Resumo
Este estudo objetiva analisar as vivências de pessoas em situação de rua vinculadas ao Centro de Referência Especializado para População em Situação de Rua (Centro POP) da cidade de Novo Hamburgo, no Rio Grande do Sul. A pesquisa realizada com seis participantes é de caráter exploratório-descritivo com abordagem qualitativa. Utilizaram-se um questionário sociodemográfico e uma entrevista semiestruturada. Os dados foram submetidos à análise temática. Em relação às vivências na rua, a violência apareceu como um elemento central. Os participantes relataram diferentes tipos de violência e práticas que retiram a dignidade do sujeito e perpetuam o lugar de exclusão. Ademais, foram atribuídos à rua diferentes sentidos, pois se configura tanto como um local de vulnerabilidade e insegurança quanto um espaço de sobrevivência e construção de vínculos. Evidencia-se, assim, a necessidade de políticas públicas afirmativas que garantam a dignidade e os direitos dessa população, combatendo especialmente as práticas de violência.
Palavras-chave:
pessoas em situação de rua; violência; violência simbólica; direitos humanos
Abstract
This study aims to analyze the experiences of homeless persons who attend a Specialized Reference Center for the Homeless Population in the municipality of Novo Hamburgo, in Rio Grande do Sul. This exploratory-descriptive qualitative research was carried out with six participants. Sociodemographic questionnaires and semi-structured interviews were used. Thematic analysis was used to analyze the data. Violence was identified as a key element in volunteers’ experiences of homelessness. Participants reported different types of violence and actions that violated subjects’ dignity and perpetuated exclusion spaces. Moreover, different meanings were attributed to the streets since participants perceived them as both a place of vulnerability and insecurity and as a space for survival and construction of bonds. Thus, we have evinced the need for affirmative public policies that guarantee the dignity and rights of this population, especially to combat violence.
Keywords:
homeless-persons; violence; symbolic violence; humans rights
Resumen
Este estudio pretende analizar las vivencias de personas en situación de calle vinculadas al Centro de Referencia Especializado para Población en Situación de Calle (Centro POP) de la ciudad de Novo Hamburgo, en Rio Grande do Sul (Brasil). La investigación realizada con seis participantes es exploratoria, descriptiva, de abordaje cualitativo. Se utilizaron un cuestionario sociodemográfico y una entrevista semiestructurada. Los datos se sometieron al análisis temático. Sobre las vivencias en la calle, la violencia fue un elemento central. Los participantes relataron diferentes tipos de violencia y prácticas que quitan la dignidad del sujeto y perpetúan la exclusión. Además, atribuyeron a la calle diferentes sentidos, pues esta se configura tanto como un sitio de vulnerabilidad e inseguridad como un espacio de supervivencia y construcción de vínculos. Se evidencia, así, la necesidad de políticas públicas afirmativas que garanticen la dignidad y los derechos de esa población, especialmente en combate a las prácticas de violencia.
Palabras clave:
personas sin hogar; violencia; violencia simbólica; derechos humanos
Résumé
Cette étude a le but d’analyser les expériences des personnes sans-abri liées au Centre de Référence Spécialisé pour la Population en Sans-Abri (Centro POP) de Novo Hamburgo, Rio Grande do Sul. Larecherche, réalisé eavec six participants, aun caractère exploratoire-descript if d’approche qualitative. On autilisé un questionnaire socio-démographique etune interview semi-structurée. Les données ont éte soumises à l’analyse thématique. La violence est considérée un élément central des expériences dans la rue. Les participants ont rapporté plusieurs types de violence et pratiques qui enlèvent leur dignité et perpétuent le lieu d’exclusion. Des différents sens sont aussi attribués à la rue, car elle se configure comme un lieu de vulnérabilité et insécurité, ainsi qu’un espace de survie et de construction de liens. Le besoin de politiques publiques affirmatives qui garantissent la dignité et les droits de cette population, en luttant contre les pratiques de violence est aussi relevé.
