequentemente, nas diferentes áreas da vida social. Essas mudanças afetam as relações sociais e as identidades das pessoas, e parte delas consiste em mudanças nas práticas discursivas, ou seja, no uso da língua e como tal uso tem assumido grande importância como um meio de produção e controle social.

Os eixos da análise das práticas discursivas de Fairclough (1994) são os conceitos de ideologia e hegemonia. Ele conceitua hegemonia como:

  1. uma liderança que exerce poder em vários domínios da sociedade (econômico, político, cultural e ideológico);

  2. uma manifestação do poder de uma classe economicamente definida em aliança com as outras forças sociais que atuam sobre a sociedade como um todo. O domínio total nunca é alcançado, sendo parcial, temporário e instável;

  3. construção de alianças e integração através de concessões;

  4. foco de luta constante entre as classes com fins de construir, manter ou romper alianças e relações de dominação e subordinação.

As lutas hegemônicas ocorrem em setores como educação, negócios, família, mídia, etc. O autor acredita que a hegemonia ofereça um modelo e uma matriz. É um modelo na educação, por exemplo, em que os grupos dominantes parecem exercer poder através de alianças, integrando os grupos subordinados ao invés de dominá-los, ganhando seu consentimento e alcançando um precioso equilíbrio que pode ser minado por outros grupos por meios discursivos. É uma matriz, pois alcançar a hegemonia em nível social requer um grau de integração de instituições locais e relações de poder, sendo as últimas moldadas pelas relações hegemônicas.

Embora a hegemonia pareça ser a forma organizacional predominante de poder na sociedade contemporânea, ela não é a única. Há, também, restos de formas anteriores em que a dominação foi alcançada através de uma imposição de regras, normas e convenções. Tal fator está relacionado a um modelo codificado de discurso, em que o discurso representa uma prática altamente normativa e regimentada, contrastando com o modelo articulatório de discurso que corresponde a uma forma organizacional de caráter hegemônico. Esses modelos codificados são altamente orientados por instituições, ao passo que os modelos articulados são orientados pelo público. Quanto aos primeiros modelos, Fairclough (1994) os identifica como pós-modernos e afirma que podem ser encontrados principalmente em anúncios de publicidade.

Por outro lado, o discurso representa uma mistura de práticas políticas e ideológicas. Enquanto prática política, o discurso estabelece, sustenta e muda as relações de poder; enquanto prática ideológica, constitui, naturaliza, sustenta e muda os significados do mundo de diversas posições nas relações de poder. Fairclough (1994) entende a ideologia como sendo construções da realidade presentes em várias dimensões e formas nas práticas discursivas. As ideologias tornam-se mais efetivas quando são naturalizadas e atingem o status de senso comum, porém tal estabilidade não é definitiva devido às lutas para remodelar as práticas discursivas e as ideologias nelas contidas. As práticas discursivas são ideologicamente revestidas porque incorporam significados que contribuem para a manutenção ou reestruturação das relações de poder. As relações de poder podem, dessa forma, ser afetadas por práticas discursivas de qualquer tipo. As ideologias surgem em sociedades caracterizadas por relações de dominação baseadas em classes, gêneros, culturas, entre outros.

Quanto à localização da ideologia no texto, acredita-se que ela esteja contida nos textos de forma que seja impossível removê-la e, assim, uma oposição rígida entre a forma e o significado não seria possível, uma vez que o significado dos textos está sempre mesclado com sua forma, e suas estruturas formais estão, em vários níveis, relacionadas a questões ideológicas. As ideologias construídas através de convenções podem ser naturalizadas e automatizadas, tornando difícil a compreensão de que nas práticas normais existem expressões de ideologias específicas. As práticas discursivas são ideologicamente revestidas porque elas incorporam significados que contribuem para a manutenção ou reestruturação das relações de poder que podem, em princípio, ser afetadas pelas práticas discursivas de qualquer tipo.

