Open-access Estado e sociedade no Brasil: um encontro adiado com a democracia

RESUMO

Três momentos decisivos das relações entre Estado e sociedade no pensamento social e político são abordados: no Império, o debate entre Tavares Bastos e o Visconde do Uruguai; na Primeira República, Oliveira Vianna é o autor central; na transição da ditadura civil-militar de 1964-1985 para a democracia, Raymundo Faoro e Florestan Fernandes são incontornáveis. Se no primeiro momento o debate sobre centralização e descentralização política concentra os interesses, no segundo a questão da adequação das instituições políticas à sociedade é o grande tema; mas, já no terceiro momento, o enfrentamento do problema da democracia nas relações entre Estado e sociedade não poderia ser mais adiado. Traçando esse histórico, no Bicentenário da Independência, queremos repensar impasses dessas relações que permanecem em aberto no presente.

PALAVRAS-CHAVE: Estado e sociedade; Pensamento social e político; Bicentenário da Independência

ABSTRACT

Three decisive moments in the relations between State and society in social and political thought are discussed: the Empire, with the debate between Tavares Bastos and the Viscount of Uruguay; the First Republic, when Oliveira Vianna is the central author; and the transition from the civil-military dictatorship of 1964-1985 to democracy, where Raymundo Faoro and Florestan Fernandes are inescapable. If in the first moment the debate about political centralization and decentralization concentrates various ongoing interests, in the second the question of the adequacy of political institutions to society is the main theme; and in the third moment confronting the problem of democracy in the relations between State and society could no longer be postponed. By outlining this historical framework on the Bicentennial of Independence, we want to rethink the deadlocks in the relations between State and society that remain relevant in the present.

KEYWORDS: State and society; Political and social thought; Bicentennial of Independence

“De tudo ficaram três coisas: a certeza de que ele estava sempre começando, a certeza de que era preciso continuar e a certeza de que seria interrompido antes de terminar.”

(Fernando Sabino, O encontro marcado, 1956)

No prefácio que escreveu especialmente para a edição brasileira de um dos seus livros, Charles Tilly (1996, p.37) afirma que o programa sociológico crucial para pesquisadores “não europeus” da construção nacional seria hoje o de entender de que modo “a exportação de estruturas europeias de Estado produziram Estados tão diferentes em regiões de colonização europeia”. Programa para cuja boa execução o importante, como enfatiza o autor, não é “aplicar mecanicamente modelos europeus, mas examinar os tipos de causas e efeitos que produziram coisas diferentes quando foram aplicados nos ambientes distintivos” (ibidem, p.40).

As tensões imprimidas pela burocratização, racionalização e nacionalização da autoridade pública do Estado, bem como pela formação de uma solidariedade social correspondente, progressivamente incorporada na ideia de nação, sobre a dinâmica da vida social sempre estiveram presentes no pensamento social e político brasileiro. Mais do que isso, na verdade, elas estruturaram a formação de uma reflexão mais ampla e criativa sobre as relações entre Estado e sociedade no Brasil que nem sempre se limitou a repetir sem diferenças os modelos europeus e, nos melhores casos, desafiou a geopolítica do conhecimento que divide sociedades em produtoras e consumidoras de teoria. Numa sociedade de matriz colonial como a brasileira, de alguma forma, não se precisou esperar pela intensificação dos debates sobre a globalização para se compreender que o Estado-nação, afinal, não era uma experiência universal ou um resultado “natural” da dinâmica societária (Wagner, 1994, p.73), mas antes, uma forma muito específica e contingente de articulação entre autoridade e solidariedade social.

Poucos elementos foram tão problematizados no pensamento brasileiro como as relações entre Estado e sociedade no Brasil; elas despertaram o interesse e exigiram a atenção concentrada de intelectuais, construtores do Estado e atores políticos em geral de diferentes orientações teóricas e ideológicas e em diferentes momentos. Nesse sentido, a reflexão sobre essas relações forjou uma espécie de vezo ou de linha de continuidade nas intepretações do Brasil que até hoje impressiona. Foi também um legado ativamente assumido pelas ciências sociais brasileiras que, de perspectivas próprias, vêm esquadrinhando o fenômeno por diferentes ângulos empíricos, históricos e também teóricos.1

O Bicentenário da Independência é um convite para rever o debate sobre as relações entre Estado e sociedade no Brasil, um processo relativamente longo (sobretudo para as ciências sociais em geral e cada vez mais concentradas na análise do presente) e mais acidentado do que em geral se considera, para repensar recriações e impasses dessas relações também para a democracia que, em grande medida, seguem em aberto no presente. Não será por mero acaso histórico, ainda, que a essa comemoração venha se juntar outra, a do centenário da Semana de Arte Moderna, realizada em São Paulo em fevereiro de 1922. Sobretudo se entendermos o modernismo de um ponto de vista sociológico como um movimento cultural, isto é, como uma ação coletiva que disputa o controle cultural pela mudança da sociedade (Botelho; Hoelz, 2022 ), percebe-se como ele compreende ao menos dois problemas centrais referentes às relações entre Estado e sociedade. Primeiro, o modernismo foi um movimento de forte mobilização coletiva de identidades que também implicou processos simbólicos violentos de domesticação da diversidade regional e desigualdades sociais numa identidade nacional unitária. Segundo, o modernismo coloca em debate a questão da persistente dependência cultural que sobreviveu à independência política, de 1822, encetando uma reflexão potente sobre os impasses da modernidade, de que os chamados ensaios de interpretação do Brasil dos anos 1920 e 1930 são algumas das melhores expressões (Ferreira; Botelho, 2010). Não por acaso, talvez, as relações entre público e privado como impasses da relação entre Estado e sociedade estiveram também no centro desses ensaios, a exemplo de Raízes do Brasil (Holanda, 2016).

Assim, os últimos 100 anos são, na verdade, os decisivos para que se possa rediscutir o Estado-nação, pois foi neles que a própria relação, representada pelo hífen, entre o polo da autoridade pública, encarnado no Estado, e o polo da solidariedade social, na nação, enfim, se coloca como um problema, uma necessidade, um desafio. Ao se tornar politicamente independente, em 1822, o Brasil se tornou formalmente um Estado livre, o que implicou um processo interno de centralização política, administrativa e burocrática, além de nacionalização da vida social e da autoridade pública, mas, não necessariamente, um Estado-nação. Durante o Império (1822-1889) o sentimento de pertencimento à comunidade política foi minuciosamente construído tanto pela condição de súditos da Coroa quanto por uma ideia de liberdade em oposição ao escravizados, base da sociedade. Com a maior parte da população excluída dos direitos civis e políticos, a construção do Estado imperial sequer mobilizou um sentido forte de nacionalidade (Carvalho, 1990; Schwarcz, 1998). Nesse sentido, a Abolição e a República instauram uma crise intensa alargando e tornando ainda mais abstrata e problemática a noção de cidadania. Elas dão início ao longo processo de cultivo de novos sentimentos de pertencimento e de mobilização política de identidade nacional entre os brasileiros que passaram a se tornar formalmente cidadãos livres (Carvalho, 2004; Botelho; Schwarcz, 2012 ). Em grande medida, a obsessão pela cultura brasileira que marca os anos 1920-1940 relaciona-se, de várias maneiras, ao tema da nacionalização da vida social, da formação da nação como forma de solidariedade social.

