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Muito além do excepcionalismo da teoria da modernização: a crise da democracia nos Estados Unidos e o autoritarismo como gramática da modernidade política

RESENHA: LEVITSKY, Steven; ZIBLATT, Daniel. . Como salvar a democracia. Rio de Janeiro: Zahar, 2023.

Os Estados Unidos possuem uma das democracias mais antigas do mundo, que seria o exemplo máximo da modernidade política e se constituiria como antípoda do Brasil tradicional ou, no máximo, semitradicional (DaMatta, 2020DAMATTA, Roberto. Você sabe com quem está falando? Estudos sobre o autoritarismo brasileiro. Rio de Janeiro: Rocco, 2020.). Essa diferença essencial foi difundida no país nas décadas de 1950 e 1960 por meio da teorização da modernização. Para tanto, Talcott Parsons (1974)PARSONS, Talcott. O sistema das sociedades modernas. São Paulo: Pioneira, 1974. foi crucial para a reprodução de uma imagem idealizada da sociedade americana, uma vez que a modernidade constituída na Europa teria seu fim mais bem acabado nos Estado Unidos dos anos 1950. Através dos padrões variáveis (pattern variables) todas as sociedades chegariam à modernidade estruturada por secularização e igualdade social (Domingues, 2001DOMINGUES, José Maurício. A sociologia de Talcott Parsons. Niterói: Editora UFF, 2001.). O Brasil, por sua vez, teria o domínio do primitivo, pessoal e corrupto como marcas essenciais de sua sociedade patrimonialista (Souza, 2015SOUZA, Jessé. A tolice da inteligência brasileira ou como o país se deixa manipular pela elite. São Paulo: Leya, 2015., p. 25). Parsons, portanto, instituiu o discurso hegemônico sobre os Estados Unidos ao qual ainda somos fortemente ligados (Tavolaro, 2014TAVOLARO, Sérgio. A tese da singularidade brasileira revisitada: desafios teóricos contemporâneos. Dados - Revista de Ciências Sociais, Rio de Janeiro, v. 57, n. 3, p. 633-673, 2014.).

Depois da publicação de Como as democracias morrem (2018), Steven Levitsky e Daniel Ziblatt produziram uma continuação aprofundada em Como salvar a democracia, pois buscam explicar como os Estados Unidos chegaram à crise democrática, e, conjuntamente, propor alternativas para enfrentá-la e superá-la. Apresentarei os elementos principais do livro, que é organizado em um prefácio à edição brasileira, introdução e oito capítulos. Na parte final, tecerei alguns comentários sobre a obra resenhada.

No prefácio à edição brasileira, Levitsky e Ziblatt pontuam que Estados Unidos e Brasil tomaram caminhos paralelos até o dia 8 de janeiro em Brasília, isto é, apontam similaridades com o que ocorreu na invasão do Capitólio. Apesar da similitude, no caso dos Estados Unidos a ameaça à democracia permanece firme, uma vez que Donald Trump tem chances reais de vitória nas eleições presidenciais de 2024.

Os autores argumentam que o objetivo central do livro é sustentar como os políticos semileais - políticos tradicionais que toleram, ajudam e protegem os autoritários - têm o protagonismo como agentes de destruição da democracia - como os republicanos nos Estados Unidos -, cujas ações têm por fim barrar a constituição de uma democracia multirracial, fator determinante para uma efetiva democracia no século XXI.

Na introdução, são expostas as ações nos Estados Unidos contra a constituição da democracia multirracial, isto é, a reação autoritária contra a diversidade étnica como base principal da particularidade da crise democrática capitaneada pelos republicanos. Além de explicitar os responsáveis pelo ataque à democracia e sua causa, também fazem o questionamento que responderão ao longo do livro, ou seja, como as falhas na constituição escrita mais antiga do mundo foram decisivas para que uma minoria extremista conquistasse o poder.