Com um foco mais direto no discurso da mídia, Fairclough (1995), em sua obra intitulada “Media Discourse”, identifica no discurso o que ele chama de “personificação sintética”, uma simulação do privado, através do discurso público de massa (jornais, revistas, rádio, internet e televisão). Essa tendência, que está ligada à migração do discurso privado para os domínios institucionais, é estabelecida através de lutas e possui estabilidade limitada devido à heterogeneidade de seus próprios elementos contraditórios que levam a mais lutas e mudanças.

Fairclough (1995) aponta três tendências de mudança no discurso contemporâneo da mídia: a democratização, a tecnologização e a mercantilização ou comercialização. A democratização tem representado um parâmetro para as mudanças discursivas nas últimas décadas. Fairclough (1995) aponta áreas principais nas quais a democratização tem sido mais visível: as relações entre línguas e dialetos, o acesso a formas de prestígio do discurso, a eliminação de marcadores de poder em certos discursos institucionais (informalidade maior no uso da língua) e as mudanças linguísticas nas práticas de gênero. Quanto à tecnologização do discurso, Fairclough (1995) acredita que em entrevistas e anúncios, por exemplo, estão sendo empregadas ferramentas diversas de formas bastante variadas, e tais ferramentas ou tecnologias estão sendo usadas por agentes sociais em instituições específicas. Eles detêm o poder, e as tecnologias discursivas desenhadas servem para produzir certos efeitos sobre determinados tipos de público que as desconhecem. Com relação à mercantilização, a crescente construção do público consumidor e a pressão sobre os produtores para entreter podem ser vistas como parte de uma normalização e naturalização do comportamento e da cultura consumista, que envolve anúncios e representações de pessoas em vários tipos de mensagens midiáticas. A mídia, também, influencia as práticas discursivas de domínio privado, fornecendo modelos de interação e estabelecendo relação dialética complexa entre seu discurso e práticas de linguagem do dia a dia.

As análises de Fairclough (1994; 1995) acerca das tendências do discurso da mídia atual e seus conceitos de hegemonia e ideologia, incluindo a concepção sobre como elas agem no discurso, servem de base principal para a macroanálise proposta neste artigo. Passo a seguir a análise do corpus.

2. METODOLOGIA E CRITÉRIOS DE ANÁLISE

Serão analisados anúncios de grandes empresas financeiras, incluindo bancos e corretoras, veiculados em televisão, jornais, revistas e internet entre 2016 e 2018. Foram escolhidos anúncios que visam romper com antigos estereótipos ou práticas discursivas enraizadas na busca de interação com um “novo público-consumir”. A análise partirá dos elementos linguísticos na busca de entender como os aspectos sintáticos e morfológicos se interrelacionam na produção de diferentes significados, perpassando pelos elementos visuais e sua conexão com os elementos linguísticos e considerando os processos metonímicos até atingir as ideologias e hegemonias transmitidas pelos anúncios. Desta forma, a análise contempla elementos micro e macro nos anúncios selecionados.

Quadro 3
Categorias de análise

O quadro indica os passos a serem considerados na análise dos anúncios em questão, cuja escolha foi feita pelo fato de, no contexto atual, identificar-se cada vez mais a presença de anúncios de instituições financeiras que buscam romper com estereótipos enraizados através de peças publicitárias que mostram cada vez mais pessoas comuns assumindo papéis de protagonistas. As análises seguirão a ordem de apresentação das teorias que compõem a base teórica e, sendo assim, na primeira análise, microanálise ou análise linguística, usarei como base teórica principal a GSF. A segunda análise, dos recursos visuais que compõem as imagens, será feita com base na multimodalidade e na GDV, e serão investigados os significados representacionais, interacionais e composicionais nelas expressos. A análise dos tipos de metonímia e processo metonímicos presentes nos anúncios aparece a seguir, abrindo caminho para a terceira análise. Na terceira análise ou macroanálise, procura-se unir a análise linguística, semiótica e metonímica, sendo usados os pressupostos da ADC e as tendências do discurso midiático propostas por Fairclough (1994; 1995).