Mots-clés:
sans-abri; violence; violence symbolique; droits de l’homme
Considerações iniciais
A situação de rua se faz presente em economias desenvolvidas, subdesenvolvidas e em desenvolvimento. Esse fenômeno é multifacetado e atinge diferentes grupos de pessoas de várias maneiras, porém com algumas características em comum. O termo “situação de rua” não apenas retrata a falta de moradia, mas também descreve um grupo social estigmatizado, excluído da sociedade e, consequentemente, criminalizado. Esse cenário resulta da incapacidade dos governos de confrontar as desigualdades de renda, de riqueza e de acesso à terra e à propriedade, assim como da falta de respostas efetivas aos problemas de imigração e de urbanização (Farha, 2015Farha, L. (2015). Relatório da relatora especial sobre moradia adequada como componente do direito a um padrão de vida adequado e sobre o direito a não discriminação neste contexto. Genebra: Conselho de Direitos Humanos. Recuperado de http://www.ohchr.org/Documents/Issues/Housing/A_HRC_31_54_Unofficial_translation_Portuguese.pdf
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).
Constata-se, diante de inúmeras pesquisas (Cunha & Rodrigues, 2009Cunha, J. V. Q., & Rodrigues, M. (Orgs.). (2009). Rua: aprendendo a contar: Pesquisa Nacional sobre População em Situação de Rua. Brasília, DF: Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome.; Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas, 2015Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas. (2015). Pesquisa censitária da população em situação de rua, caracterização socioeconômica da população adulta em situação de rua e relatório temático de identificação das necessidades desta população na cidade de São Paulo. São Paulo, SP: Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas. Recuperado de https://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/upload/Produtos/Produto%209_SMADS_SP.pdf
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; Qualitest, 2019Qualitest. (2019). Pesquisa censitária da população em situação de rua, caracterização socioeconômica da população adulta em situação de rua e relatório temático de identificação das necessidades desta população na cidade de São Paulo. São Paulo, SP: Qualitest. Recuperado de https://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/upload/Produtos/Produto%209_SMADS_SP.pdf
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), que a população em situação de rua (PSR) no Brasil é um grupo populacional heterogêneo que tem em comum a pobreza extrema, vínculos familiares interrompidos ou fragilizados e a inexistência de moradia convencional regular. Sãocidadãos queutilizam os logradouros públicos e as áreas degradadas como espaço de moradia e de sustento, de forma temporária ou permanente, bem como as unidades de acolhimento para pernoite temporário ou como moradia provisória (Cunha & Rodrigues, 2009Cunha, J. V. Q., & Rodrigues, M. (Orgs.). (2009). Rua: aprendendo a contar: Pesquisa Nacional sobre População em Situação de Rua. Brasília, DF: Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome.).
Para M. L. Silva (2009Silva, M. L. L. D. (2009). Trabalho e população em situação de rua no Brasil. São Paulo, SP: Cortez.), o fenômeno da PSR vincula-se à estrutura da sociedade capitalista e apresenta múltiplos fatores. Atualmente, constitui uma expressão radical da questão social, uma vez que as pessoas atingidas são estigmatizadas e enfrentam o preconceito como marca do grau de dignidade e valor moral atribuído pela sociedade. Para a autora, a questão social da PSR tem características gerais, mas também particularidades vinculadas ao território em que se manifesta.
Estimativas indicam que existem, atualmente, cerca de 221.869 pessoas em situação de rua no Brasil (Natalino, 2020Natalino, M. (2020). Estimativa da população em situação de rua no Brasil (setembro 2012 a março de 2020). Brasília, DF: Ipea. Recuperado de https://repositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/10074/1/NT_73_Disoc_Estimativa%20da%20populacao%20em%20 situacao%20de%20rua%20no%20Brasil.pdf
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). Diversos estudos apontam que há uma prevalência de homens em situação de rua e os principais motivos são os conflitos familiares, o desemprego e o abuso de substâncias (Cunha & Rodrigues, 2009Cunha, J. V. Q., & Rodrigues, M. (Orgs.). (2009). Rua: aprendendo a contar: Pesquisa Nacional sobre População em Situação de Rua. Brasília, DF: Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome.; Giongo et al., 2020Giongo, C. R., Passini, E. S., Fritz, M., Backes, R. M. F., Nardes, S., & Pinheiro, S. S. (2020). Cartilha população adulta em situação de rua de Novo Hamburgo. Novo Hamburgo, RS: Universidade Feevale. Recuperado de https://www.feevale.br/Comum/midias/381f0435-88af-4ecb-85d5-df358a020b6a/CARTILHA_final.pdf