As ciências sociais em formação no Brasil dos anos 1930-1940 mostraram-se, porém, menos interessadas em questões de identidade nacional do que em certos impasses tenazes da relação entre Estado e sociedade. Poucos elementos foram tão tematizados no pensamento social e nas ciências sociais brasileiras do que o baralhamento entre público e privado, um fenômeno recorrente na longa e problemática nacionalização da vida social brasileira ou na conversão da nossa sociedade de matriz colonial num moderno Estado-nação. Nesse sentido, pode-se dizer que é para a própria relação entre Estado e sociedade que se voltam crescentemente os interesses das ciências sociais até o ponto de, em torno dos 1970-1980, entre a ditadura civil-militar (1964-1985) e a transição para a democracia, a questão democrática se impor e passar a pautar a própria reflexão sobre as relações entre Estado e sociedade. É nesse contexto que categorias como “patrimonialismo” e “autocracia” ganham o centro do debate, expressando o caráter antidemocrático das relações entre Estado e sociedade no Brasil.

A riqueza do debate sobre Estado e sociedade no pensamento brasileiro justamente traz, porém, dificuldades praticamente intransponíveis para qualquer visão mais sintética dos últimos 200 anos, dadas a extensão, a variedade do repertório e as diferenças de contexto e também analíticas das categorias que foram sendo forjadas sobre o tema. Na tentativa de dar ao menos uma ideia da abrangência, da diversidade e dos alcances teóricos e políticos do debate sobre Estado e sociedade, no lugar de um panorama mais fragmentado, como forçosamente seria o caso aqui, escolhemos trabalhar três momentos decisivos que perpassam o debate. O primeiro está concentrado no Estado e fortemente marcado pela questão da centralização e descentralização política que ocupou o que havia de melhor no debate intelectual e político do Império (1822-1889), a partir de Tavares Bastos e o visconde do Uruguai. No segundo momento, a partir da Primeira República (1889-1930), mas, na verdade, com consequências decisivas também para todo o ciclo modernizador e autoritário que se segue à Revolução de 1930, o debate está marcado pelo retorno da sociedade, especialmente concentrado na questão da adequação ou não das instituições à sociedade, que se passa a escrutinar de diversos ângulos. Nenhum outro autor se destaca nesse período como Oliveira Vianna. O terceiro momento, embora possa ser recuperado em todo o trajeto das relações entre Estado e sociedade, ganhará contornos e estatuto próprios justamente no contexto da transição da ditadura civil-militar de 1964-1985, colocando o problema da democracia diretamente em questão, e não apenas tangencialmente como noutros períodos - Raymundo Faoro e Florestan Fernandes são autores incontornáveis a esse respeito.

Centralização e descentralização

O debate sobre as relações entre Estado e sociedade no Brasil ganhou uma primeira formulação importante durante o Império, na contenda em torno da organização do poder do Estado. No início da década de 1860, depois de quase duas décadas de relativa calmaria, renascia um debate sobre as bases do poder constituído, colocando em questão temas como o sistema representativo, o papel do Poder Moderador e, o que mais nos interessa aqui, o modelo de Estado mais adequado ao Brasil, na controvérsia sobre centralização e descentralização político-administrativa. Atravessam esse tema problemas fundantes e perenes da reflexão sobre o Estado-nação no Brasil: o legado histórico do passado colonial, a adequação de instituições liberais ao Brasil, a relação entre poder público e poder privado, a enorme disparidade regional brasileira. O debate entre o político conservador fluminense Paulino José Soares de Sousa (Visconde do Uruguai) e o deputado liberal alagoano Tavares Bastos revela olhares muito distintos sobre esses problemas.2

Havia um consenso, entre a elite da época, sobre o baixo nível de educação da população brasileira, particularmente no que dizia respeito à sua capacidade política, suas “virtudes cívicas”. Sobre esse ponto, o Visconde do Uruguai e Tavares Bastos estavam se acordo, assim como sobre a sua origem: o fato de o país ter sido colonizado pela monarquia centralizada portuguesa e não (hélas!) por uma nação como a Inglaterra, onde florescera o hábito do autogoverno:

Herdamos a centralização da monarquia portuguesa. Quando veio a Independência e com ela a Constituição que nos rege, saíamos da administração dos capitães-generais, dos ouvidores de comarca [...] Não tínhamos, como a formaram os ingleses por séculos, como a tiveram herdada os Estados Unidos, uma educação que nos habilitasse praticamente para nos governarmos nós mesmos; não podíamos ter adquirido os hábitos e o senso prático para isso necessários. (Uruguai, 2002, p.429)

Tavares Bastos (1975b), por sua vez, ia mais longe na sua avaliação do legado colonial, desenvolvendo, em seu panfleto “Os males do presente e as esperanças do futuro” (1861), uma crítica ácida à sociedade e à política do Portugal quinhentista, de onde haviam saído os povoadores do Brasil carregando sua “depravação moral”. A ausência de espírito público e de “atividade empreendedora” no Brasil fora, argumentava Tavares Bastos, reforçada pela forma centralizadora e egoísta com que a metrópole empreendera a colonização.

Outro ponto de concordância era a constatação da enorme diversidade regional brasileira, mas aqui o tom empregado por cada autor era diferente. Paulino de Sousa, desde seus relatórios e discursos como ministro da Justiça no começo dos anos 1840, quando estivera à frente das reformas centralizadoras do Regresso, enfatizava a diferença entre a relativa civilização do litoral e a barbárie dos sertões, especialmente nas províncias do Norte. Nos sertões pouco povoados, observava o ministro em 1841, vivia uma população que “não participa dos poucos benefícios da nossa nascente civilização [...] Constitui ela assim uma parte distinta da Sociedade do nosso litoral e de muitas das nossas povoações e distritos, e principalmente por costumes bárbaros se caracteriza” (Sousa, 1841, p.18-19 ). Na sua obra de 1862, Uruguai (2002, p.470) argumentava que as reformas liberais e descentralizadoras da Regência - tanto o Código do Processo Criminal, centrado na figura do juiz de paz eletivo, quanto o Ato Adicional, que criara as Assembleias Provinciais - não haviam considerado a heterogeneidade regional brasileira e a inexistência de uma unidade “que nasce da semelhança dos elementos sociais”.