3. ANÁLISE DOS DADOS

Anúncio 1
banco Itaú: Mulher empreendedora

O primeiro anúncio analisado pertence ao banco Itaú Unibanco e foi veiculado em televisão, internet e revistas de grande circulação nacional. Ele foi produzido em julho de 2018 e, segundo o site3 especializado que lida com a produção de anúncios, visa “conectar mulheres para que elas trabalhem em rede, estimulando a inspiração, capacitação e o protagonismo à frente de seus negócios”.

Passo à análise dos elementos que constituem este anúncio na busca de entender como a parcialidade (FENG, 2017) e os processos metonímicos envolvidos na sua confecção contribuem para que o discurso seja coerente e consiga atingir o objetivo de persuadir os clientes.

O processo acional está relacionado com as ações sociais dos participantes representados nas imagens. Nesta imagem, diversas ações não sincronizadas e simultâneas se fazem presentes, se unindo na formação do todo. Há uma representação parcial no sentido de mostrar breves momentos de uma atividade e estes momentos servem para ativar o conhecimento prévio dos leitores acerca da atividade praticada, contextualizando o produto na busca de aceitação. A dança representa a mulher em movimento e transformação, mas a não sincronia apresentada na imagem pode indicar a independência feminina em seguir seu próprio ritmo e tomar suas próprias decisões. As ações das participantes representadas são reforçadas pelo texto escrito (#VAIGAROTA) que utiliza, em termos da Gramática Sistêmico-Funcional (HALLIDAY, 1994), um processo material (vai) que denota movimento, atitude, transformação. Todos os fatores analisados nos levam a concluir a existência da metonímia da Ação por Atributo (FENG, 2017), que enfatiza que em uma representação visual, as ações de um personagem representam o recurso principal para construir suas atitudes, e.g. como herói, vilão, empreendedor, chefe, etc.

O processo analítico indica como os participantes estão sendo representados nas imagens, o que também engloba o enquadramento na moldura, além dos trajes, que servem como atributos. As participantes representadas estão sendo mostradas de uma distância pessoal distante (KRESS E VAN LEEUWEN, 2006), pois vê-se até o quadril e, neste sentido, tem-se novamente o princípio da parcialidade, pois as partes são mostradas na representação do todo. A imagem possui modalidade sensorial entre média e baixa na tentativa de transmitir as sensações e valores ligados ao produto anunciado. Já as roupas e acessórios são informais e não padronizados, o que pode indicar liberdade de escolha.

Em termos do processo classificatório, a construção identitária das personagens se torna o foco de análise. Neste caso, várias participantes buscam representar a diversidade do universo feminino da vida real, fugindo a padrões pré-estabelecidos de beleza, etnia ou vestuário. As identidades das mulheres empreendedoras, ou convidadas a se tornarem empreendedoras, são múltiplas. Neste sentido, o anúncio abre um leque de possiblidades na busca de convidar clientes a aderirem ao produto em questão.

Neste caso, as identidades não são explicitamente rotuladas, mas são metonimicamente representadas através de atitudes, ações, movimentos roupas e estilos, o que nos remete à duas formas de metonímia já analisadas neste artigo e apresentadas por Feng (2017): ação por atributo e características analíticas por atributo.

Pode-se dizer que as diversas categorias profissionais estão sendo contempladas no anúncio, enfocando que em todas elas existem mulheres empreendedoras. A propósito, o anúncio busca exatamente a ruptura de estereótipos, sejam eles profissionais ou pessoais. O empreendedorismo irá se basear na diversidade de ações, profissões, atitudes e pessoas envolvidas. As participantes representadas não incorporam nenhum indivíduo, expressando suas particularidades, mas todas pertencem a uma única categoria: mulheres empreendedoras. Segundo Feng (2017) neste tipo de categorização temos a metonímia do membro por toda a categoria. O mesmo autor enfatiza que as identidades e o conhecimento sobre estereótipos são importantes em textos multimodais, sendo que a partir das identidades atribuídas aos participantes representados é possível ativar o conhecimento prévio dos leitores sobre estereótipos e atitudes de um determinado grupo ao qual as personagens pertencem. Somente a partir de tal ativação, os leitores irão aderir ao produto ou rejeitá-lo.