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; Pimenta, 2019Pimenta, M. M. (2019). Pessoas em situação de rua em Porto Alegre: processos de estigmatização e invisibilidade social. Civitas, 19(1), 82-104. doi: 10.15448/1984-7289.2019.1.30905
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; Qualitest, 2019Qualitest. (2019). Pesquisa censitária da população em situação de rua, caracterização socioeconômica da população adulta em situação de rua e relatório temático de identificação das necessidades desta população na cidade de São Paulo. São Paulo, SP: Qualitest. Recuperado de https://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/upload/Produtos/Produto%209_SMADS_SP.pdf
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). Em São Paulo, nos últimos quatro anos houve um aumento expressivo (53%) do número de pessoas em situação de rua ou acolhidas em repúblicas e abrigos (Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas, 2015Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas. (2015). Pesquisa censitária da população em situação de rua, caracterização socioeconômica da população adulta em situação de rua e relatório temático de identificação das necessidades desta população na cidade de São Paulo. São Paulo, SP: Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas. Recuperado de https://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/upload/Produtos/Produto%209_SMADS_SP.pdf
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; Qualitest, 2019Qualitest. (2019). Pesquisa censitária da população em situação de rua, caracterização socioeconômica da população adulta em situação de rua e relatório temático de identificação das necessidades desta população na cidade de São Paulo. São Paulo, SP: Qualitest. Recuperado de https://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/upload/Produtos/Produto%209_SMADS_SP.pdf
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). Nesse sentido, é possível identificar que o crescimento populacional apresentado não é proporcional ao aumento das políticas públicas destinadas ao atendimento da PSR no Brasil (Dornelles, Silva, Gehlen, & Schuch, 2012Dornelles, A. E., Silva, M. B., Gehlen, I., & Schuch, P. (2012). O retrato censitário da população adulta em situação de rua em Porto Alegre. In P. Schuch, I. Gehlen, A. S. Dornelles, M. B. Silva, E. E. Broide, J. Broide, ... K. Krieger (Orgs.), A rua em movimento: debates acerca da população adulta em situação de rua na cidade de Porto Alegre (pp. 43-58). Belo Horizonte, MG: Didática.).
Em Novo Hamburgo a política pública voltada para o atendimento da PSR é garantida por meio de dispositivos da Assistência Social. O município conta com o Centro de Referência Especializado para População em Situação de Rua (Centro POP), umaunidadepública voltada para oatendimento especializado dessa população. O local realiza atendimentos individuais e coletivos, oficinas e atividades de convívio e socialização, além de ações que incentivem o protagonismo e a participação social da PSR (Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, 2013Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. (2013). Tipificação nacional de serviços socioassistenciais. Brasília, DF: Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome.). Além disso, existem outros dispositivos como Albergue, Consultório na Rua, Serviço Especializado de Abordagem Social (Seas) e Organização da Sociedade Civil (OSC) que auxiliam nas demandas dessa população. Ademais, há o Comitê de Acompanhamento e Monitoramento da Política Municipal para a população em situação de rua (Comitê POP Rua NH), que conta com diferentes representações públicas e da sociedade civil.
Com a finalidade de compreender as vivências e demandas da PSR, o primeiro censo da cidade contabilizou um total de 215 pessoas nessa condição. Destes, 86,5% eram homens e 13,5% mulheres, com média de 39 anos. Com relação à escolaridade, 60,6% não tinham o ensino fundamental completo nem o ensino médio (14,7%) e alguns estavam em situação de rua há mais de dez anos (21,3%). Ainda, 60,6% já haviam deixado de estar em situação de rua e retornaram. Quanto aos aspectos de trabalho e renda, a grande maioria (98,2%) não tinha vínculo de emprego formal e 33,5% referiram não ter ocupação. Entre as principais dificuldades citadas, estavam o preconceito (38,8%), a violência (35,9%) e a fome (31,8%). Os participantes referiram violência entre pares (56,5%) e violência institucional (52,2%) como as principais formas de violações (Giongo et al., 2020Giongo, C. R., Passini, E. S., Fritz, M., Backes, R. M. F., Nardes, S., & Pinheiro, S. S. (2020). Cartilha população adulta em situação de rua de Novo Hamburgo. Novo Hamburgo, RS: Universidade Feevale. Recuperado de https://www.feevale.br/Comum/midias/381f0435-88af-4ecb-85d5-df358a020b6a/CARTILHA_final.pdf
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).