Tavares Bastos também criticava o “vício da uniformidade” presente no Código do Processo Criminal que, segundo ele, projetara um país onde fossem uniformes os níveis de civilização, moralidade e respeito à lei. Havia disparidades entre as províncias quanto a esses quesitos. Havia “as solidões do Amazonas” e “as florestas de Mato Grosso e Goiás”, praticamente selvagens. Mas a Reforma do Código Criminal de 1841 incorrera no mesmo vício, com sinal invertido: imaginara “um país corrompido, um povo anarquizado” (Tavares Bastos, 1975a, p.112). Embora reconhecendo essas disparidades, o político alagoano não aceitava a tese da inferioridade das províncias do Norte em relação às do Sul, ao contrário. No seu livro de 1870, Tavares Bastos acusava as províncias de Rio de Janeiro, Minas Gerais e São Paulo de atrasarem o necessário avanço de medidas voltadas à emancipação da escravatura, por concentrarem um grande número de escravos. No Norte, ao contrário, várias províncias não possuíam escravos e todas praticavam o trabalho livre em larga escala. As onze províncias setentrionais, argumentava Tavares Bastos, eram as grandes vítimas do Estado centralizado em torno do Rio de Janeiro, em vários aspectos: envolvimento em guerras que pouco lhes diziam respeito, grandes prejuízos financeiros, atraso no processo de emancipação.

Um outro aspecto, pouco tocado por Tavares Bastos, mas central nos argumentos de Uruguai, era a força do poder privado e sua influência sobre a vida política e o funcionamento das instituições. Os “poderosos” que dominavam a política local eram, segundo Uruguai, movidos unicamente por interesses particulares, promovendo a desordem e o arbítrio. Descentralizar o poder significava, em um país como o Brasil, entregá-lo às paixões mesquinhas das facções nascidas nas localidades. Esse fora o erro dos liberais da Regência, que haviam tentado adaptar instituições próprias dos Estados Unidos em um país que carecia das precondições básicas para suportá-las. O argumento, aqui, seguia de perto a tópica, própria do conservadorismo, contrária à aplicabilidade universal das soluções político-institucionais: “A maior ou menor centralização ou descentralização depende muito das circunstâncias do país, da educação, hábitos e caráter nacionais, e não somente da legislação” (Uruguai, 2002, p.437). Como veremos, essa linha de pensamento seria muito forte na reflexão sobre a relação entre Estado e sociedade nas primeiras décadas do século XX.

Para Uruguai, as circunstâncias brasileiras, incluindo a grande diversidade regional, recomendavam a adoção de um modelo institucional mais próxima ao francês, com uma administração organizada hierarquicamente. Segundo o visconde, isso não implicava copiar tal modelo sem critério, permitindo e ampliando, sempre que possível, a participação dos cidadãos nos negócios específicos de sua província e município, “habituando assim o povo ao uso de uma liberdade prática, séria e tranquila” (Uruguai, 2002, p.498).

Muito mais do que o visconde, Tavares Bastos acreditava na capacidade das leis e das instituições de mudar as circunstâncias, agir sobre o povo e sua aptidão política - para o bem ou para o mal (Ferreira, 2010, p.61-2). O maior problema do Brasil, segundo ele, não derivava do atraso social herdado da colônia, e sim da adoção, a partir de 1840, de um sistema centralizado de organização do poder que eliminava a possibilidade de superar o atraso: “Negam ao país aptidão para governar-se por si, e o condenam por isso à tutela do governo. É pretender que adquiramos as qualidades e virtudes cívicas, que certamente nos faltam, sob a ação estragadora de um regime de educação política que justamente gera e perpetua os vícios opostos” (Tavares Bastos, 1975a, p.32). O exercício da liberdade política era apresentado por ele como o meio mais efetivo de aperfeiçoamento moral e político da população. A diversidade regional brasileira, apontada por Uruguai como argumento para a centralização político-administrativa, era usada por Tavares Bastos para, na trilha dos liberais radicais dos anos 1830, defender o seu modelo de monarquia federativa - que, segundo ele, permitiria uma melhor adaptação das leis às circunstâncias locais. Nessa proposta de organização do Estado, o autor alagoano fundava todo o seu projeto de reformas destinadas a promover o desenvolvimento “material e moral” do país: liberdade econômica, ensino público, abolição gradual da escravidão, incentivo à imigração.

Com recorte fortemente político-institucional, muito centrado no tema do Estado e de sua organização, o debate entre Tavares Bastos e o Visconde do Uruguai tocava em questões fundamentais que permaneceriam em aberto e emergiriam em outros momentos da reflexão sobre o Estado-nação no Brasil, embora com ênfases distintas.

Instituições políticas e vida social

Era praticamente um lugar-comum na Primeira República atribuir às instituições políticas liberais adotadas na Constituição de 1891 uma legalidade sem correspondência na sociedade, o que parecia poder ser confirmado por evidências cotidianas por toda sorte de práticas oligárquicas. À margem da história da República, organizado por Vicente Licínio Cardoso (1981) no contexto do centenário da Independência, mas publicado em 1924, reúne um grupo representativo de intelectuais da geração nascida com a República que vivenciou a crise dos anos 1920. Nele se encontram A. Carneiro Leão, com “Os deveres das novas gerações brasileiras”; Gilberto Amado, com “Instituições políticas e o meio social no Brasil”; Pontes de Miranda, com “Preliminares para a reforma constitucional”; Oliveira Viana, “O idealismo da Constituição”; Ronald de Carvalho, com “As bases da nacionalidade brasileira; uma síntese histórica”; e Tristão de Ataíde (pseudônimo de Alceu Amoroso Lima), com “Política e letras” e outros cinco autores, além do próprio Vicente Licínio.

O volume propõe um balanço crítico da República no qual se ressaltam justamente, de diferentes ângulos, problemas relativos à legalidade sem correspondência na sociedade brasileira das instituições liberais republicanas. As propostas de reorganização social lançadas no livro cobriam amplo espectro, que ia da sociedade ao Estado, incluindo a reforma da Constituição de 1891, a reforma educacional e a reforma moral das elites brasileiras. A crítica ao artificialismo político da Primeira República perpassa todos os artigos; alguns deles avançam sobre o papel dos intelectuais na busca de uma “cultura” brasileira como base social para as instituições da sociedade brasileira. Um campo problemático contemporâneo mais amplo, como se vê, que também envolve centralmente o modernismo como movimento cultural e o debate sobre a construção da nação (i. e. uma identidade nacional o mais una e coesa possíveis por meio às diversidades regionais e desigualdades sociais) como forma de solidariedade social correspondente à forma de autoridade pública burocratizada e racionalizada. Numa palavra, o hífen que liga Estado à nação. Vejamos dois dos artigos bastante representativos do balanço.