Já o processo relacional lida com as emoções representadas ou despertadas no leitor, além de envolver as estratégias interacionais usadas na confecção da imagem, como olhar, expressão facial, sorrisos, etc. No caso da imagem 1, as participantes representadas, de uma forma geral, apresentam sorrisos e expressões faciais que denotam confiança, firmeza, certeza e segurança, reafirmando a importância de se valorizar as diferenças e de o indivíduo se assumir como ele realmente é e isso pode denotar exigências do mundo dos negócios na atualidade.

De acordo com Kress e van Leeuwen (2006) olhares de demanda requerem atitude do leitor e olhares de oferta convidam o leitor a adentrar o universo ofertado na imagem. Sendo assim, a imagem exerce os dois tipos de ação sobre o leitor, pois ela combina ambas as formas de olhar. A partir da análise do processo reacional, é possível afirmar que as forma de representação dos indivíduos nas imagens não somente constrói metonimicamente as emoções dos participantes representados, mas também busca a empatia e o desejo do leitor ao despertar emoções e sensações no público-alvo. Vale salientar que as emoções despertadas pelos anúncios são, na maioria das vezes, de curta duração e incluem os efeitos dos produtos anunciados sobre os clientes.

Em termos de ideologias e aspectos hegemônicos, os produtores do anúncio aparentemente buscam um rompimento com os tradicionais anúncios produzidos para instituições financeiras onde somente homens brancos e vestidos de terno e gravata eram apresentados ao público como prováveis investidores e clientes em potencial. Evidencia-se a busca por um novo tipo de público-alvo: mulheres diversas que são capazes de empreender. Das tendências da mídia atual apontadas por Fairclough (1995) identifica-se, principalmente, a democratização pelo fato de existir a tentativa de eliminação de marcadores verbo-visuais de prestígio tradicionalmente usados, pois existe um predomínio da informalidade, seja ela nas imagens ou no texto escrito, o que inclui o slogan “#VAIGAROTA”. Mas as demais tendências apontadas por Fairclough também são identificadas no anúncio, pois ferramentas tecnológicas estão sendo colocadas em prática pelos produtores da imagem na busca de comercialização do produto, nos remetendo à tecnologização e à mercantilização4.

Anúncio 2
Banco do Brasil

O segundo anúncio analisado pertence ao Banco do Brasil, com ênfase no crédito para pequenos empresários e ele visa informar aos clientes sobre a oferta de crédito e orientação financeira para microempresários ou para aqueles que desejam iniciar um pequeno negócio, sendo produzido em 2018 e veiculado, principalmente, na internet e em revistas de grande circulação nacional.

Em termos de processo acional, novamente nos defrontamos com muitas pessoas que participam de ações diferentes e simultâneas, remetendo à questão da parcialidade de representações de momentos que irão ativar o conhecimento prévio do leitor acerca do todo. Se comparado com o anúncio 1, as ações praticadas neste anúncio podem ser consideradas ainda mais corriqueiras, se subdividindo em cenas que acontecem ao mesmo tempo: uma conversa informal entre o atendente e os dois clientes e um sorriso da dona do estabelecimento que simboliza que ela está de fato interagindo ou “atendendo” os leitores interessados no produto anunciado. Esse ato de imagem (KRESS E VAN LEEUWEN, 2006) pode ainda simbolizar os efeitos do produto sobre seus clientes, ou seja, a satisfação de quem os usa. Pode-se concluir que as duas ações se resumem no “atender bem”, o que gera o bem-estar e a atmosfera representada, reforçando o slogan do banco: “Bom pra todos”. Para Feng (2017) as ações em representações visuais são um recurso eficaz na construção de atitudes, sendo que certas ações, além de contribuírem para o enredo, são especificamente designadas para evocar o julgamento do observador, reforçando ou diminuindo sua empatia. Detecta-se neste ponto a presença da metonímia da ação por atributo.

Considerando o processo analítico de Feng (2017), todos os participantes são mostrados de uma distância pessoal distante, ou seja, vê-se até quase o quadril, diminuindo assim a distância entre o banco e seus clientes. A modalidade é altamente naturalista, com riqueza de detalhes que visam fazer com que o leitor considere a cena como real, próxima daquilo que deseja vivenciar, e acabe adentrando o universo representado.