Apesar da relevância desses estudos, não há dados precisos sobre essa população no País, o que se deve às subnotificações ou, ainda, à falta de inclusão desses coletivos nos dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A Defensoria Pública da União, por meio da Justiça Federal do Rio de Janeiro, entrou com um pedido e tornou a inclusão da PSR obrigatória no censo de 2020. Entretanto, ainda não está definido como se dará, na prática, a coleta desses dados (Sasse & Oliveira, 2019Sasse, C., & Oliveira, N. (2019, 28 de março). Invisível nas estatísticas, população de rua demanda políticas públicas integradas. Senado Notícias. Recuperado de https://www12.senado.leg.br/noticias/especiais/especial-cidadania/especial-cidadania-populacao-em-situacao-de-rua
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).
Sem dados precisos, sem a implementação suficiente de políticas públicas e serviços destinados a esses cidadãos, as pessoas em situação de rua vivenciam os fenômenos da exclusão social, desigualdade e privação de direitos. Esses indivíduos vivememum contexto radical de insegurança e flutuação errante dentro desse percurso social. Tal condição não significa, todavia, uma forma de inexistência social, mas de uma condição marcada por rupturas de vínculos e relações sociais concretas e simbólicas (Castel, 2003Castel, R. (2003). As metamorfoses da questão social: uma crônica do salário (4a ed.). Petrópolis, RJ: Vozes.).
Como visto, um dos elementos que marca a trajetória daqueles que vivem na rua é a violação de direitos e a violência. Porvezes, aspessoasexcluídasdosseusdireitos tornam-sealvos, ou atores, mais imediatos da violência (Porto, 2000Porto, M. S. G. (2000). A violência entre a inclusão e a exclusão social. Tempo social, 12(1), 187-200. doi: 10.1590/S0103-20702000000100010
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). Sobre esse tema, é possível identificar a mobilização de grupos e coletivos sociais, como o Movimento Nacionalda População em Situação de Rua (MNPSR), que nasceu em 2004, com a indignação diante de um crime de violência extrema identificado como o Massacre da Sé, em São Paulo. Na ocasião, sete pessoas em situação de rua foram brutalmente assassinadas.
Em 2010, esses atos de crueldade infelizmente se repetiram: vinte e duas pessoas que estavam na rua foram mortas no estado de Alagoas, simplesmente por estarem ocupando o espaço público para habitação (Gibbs & Amazonas, 2015Gibbs, C. C. M., & Amazonas, L. (2015). População em situação de rua e políticas públicas: os limites à efetivação dos direitos na cidade de Manaus. In 7ª Jornada Internacional de Políticas Públicas da Universidade Federal do Maranhão (pp. 1-12). São Luís, MA: UFMA.). Diante desse caso houve intensa mobilização das PSR em conjunto com outros setores da sociedade civil, contribuindo para que, anos mais tarde, fosse criada a Política Nacional da População em Situação de Rua (Decreto nº 7.053, 2009Decreto nº 7.053, de 23 de dezembro de 2009. (2009, 23 de dezembro). Institui a Política Nacional para a População em Situação de Rua e seu Comitê Intersetorial de Acompanhamento e Monitoramento, e dá outras providências. Presidência da República. Recuperado de http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2009/Decreto/D7053.htm
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).
Por outro lado, a situação de rua pode assumir outras formas e arranjos de viver a vida. A rua, nesse contexto, apresenta-se nãoapenascomoespaço deviolência, mastambém comumapossibilidade de sobrevida. Santos (2009Santos, D. D. (2009). O retrato do morador de rua da cidade de Salvador-BA: um estudo de caso (Monografia, Universidade do Estado da Bahia, Salvador)., p.20) aponta que “a casa pode ser entendida como uma construção no espaço que delimita o território dos habitantes, conferindo-lhes liberdade e privacidade, portanto, espaço particular”. A rua, para a autora, “compreende espaços públicos, coletivos que são de livre acesso a todas as pessoas”. DaMatta (1997DaMatta, R. (1997). A casa e a rua: espaço, cidadania, mulher e morte no Brasil. Rio de Janeiro, RJ: Rocco.), por sua vez, propõe considerar que tais pressupostos são categorias sociológicas e que não se referem apenas a espaços geográficos ou físicos, masaesferas sociais, domínios culturais institucionalizados e entidades morais, sendo assim, capazes de despertar emoções, reações, leis, entre outros. As significações em torno dessas categorias sociais podem assumir diferentes formatos em distintos momentos sócio-históricos na vida daqueles que têm a rua como espaço de moradia. Nessa perspectiva, Leontiev (1978Leontiev, A. (1978). O desenvolvimento do psiquismo. Lisboa: Horizonte Universitário.) e Vigotski (2000Vigotski, L. S. (2000). A construção do pensamento e da linguagem. São Paulo, SP: Martins Fontes.) corroboram ao entenderem as significações como síntese das práticas sociais, já que o sentido está diretamente vinculado à vivência. Assim, compreender esses arranjos significa analisar a dinâmica social e os diferentes lugares ocupados pelo sujeito de fala.