“As bases da nacionalidade brasileira”, de Ronald de Carvalho (1981), aparece no mesmo ano, 1924, na revista Terra de Sol, editada por Tasso da Silveira e Álvaro Pinto, no Rio de Janeiro, o primeiro deles também presente na coletânea organizada por Vicente Licínio Cardoso, e ainda em Estudos brasileiros - 1 a série, do próprio Ronald. Vastamente divulgado, o ensaio sustenta que o sentido da formação da nacionalidade brasileira seria dado pela progressiva encarnação, desde os tempos coloniais, de uma “vocação nacional” da qual as elites dirigentes seriam a portadora original no Estado. Não se trata, contudo, de qualquer Estado. Muito menos do Estado liberal e oligárquico da Primeira República. Mas de um Estado forte e centralista que, baseado no papel histórico desempenhado pelas elites na modelagem da sociedade, estaria apto a reordená-la.

Movido pelo desejo modernista difuso de tornar o “Brasil” mais familiar aos “brasileiros”, Ronald de Carvalho procura a um só tempo denunciar a ideia de transplante cultural e institucional e definir a busca de uma cultura brasileira “autêntica” como elemento de continuidade e coesão para a sociedade enfrentar o desafio de se reconstruir modernamente como Estado-nação. Esse não se afigurava, contudo, um desafio modesto. Em primeiro lugar porque, dados os dilemas históricos formativos da sociedade brasileira, nem mesmo a independência política realizada em 1822 havia de todo assegurado à sociedade um projeto e um destino autônomos coesos, tão profundamente marcada que estava pela sua condição colonial de origem. Associado a isso, em segundo lugar, porque o influxo contemporâneo dos princípios normativos das culturas políticas liberal e democrática, tomados como meramente importados, dificultavam até mesmo a identificação da “particularidade” da nossa formação social, condição intelectual para uma organização mais orgânica da sociedade brasileira como Estado-nação (Botelho, 2005).

Para completar a independência iniciada há um século, caberia ao Estado promover aquela adequação entre instituições e cultura, objeto do compromisso e garantia de participação dos próprios intelectuais na construção nacional. Mas, cumpre ressaltar, o sucesso da empreitada estaria condicionado à capacidade do Estado em, simultaneamente, incorporar a experiência histórica das elites dirigentes tradicionais e promover a centralização e o fortalecimento do poder como base de ordenação da sociedade nacional. Talvez por isso, na homenagem póstuma que prestou a Ronald de Carvalho, Alceu Amoroso Lima, também presente na coletânea de Vicente Licínio Cardoso, não tenha deixado de ressaltar que, nos “últimos tempos, quando de novo nos aproximamos, depois de sua volta [de Paris], era ele o nacionalista integral, apologista do Estado Forte, fazendo o elogio da atitude reacionária” (Lima, 1942, p.280).

O ensaio de Ronald de Carvalho repetia a identificação entre elites políticas e burocracia estatal que, como mostra José Murilo de Carvalho (1996, p.129), já caracterizava a elite política imperial brasileira “à semelhança de outras elites de países e capitalismo retardatário ou frustrado”. Todavia, não se revelaria exatamente simples a tarefa de compatibilizar uma nova reordenação e centralização do Estado com a garantia de certa continuidade social assegurada, sobretudo, pelo resgate do que o autor entendia ser a experiência histórica das elites brasileiras. Problema com o qual Francisco José de Oliveira Vianna já vinha se confrontando e permaneceria enfrentando, e ao qual dará as mais significativas formulações no período.

Verdade que Ronald de Carvalho encontrava argumentos para a suas ideias em parte em Esplendor e decadência da sociedade brasileira, de 1911, e em Bastiões da nacionalidade brasileira, de 1922, de Elísio de Carvalho, a quem chega a atribuir a tese segundo a qual o Brasil teria nascido “do esforço sincero e persistente de uma aristocracia” (Carvalho, 1981, p.22). Há compartilhamento nessas interpretações, sobretudo, talvez, no que diz respeito à recusa da democracia e aceitação da proposição de um ordenamento social baseado nos ideais de “autoridade” e “ordem” das classes dominantes. Há também divergências. Por exemplo, quanto ao próprio perfil das elites em ambos os casos elogiadas. Em O espelho de Ariel, Ronald de Carvalho (1976, p.137) observa que, ao contrário do que queria Elísio de Carvalho, não “somos nem seremos nunca uma sociedade de salões, de intrigas amáveis, de solertes disfarces. Quem foram os nossos mais puros fidalgos, os que fundaram a nacionalidade? Antes do mais, homens de ação, idealistas é certo, mas cheios de belo entusiasmo que só os horizontes vastos da terra sabem despertar”. Daí, suas constantes referências a Oliveira Vianna. Segundo Ronald, Vianna havia demonstrado em Populações meridionais do Brasil, publicado em 1920, “o papel dos senhores de engenho e dos fazendeiros, na evolução da sociedade nacional”, isto é, que o “grande domínio agrícola, como o castelo roqueiro do barão feudal, foi a base de todo o nosso progresso econômico e social” (ibidem, p.120). Ronald mostra-se particularmente interessado na tese de que teria cabido ao “clã rural” e não aos municípios e comunas, “implantadas artificialmente aqui, por imitação dos sistemas políticos europeus”, o papel de “célula da vida pública” no Brasil (ibidem, p.121, grifos no original). Vemos, assim, como o debate tão importante no Império entre Tavares Bastos e o Visconde do Uruguai retorna nos anos 1920.

Não casualmente, Oliveira Vianna (1981) se faz presente na coletânea de Vicente Licínio Cardoso de que estamos tratando com “O idealismo da constituição”. Dois anos antes, justamente noutra comemoração do centenário da Independência, a de O Estado de S. Paulo, já aparecera o seu “Idealismo na evolução política do Império e da República” (1922). Nele, Vianna fazia a conhecida distinção entre “idealismo utópico” e “idealismo orgânico” que, tendo como critério justamente a adequação dos “sistemas doutrinários” ou “conjunto de aspirações políticas” à “realidade nacional” (Vianna, 1981), tamanha fortuna encontraria no pensamento brasileiro. A edição especial contou com artigos temáticos de Oliveira Lima, Plínio Barreto, Amadeu Amaral, Ricardo Severo, Sud Mennuci e, dentre outros, novamente Ronald de Carvalho.

