Resumo
Objetivo Analisar a correlação entre qualidade da transição do cuidado na alta hospitalar de crianças e a satisfação com os cuidados de enfermagem.
Método Pesquisa quantitativa, transversal, realizada em 2019, no sul do Brasil. Foram incluídos os responsáveis por 305 crianças que tiveram alta do hospital para o domicílio. Além da caracterização dos participantes, foram utilizados os instrumentos Care Transitions Measure (CTM-15 Brasil) e Instrumento de Satisfação do Paciente para coleta de dados. Foi aplicado o teste de Correlação de Spearman. Considerou-se nível de significância de 5% (p<0,05).
Resultados A média final do Care Transitions Measure foi de 87,9 (0-100 pontos), caracterizando a qualidade da transição do cuidado como satisfatória. Todos os itens do Instrumento de Satisfação do Paciente apresentaram média superior a 3,0 pontos, indicando alto grau de satisfação. A correlação entre qualidade da transição do cuidado e satisfação dos pacientes foi de fraca magnitude.
Conclusão A qualidade da transição do cuidado e a satisfação do paciente com os cuidados de enfermagem apresentaram valores significativos. Foi verificada fraca correlação entre elas, o que sugere que a avaliação da qualidade da transição do cuidado seja influenciada por múltiplos fatores.
Cuidado transicional; Satisfação do paciente; Alta do paciente; Criança; Cuidados de enfermagem
Resumen
Objetivo Analizar la correlación entre la calidad de la transición del cuidado en el alta hospitalaria de niños y la satisfacción con los cuidados de enfermería.
Métodos Estudio cuantitativo, transversal, realizado en 2019 en el sur de Brasil. Se incluyeron los adultos responsables de 305 niños que recibieron el alta del hospital a su domicilio. Además de la caracterización de los participantes, se utilizaron los instrumentos Care Transitions Measure (CTM-15 Brasil) e Instrumento de Satisfacción del Paciente para recopilación de datos. Se aplicó la prueba de correlación de Spearman. Se consideró un nivel de significación de 5 % (p<0,05).
Resultados El promedio final del Care Transitions Measure fue 87,9 (0-100 puntos), que caracterizó la calidad de la transición del cuidado como satisfactoria. Todos los ítems del Instrumento de Satisfacción del Paciente presentaron un promedio superior a 3,0 puntos, lo que indica un alto nivel de satisfacción. La correlación entre la calidad de la transición del cuidado y la satisfacción de los pacientes fue de escasa magnitud.
Conclusión La calidad de la transición del cuidado y la satisfacción del paciente con los cuidados de enfermería presentaron valores significativos. Se verificó una escasa correlación entre estas variables, lo que sugiere que la evaluación de la calidad de la transición del cuidado esté influenciada por múltiples factores.
Cuidado de transición; Satisfacción del paciente; Alta del paciente; Niño; Atención de enfermería
Abstract
Objective To analyze the correlation between quality of care transition at hospital discharge of children and satisfaction with nursing care.
Methods This is quantitative, cross-sectional research carried out in 2019 in southern Brazil. Parents of 305 children who were discharged from hospital to home were included. In addition to participant characterization, the Care Transitions Measure (CTM-15 Brazil) and Patient Satisfaction Instrument were used to collect data. Spearman’s correlation test was applied. A significance level of 5% was considered (p<0.05).
Results The final mean of the Care Transitions Measure was 87.9 (0-100 points), characterizing quality of care transition as satisfactory. All Patient Satisfaction Instrument items had a mean greater than 3.0 points, indicating a high degree of satisfaction. The correlation between quality of care transition and patient satisfaction was of low magnitude.
Conclusion Quality of care transition and patient satisfaction with nursing care showed significant values. A weak correlation was found between them, which suggests that quality of care transition assessment is influenced by several factors.