No primeiro capítulo, são apresentados os elementos centrais para a manutenção da democracia e, em sentido contrário, para a ruptura democrática. O primeiro deles é a aceitação da derrota eleitoral que, quando existe, permite à democracia estabelecer raízes e normalizar a alternância do poder (Levitsky; Ziblatt, 2023LEVITSKY, Steven ; ZIBLATT, Daniel. Como salvar a democracia. Rio de Janeiro: Zahar, 2023., p. 32). O que leva à ruptura, por outro lado, é o medo de perder e não voltar ao poder no futuro. Em decorrência, são realizadas ações para não acatar os resultados eleitorais. Para o primeiro caso, os autores trazem o exemplo dos peronistas na Argentina na década de 1980, cuja aceitação da derrota foi decisiva para consolidar a democracia no país.

No segundo sentido, expõem o caso da Tailândia que sucumbiu a um golpe militar no século XXI apoiado por políticos semileais que lutaram pela democracia nos anos 1990. A partir do caso tailandês, sustentam que o medo de perder o poder político - e a posição de domínio na sociedade - se torna o motivo para a guinada ao autoritarismo (Levitsky; Ziblatt, 2023LEVITSKY, Steven ; ZIBLATT, Daniel. Como salvar a democracia. Rio de Janeiro: Zahar, 2023., p. 42).

No segundo capítulo, Levitsky e Ziblatt prosseguem a discussão sobre como as ações dos políticos semileais foram decisivas para a subversão da democracia a partir das regras constitucionais. Para tanto, aduzem os casos da aceitação do nazismo pelos franceses na década de 1940, da Tailândia, do Peru e da Índia. A semilealdade banaliza o autoritarismo (Levitsky; Ziblatt, 2023LEVITSKY, Steven ; ZIBLATT, Daniel. Como salvar a democracia. Rio de Janeiro: Zahar, 2023., p. 56). Nesse sentido, chamam a atenção para o jogo duro constitucional - criação e aplicação seletiva da lei - que pode, de maneira tecnicamente legal, destituir a democracia pela legitimação da autocracia com roupagem constitucional (Levitsky; Ziblatt, 2023LEVITSKY, Steven ; ZIBLATT, Daniel. Como salvar a democracia. Rio de Janeiro: Zahar, 2023., p. 62). O caso da Hungria de Viktor Orbán, por sua vez, é exposto como modelo exemplar de formação da autocracia por dentro.

No terceiro capítulo, os autores voltam-se à história americana para, por meio dela, explicar como os republicanos abandonaram a democracia. O capítulo é iniciado com a abordagem do caso de Wilmington, maior cidade do estado da Carolina do Norte, que era majoritariamente negra, e onde houve um indício de democracia multirracial. Os republicanos eram democráticos, respeitavam e defendiam os direitos civis da população negra. Os democratas, por sua vez, tinham um comportamento autoritário, violento, efetivado por meio de fraudes, golpes e restrição do voto por supremacistas brancos. Além das ações violentas, os democratas utilizaram o jogo duro constitucional para, por meio de bases legais, instituir barreiras para o voto dos negros e minar a democracia na Carolina do Norte. A partir das ações autoritárias dos democratas, houve a exclusão dos negros e o domínio de quase um século do autoritarismo no Sul dos Estados Unidos.

No quarto capítulo, o foco está voltado para a explicação das causas que fizeram com que os republicanos abandonassem a democracia que, historicamente, haviam defendido. Antes, contudo, os autores explicam os fatores que fizeram o Partido Democrata tornar-se força progressista. Para tanto, a ala democrata liberal enfrentou a facção conservadora do Sul para se tornar a principal defensora dos direitos civis, quase um século depois da Reconstrução, que significou a segunda fundação do país. No ano de 1964, houve a Lei dos Direitos Civis e, em 1965, a Lei dos Direitos de Voto, que representaram a terceira fundação dos Estados Unidos, bem como houve a instituição das bases da democracia multirracial (Levitsky; Ziblatt, 2023LEVITSKY, Steven ; ZIBLATT, Daniel. Como salvar a democracia. Rio de Janeiro: Zahar, 2023., p. 92). Para essas ações de democratização os partidos Democrata e Republicano foram decisivos.