No texto publicado pela primeira vez na coletânea de Vicente Licínio Cardoso, Oliveira Vianna (1981, p.108) se concentra na crítica à Constituição de 1891, fruto do “idealismo republicano”, e cujos princípios estariam em desacordo com “as condições psicológicas e estruturais do nosso povo”. Fundamentalmente, argumenta Vianna, não existe no Brasil uma “opinião pública organizada” - pressuposta pelos constituintes - tampouco há qualquer tipo de solidariedade de classes ou “sentimentos de interesses coletivos”. Nessas condições, a condução do país ficaria necessariamente à mercê dos “clãs politicantes”.

Se em “O idealismo da constituição”, Vianna (1981, p.117) chega a afirmar que, em sua proposta, “as reformas políticas, isto é, as reformas constitucionais, serão apenas auxiliares de outras reformas maiores, de caráter social e econômico”, em Problemas de direito corporativo (Vianna, 1938), procura fundamentar novos recursos jurídicos que visavam garantir a capacidade de intervenção do Estado em diversos domínios da vida social - o que possibilitará a própria organização futura da economia em moldes corporativos. Note-se que esse livro rebate as críticas de Waldemar Ferreira feitas em Princípios de legislação social e direito judiciário do trabalho, publicado igualmente em 1938. O debate, nas palavras do próprio Vianna, expõe o “conflito” entre duas concepções concorrentes no campo do direito: por um lado, “a velha concepção individualista” defendida por Ferreira, para quem os conflitos de trabalho deveriam ser tratados a partir dos cânones do liberalismo doutrinário clássico; e, por outro lado, “a nova concepção, nascida da crescente socialização da vida jurídica, cujo centro de gravitação se vem deslocando sucessivamente do Indivíduo para o Grupo e do Grupo para a Nação”, por ele defendida (Vianna, 1938, p.9).3

Permeando esses textos, há o incontornável ensaio Populações meridionais do Brasil, escrito em 1918, em que Oliveira Vianna (1973) diagnosticara um “fosso” entre a Constituição viva, praticada pelo “povo”, e a Constituição escrita, confeccionada pelas elites dirigentes. Não é por outro motivo que esse seu ensaio de estreia já traz em seu título, como um dado, a heterogeneidade brasileira. Populações meridionais do Brasil era parte de um projeto maior, e apenas parcialmente realizado, voltado justamente para o esclarecimento das diferenças entre as “instituições” e a “cultura política” das populações rurais do país. Mais do que tudo, o ensaio mostra como Vianna soube traduzir a crítica política comum à Primeira República em termos teórico-metodológicos relativamente consistentes, formalizando-a na tese de que os fundamentos e a dinâmica das instituições políticas se encontrariam nas relações sociais. Dessa perspectiva, as instituições não seriam virtuosas em si mesmas, como bem expressa sua discussão sobre a justiça (Vianna, 1973, p.139-41), não seriam locais de ação autônoma em relação aos valores e às práticas vigentes na sociedade como um todo e nem poderiam ser tomadas como variáveis independentes de outras forças sociais.

Como dissemos, a tarefa de compatibilizar uma nova reordenação e centralização do Estado com a garantia de certa continuidade social não se mostraria, porém, em nada simples. Mesmo a convicção “autoritária” de Oliveira Vianna sobre a ação transformadora do Estado, presente no primeiro volume de Populações meridionais do Brasil, acabou se mostrando mais contingente, tensa e descontínua ao longo do desenvolvimento da sua obra. Por exemplo, a afirmação feita em Instituições políticas brasileiras (Vianna, 1987) de que os “complexos culturais” tenderiam à estabilidade revela não apenas uma maturação de ideias, mas uma nova percepção sobre os próprios limites da ação do Estado. Pois, ao mobilizar a cultura para enfatizar a inutilidade de reformas políticas e jurídicas feitas em desacordo com os valores assentados na sociedade pela tradição (o que chama de “direito costumeiro”), Vianna problematiza sua própria posição inicial sobre a capacidade de o Estado recriar a velha sociedade corrompida por práticas privatistas. Questão aprofundada no livro póstumo Introdução à história social da economia capitalista no Brasil (1958), no qual propõe justamente uma espécie de volta aos valores “patriarcais” e “pré-capitalistas” presentes nas origens da formação social brasileira como possibilidade de reordenação não conflituosa da vida social.

Essa perspectiva inovadora de Oliveira Vianna o destaca na tradição intelectual brasileira considerada não apenas em termos sincrônicos, mas também diacrônicos. É o que ocorre em relação à produção do Império (1822-1889), à qual, por outro lado, Vianna também está ligado. Se no Império problemas relativos à construção do Estado no plano político-administrativo vinham forçando alguns statemakers a formalizar suas posições também no plano intelectual, do que permanece emblemático o embate entre Tavares Bastos e o Visconde do Uruguai sobre centralização e descentralização das instituições políticas, como vimos, Oliveira Vianna não se limitou a recolocar a problemática de uma perspectiva estritamente institucional, redirecionando o interesse analítico para as relações e as tensões entre instituições políticas herdadas do colonizador português e/ou adotadas da Europa em geral e a vida social que se veio formando desde a colonização no Brasil.

A democratização do Estado e da sociedade

A questão da relação entre Estado e sociedade volta ao primeiro plano nos anos 1970, durante a ditadura militar instaurada em 1964. Não por acaso, Os donos do poder, obra que Raymundo Faoro (2021) publicara em 1958 com pouca repercussão, teve grande impacto em sua segunda edição, de 1975, revisada e muito ampliada. Como observa o autor no prefácio da segunda edição, a tese básica do livro não se alterou: o domínio sufocante, ao longo das histórias portuguesa e brasileira, da nação pelo estamento burocrático, no quadro do Estado patrimonialista. É compreensível que nos anos 1950, quando a tônica dominante da agenda política e intelectual era o desenvolvimentismo, o livro não tenha encontrado boa acolhida. Em 1975, ao contrário, a tese de Faoro fez muito mais sentido, e a categoria de patrimonialismo forneceu munição para a crítica ao autoritarismo vigente (Werneck Vianna, 2009; Jasmin, 2021; Ferreira; Ricupero, 2021).