Transitional care; Patient satisfaction; Patient discharge; Child; Nursing care
Introdução
A transição do cuidado é conceituada como o conjunto de ações organizadas em modelos assistenciais que visam promover a transferência do paciente de um serviço de saúde a outro de modo seguro e oportuno, facilitando a continuidade do cuidado.(1) Os programas de transição do cuidado consistem em ferramentas de gestão e permitem o atendimento concomitante dos objetivos de melhora das experiências dos pacientes, da situação de saúde e da otimização dos recursos, indo além da simples orientação para a alta.(2)
Dentre os desfechos associados a transições efetivas estão maior continuidade do cuidado, otimização dos recursos financeiros hospitalares, redução de taxas de reospitalização, diminuição do tempo de internação, maior satisfação do paciente e família e melhores desfechos de saúde.(2,3) Nesse sentido, o processo de transição do cuidado configura-se como importante barreira na prevenção de incidentes de segurança relacionados à sua continuidade. Destaca-se que a transição do cuidado consta nos objetivos estratégicos globais da Organização Mundial da Saúde para 2021-2030, no sentido de oferecer um cuidado seguro a cada etapa do processo assistencial.(4)
Apesar da importância da temática e sua influência sobre a qualidade da assistência e a segurança do paciente, no Brasil, mecanismos de transição do cuidado ainda são incipientes e a discussão na literatura sobre aspectos que envolvem a transição do cuidado é recente no país, especialmente no que se refere à população infantil. No contexto internacional, a literatura disponível acerca desta temática também é escassa e enfoca principalmente aspectos relacionados à comunicação entre os serviços e a relação entre a qualidade da transição do cuidado e novas internações.(1,5,6)
A satisfação do paciente é considerada um importante indicador da qualidade do cuidado e é entendida como uma avaliação subjetiva dada por ele frente ao confronto das suas expectativas sobre o cuidado de enfermagem e a percepção do cuidado real. Especificamente, na atenção à saúde da criança, a satisfação do paciente quanto ao cuidado de enfermagem está relacionada a aspectos como habilidades de comunicação, disponibilidade, gentileza e manejo da dor.(7)
Na internação hospitalar, os enfermeiros são os profissionais que, devido às habilidades clínicas, presença contínua e relacionamento construído, impactam de forma significativa na satisfação das necessidades do paciente e família.(7) Nesse sentido, tem destaque a Teoria das Transições, proposta por Afaf Meleis, que auxilia no entendimento dos períodos de transição pelas quais os indivíduos passam ao longo da vida, os quais podem estar relacionados ao estado de saúde, relações, habilidades ou expectativas.(8)Assim, cabe à enfermagem exercer um cuidado que permita identificar esses momentos e torná-los mais saudáveis, reiterando a importância da integralidade do cuidado.
Na busca pela compreensão de fatores que possam impactar em melhor transição do cuidado do hospital para o domicílio, destaca-se a importância de analisar como a transição está associada à satisfação com o cuidado de enfermagem, tendo em vista que esta é a categoria profissional mais representativa no contexto hospitalar, e mais próxima dos pacientes durante a internação.(7)
O objetivo deste estudo foi analisar a correlação entre qualidade da transição do cuidado na alta hospitalar de crianças e a satisfação com os cuidados de enfermagem.
Métodos
Pesquisa quantitativa, do tipo transversal. Realizada em dois hospitais de grande porte da rede pública de saúde, localizados na Região Sul do Brasil, sendo um hospital infantil e uma clínica pediátrica de um hospital geral. Os participantes foram os responsáveis de crianças admitidas nas unidades de internação das instituições. Foram convidados a participar todos os responsáveis legais de crianças internadas nas instituições, identificados por meio de visitas sistemáticas às unidades de internação, realizadas três vezes por semana, em dias alternados, durante todo o período de coleta de dados. Foram excluídos respondentes menores de 18 anos, responsáveis de crianças menores de 29 dias, transferidas a outras unidades ou instituições, que foram a óbito ou reinternadas, e aqueles que não responderam ao contato telefônico. O cálculo amostral foi realizado com o programa Winpepi®️, versão 11.65, considerando intervalo de confiança de 95%, margem de erro de 4 pontos, média de 74,7, e desvio padrão de 17,1 pontos,(9) poder de 80% e nível de significância de 5%, acrescentando-se 5% para possíveis perdas e recusas. Assim, foi calculada amostra mínima de 156 participantes. Foram utilizados três instrumentos: instrumento de caracterização dos participantes e Instrumento de Satisfação do Paciente (ISP), aplicados durante a internação hospitalar, e o Care Transitions Measure (CTM-15 Brasil), aplicado de sete a 30 dias após a alta, via telefone.
