Open-access Características de acidentes e padrões de lesões em motociclistas hospitalizados: estudo retrospectivo de emergência

Características de accidentes y patrones de lesiones en motociclistas hospitalizados: estudio retrospectivo de emergencia

Resumo

Objetivo  descrever as características dos acidentes de motocicleta e das vítimas hospitalizadas em um hospital de grande porte e referência em trauma no Brasil.

Métodos  foi realizada uma pesquisa documental com uma amostra de 343 vítimas de acidentes de motocicleta internadas no Hospital de Restauração no ano de 2014. Os dados foram coletados nos prontuários dos pacientes. As variáveis demográficas foram analisadas e relacionadas a circunstâncias do acidente, clínicas e do tratamento. O programa Epi Info 7 foi utilizado para análise estatística descritiva. O teste do qui-quadrado de Pearson foi utilizado para analisar proporções. Nos casos em que as premissas do teste do qui-quadrado não foram satisfatórias, foi aplicado o teste exato de Fisher. O nível de significância de 5% foi considerado para todas as conclusões.

Resultados  o maior número de acidentes envolveu o sexo masculino (87,5%), na faixa etária de 20 a 29 anos (34,7%), solteiros (86,7%). A maior frequência de acidentes ocorreu aos domingos (25,1%) e à noite (32,1%). A região corporal mais afetada foi a cabeça (43,9%). O tempo médio de internação foi de 15,9 ± 23,8 (1-161) dias. O desfecho principal foi alta hospitalar (88,5%). O teste de comparação de proporções foi significativo para todas as variáveis analisadas (valor de p <0,001). Algum tipo de sequela afetou 51 (14,8%) vítimas.

Conclusão  o perfil das vítimas foi sexo masculino, idade entre 20 e 29 anos e a cabeça como área corporal mais afetada. O perfil das internações por acidente de motocicleta em um hospital de trauma traz informações relevantes sobre as características das vítimas e dos acidentes, que podem auxiliar no desenvolvimento de estratégias de prevenção de lesões.

Causas de morte; Motocicletas; Acidentes de trânsito; Emergências; Serviço hospitala de emergência

Resumen

Objetivo  Describir las características de los accidentes de motocicleta y de las víctimas internadas en un hospital de gran tamaño y referencia en trauma de Brasil.

Métodos  Se realizó una investigación documental con una muestra de 343 víctimas de accidentes de motocicleta internadas en el Hospital de Restauração en 2014. Los datos se recolectaron de las historias clínicas de los pacientes. Se analizaron las variables demográficas y se las relacionó con las circunstancias del accidente, clínicas y del tratamiento. Para el análisis estadístico descriptivo, se utilizó el programa Epi Info 7. Para analizar proporciones, se utilizó la prueba χ2 de Pearson. En los casos en que las premisas de la prueba χ2 de Pearson no fueron satisfactorias, se aplicó la prueba exacta de Fisher. Se consideró el nivel de significación de 5% en todas las conclusiones.

Resultados  En el mayor número de accidentes, los involucrados fueron del sexo masculino (87,5%), del grupo de edad de 20 a 29 años (34,7%), solteros (86,7%). La mayor frecuencia de accidentes ocurrió los domingos (25,1%) y a la noche (32,1%). La región corporal más afectada fue la cabeza (43,9%). El tiempo promedio de internación fue de 15,9 ± 23,8 (1-161) días. El desenlace principal fue el alta hospitalaria (88,5%). La prueba de comparación de proporciones fue significativa en todas las variables analizadas (valor de p <0,001). Algún tipo de secuela afectó a 51 (14,8%) víctimas.

Conclusión  El perfil de las víctimas fue de sexo masculino, edad entre 20 y 29 años y la cabeza fue la zona corporal más afectada. El perfil de las internaciones por accidente de motocicleta en un hospital de trauma proporciona información relevante sobre las características de las víctimas y de los accidentes, que pueden servir para la elaboración de estrategias de prevención de lesiones.

Causes de muerte; Motocicletas; Accidentes de tránsito; Urgencias medicas; Servicio de urgencia en hospital

Abstract

Objective  To describe the characteristics of motorcycle accidents and victims hospitalized in Brazilian a large hospital and reference in trauma.

Methods  A documentary research study was developed with a sample of 343 motorcycle accident victims hospitalized at the Hospital of Restoration in the year 2014. Data was collected in patients’ medical records. Demographic variables were analyzed; related to the circumstances of the accident, clinics and treatment. The Epi Info 7 program was used, through descriptive statistics for analysis. Pearson’s Chi-square test was used to analyze proportions. In cases where the assumptions of the chi-square test were not satisfied Fisher’s exact test was applied. All conclusions were drawn considering the level of significance of 5%.