A tese principal de Os donos do poder é conhecida: a formação e a persistência, desde os primórdios da formação do Estado português até o Brasil contemporâneo, no interior do Estado, do que ele chama de estamento burocrático, os “donos do poder”, uma “comunidade de domínio” que se apropria do aparelho do Estado e se torna “proprietária da soberania”, operando uma cisão entre Estado e nação. Diferentemente da elite política, presente em muitas sociedades, não é uma camada heterônoma e aberta, nem exprime e representa as forças atuantes na sociedade: o estamento é uma estrutura social autônoma e fechada agindo como comunidade e monopolizando o domínio político. Contra a tese marxista de que só em momentos históricos excepcionais, de equilíbrio entre as classes, o Estado ganharia autonomia em relação à sociedade, Faoro sustenta que no Brasil a independência do Estado não é a exceção, é a regra. Não só o Estado é autônomo em relação à nação, como também ele a subordina, sufoca e deforma.

Como já mencionado, na sua interpretação do processo histórico brasileiro Faoro se apoia na categoria weberiana de patrimonialismo - subtipo da dominação tradicional marcada pela existência de um quadro administrativo que deve lealdade pessoal ao senhor - para caracterizar o Estado brasileiro. Ligada ao patrimonialismo está a categoria, fundamental na análise de Faoro, de capitalismo politicamente orientado, no qual as atividades econômicas e os interesses privados se subordinam às necessidades e aos interesses do Estado. Esse patrimonialismo ibérico, originado já no século XIV em Portugal, com a formação precoce de um Estado absolutista e a derrota do feudalismo, vem, segundo Faoro, moldar a experiência histórica brasileira como uma espécie de “vício de origem” do qual o país nunca consegue se livrar. Mesmo que uma outra tendência presente na história brasileira, amparada por ideias liberais, com um sentido descentralizador e autonomista, tenha conseguido vitórias parciais e temporárias em alguns momentos, o domínio do estamento burocrático sempre voltaria a se impor: “De d. João I a Getúlio Vargas, numa viagem de seis séculos, uma estrutura político-social resistiu a todas as transformações fundamentais, aos desafios mais profundos, à travessia do oceano largo” (Faoro, 2021, p.693).

O Estado brasileiro, tal como caracterizado por Faoro, tolheria não só o pleno desenvolvimento do capitalismo moderno, mas também o exercício das liberdades públicas e o florescimento da democracia no país. O padrão de domínio multissecular retratado em Os donos do poder se daria sempre, numa expressão singela muito utilizada por ele em seus escritos, “de cima para baixo”: “Sobre a sociedade, acima das classes, o aparelhamento político - uma camada social, comunitária embora nem sempre articulada, amorfa muitas vezes - impera, rege e governa, em nome próprio, num círculo impermeável de comando. Essa camada muda e se renova, mas não representa a nação...” (ibidem, p.647).

Embora Sérgio Buarque de Holanda (2016) já tivesse, em Raízes do Brasil, feito referência ao patrimonialismo em chave weberiana, Faoro reivindicava para si o pioneirismo no uso dessa categoria nas interpretações do Brasil. Holanda, argumentava o jurista gaúcho, embora tivesse usado o termo “funcionário patrimonial”, baseara sua análise da história brasileira na categoria de patriarcalismo e não na de patrimonialismo (Faoro, 1993, p.18; 1999). Disputas à parte, não é exatamente ao mesmo patrimonialismo que dão ênfase Sérgio Buarque de Holanda e Raymundo Faoro. Em “Weber e a interpretação do Brasil”, artigo em que trata dos variados usos da obra de Weber no Brasil, Luiz Werneck Vianna (1999) faz uma distinção entre o que chama de “patrimonialismo de sociedade civil” e “patrimonialismo de Estado”. Enquanto os autores orientados pela primeira vertente (como Florestan Fernandes e Maria Sylvia Carvalho Franco) dirigiriam seu olhar para a sociedade brasileira “senhorial escravocrata” e dariam grande centralidade à questão agrária, intérpretes como Raymundo Faoro e Simon Schwartzman, guiados pela ideia de patrimonialismo de Estado, enxergariam como vício de origem na história brasileira a herança do patrimonialismo ibérico; fundamentalmente, para esse segunda vertente o patrimonialismo seria marca do Estado e não da sociedade, daí a ênfase primordialmente institucional da análise. Partindo dessa sugestiva distinção, podemos sugerir que o uso do conceito weberiano feito por Sérgio Buarque de Holanda em Raízes do Brasil se aproxima mais do patrimonialismo societal do que do estatal.

Pouco tempo depois de lançada a segunda edição de Os donos do poder, em entrevista concedida à revista Veja em 1976, perguntado sobre a visão pessimista da história do Brasil expressa no seu livro, Faoro (1976) respondeu:

E como não? Isso é inevitável, quando o tema é um país sem povo, ou melhor, onde o povo foi ignorado pelo processo político. Notem bem: não é o fato de que a história do Brasil seja a história de uma minoria; isso vale para a história de muitos outros países. Mas o que é triste, amargo, é constatar quanto essa minoria é estagnada, dissociada do resto da sociedade, se alimentando e se realimentando apenas de si mesma.

Essa visão fundamentalmente pessimista sobre o padrão histórico brasileiro não o impediu de procurar, como jurista e publicista, no cotidiano da política, brechas para a luta por uma mudança desse padrão, no sentido da democratização do país - como em 1981, durante a campanha pela convocação de uma assembleia constituinte, quando escreveu “Assembleia constituinte: a legitimidade recuperada” (Faoro, 2007).

Mais do que contribuir para o revigoramento do interesse pelo Estado, Faoro foi um dos responsáveis por uma reorientação pioneira dos estudos da política, pela sua concepção do Estado como realidade empírica e variável analítica relativamente independente das classes e de outras forças sociais. Nessa perspectiva, no limite, as instituições não apenas ganhavam autonomia como lócus empírico de realização da política, mas também a capacidade de modelar a vida política e a própria vida social mais ampla. Por certo, essa reorientação se mostrou particularmente importante para a ciência política, até em razão de tradicionalmente seu objeto privilegiado ser o Estado.

No polo oposto do institucionalismo, de certa forma anunciado por Raymundo Faoro, temos a reafirmação da sociologia em Florestan Fernandes (2008), que vinha discutindo os limites e as possibilidades da democracia a partir tanto da participação social, tema de A integração do negro na sociedade de classes, de 1965, quanto do ponto de vista da estrutura sociopolítica que perpassa as instituições e a vida social, notavelmente discutido em A revolução burguesa no Brasil (Fernandes, 2020) uma década depois. Se, de fato, como assinalou Sallum Jr. (2002), Florestan conferia pouca eficácia explicativa às dimensões institucionais do poder político, apesar disso, como lembra Gildo Marçal Brandão (2007 , p.168), a força do conceito de autocracia burguesa “não limita o olhar às dimensões puramente institucionais do jogo político, busca captar uma dimensão estrutural - a presença estruturante da economia e da sociedade no plano político”.