O ISP tem o objetivo de avaliar a satisfação dos pacientes em relação aos cuidados de enfermagem, envolvendo aspectos sociais e interpessoais do enfermeiro, e as competências técnicas do profissional. O instrumento possui 25 itens em escala Likert, divididos em três domínios, sendo estes: 1) Profissional; 2) Educacional; e 3) Confiança. As opções de respostas variam de um a cinco pontos, entre “concordo totalmente” e “discordo totalmente”, com uma opção neutra. Vale ressaltar que algumas questões são apresentadas de forma reversa, ou seja, quanto maior a pontuação, menos o participante concorda com a afirmação, necessitando de ajuste dos pesquisadores na formulação do escore final. A partir disso é calculada a média total, por itens e por domínios, variando de um a cinco pontos, considerando-se que quanto maior o escore, maior a satisfação do paciente.(10)
O CTM-15 Brasil foi aplicado com o intuito de avaliar a qualidade da transição do cuidado do hospital para o domicílio. Os 15 itens do instrumento são apresentados em escala Likert com cinco opções de resposta que variam de um a quatro pontos, “discordo totalmente” a “concordo totalmente”, e uma quinta opção neutra, “Não sei/Não me lembro/Não se aplica”, que não é utilizado cálculo do escore final. Os itens do instrumento são divididos em quatro fatores: 1) Preparação para o autogerenciamento; 2) Entendimento sobre medicações; 3) Preferências asseguradas; e 4) Plano de cuidado. O cálculo da média das respostas varia de um a quatro pontos. A partir disso, esse escore é transformado em uma escala linear que varia de zero a 100, por meio da fórmula: [(escore-1)/3]*100.(11) Tanto o ISP quanto o CTM-15 não possuem um ponto de corte e, em ambos os casos, quanto maior a média final, maior a satisfação do paciente e qualidade da transição do cuidado, respectivamente.(10,11)
A coleta de dados ocorreu entre fevereiro e setembro de 2019, em duas etapas. Inicialmente, durante a internação da criança e posteriormente entre sete e 30 dias após a alta via telefone. A coleta de dados foi realizada pela autora principal, e por uma estudante capacitada e acompanhada por esta. Durante a internação, todos os acompanhantes de crianças internadas foram convidados a participar, sendo explicados os objetivos e etapas da pesquisa. Em caso de aceite, foi apresentado e assinado o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), e aplicados os instrumentos de caracterização e ISP.
Na segunda etapa, foi aplicado o CTM-15 via telefone. As ligações ocorreram a partir da sala do laboratório de pesquisa, a partir de telefone pessoal. Os formulários de coleta de dados foram organizados na plataforma Google Forms®, de modo a facilitar a organização dos dados coletados, e preenchidos pelas pesquisadoras no momento da coleta. Como variáveis contínuas do estudo, tem-se a qualidade da transição do cuidado, o nível de satisfação do paciente, idade do paciente e tempo de internação, e como variáveis categóricas: sexo e presença de condição crônica. Os dados foram organizados em uma planilha do Microsoft Office Excel®, onde foram calculadas as médias e desvios padrões. Para análises inferenciais, foi utilizado o software Statistical Package for the Social Science®️ (SPSS), sendo aplicado o teste de Correlação de Spearman, com nível de significância de 95% (p<0,05), cujos valores entre 0,1 e 0,29 configuram fraca magnitude, de 0,30 a 0,49, moderada, e aqueles maiores ou iguais a 0,50, forte magnitude.
A pesquisa seguiu os preceitos éticos regidos pela Resolução 466/2012. O projeto de pesquisa foi submetido ao Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) via Plataforma Brasil, e aprovado sob Certificado de Apresentação para Apreciação Ética (CAAE) 02730018.7.0000.0121, parecer 3.400.796.
Resultados
Dos 395 pacientes convidados a participar do estudo, 73 não responderam ao contato telefônico, nove eram crianças menores de 29 dias, três foram transferidas, duas foram a óbito, duas desistiram de continuar a pesquisa, e uma foi reinternada após a alta, resultando em 305 crianças, cujos responsáveis foram incluídos no estudo. Dentre os respondentes, a maioria foram mães (n=233;76,4%), seguidas de pais (n=44;14,4%), e outros cuidadores (n=28;9,2%). A maioria das crianças era do sexo masculino (n=172;56,4%), e apresentava alguma condição crônica de saúde (n=192;62,9%). A média de idade foi de 4,4 anos (+/-4,3) e o tempo médio de internação foi de 8,6 dias (+/-10,5). No que tange à qualidade da transição do cuidado, a média final do CTM-15 Brasil foi de 87,9 (dp=13,4; IC=85,7-89,2), em uma escala de zero a 100 pontos. Os itens 9 e 14, “Compreende o que é de sua responsabilidade” e “Entende como tomar os medicamentos” tiveram a maior média. A pior foi verificada no item 15, “Entende os efeitos colaterais dos medicamentos” (Tabela 1).