Results  The largest number was male (87.5%), in the age group of 20 to 29 years (34.7%), unmarried (86.7%). The highest frequency of accidents was in on Sunday (25.1%) and at night (32.1%). The most affected body region was the head (43.9%). The mean length of hospital stay was 15.9 ± 23.8 (1-161) days. The main outcome was hospital discharge (88.5%). The proportion comparison test was significant in all variables analyzed (p-value <0.001). 51 (14.8%) of the victims suffered some kind of side effect.

Conclusion  The profile of the victims was 20 to 29 years old, male, with the head being the most affected body area. The profile of hospitalizations due to motorcycle accidents in a trauma hospital, brings relevant information on the characteristics of victims and accidents, which may provide subsidies for injury prevention strategies.

Cause of death; Motorcycles; Accidents, traffic; Emergencies; Emergency services, hospital

Introdução

Os acidentes de trânsito estão entre as principais causas de morte, hospitalização e deficiência. O número estimado de vítimas fatais e não fatais no trânsito é 1,3 milhão e até 50 milhões por ano, respectivamente, em todo o mundo. De acrodo com a Organização Mundial da Saúde, sem ações preventivas, os acidentes de trânsito seguirão aumentando até se tornarem a sétima causa de morte em 2030, e cerca de 90% da mortalidade global no trânsito ocorre em países de renda baixa e média, apesar deles possuírem metade dos veículos do mundo.( 1 )

Comparado aos países de alta renda, na maioria dos países de renda baixa e média, uma parcela muito maior de usuários de estradas é pedestre, ciclista e motociclista. Quase metade das lesões fatais causadas pelo trânsito envolve motociclistas,( 2 ) que estão mais expostos a mortes e ferimentos.( 3 ) Em estudo sobre o risco de lesões em motociclistas causadas pela velocidade de colisão e outros fatores envolvidos, foi encontrada uma relação forte e significativa entre a velocidade relativa e a gravidade das lesões em acidentes de moto.( 4 ) À velocidade de 70 km/h, o risco de lesões graves por colisões com objetos grandes, barreiras de impacto e objetos estreitos foi de 20%, 51% e 64%, respectivamente.( 4 ) Além disso, em colisões frontais entre motocicletas e automóveis de passageiros com ambos os veículos a 60 km/h (velocidade relativa de 120 km/h), há 55% de risco de lesões graves para o motociclista.( 4 ) Embora lesões nos membros inferiores sejam mais comuns em acidentes de motocicleta, lesões na cabeça são mais frequentes em colisões fatais.( 5 , 6 )

Nas últimas décadas, aumentou o tráfego de motocicletas em muitas regiões do mundo e a segurança continua a ser um grande desafio. Acidentes com motociclistas envolvem vários fatores de risco, com ênfase para aqueles relacionados à infraestrutura (tipo e geometria da estrada, instalações na estrada, iluminação e visibilidade, tipo de juntas e condições do pavimento).( 4 , 7 ) Características e comportamentos dos participantes também são fatores de risco para esses acidentes, como por exemplo, excesso de velocidade, álcool, uso de capacete, sexo e idade.( 8 )

No México, as motocicletas representam 13,14% do número total de mortes em acidentes rodoviários.( 9 ) Um estudo realizado no Irã identificou que motocicletas estavam envolvidas em 43,4% dos acidentes de trânsito, assim como uma maioria masculina (86,2%).( 10 ) Enquanto 10% da população de motoristas é formada por jovens, a taxa de mortalidade por acidentes de motocicleta é três vezes maior.( 11 ) Em um estudo na África, os acidentes de motocicleta corresponderam a 57% de todos os acidentes de trânsito, predominantemente com vítimas do sexo masculino, de baixo nível socioeconômico e idade entre 20 e 40 anos.( 5 )

No Brasil, os acidentes de moto são um importante problema epidemiológico. Há uma tendência de crescimento da taxa de mortalidade, que suplantou a de acidentes com automóveis. De 1990 a 2015, a taxa de mortalidade de motociclistas foi de 5,9/100 mil.( 12 ) A tendência linear de mortalidade entre motociclistas aumentou significativamente em todas as macrorregiões brasileiras, com a maior variação anual registrada no Nordeste.( 13 ) Em estudo sobre os anos potenciais de vida perdidos em acidentes com motocicletas no Estado de São Paulo, foram identificadas taxas de 486,9 para idades entre 20 a 29 anos e de 199,5 para a faixa de 30 a 39 anos, mostrando o impacto dessas mortes na sociedade.( 14 )