Em A integração do negro na sociedade de classes, Florestan Fernandes (2008, p.21) analisa o que ele mesmo denomina a emergência do “povo” na história da sociedade brasileira, vista a partir do grupo social que teve o pior ponto de partida no processo de transição do rural ao urbano - a população negra, constituída pelos antigos escravos e libertos na ordem escravocrata e senhorial. Como o próprio uso do termo “povo” esclarece, trata-se de uma análise que vai além da questão das relações raciais no Brasil, pois se almeja compreender, pelo ângulo do setor mais vulnerável da sociedade, os limites mais gerais da realização de uma ordem social democrática. Os dilemas enfrentados pelas associações negras exprimiram, segundo o argumento de A integração do negro na sociedade de classes, os dilemas mais gerais da participação democrática numa sociedade que não experimentou um processo clássico de revolução burguesa. E que, por isso mesmo, haja vista o padrão conservador de transição ao mundo urbano, não abre às camadas populares o uso legítimo da competição e do conflito como instrumentos de democratização e universalização de direitos e garantias sociais. Apesar das especificidades da questão racial tratadas, a atuação das associações negras revelariam, com considerável nitidez, os limites impostos à participação política para o conjunto das camadas populares: os efeitos negativos da pauperização e da anomia nas formas de ação coletiva, a identificação com valores da ordem vigente em geral, associada aos fenômenos de mobilidade social ascendente - ainda que os canais para tal sejam estreitos -, bem como a pressão por soluções individualizadas para problemas de ordem coletiva e, arrematando o conjunto dos problemas, o confinamento dos benefícios da urbanização a um “circuito fechado”, isto é, a parcelas reduzidas da população que monopolizam a renda, o prestígio social e o poder político.

Na década seguinte, em A revolução burguesa no Brasil, Florestan Fernandes (2020) articulou essa visão sobre o processo de mudança social no Brasil com uma análise de longa duração sobre a constituição do poder político no Brasil.4 A monopolização da renda, do prestígio social e do poder político por parte das camadas dominantes, ponto já identificado em A integração do negro, passou a ser entendida como constitutiva de um estilo especial de transformação capitalista, que Fernandes denominou de “autocrático-burguês”. Assim, o fechamento das possibilidades de participação política autônoma por parte dos setores subalternos, exemplificada aqui através dos problemas enfrentados pelos movimentos negros em São Paulo, tal como são tratados pelo autor, seria reveladora da orientação privatista em relação ao poder, que não legitimaria o conflito por parte dos “de baixo” como mecanismo de democratização da sociedade.

Também A revolução burguesa no Brasil não foi um livro fácil para os leitores dos anos de 1970. Para retomar uma questão central, seu conceito de “autocracia burguesa” não deixava de ser algo desolador para aqueles seus contemporâneos que buscavam diretamente no livro um meio, digamos, operacional, de combate à ditadura civil-militar. Afinal, Florestan faz nele uma distinção heurística crucial que torna a compreensão da realidade social e da transição democrática muito mais complexa e matizada do que, talvez, estivessem prontos seus leitores de então. Mostra que a “democracia” não constituiria apenas uma forma de “exercício” do poder político (que se contraporia à ditadura então vigente), mas que dizia respeito também às formas sociais de “organização” do poder político. Aqui toda a qualidade sociológica apurada em mais de duas décadas de trabalho rigoroso como que atinge seu ápice, e Florestan passa a interrogar os fundamentos sociais tanto da política quanto da economia. Por isso, Florestan forja a ideia de “autocracia” para interpretar o fenômeno da persistência de um princípio ordenador radicalmente antidemocrático mais geral do Estado, da sociedade e do mercado até mesmo em momentos formal ou abertamente democráticos. A relação da autocracia com a democracia não é de oposição, mas, precisamente, parafraseando a imagem de Gabriel Cohn (2015), “sua sombra sempre presente em segundo plano, para emergir, com maior ou menor virulência, em situações de crise do poder burguês”. As reviravoltas na espiral da democracia não pararam - como bem sabemos hoje, no Brasil e no mundo. E então, a distinção crucial de Florestan parece fazer até mais sentido para nós, do que no contexto de transição democrática. A autocracia saiu da sombra.

Analisando a conexão entre transformação capitalista e autocracia burguesa, Florestan mostra como o processo de expansão interna do capitalismo não se fazia contra, mas a partir do legado social colonial, com seus efeitos terríveis de desenvolvimento desigual interno e articulação dependente com as burguesias centrais (o que ele chama de “dupla articulação”). Nesse sentido, coloca em evidência a revolução burguesa que nos coube experimentar. Qual, afinal, o sentido da atuação das camadas burguesas no processo de incorporação da sociedade brasileira ao capitalismo? Trata-se, nos diz Florestan (2020), de uma espécie de capitalismo difícil, pois a nossa “burguesia” não possui autonomia - afinal, sem a sua associação como sócia menor das burguesias centrais, as camadas burguesas na periferia não seriam capazes de acelerar a acumulação capitalista. Porém, sua condição heterônoma (outra expressão do agrado do autor) não é antitética a uma margem de manobra imensa no plano interno, o que se associa a uma crônica irresponsabilidade coletiva dos “de cima”.

Nesse terreno estreito de uma ordem social competitiva que não gravita em torno da democratização da sociedade, mas do autoprivilegiamento burguês, o Estado autocrático daí resultante teria uma dupla face de Jano: uma voltada para o passado - a reiteração da tradição brasileira de “mandonismo” e democracia restrita - e outra para o futuro, que deseja modernizar o poder institucionalizado pela “normalização” da autocracia burguesa em termos jurídicos e democrático-representativos. Era nesse registro que Florestan começava a desconfiar do caráter efetivamente democratizante - nos termos das formas de organização e distribuição social do poder, e não apenas nos modelos institucionais de exercício do poder político - do processo de abertura política que então se anunciava no horizonte.5 Autocracia burguesa constitui, assim, um conceito que orienta uma discussão mais geral sobre a relação Estado e sociedade e em relação ao poder que, sem se limitar às dimensões puramente institucionais do jogo político, busca captar uma dimensão estrutural a presença estruturante da economia e da sociedade no plano político.

Considerações finais

A Província, Ensaio sobre o direito administrativo, Populações meridionais do Brasil, Os donos do poder e A revolução burguesa no Brasil, entre outros lembrados nesses comentários, merecem ser rediscutidos em qualquer reflexão sobre a independência política do Brasil, pela inovação que, sem dúvida, trouxeram, mas, também, pelo caráter heurístico que a comparação ou o confronto teórico entre suas proposições principais permite observar no debate sobre Estado e sociedade no Brasil. Não são muitos os livros brasileiros que sobreviveram ao seu tempo. De formas diferentes isso aconteceu com os livros que destacamos. É certo que os problemas tratados neles, cada um de uma perspectiva própria, dizem respeito a processos históricos, sociais e políticos de longa duração que constituem, mas também excedem, as circunstâncias originais de sua publicação.