Dentre os fatores do instrumento, o que apresentou maior média foi Preparação para autogerenciamento, e a menor média foi em Plano de cuidado (Tabela 2).
No que se refere à satisfação do paciente, o item 22, “Eu estou cansado do enfermeiro(a) falar comigo como se eu fosse uma pessoa inferior”, apresentou média mais alta, 4,4 (dp=1,0), portanto, foi o mais bem avaliado. A pior avaliação foi verificada no item 11, “Eu gostaria que o enfermeiro(a) me desse mais informações sobre os resultados do meu exame”, com 3,3 (dp=1,4) pontos. Todos os itens do ISP apresentaram média superior a 3,0 pontos. Dos 25 itens do instrumento, apenas cinco apresentaram média inferior a 4,0 pontos (Tabela 3).
Dentre os quatro Domínios do instrumento, a menor média foi apresentada no Domínio Educacional, com 3,9 pontos, e a maior no Domínio Profissional, com 4,2 pontos (Tabela 4).
A tabela 5 apresenta o resultado da correlação entre o escore total e por fatores do CTM-15 Brasil e a média final geral e por domínios do ISP. Foi identificada correlação de fraca magnitude entre o escore total do CTM e a média final do ISP.
Discussão
A maioria das crianças, n=192 (63,0%), incluídas no estudo apresentava alguma condição crônica. Esta frequência foi superior à apresentada em outro estudo brasileiro realizado em um hospital público, em que 42% dos pacientes menores de 17 anos apresentavam alguma comorbidade preexistente.(12) Este fato pode estar relacionado à característica dos hospitais incluídos neste estudo, pois ambos são referências estadual para diversas especialidades.
Apesar de o CTM não possuir um ponto de corte estabelecido pelos autores para valorar a qualidade da transição do cuidado, a média de 87,9 pontos pode ser considerada alta, especialmente quando comparada a outros estudos desenvolvidos nacional e internacionalmente. No Brasil, o CTM-15 foi utilizado em estudos anteriores para avaliar a qualidade da transição do cuidado em uma população de indivíduos adultos, apresentando médias de 69,5, 74,7 e 79,0.(9,11,13)
No contexto internacional, o instrumento foi aplicado em diversos países, a exemplo Suécia, Coreia do Sul, e Estados Unidos, apresentando médias que variaram de 65,8 a 80,4 na avaliação da qualidade da transição do cuidado de pacientes adultos.(14-16) Especificamente, no contexto da atenção à saúde da criança, foram verificadas médias de 78,7 e 83,7,(17,18) sugerindo melhor qualidade da transição do cuidado no contexto da atenção à saúde da criança.
A Preparação para autogerenciamento dos cuidados apresentou maior média, podendo estar relacionada às ações de educação em saúde dispensadas durante a internação hospitalar, ao envolvimento dos familiares nos cuidados diretos à criança, assim como à preocupação dos profissionais para que essas orientações fossem incorporadas.(19-22)
A transição do ambiente hospitalar para o domicílio é um dos momentos de maior vulnerabilidade para a fragmentação do cuidado. Dessa forma, a atuação do enfermeiro na educação para autogerenciamento da condição de saúde é fundamental para que ocorra a continuidade do cuidado após a alta.(1)
O Fator Plano de cuidado, cuja avaliação envolve aspectos relacionados à organização das orientações para alta hospitalar de forma documentada, garantindo clareza e efetividade na comunicação, foi o que apresentou menor média. Além disso, tendo em vista que muitas vezes tratam-se de orientações complexas, a importância do plano de cuidado deve ser reforçada e evitar que as orientações fiquem limitadas ao momento da alta.(19-23)
Em relação à satisfação do paciente, a média geral do ISP foi de 4,1, em uma escala que varia de um a cinco pontos, superior à encontrada em outros estudos desenvolvidos em hospitais públicos brasileiros, contexto semelhante ao deste estudo, apresentando médias de 3,95,(14) 3,7,(25) e 3,9.(26)
O domínio profissional do ISP, que diz respeito ao preparo e competência do enfermeiro para desenvolvimento técnico das ações de cuidado em enfermagem e saúde, apresentou a maior média. O domínio com menor média foi o educacional, que está relacionado às habilidades do enfermeiro nas ações de orientação dos pacientes.(26) Este padrão também se repetiu em outros estudos brasileiros, em que o domínio profissional foi o mais bem avaliado, e o domínio educacional foi o que obteve pior avaliação.(24-27)