Em 2021, contudo, o Partido Republicano voltou-se contra a democracia (Levitsky; Ziblatt, 2023LEVITSKY, Steven ; ZIBLATT, Daniel. Como salvar a democracia. Rio de Janeiro: Zahar, 2023., p. 93). Esse compromisso foi rompido pelos republicanos como reação às bases da democracia multirracial que ajudaram a instituir. A partir dos anos 1950, o Partido Republicano foi se estabelecendo como o partido do homem branco, baseado em um forte conservadorismo racial (Levitsky; Ziblatt, 2023LEVITSKY, Steven ; ZIBLATT, Daniel. Como salvar a democracia. Rio de Janeiro: Zahar, 2023., p. 97). Por outro lado, os Estados Unidos se tornaram menos cristãos e mais diversificados em termos étnicos e religiosos. Como consequência, os norte-americanos adotaram princípios básicos da democracia multirracial (Levitsky; Ziblatt, 2023LEVITSKY, Steven ; ZIBLATT, Daniel. Como salvar a democracia. Rio de Janeiro: Zahar, 2023., p. 101).

Como reação à diversidade, os autores nos apresentam os casos da Carolina do Norte e do Texas, onde a guerra jurídica foi utilizada através das leis de identificação do voto, que tinham como objetivo real limitar a participação dos eleitores de baixa renda e de grupos minoritários (Levitsky; Ziblatt, 2023LEVITSKY, Steven ; ZIBLATT, Daniel. Como salvar a democracia. Rio de Janeiro: Zahar, 2023., p. 108). Assim, o partido tornou-se representante da maioria branca e cristã, cujo objetivo passou a tornar o cristianismo branco dominante (Levitsky; Ziblatt, 2023LEVITSKY, Steven ; ZIBLATT, Daniel. Como salvar a democracia. Rio de Janeiro: Zahar, 2023., p. 111).

A Presidência de Donald Trump teve o papel de acelerar o processo de radicalização do Partido, pois sua vitória representou o êxito da política identitária branca de ressentimento contra as mudanças demográficas. Trump foi o primeiro presidente da história do país a não aceitar os resultados eleitorais, assim como a maioria do seu partido (Levitsky; Ziblatt, 2023LEVITSKY, Steven ; ZIBLATT, Daniel. Como salvar a democracia. Rio de Janeiro: Zahar, 2023., p. 117). Depois da invasão do Capitólio, o mais grave ataque à democracia dos Estados Unidos, o apoio ao ex-presidente foi mantido, o que atesta a banalização do autoritarismo.

No quinto capítulo, os autores enunciam os elementos que fazem com que os republicanos, mesmo sendo minoria, consigam acumular muito poder a ponto de vetar as mudanças progressistas e se tornarem uma grande ameaça à democracia. Mesmo apontando que a democracia necessita de algum grau de contramajoritarismo, um regime que não conceda espaço para as maiorias não é uma efetiva democracia, como nos Estados Unidos, onde as instituições são demasiadamente contramajoritárias. Para tanto, há mecanismos institucionais de veto, como a regra da supermaioria no Senado - o filibuster -, que possibilita à minoria impor suas preferências à maioria legislativa (Levitsky; Ziblatt, 2023LEVITSKY, Steven ; ZIBLATT, Daniel. Como salvar a democracia. Rio de Janeiro: Zahar, 2023., p. 135).