Diante das problematizações apresentadas, o objetivo deste estudo é analisar as vivências de pessoas em situação de rua vinculadas ao Centro POP da cidade de Novo Hamburgo/RS, atribuindo maior ênfase aos sentidos da rua e às vivências relacionadas à violência.
Método
Para a realização desta pesquisa, utilizou-se um delineamento exploratório e descritivo de caráter qualitativo. A pesquisa descritiva tem como objetivo o relato dos fatos observados com base em uma descrição das características significativas de determinada população, por meio da coleta de dados, o que possibilita uma nova visão do problema estudado (Gil, 2008Gil, A. C. (2008). Métodos e técnicas de pesquisa social (6a ed.). São Paulo, SP: Atlas.). Já o método qualitativo, segundo Minayo (2014Minayo, M. C. D. S. (2014). O desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde. São Paulo, SP: Hucitec.), tem como foco responder questões particulares da realidade que não podem ser quantificadas, pois trabalha com um universo de significados, motivos, aspirações, crenças, valores, atitudes correspondentes a um espaço profundo das relações, processos e fenômenos. A população-alvo deste estudo são usuários de um Centro POP do Rio Grande do Sul. Participaram da pesquisa seis sujeitos, três do sexo feminino e três do sexo masculino. Para delimitar os participantes, utilizaram-se os seguintes critérios de inclusão: ter idade igual ou superior a 18 anos, de ambos os sexos, ter acessado o serviço nos últimos seis meses. Os dados sociodemográficos dos entrevistados podem ser observados, por ordem alfabética, no Quadro 1 1 1 Para preservar a identidade dos participantes, os nomes aqui apresentados são fictícios e remetem a deuses(as) da mitologia. Os nomes foram escolhidos com base nas características pessoais dos participantes e a dominação que o acompanha foi atribuída com a finalidade de evidenciar elementos da sua história de vida, identificada pela pesquisadora. .
Para a coleta de dados2 2 Este estudo tem aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Feevale, pois integra uma pesquisa maior, intitulada “População adulta em situação de rua de Novo Hamburgo/RS: vivências, demandas e possibilidades de intervenção”, vinculada à Universidade Feevale e aprovada em novembro de 2018, sob parecer nº 3.038.366. Destaca-se, ainda, que os participantes da pesquisa receberam o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) antes de iniciar a coleta dos dados. , aplicou-se um questionário sociodemográfico, utilizado com a finalidade de mapear questões de sexo, idade, escolaridade, entre outros. Além disso, realizou-se uma entrevista semiestruturada, que, segundo Lakatos e Marconi (2011Lakatos, E. M., & Marconi, M. D. A. (2011). Metodologia científica (6a ed.). São Paulo, SP: Atlas.), tem como finalidade a obtenção de informações importantes que ajudam o pesquisador a compreender as perspectivas, experiências e os significados que as pessoas entrevistadas dão aos fenômenos e eventos de suas vidas cotidianas. Esta pesquisa foi realizada no Centro POP de Novo Hamburgo. Os dados foram obtidos inicialmente pela inserção da pesquisadora em um projeto de extensão desenvolvido no Centro POP em parceria com a Universidade Feevale. Foi no contexto das práticas de extensão que se percebeu a necessidade de realizar um recenseamento da população adulta em situação de rua do município, atuando na aproximação das demandas desse público e para contribuir na construção de políticas públicas. Com isso, nasceu, em 2018, o projeto de pesquisa intitulado “População adulta em situação de rua de Novo Hamburgo/RS: vivências, demandas e possibilidades de intervenção”. Nessa pesquisa, a pesquisadora coletou dados para seu trabalho de conclusão de curso que tinha como objetivo compreender os sentidos da rua e as vivências de violência. A amostra foi escolhida por conveniência das pesquisadoras, tomando-se o cuidado de garantir a participação de homens e mulheres.