Apesar de ter apresentado a menor média, o domínio educacional do ISP apresentou correlação com o escore total do CTM-15, e com seus domínios 1 e 4, Preparação para autogerenciamento e Plano de cuidado, atividades que requerem habilidades de comunicação e orientação do paciente e família na transição do cuidado. A literatura aponta que o sentimento de preparo para vivenciar a transição do cuidado é relacionada à educação em saúde que os pais recebem durante a internação hospitalar, o que propicia uma transição com maior segurança, cabendo aos profissionais identificar e intervir sobre aspectos que possam influenciar sobre a compreensão dos cuidados.(1,13)
Nesse sentido, destaca-se a importância da educação em saúde realizada pelo profissional de enfermagem que favorece e facilita a transição do cuidado. Através das orientações em saúde, o enfermeiro oferece suporte e conhecimento acerca da prevenção de doenças e agravos, promoção e manutenção da saúde, permitindo qualificar a transição do cuidado e propiciando a continuidade dos cuidados em ambiente domiciliar.(1,28,29)
Foi verificada fraca correlação entre o CTM-15 e o ISP, tanto nas associações entre médias gerais quando naquelas entre fatores e domínios dos instrumentos, indicando que possam existir outros fatores que influenciam na qualidade da transição do cuidado. Contudo, estudo anterior realizado com pacientes adultos identificou maiores escores de qualidade da transição do cuidado em pacientes satisfeitos com o atendimento hospitalar.(16)
A fraca associação entre as duas variáveis sugere que a satisfação com os cuidados de enfermagem não é suficiente para melhorar a experiência de transição do cuidado. Assim, o papel da equipe multidisciplinar é fundamental nos cuidados de transição ao paciente e familiares, participando de ações como orientações para alta e educação do paciente e família quanto aos cuidados, e planejamento de metas para o tratamento considerando as preferências do paciente.(13,30,31)
Em pesquisas sobre a avaliação da transição do cuidado, pontua-se a possibilidade do viés de agradecimento, em que a relação construída ao longo da internação com os profissionais poderia impedir respostas sinceras dos participantes. Assim, o participante poderia refletir indevidamente sobre qual seria a resposta certa, escolhendo a que julgasse que mais agradaria ao entrevistador, o que impactaria sobre o resultado obtido.(32) Os resultados sugerem que os valores satisfatórios de qualidade da transição do cuidado encontrados podem ter sofrido pouca influência de possíveis vieses de gratidão e que a qualidade da transição do cuidado pode ser influenciada por múltiplos fatores.
Embora este estudo não tenha evidenciado forte associação entre os valores apresentados pelo CTM-15 e o ISP, são necessárias novas pesquisas, especialmente no que tange à abrangência de outras populações, possibilitando maior compreensão dos fatores que influenciam a qualidade da transição do cuidado.
O contexto restrito da pesquisa, sendo dois hospitais da mesma região, pode caracterizar uma limitação desta pesquisa, sendo necessários novos estudos em diferentes contextos e populações mais abrangentes que possam reforçar os achados deste estudo. Apesar das limitações identificadas na pesquisa, estes achados podem contribuir em futuros estudos que busquem avaliar a transição do cuidado utilizando o CTM-15 Brasil, reforçando a compreensão na utilização do instrumento.
Conclusão
O estudo buscou analisar a correlação entre a qualidade da transição do cuidado e a satisfação do paciente quanto aos cuidados de enfermagem na alta hospitalar de crianças. Tanto a qualidade da transição do cuidado quanto a satisfação do paciente apresentaram valores significativos quando comparados a outros estudos, no contexto nacional e internacional. Contudo, a correlação entre seus valores foi de fraca magnitude, o que pode indicar que a qualidade da transição do cuidado seja influenciada por múltiplos fatores. Os achados sugerem ainda que um possível sentimento de gratidão pelos participantes sobre os cuidados recebidos não exerceria forte influência na avaliação da qualidade da transição do cuidado percebida pelos familiares. Isso reforça a viabilidade da utilização do CTM-15 Brasil para fins da avaliação da qualidade da transição do cuidado do hospital para o domicílio.
Agradecimentos
O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – Brasil (CAPES) – Código de Financiamento 001.
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Editado por
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Editor Associado (Avaliação pelos pares): Denise Miyuki Kusahara. (https://orcid.org/0000-0002-9498-0868). Escola Paulista de Enfermagem, Universidade Federal de São Paulo, SP, Brasil
Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
06 Fev 2023 -
Data do Fascículo
2023
Histórico
-
Recebido
28 Out 2021 -
Aceito
29 Ago 2022