Paralelamente, os direitos constitucionais são mal definidos e desigualmente protegidos (Levitsky; Ziblatt, 2023LEVITSKY, Steven ; ZIBLATT, Daniel. Como salvar a democracia. Rio de Janeiro: Zahar, 2023., p. 131). A dificuldade de reformar a Constituição, que foi promulgada no período pré-democrático, juntamente com o Colégio Eleitoral, uma relíquia medieval, também são fatores decisivos para manter o poder entre os republicanos (Levitsky; Ziblatt, 2023LEVITSKY, Steven ; ZIBLATT, Daniel. Como salvar a democracia. Rio de Janeiro: Zahar, 2023., p. 153). A abordagem sobre as barreiras institucionais é crucial para a sustentação dos elementos que balizam o domínio republicano e da tese sobre a existência da dualidade população-instituições, isto é, o choque entre a maioria democrática da população e as instituições autoritárias (Levitsky; Ziblatt, 2023LEVITSKY, Steven ; ZIBLATT, Daniel. Como salvar a democracia. Rio de Janeiro: Zahar, 2023., p. 154).

No sexto capítulo, Levitsky e Ziblatt prosseguem a argumentação do capítulo anterior ao defenderem que as instituições americanas estão presas ao passado. Nesse sentido, os Estados Unidos possuem uma versão própria do contramajoritarismo sutil: “Como resultado disso, o viés constitucional pró-estado pequeno, que se tornou um viés pró-rural no século XX, no século XXI se transformou num viés partidário” (Levitsky; Ziblatt, 2023LEVITSKY, Steven ; ZIBLATT, Daniel. Como salvar a democracia. Rio de Janeiro: Zahar, 2023., p. 160).

O Senado, por exemplo, é uma instituição que representa 20% do país, isto é, os estados pouco povoados conseguem estabelecer maioria na Casa legislativa. E os estados pequenos, por sua vez, com apenas 11% da população, conseguem obstruir projetos de leis por meio do filibuster (Levitsky; Ziblatt, 2023LEVITSKY, Steven ; ZIBLATT, Daniel. Como salvar a democracia. Rio de Janeiro: Zahar, 2023., p. 163). Como consequência, em nenhum momento do século XXI, os republicanos representaram a maioria da população (Levitsky; Ziblatt, 2023LEVITSKY, Steven ; ZIBLATT, Daniel. Como salvar a democracia. Rio de Janeiro: Zahar, 2023., p. 164).

O terceiro elemento do governo de minoria é a Suprema Corte, que possui forte influência partidária republicana (Levitsky; Ziblatt, 2023LEVITSKY, Steven ; ZIBLATT, Daniel. Como salvar a democracia. Rio de Janeiro: Zahar, 2023., p. 164). No caso do aborto, por exemplo, a Suprema Corte foi de encontro à vontade popular. Como consequência da formatação antidemocrática das instituições contramajoritárias, não há defesa de políticas de combate à pobreza e de cunho significativamente redistributivo em suas fileiras. Contudo, os republicanos necessitam criar maiorias eleitorais para que o país não fique propenso a crises e retrocessos no século XXI (Levitsky; Ziblatt, 2023LEVITSKY, Steven ; ZIBLATT, Daniel. Como salvar a democracia. Rio de Janeiro: Zahar, 2023., p. 180).

No sétimo capítulo, os autores têm como propósito sustentar o caráter particular e desviante dos Estados Unidos com relação à democracia ao compará-la a outros exemplos históricos. Para tanto, expõem os casos da Noruega, que seguiu a Constituição dos Estados Unidos, da Polônia, da França e da Inglaterra, que reformaram suas instituições e se democratizaram. Essas sociedades conseguiram eliminar o contramajoritarismo, consolidando a democracia. Ao contrário dos exemplos supracitados, os Estados Unidos mantiveram suas instituições contramajoritárias, como pode ser comprovado pela eleição indireta do presidente pelo Colégio Eleitoral, os mandatos vitalícios dos membros da Suprema Corte e a grande dificuldade em reformar a Constituição (Levitsky; Ziblatt, 2023LEVITSKY, Steven ; ZIBLATT, Daniel. Como salvar a democracia. Rio de Janeiro: Zahar, 2023., p. 204). Como consequência, a maior potência global tornou-se um retardatário democrático.