Após a coleta dos dados, as entrevistas foram transcritas e analisadas. A técnica utilizada para a análise dos dados foi a análise temática, que consiste em delimitar os núcleos de sentido que integram o processo de comunicação, nos quais a presença ou a frequência com que aparecem signifique algo visado para o objeto analítico (Minayo, 2014Minayo, M. C. D. S. (2014). O desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde. São Paulo, SP: Hucitec.). Esse método, que se desdobra em três etapas - pré-análise; exploração do material; e tratamento e interpretação dos dados - possibilitou a seleção de dois grandes temas, quais sejam: (1) O sentido da rua, que se desdobrou em três subtemáticas: rua como casa; rua como proteção; e rua como transição; e (2) Vivências e significados da violência. Cabe destacar que diversos outros temas foram abordados pelos entrevistados, no entanto, os relatos sobre os significados da rua e as vivências de violência, em especial, a violência simbólica, destacou-se significativamente entre todos os entrevistados.
Análise e discussão dos resultados
O sentido da rua
Os significados contidos nos construtos casa e rua podem assumir representações opostas. Normalmente a “rua” detém conotação negativa, como nas expressões “rua da amargura”, “olho da rua”, expondo desaconchego e isolamento. Já a “casa”, tem um simbolismo marcado pelo espaço de moradia e residência, tanto que palavras como casamento e casal são suas derivações. Expressões, como “ser posto para fora de casa”, representam algo violento, ao mesmo passo em que estar ou “sentir-se em casa” se refere a situações de aconchego e relações de harmonia, em que disputas são evitadas (DaMatta, 1997DaMatta, R. (1997). A casa e a rua: espaço, cidadania, mulher e morte no Brasil. Rio de Janeiro, RJ: Rocco.).
Nessa primeira temática, intitulada O sentido da rua, reuniram-se subtemáticas que abordam significados, expressões, ideias e pensamentos sobre o papel que a rua assume na vida de quem se encontra em situação de rua. A partir disso, a rua será discutida por meio dos subtemas rua como casa; rua como proteção; e rua como transição.
Rua como casa
Essa subtemática descreveu a identificação da rua como extensão do lar. A apropriação do espaço público e o pertencer às ruas foi comentado pelos participantes, que falaram sobre as relações de amizade e as estratégias de organização que utilizam nas ruas. O desenvolvimento dessas práticas torna a rua semelhante, e não mais oposta ao lar. A fusão dos conceitos “casa” e “rua” pode ser ilustrada na seguinte narrativa, que demonstra a complexidade e a dinamicidade do que é a “rua”:
A minha casa é na rua. A minha família é os guris da rua. É minha segunda família, eu considero mais eles do que quem tá em casa. Eles são minha família. A família que eu dou mais valor é a da rua. Amizade, consideração... nós cumprimo (regras) nós vivemo junto e a primeira coisa que vale no nosso meio é a educação, respeito isso aí. (Dionísio, 43 anos, o poeta)
É possível analisar que a compreensão da rua como casa refere-se ao estabelecimento de relações autênticas de amizade e companheirismo constituídas nesse ambiente. Assim, diante da fala desse participante, o que ocorre na rua assemelha-se àquilo que ocorre dentro das representações tradicionais dos lares, onde as relações de convivência dão-se e são expressas por meio de cuidado, educação e respeito. Esse senso de pertencer à “família da rua” indica, conforme apontado por DaMatta (1997DaMatta, R. (1997). A casa e a rua: espaço, cidadania, mulher e morte no Brasil. Rio de Janeiro, RJ: Rocco.), a reprodução mútua entre casa e rua, uma vez que pessoas, grupos e categorias sociais podem se apropriar dos espaços da rua, tornando-os sua “casa” ou seu “ponto”. Nesse sentido, categorias sociais podem ocupar de forma permanente os locais da rua e viver como “se estivessem em casa”, tornando a rua um espaço de convivência e moradia.