As roupas agem como atributos recebidos pelos personagens (metonímia da característica por atributo) e, neste caso, podemos diferenciar quem é o atendente de quem é a dona do estabelecimento pelas vestimentas. O uniforme usado pelo atendente masculino, por exemplo, atua na co-construção da personagem e da cena como um todo. Já as roupas usadas pela dona do estabelecimento servem para destacar sua importância na cena e suas atitudes em adquirir o produto, tornando-se uma microempresária de sucesso. O enquadramento desta personagem revela a importância que a instituição atribui aos seus clientes, sendo que eles ocupam o centro do processo.

Analisando os recursos linguísticos que compõem esta imagem, detectamos que a mensagem reforça a centralidade e importância dos clientes: “O apoio na medida certa para você”. Na perspectiva da GSF, de Halliday (1994), detecta-se que o cliente (você) é o beneficiário de uma ação que resultará na imagem de empresário bem-sucedido endossada pela participante representada na imagem.

Os processos analíticos e acionais representam “recursos primários na construção identitária das personagens” (FENG, 2017, p. 459) porque metonimicamente representam o que elas fazem (ação por atributo) e como elas estão sendo representas (características analíticas por atributo). Mas o processo classificatório tem um enfoque mais direto e abrangente na identidade e na transmissão de estereótipos.

Na imagem 2, identifica-se que, mais uma vez, buscou-se romper com padrões pré-definidos na tentativa de mostrar pessoas comuns em ações corriqueiras como sendo pessoas empreendedoras e economicamente ativas. A presença da mulher negra como personagem principal no contexto apresentado e como empresária bem-sucedida pode ser vista como fuga de padrões e estereótipos na busca de interação e aceitação dos produtos por novos tipos de público. Neste caso, podemos afirmar que a mulher representada no anúncio representa toda uma categoria (membro de uma categoria por toda ela). Porém, o anúncio também tem a função de evocar o conhecimento prévio do leitor e, neste sentido, ainda temos a representação de empregado e patrão, enfatizando a metonímia de identidade pelo atributo da categoria.

Já no processo reacional podemos destacar o sorriso da dona do estabelecimento como forma de interação com os leitores. Tal sorriso expressa satisfação em ser cliente do banco e o efeito dos produtos anunciados na vida daqueles que aderem a eles. O sorriso metonimicamente constrói a felicidade e expressa a metonímia da reação por emoção, despertando no leitor o desejo e sensação de ser como a personagem apresentada pelos produtores da imagem.

Existem ainda os olhares como forma de interação e de despertar emoções e reações no leitor. O olhar de demanda fica a cargo da dona do quiosque, que demanda atitudes e adesão dos leitores ao produto e ao convite de se tornarem empreendedores. O olhar é combinado com um sorriso e, nestes casos, temos demanda com sedução (KRESS E VAN LEEUWEN, 2006). Já o atendente e os cliente apresentam olhar indireto, com sorriso, e são mostrados a partir de um ângulo oblíquo, denotando a permissão ao leitor de se inserir naquele contexto.

Com base na perspectiva de Fairclough (1994; 1995), na análise dos macroelementos, ou seja, de aspectos ideológicos e hegemônicos, podemos afirmar que, novamente, buscou-se o rompimento com padrões pré-estabelecidos que incluem representações tradicionais de empresários, atendentes e clientes. Neste caso, todos foram mostrados de maneira mais informal, enfocando o contexto brasileiro a partir de paisagens representativas como sol, céu azul, quiosques, frutas tropicais e praia. Fairclough (1995) identificou o fenômeno da “personificação sintética”, que nada mais é do que uma simulação do privado, do discurso cara a cara, através de discursos veiculados em propagandas. Essa tendência está presente no anúncio analisado, pois ele, além de romper com os padrões tradicionais de anúncios de instituições financeiras, busca uma aproximação do público-alvo pelo grau de informalidade e simulação de situações da vida real.