No último capítulo, os autores propõem reformas que possam democratizar a democracia americana. Para tanto, preconizam algumas medidas para garantir a vontade eleitoral da maioria da população, como a preservação do direito de voto, a reforma do Senado, a limitação do mandato dos ministros da Suprema Corte e o estímulo à reforma constitucional. Apenas com as reformas haverá um acerto de contas com o passado pouco democrático, de modo a proporcionar liberdade e justiça para todos (Levitsky; Ziblatt, 2023LEVITSKY, Steven ; ZIBLATT, Daniel. Como salvar a democracia. Rio de Janeiro: Zahar, 2023., p. 231), isto é, instituir uma efetiva democracia multirracial no país.

O livro resenhado oferece uma interpretação consistente da crise da democracia norte-americana - pois teórica e historicamente informada. Nesse sentido, aprofunda a discussão estabelecida no livro anterior sobre a crise do sistema político norte-americano com a ascensão de Donald Trump à Presidência dos Estados Unidos (Levitsky e Ziblatt, 2018LEVITSKY, Steven ; ZIBLATT, Daniel. Como as democracias morrem. Rio de Janeiro: Zahar, 2018.), pois estabelece a democracia multirracial como dimensão decisiva para compreensão da crise da democracia norte-americana, bem como defende sua importância decisiva para o estabelecimento de uma efetiva democracia no século XXI.

Por conseguinte, torna-se uma literatura necessária para se contrapor à idealização da modernidade política, difundida pela teoria da modernização, e que ainda é central para a reprodução, entre interpretações do Brasil, do imaginário político sobre os Estados Unidos ao se comparar com a pré-modernidade e singularidade do autoritarismo brasileiro - essencialmente distinto da democracia. O livro resenhado, por sua vez, nos mostra o lado concreto das instituições modernas (Domingues, 2021DOMINGUES, José Maurício. Teoria crítica e modernidade política. São Paulo/Rio de Janeiro: Hucitec/PUC-Rio, 2021.), que contém desigualdade, exclusão, dominação e irresponsabilidade (Domingues, 2009DOMINGUES, José Maurício. A América Latina e a modernidade contemporânea: uma interpretação sociológica. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2009.).

A partir da leitura ambivalente da modernidade política é possível também compreender o alcance global de produções da periferia como a teorização de Wanderley Guilherme dos Santos (2017)SANTOS, Wanderley Guilherme. A democracia impedida: o Brasil no século XXI. Rio de Janeiro: FGV Editora, 2017., uma vez que os elementos que possibilitam o golpe parlamentar estão presentes no que os autores denominam de jogo duro constitucional. Santos rompe com a visão etnocêntrica de que o golpe parlamentar seria a confirmação de um reiterado autoritarismo que marcaria atavicamente o sistema político brasileiro (Ribeiro; Dutra; Martins, 2022RIBEIRO, Marcos Abraão; DUTRA, Roberto; MARTINS, Maro Lara. Para além do atraso e singularidade: a atualidade do pensamento social e político brasileiro. Terceiro Milênio - Revista Crítica de Sociologia e Política, Rio de Janeiro, v. 18, n. 1, p. 7-28, 2022., p. 18). Assim, afasta-se das intepretações do Brasil que procuram compreender o autoritarismo como um fenômeno político avesso à democracia, como são os casos de DaMatta (2020)DAMATTA, Roberto. Você sabe com quem está falando? Estudos sobre o autoritarismo brasileiro. Rio de Janeiro: Rocco, 2020. e Schwarcz (2019)SCHWARCZ, Lilia Moritz. Sobre o autoritarismo brasileiro. São Paulo: Companhia das Letras, 2019..