Nessa temática, a rua foi identificada também como extensão da casa. Os participantes falaram sobre as formas de organização e estratégias que utilizam na rua para compor um ambiente mais aconchegante, normas e práticas que advêm do espaço casa. A fala a seguir revela que a rua pode ser compreendida como uma extensão do ambiente doméstico ou da casa propriamente dita:
Não que seja ruim estar na rua, ruim não é né, mas a gente tem que respeitar as normas das pessoas né, mesmas coisas quando tá dentro de casa é ali. Tu dormiu num ambiente, é como eu disse não procurar deixar sujeira, não fazer coisas que não precisa, manter o ambiente limpo né... que nem na rua é dentro de casa. A mãe ensinou desde criança que a gente tem que levantar e arrumar a cama pra dormir então eu não gosto de levantar e sair. (Gaia, 56 anos, a fortaleza)
Nessa passagem, a rua constitui-se uma possibilidade real de moradia do ponto de vista de quem nela habita. Sobre o sentido do que é a casa ou o espaço de moradia, esses achados corroboram R. Gomes (2006Gomes, R. D. C. M. (2006). Gente-Caracol: a cidade contemporânea e o habitar as ruas (Dissertação de mestrado, Instituto de Psicologia, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre).), que em seu estudo apresenta o termo Gente-Caracol, cunhado e apresentado inicialmente em matéria do Jornal Boca de Rua de 2004:
Morador de rua também tem casa. Como qualquer casa, é construída na rua, só que não tem paredes e é armada e desarmada conforme a necessidade. Ela é chamada de mocó e montada em um lugar para a pessoa dormir em paz. Muitas pessoas carregam seu mocó nas costas como caracol ou tartarugas. (Jornal Boca de Rua, 2004, citado por R. Gomes, 2006Gomes, R. D. C. M. (2006). Gente-Caracol: a cidade contemporânea e o habitar as ruas (Dissertação de mestrado, Instituto de Psicologia, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre)., p. 79)
A casa das pessoas que fazem da rua sua moradia tem suas especificidades. Alguns participantes desta pesquisa possuem local fixo de moradia, outros consideram-se “trecheiros”, ou seja, pessoa que transita de uma cidade à outra. No dia da entrevista, por exemplo, Gaia levava consigo um carrinho com sua casa, ou seja, embora dormisse sempre no mesmo lugar, sempre levava consigo tudo o que tinha.
Casa desmontável ao amanhecer e colada ao corpo, que continua seu perambular pela cidade. Para R. Gomes (2006Gomes, R. D. C. M. (2006). Gente-Caracol: a cidade contemporânea e o habitar as ruas (Dissertação de mestrado, Instituto de Psicologia, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre).), essa é uma tentativa de reproduzir uma noção de casa que traga centralidade, um norte em meio a tantas coisas desconexas e mutáveis do cotidiano da rua. Nessa perspectiva, o corpo passa a ser uma extensão da casa; a pessoa em situação de rua leva consigo os objetos que a constituem como indivíduo, leva junto tudo o que tem, sua identidade, seu pertencer. As pessoas em situação de rua levam sua casa junto a si e, como um caracol diante de uma ameaça do mundo, escondem-se dentro do seu casco, do seu casulo, fugindo do mundo e buscando um momento só seu, de olhar para si, diante dos movimentos frenéticos que a cidade produz.
Rua como proteção
A segunda subtemática, rua como proteção, traz à tona a discussão da rua como uma possibilidade de sobrevivência. Os relatos dos participantes indicam que, antes da ida às ruas, estes estiveram diante de situações de violação de direitos, em diferentes contextos da vida. Há inúmeras variáveis individuais, sociais e contextuais entre os motivos que levam as pessoas à situação de rua, em especial os problemas e conflitos familiares (Cunha & Rodrigues, 2009Cunha, J. V. Q., & Rodrigues, M. (Orgs.). (2009). Rua: aprendendo a contar: Pesquisa Nacional sobre População em Situação de Rua. Brasília, DF: Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome.; Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas, 2015Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas. (2015). Pesquisa censitária da população em situação de rua, caracterização socioeconômica da população adulta em situação de rua e relatório temático de identificação das necessidades desta população na cidade de São Paulo. São Paulo, SP: Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas. Recuperado de https://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/upload/Produtos/Produto%209_SMADS_SP.pdf
https://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/...
; Qualitest, 2019Qualitest. (2019). Pesquisa censitária da população em situação de rua, caracterização socioeconômica da população adulta em situação de rua e relatório temático de identificação das necessidades desta população na cidade de São Paulo. São Paulo, SP: Qualitest. Recuperado de https://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/upload/Produtos/Produto%209_SMADS_SP.pdf
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).