Anúncio 3
Bradesco Seguradora

O terceiro anúncio analisado pertence à Bradesco Seguradora, ano de 2016, que oferece serviços para proteção e bem-estar dos clientes, incluindo serviços para automóveis, residências, saúde e capitalização. Novamente, irei traçar o mapa metonímico dos recursos usados na confecção do anúncio, destacando o princípio da parcialidade e as demais representações metonímicas presentes nas personagens e situações, através da análise dos processos envolvidos na confecção e que visam a persuasão dos leitores.

Em primeiro lugar, três personagens (ou participantes representados) compõem da cena e representam um momento “brasileiro em família”. Neste anúncio, como nos demais aqui analisados, detecta-se o princípio da parcialidade no qual momentos de ações servem para representar o todo. Mas ao contrário dos demais anúncios analisados, tem-se apenas uma cena e uma ação específica onde um casal interage com um bebê.

Para Kress e van Leeuwen (2006) vetores são linhas, na maioria das vezes diagonais, que conectam os participantes, por exemplo, um braço entendido ou uma seta. Os vetores expressam dinâmica e os “atores” são aqueles dos quais emanam os vetores. As “metas” são representadas pelos participantes para os quais os vetores são direcionados. Em uma imagem onde se tem ator e metas, pode-se dizer que há transitividade, devido à ação bilateral. Por outro lado, a linha de olhar dos participantes representa, também, um tipo de vetor.

No anúncio 3, a ação apresentada é guiada por vetores, onde a união entre as mãos do pai e filha representa um elo de ligação e afetividade entre os membros da família do anúncio. Por outro lado, a linha de olhar entre os participantes representados também exerce a função de vetores e elos de conexão entre eles, reforçando a ideia de ação praticada em prol do bem-estar da família. Os pais são, neste caso, colocados como os atores de onde os vetores se originam e a garota é a meta, ou seja, ela terá seu futuro protegido caso os pais contratem os serviços sugeridos neste anúncio.

Em termos linguísticos, na frase “As melhores soluções para proteger o que é mais importante para você, sua família e seu patrimônio” identifica-se o cliente e sua família como beneficiários da ação, reforçando a análise imagética acima.

A análise do processo analítico revela uma imagem próxima da realidade com modalidade sensorial alta, conforme indicado por Kress e van Leeuwen (2002), que afirmam que aquelas imagens que não estão em preto e branco ou que fogem aos tons pasteis estão próximas das representações reais. Pode-se dizer que o anúncio nos remete à fórmula: “cores reais + pessoas comuns = situação rotineira”. Tal fórmula representa a vontade do produtor da imagem em retratar pessoas comuns atuando em situações do dia a dia como forma de interação com os clientes.

A distância através da qual a família está sendo mostrada (distância próxima pessoal) denota intimidade e proximidade entre os participantes representados e os leitores, e entre o produto anunciado e os clientes a que ele se destina, passando a ideia de que é fácil adquiri-lo e que ele está ao acesso de todos.

O processo classificatório está relacionado com a representação identitária das personagens e à transmissão de estereótipos (FENG, 2017). Neste caso, há quebra dos padrões tradicionalmente usados, no sentido de se colocar uma família negra como forma de representar a família brasileira. Por outro lado, o estereótipo de família ou de ações praticadas em família precisa ser preservado para que os clientes ativem seu conhecimento prévio sobre as ações, atitudes e forma de ser daquele grupo específico. Conclui-se que a metonímia da identidade pelo atributo estereotipado ou da categoria está presente neste anúncio.

Ao tentar colocar uma família negra como personagem principal do anúncio, os produtores realçam a importância do negro na economia brasileira, neste caso temos uma única família negra sendo usada na busca de representar todas as demais e interagir com elas, nos remetendo à metonímia de membros de uma categoria por toda ela.

Na perspectiva do processo reacional identifica-se os olhares dos participantes representados que são de oferta, desenhando linhas de olhar entre eles sem que haja contato visual direto com os leitores. Neste caso, existe um convite endereçado ao leitor a ingressar naquele universo. O efeito do produto (da adesão aos serviços apresentados pelo anúncio) está expresso nos rostos dos participantes representados através de sorrisos de satisfação. Neste sentido, Feng (2017) afirma que existe a metonímia da reação por emoção, que é muito comum em imagens estáticas e em movimento. A expressão não-verbal da emoção pode ser reconhecida com alto grau de precisão, sendo as expressões faciais o primeiro recurso para a construção de significados.