Como decorrência, a teorização do autor sobre o golpe parlamentar tem no país uma unidade de análise para compreender um fenômeno político moderno, global e intrínseco ao sistema democrático representativo. A teorização de Santos não está presa ao nacionalismo metodológico presente nas interpretações do Brasil que demarcam o lado autocrático como algo singular do país e a democracia como télos de desenvolvimento, cuja instituição seria tributária da superação de nosso atraso político (Dutra; Ribeiro, 2021DUTRA, Roberto; RIBEIRO, Marcos Abraão. Existe um autoritarismo brasileiro? Uma interpretação alternativa à tese da singularidade política nacional. Revista Brasileira de Sociologia, Porto Alegre, v. 9, n. 22, p. 246-273, 2021., p. 248).

Santos, portanto, produz teoria política a partir da periferia, cuja globalidade fica bem evidenciada quando comparamos com o trabalho dos cientistas políticos norte-americanos. Como os autores do livro resenhado, Santos constrói uma teorização que confirma a tese de Ahlers e Stichweh (2019)AHLERS, Anna. L.; STICHWEH, Rudolf. The bipolarity of democracy and authoritarianism: value patterns, inclusion roles and forms of internal differentiation of political systems. Sociologia e Antropologia, Rio de Janeiro, v. 9, n. 3, p. 819-846, 2019. sobre a bipolaridade da modernidade política entre autocracia e democracia. Assim, o livro resenhado também contribui para sustentar a globalidade da teorização brasileira no campo da teoria política.

  • AHLERS, Anna. L.; STICHWEH, Rudolf. The bipolarity of democracy and authoritarianism: value patterns, inclusion roles and forms of internal differentiation of political systems. Sociologia e Antropologia, Rio de Janeiro, v. 9, n. 3, p. 819-846, 2019.
  • DAMATTA, Roberto. Você sabe com quem está falando? Estudos sobre o autoritarismo brasileiro. Rio de Janeiro: Rocco, 2020.
  • DOMINGUES, José Maurício. A sociologia de Talcott Parsons. Niterói: Editora UFF, 2001.
  • DOMINGUES, José Maurício. A América Latina e a modernidade contemporânea: uma interpretação sociológica. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2009.
  • DOMINGUES, José Maurício. Teoria crítica e modernidade política. São Paulo/Rio de Janeiro: Hucitec/PUC-Rio, 2021.
  • DUTRA, Roberto; RIBEIRO, Marcos Abraão. Existe um autoritarismo brasileiro? Uma interpretação alternativa à tese da singularidade política nacional. Revista Brasileira de Sociologia, Porto Alegre, v. 9, n. 22, p. 246-273, 2021.
  • LEVITSKY, Steven ; ZIBLATT, Daniel. Como as democracias morrem. Rio de Janeiro: Zahar, 2018.
  • LEVITSKY, Steven ; ZIBLATT, Daniel. Como salvar a democracia. Rio de Janeiro: Zahar, 2023.
  • PARSONS, Talcott. O sistema das sociedades modernas. São Paulo: Pioneira, 1974.
  • RIBEIRO, Marcos Abraão; DUTRA, Roberto; MARTINS, Maro Lara. Para além do atraso e singularidade: a atualidade do pensamento social e político brasileiro. Terceiro Milênio - Revista Crítica de Sociologia e Política, Rio de Janeiro, v. 18, n. 1, p. 7-28, 2022.
  • SANTOS, Wanderley Guilherme. A democracia impedida: o Brasil no século XXI. Rio de Janeiro: FGV Editora, 2017.
  • SCHWARCZ, Lilia Moritz. Sobre o autoritarismo brasileiro. São Paulo: Companhia das Letras, 2019.
  • SOUZA, Jessé. A tolice da inteligência brasileira ou como o país se deixa manipular pela elite. São Paulo: Leya, 2015.
  • TAVOLARO, Sérgio. A tese da singularidade brasileira revisitada: desafios teóricos contemporâneos. Dados - Revista de Ciências Sociais, Rio de Janeiro, v. 57, n. 3, p. 633-673, 2014.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    06 Set 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    25 Fev 2024
  • Aceito
    22 Abr 2024
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