Somado a isso, está o impacto de lesões não fatais no Sistema Único de Saúde (SUS). De um total de 170.805 hospitalizações registradas no Sistema de Internação Hospitalar (SIH) em 2013, 51,9% foram causadas por acidentes de motocicleta.( 15 ) Essas hospitalizações mostram a gravidade das lesões e influenciam diretamente os gastos com saúde, muitas vezes difíceis de estimar devido aos custos sociais envolvidos, que impactam no perfil de mortalidade e morbidade e representam um grande desafio à saúde pública.( 16 ) O objetivo deste estudo foi descrever as características dos acidentes de motocicleta e de suas vítimas internadas em um hospital de grande porte e referência no tratamento de trauma.

Métodos

Trata-se de uma pesquisa documental (prontuários médicos) realizada no Hospital da Restauração Governador Paulo Guerra. Este hospital faz parte da rede pública de saúde do Estado de Pernambuco e é a principal referência para as vítimas de politrauma. Estima-se que mensalmente, sejam realizados 10.000 atendimentos de emergência, 13.000 atendimentos ambulatoriais, 2.200 internações e 800 cirurgias. Para o cálculo amostral, foi utilizado o programa Openepi (https://www.openepi.com/Menu/OE_Menu.htm) com os seguintes parâmetros: tamanho populacional de 2.195 vítimas de acidentes de motocicleta atendidas no ano estudado (2014), prevalência de 50%, variação de 5% e nível de confiança de 95%, obtendo n=328. Os dados foram coletados pelo pesquisador responsável através de consulta aos prontuários dos pacientes, no período de janeiro a dezembro de 2016 e posteriormente transcritos para instrumento desenvolvido para o estudo. Foram analisadas variáveis demográficas (sexo, faixa etária, estado civil e procedência), as relacionadas com as circunstâncias do acidente (dia da semana, hora, mês, uso de capacete e bebidas alcoólicas) e variáveis clínicas e de tratamento (localização da lesão, ECG, tipo de tratamento, tempo de internação, morte, resultado, sequelas e cuidados especializados após a alta). As variáveis mecanismo de trauma (43,7%) e número de lesões (19,0%) foram excluídas da análise pela alta proporção de não preenchimento.

Para análise dos dados, foi utilizado o programa Epi Infor 7 por meio de estatística descritiva (distribuição de frequências, medidas de tendência central e dispersão). A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital Universitário Oswaldo Cruz da Universidade de Pernambuco (CAAE nº 50163215.0.0000.5192), protocolo número 1.315.56, de 10 de novembro de 2015.

Resultados

A população do estudo foi composta por 343 vítimas de acidentes de motocicleta hospitalizadas no período de janeiro a dezembro de 2014. A tabela 1 mostra as características demográficas das vítimas de acidentes de motocicleta. A idade média foi de 29,9 ± 12,4 anos. A maior casuística foi do sexo masculino (n=300; 87,5%), idade entre 20 e 29 anos (n=119; 34,7%), solteiros (n=255; 86,7%), residentes em municípios do interior do estado (n=10; 61,8%).

Tabela 1
Características demográficas das vítimas de acidentes de motocicleta

A maior frequência de acidentes ocorreu em setembro (n=39; 11,4%), aos domingos (n=86 25,1%) e no período noturno (n=110; 32,1%), conforme observado na tabela 2 . Os motociclistas relataram usar capacete (n=312; 91,0%) e não ter consumido álcool (n=240; 70,0%) ( Tabela 2 ).

Tabela 2
Características dos acidentes envolvendo motociclistas

A tabela 3 descreve as características das lesões e o tratamento das vítimas. A região corporal mais afetada foi a cabeça (n=163; 43,9%), no entanto, o valor prevalente da Escala de Coma de Glasgow (ECG) foi leve (n=240; 82,5%) e a maioria das vítimas permaneceu até sete dias no hospital (n=194; 57,1%). O tempo médio de internação foi de 15,9 ± 23,8 (1-161) dias. O principal desfecho foi alta hospitalar (n=284; 88,5%) e houve 22 óbitos (6,4%). Dos 343 motociclistas hospitalizados, 51 (14,8%) apresentaram sequelas ( Tabela 3 ). O ambulatório de ortopedia (n=68; 32,4%) foi o mais indicado para a continuação do tratamento após a alta hospitalar ( Tabela 3 ). Houve afastamento do trabalho em 27,7% dos casos e o tempo médio de ausência foi de 43,5 ± 24,3 (3-120) dias.