Centralização e descentralização, a relação entre instituições políticas e vida social, patrimonialismo ou autocracia burguesa, afinal, não se restringem a eventos datados, mas envolvem e implicam as temporalidades múltiplas próprias dos processos históricos e sociais. Então os temas desses livros ainda nos dizem respeito. Ainda mais numa sociedade como a brasileira, em que a mudança se realiza mais pela reiteração e acomodação do que apenas pela ruptura - como, aliás, estamos protagonizando/testemunhando em acontecimentos cruciais em curso novamente neste momento.

Sabemos dos riscos de colocar interpretações tão distintas lado a lado, mas, todavia, decidimos corrê-lo para, numa espécie de depuração teórica, repensá-las como recursos analíticos heurísticos sobre a relação entre Estado e sociedade no Brasil. A pergunta correta não é, do nosso ponto de vista, se existe uma interpretação melhor do que a outra no pensamento brasileiro. Vistas em conjunto, como nesta oportunidade, esses resultados de pesquisas permitem apostar numa reflexão metateórica para sistematizar uma espécie de repertório intelectual que ao mesmo tempo aponta impasses para a realização do Estado-nação no Brasil e chama a atenção para desafios políticos e teóricos ainda em aberto.

Cabe, assim, problematizar tanto visões formalistas do estudo do Estado, que tendem a considerar as instituições políticas virtuosas ou não em si mesmas; mas também as análises do Estado centradas exclusivamente na sociedade, que tendem a caracterizá-lo como um espaço em que grupos de interesses se aliam ou opõem a fim de definir as políticas públicas. A distinção entre Estado e sociedade funda a possibilidade de uma abordagem diferencialmente sociológica da política, ainda que isso não implique, necessariamente, corroborar uma concepção dicotômica dessa relação, como se Estado e sociedade não constituíssem esferas entrelaçadas. Por isso, a relação entre Estado e sociedade constitui um eixo analítico que nos permite ainda tanto situar experiências históricas particulares quanto unificar a diversidade do repertório temático da sociologia política num quadro explicativo mais amplo. É claro que sem uma visão integrada do movimento geral da sociedade fica difícil especificar tanto como as instituições democráticas se enraízam ou não através da socialização dos atores, quanto como os sentidos dessa socialização são afetados e podem alterar as próprias instituições. E esse é um desafio intelectual central do nosso tempo, infelizmente, ainda bastante marcado por oposições simples entre Estado e sociedade, como, ademais, aparece inclusive em certas representações contemporâneas de “sociedade civil”, nas quais, no limite, setores da sociedade são tomados, de um lado, como pretensamente virtuosos, e, de outro, o Estado como opressor e corruptor das virtudes e liberdades sociais.

Estudando a consolidação das ciências sociais no Brasil a partir do cotidiano da principal associação da área, a Anpocs, e analisando de modo mais detido os balanços bibliográficos por ela induzidos diretamente ao longo dos últimos vinte anos para as áreas de sociologia e de ciência política, Botelho, Ricupero e Brasil Jr. (2017) constataram a falta de base empírica para a oposição recorrente entre engajamento e teorização. Ao contrário, perceberam como a dinâmica da produção de conhecimento nas ciências sociais praticadas no Brasil combina de modo exitoso a vocação universalista da disciplina com um interesse prioritário pelos problemas sociopolíticos do país. Assim, concluem que as ciências sociais brasileiras, tais como a conhecemos hoje, são, em grande medida, o resultado da busca de respostas e instrumentos analíticos para entender a situação que o país vivia depois do golpe civil-militar.

Esse histórico das relações das ciências sociais com as questões públicas, em particular durante a última transição democrática, indica que não devemos nos furtar a enfrentar os problemas colocados pelo atual momento político do Brasil, no qual o consenso normativo em torno da democracia na esfera pública parece rompido. Mas ele também nos adverte que, como no passado recente, a capacidade de responder aos desafios que se colocam hoje determinará a própria relevância das ciências sociais brasileiras no futuro. Forjar explicações consistentes sobre as relações entre Estado e sociedade no presente é um desafio crucial do nosso tempo, e para enfrentá-lo é preciso levar em conta sua história de encontros e desencontros com a democracia nos últimos 200 anos. Se a nossa história infeliz com relação à democracia já não nos permite mais tomar, sem mais, a plena realização de uma comunidade política democrática como um processo irreversível, o ceticismo não deve esmorecer o compromisso. Então, como em O encontro marcado, de Fernando Sabino, citado como epígrafe deste artigo, não há jeito, teremos mais uma vez que fazer da “interrupção um caminho novo. Fazer da queda um passo de dança, do medo uma escada, do sono uma ponte, da procura um encontro”.

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Notas

  • 1
    André Botelho (2019) reconstituiu a formação de uma sociologia política brasileira entre os anos 1920 e 1970 em torno justamente da discussão sobre relações entre Estado e sociedade e, em particular, do baralhamento entre público e privado no Brasil.
  • 2
    Gabriela Nunes Ferreira (1999) examinou em profundidade esse debate em Centralização e descentralização no Império. Embora o Visconde do Uruguai tenha falecido em 1866, antes da publicação de A Província (1870), obra mais importante de Tavares Bastos, pode-se dizer que houve um debate entre eles. O deputado alagoano dialogou diretamente com Uruguai em A Província. Este, por sua vez, conhecia as Cartas do solitário (1862) de Tavares Bastos e, em suas duas obras de folego - Ensaio sobre o direito administrativo (1862) e Estudos práticos sobre a administração das províncias no Brasil (1865) - dialogou com a geração de liberais da década de 1830, em quem Tavares Bastos se inspirou para defender seu modelo de monarquia federativa.
  • 3
    Sobre esse debate, ver Brasil Jr. (2007 e 2010).
  • 4
    Para uma análise das continuidades entre A integração do negro na sociedade de classes (Fernandes, 2008) e A revolução burguesa no Brasil (Fernandes, 2020), mas sem minimizar as diferenças entre os dois contextos, ver Bastos (1987).
  • 5
    Botelho e Brasil Jr. (2020) desenvolveram conjuntamente essas questões no prefácio à nova edição de A revolução burguesa no Brasil.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    13 Maio 2022
  • Data do Fascículo
    May-Aug 2022

Histórico

  • Recebido
    15 Out 2021
  • Aceito
    12 Dez 2021
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