Por outro lado, a metonímia do desencadeamento de condições por emoção também se faz presente, pois os leitores são capazes de “sentir” o bem-estar da família do anúncio pelo conjunto de elementos usados pelos seus produtores.

Na análise dos aspectos ideológicos tem-se a tentativa de romper com padrões tradicionais e estereótipos através da naturalização e afirmação do poder de compra das famílias negras, uma vez que tal lugar quase sempre estivera ocupado por famílias brancas, que representam uma hegemonia neste tipo de anúncio. Há ainda um alto grau de informalidade que representa a tendência de rompimento com marcadores de poder, como o uso da frase “É melhor ter”, que nos remete à democratização nas representações da mídia atual (FAIRCLOUGH, 1995) onde discursos privados ou locais assumem contornos universais. Por outro lado, a mesma frase pode funcionar como um slogan que, por sua vez, age no inconsciente dos indivíduos, levando-os à compra do produto. Neste sentido, Vivanco (2004) explora feições de mensagens de publicidade em relação a outros tipos de texto. Como a meta da publicidade é orientar as ideias do consumidor em certa direção, a intenção comunicativa restringe-se a enfocar estratégias de persuasão em que é crucial a questão da coerência. Vivanco (2004) identificou que os textos publicitários fazem um uso relativamente baixo de conectivos, contando com o conhecimento prévio que os leitores trazem para o texto, o que irá colaborar para a construção das relações e manter a coerência.

Nesta perspectiva, Thompson (2004, p. 179) afirma que, embora os conectivos sejam um recurso linguístico crucial para a expressão de significados coerentes, sua ausência pode não tornar um texto totalmente incoerente porque os usuários de uma língua, em um dado contexto sociocultural, possuem a predisposição em construir significados com base no conhecimento prévio.

CONCLUSÃO

Este artigo teve como objetivo principal examinar anúncios de grandes instituições financeiras veiculados em diferentes mídias, como televisão, jornais, revistas e internet para identificar a contribuição dos processos metonímicos na persuasão que percorre este gênero publicitário. Através da análise ficou evidente que os produtores têm buscado um rompimento com padrões tradicionais e estereótipos na busca de interação com diferentes tipos de público. Desta forma, os anúncios apresentaram um grande nível de informalidade e situações rotineiras, que se refletem nos níveis linguístico e imagético.

Por outro lado, as análises baseadas nos processos metonímicos demonstraram os caminhos e técnicas usadas na produção dos anúncios na busca de persuadir e vender os produtos. As análises da metonímia visual se mostraram ainda uma ferramenta eficiente para compreendermos como ações, atitudes, formas de interação, representações e modalidade agem em conjunto, de forma coerente e interrelacionada na construção de significados.

  • 1
    De acordo com Minsky (1977, pp. 355), um frame pode ser considerado uma representação mental do nosso conhecimento de mundo, uma estrutura de dados que está localizada na memória humana e pode ser selecionada ou recuperada quando necessária.
  • 2
    As teorias de Halliday foram adaptadas para a análise de imagens e diversos estudiosos identificam o que eles chamam de “centro de impacto visual”, que permite ao leitor adentrar uma página através de um ponto ou elemento que indica o caminho de leitura em um texto multi-semiótico. Em termos de Halliday (1994) este seria o Tema da composição visual, pois ele representa o ponto de partida de uma composição.
  • 3
  • 4
    Processo presente na organização de domínios sociais diversos relacionado com a produção, distribuição e consumo: discursos ligados à produção de bens de consumo dominam outros discursos institucionais. Alguns autores também classificam esse processo comercialização ou comodificação.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    22 Maio 2020
  • Data do Fascículo
    Jan-Apr 2020

Histórico

  • Recebido
    10 Jan 2019
  • Aceito
    18 Out 2019
  • Publicado
    18 Fev 2020
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