Tabela 3
Características das lesões e tratamento das vítimas de acidentes de motocicleta

Discussão

Os resultados do estudo mostram que jovens adultos do sexo masculino de 20 a 29 anos foram as principais vítimas de acidentes de motocicleta, assim como em outros trabalhos.( 14 , 17 , 18 ) Em estudo onde foram analisadas as características dos motociclistas envolvidos em acidentes de trânsito e atendidos em serviços públicos de urgência e emergência do Brasil, foi identificado perfil semelhante.( 17 ) No estado do Rio Grande do Norte, o perfil de motociclistas atendidos em um serviço de emergência pré-hospitalar revelou características semelhantes e predominância de homens de 25 a 34 anos.( 19 ) Da mesma forma, pesquisa sobre as características clínicas de motociclistas envolvidos em acidentes mostrou que quase todos eram do sexo masculino, com idade entre 16 e 35 anos.( 20 ) No Irã, um estudo comparou o perfil dos pacientes de acordo com sexo e idade em um centro de trauma, e foi constatada prevalência de acidentes de automóvel e motocicleta entre os homens de 15 a 44 anos.( 21 )

Vários fatores contribuem para o risco de acidentes de motociclistas, a saber: sexo, idade, experiência, traços de personalidade.( 22 ) A maior exposição de homens jovens identificada neste estudo provavelmente está associada a comportamentos sociais e culturais, que podem implicar em comportamentos perigosos, como não usar capacete ao dirigir motocicletas, dirigir sob efeito de substâncias, não cumprir as leis de trânsito e falhar no controle de alta velocidade.( 23 ) Há uma correlação significativa entre estilo de vida e comportamento de risco em acidentes de trânsito envolvendo motocicletas.( 22 )

Um estudo realizado na Austrália com o objetivo de compreender os comportamentos associados ao risco de colisão envolveu uma amostra composta majoritariamente por homens. Foi observado que violações de velocidade e erros relacionados ao controle das motocicletas aumentavam as chances de envolvimento em uma colisão.( 24 )

O risco de acidentes por excesso de velocidade também merece destaque. Um estudo sobre os fatores de exposição da frota de motocicletas relacionados ao risco de acidentes graves revelou uma proporção significativamente maior de motociclistas que excederam o limite de velocidade, em comparação com outros veículos (6 vs. 3%, respectivamente).( 25 ) Estudo sobre o risco de lesões em motociclistas devido à velocidade de colisão demonstrou que a 70 km/h, o risco de lesões graves na colisão com objetos grandes, barreiras e objetos estreitos foi de 20%, 51% e 64%, respectivamente.( 4 ) Além disso, em colisões frontais entre motocicletas e carros de passageiro com ambos os veículos a 60 km/h (velocidade relativa de 120 km/h), o risco do motociclista sofrer lesões graves foi de 55%.( 4 )

Em relação ao mês de ocorrência, os acidentes ocorreram de forma homogênea ao longo dos meses do ano, apesar da concentração nos finais de semana, principalmente nos domingos e à noite. A maior frequência de acidentes nos finais de semana e à noite pode estar relacionada com eventos festivos e a ingestão de bebidas alcoólicas, que aumenta nesses períodos.( 26 ) No México, a análise de acidentes com motociclistas mostrou que sábados e domingos são os dias de maior probabilidade de ocorrência de acidentes (OR 1,65), em comparação com os outros dias da semana.( 9 )

Os resultados deste estudo mostraram que cerca de 70% dos entrevistados declararam não terem ingerido álcool no momento do acidente. Estudo sobre o impacto do Código de Trânsito Brasileiro na mortalidade por acidentes de trânsito revelou uma redução nesta taxa após sua implantação, mas que não foi significativa para a categoria dos motociclistas.( 18 ) Pesquisas sobre a prevalência de álcool e drogas na morte de motociclistas em acidentes de trânsito na Noruega mostraram que a presença dessas substâncias no sangue foi encontrada principalmente em motociclistas de 25 a 34 anos de idade e em acidentes nos finais de semana e à noite.( 27 ) Na cidade de São Paulo, o coeficiente de culpabilidade estimado para motociclistas com resultados positivos para álcool foi três vezes maior do que para aqueles com resultado negativo.( 28 )

O risco de acidentes pode aumentar com o uso de álcool e outras drogas, prejudicando a consciência do motorista e sua habilidade de resolver problemas. Além disso, motoristas sob a influência de álcool ou substâncias não consideram as consequências de seus comportamentos e ações sobre os outros. Isso pode aumentar o risco de estar envolvido em um acidente ou causá-lo.( 29 ) Entre os motociclistas vítimas fatais, o uso de álcool está significativamente associado ao comportamento de risco, como não usar o capacete.( 30 ) Uma parcela considerável dos acidentes poderá ser evitada com a aplicação de limitações mais eficientes contra a direção após ingestão de álcool ou substâncias.

No presente estudo, a cabeça foi a parte do corpo mais afetada por trauma, apesar de alegação do uso de capacete no momento do acidente por mais de 90% dos motociclistas. Mesmo com as evidências de redução de lesões e mortalidade associadas a acidentes de motocicleta com o uso de capacete, seu uso não é universal entre os motociclistas. No Brasil, é obrigatório utilizar capacete e o não cumprimento dessa lei representa uma infração muito grave. Uma pesquisa identificou redução de 69% em fraturas cranianas, 71% em contusão cerebral e 53% em hemorragia intracraniana com o uso de capacete por motociclistas envolvidos em acidentes.( 31 )

A maioria dos motociclistas teve mais de uma lesão. Eles são vulneráveis no trânsito, pois o veículo não possui equipamento de segurança adicional além do capacete. Uma análise dos acidentes de transporte terrestre realizados na cidade de Olinda (PE) mostrou que as principais vítimas foram os motociclistas.( 32 ) Em um acidente, o motociclista tem maior chance de ser gravemente ferido, pois não há estrutura metálica externa para absorver o impacto, como ocorre com os ocupantes de automóveis.( 20 ) O motociclista recebe a força e o impacto do acidente. O mecanismo comum de lesão é o impacto frontal ou a ejeção devido à parada abrupta da motocicleta no momento do impacto. O movimento do motociclista para frente pode causar vários ferimentos com o impacto no asfalto ou em partes das motocicletas. A maioria das lesões envolvendo motociclistas inclui a cabeça, tórax e região abdominal.( 33 )

O tempo médio de internação observado neste estudo foi de sete dias. Esse dado é semelhante ao encontrado na análise de internações por lesões decorrentes de acidentes de transporte terrestre no Brasil em 2013, em que o tempo de permanência para vítimas de acidentes de motocicleta foi de 6,1 dias.( 15 ) Em Salvador (BA), o tempo médio de internação de motociclistas feridos foi de 4,2 dias.( 34 ) No estado do Piauí, o tempo médio de permanência foi de 4,5 dias.( 35 )

Neste estudo, mais de 80% dos motociclistas envolvidos em acidentes foram classificados como leve (13 a 15 pontos) pela Escala de Coma de Glasgow. Da mesma forma, um estudo que analisou as lesões resultantes de acidentes de motocicleta tratadas em hospital localizado em Camarões descobriu que a maioria dos pacientes teve ferimentos leves.( 36 )

Em mais de 15% da amostra estudada ocorreram sequelas, dado consistente com os resultados de um estudo que avaliou internações. Em tal estudo, as vítimas mais afetadas foram os motociclistas internados por acidente de transporte terrestre associados a sequelas. O uso de equipamentos de proteção para motociclistas, como capacete e protetor de membros, contribui para reduzir a gravidade e possíveis sequelas.( 37 )

As limitações do estudo incluem a qualidade dos dados clínicos disponíveis nos prontuários médicos, que podem ter a descrição e gravidade do trauma aprimorados para fornecer relatórios precisos sobre motociclistas envolvidos em acidentes. Outra limitação foi o fato de ser um estudo hospitalar, ainda que conduzido no principal hospital de referência do estado. Estes dados podem ser usados como observatório de acidentes de motocicleta e ter utilidade para a comunidade médica, a sociedade e os gestores de saúde.

Conclusão

As características das vítimas de acidentes de motocicleta estudadas evidenciaram a presença de jovens adultos do sexo masculino. A maioria dos acidentes ocorreu nos finais de semana e no período noturno. A principal área afetada foi a cabeça e o capacete estava em uso no momento do acidente. O perfil das internações por acidentes de motocicleta em um hospital de trauma traz informações relevantes sobre as características das vítimas e dos acidentes, o que pode subsidiar as estratégias de prevenção de lesões. A prevenção primária, com a aplicação das leis de trânsito e medidas de segurança rodoviária, deve ser a chave para reduzir a morbimortalidade em acidentes envolvendo motociclistas. Da mesma forma, conhecer os tipos e gravidade das lesões contribui para o planejamento gerencial, a capacitação dos profissionais para o primeiro atendimento na unidade de saúde, o ganho de tempo e a qualidade do serviço, reduzindo os riscos de morte e sequelas futuras.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    10 Jun 2020
  • Data do Fascículo
    2020

Histórico

  • Recebido
    10 Maio 2019
  • Aceito
    04 Out 2019
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