A rua como espaço de proteção foi citada pela participante Reia. Mulher negra, filha única, órfã de pai, moradora da periferia, tinha alguns tios que eram envolvidos com o tráfico de drogas e estava em situação de rua há cinco anos. Ela contou que, diante da morte de seus avós, precisou retornar a viver com sua mãe, usuária de substâncias psicoativas e que lhe expulsara de casa aos 14 anos, com quem mantinha uma relação conflituosa.
Minha mãe me expulsou de casa quando eu tinha 14 anos. Ela batia em mim e ela é usuária de crack, daí ela me expulsou e eu fui morar na rua... se minha vó não tivesse falecido eu ia tá muito bem, eu não ia tá na rua, eu ia tá com ela, ajudando e cuidando dela. Ela morreu com 90 anos, ela tinha Alzheimer. (Reia, 19 anos, a resiliente)
O que foi apontado pela participante vai ao encontro dos achados no estudo de M. A. Silva (2019Silva, M. A. S. (2019). Os determinantes de uma vivência nas ruas: reflexões necessárias. In 16º Congresso Brasileiro de Assistentes Sociais (pp. 1-10). Brasília, DF: Abepss.) acerca dos motivos pelos quais as pessoas passam a ocupar e viver no espaço da rua. Para a autora, essa situação ocorre por diversos fatores, dentre os quais se encontram abandono, perdas por mortes, conflitos ou brigas familiares. Rosa (2005Rosa, C. M. M. (2005). Vidas de rua. São Paulo, SP: Hucitec.) afirma que não se pode responsabilizar apenas a natureza econômica dos processos de ida às ruas e aponta que “há um conjunto variado de questões que se associam, notadamente as ligadas à fragilização e/ou quebra de vínculos afetivos familiares” (Rosa, 2005Rosa, C. M. M. (2005). Vidas de rua. São Paulo, SP: Hucitec., p. 192).
No que diz respeito ao caso de Reia, é possível notar que seus avós foram um fator de proteção e que, na ausência deles, ela encontrou na rua uma nova forma de sobrevida, ou seja, recorreu às ruas como forma de reexistir. A participante precisou decidir entre permanecer na relação conflituosa com a mãe ou pertencer à dinâmica do tráfico de drogas, pairada na sua família e no seu bairro. Dentre essas possibilidades, decidiu seguir só. A entrevistada contou que levou consigo os ensinamentos que sua avó lhe deu: “tem que fazer certo, olhar pra frente, ter fé em Deus, não olhar pro passado, seguir em frente, realizar os seus sonhos”.
A rua como proteção esteve presente na fala de outra participante que sofreu violência doméstica por parte de seu ex-marido. Ela relatou sua indignação ao falar que se sentia mais insegura dentro de casa do que atualmente na rua. Cabe aqui refletir sobre a falsa sensação de segurança que uma casa oferece. Ao comparar a sensação de segurança entre as categorias casa e rua, surge uma contradição. A casa pode, afinal, ser considerada sinônimo de segurança? O que é estar seguro? A fala de Gaia, que segue, contribui com esse debate:
Eu sofri violência doméstica dentro de casa. Dentro de casa, num ambiente com porta e janela fechada e aconteceu, foi horrível, sofri horrores, então pra mim da porta pra fora não é nada entendeu, então eu coloquei isso na minha mente... isso pra mim foi a pior experiência, dentro de casa...dentro de casa... não foi da porta pra fora, o que eu sofri da porta pra fora é leve perto do que eu sofri dentro de quatro paredes, aí eu peguei mais pânico de dentro de casa do que da rua. (Gaia, 56)
A questão da rua como proteção ficou mais evidente nos relatos das mulheres desta pesquisa, pois tiveram seus direitos violados no âmbito familiar ou sofreram violência doméstica e negligência familiar. Essa problemática foi discutida por F. Gomes (2016Gomes, F. E. S. (2016). Os sentidos de habitar para pessoas em situação de rua: um olhar fenomenológico (Dissertação de mestrado, Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal).), ao considerar a rua como extensão do núcleo de violações e de violência ou, então, como um ambiente acolhedor para quem foge de uma situação de violência e sofrimento. Trata-se, nesse sentido, de um lugar de reconstrução para algumas mulheres que habitam os espaços públicos por sentirem-se seguras e protegidas, longe de uma situação que lhes causava violência, dor e sofrimento (F. Gomes, 2016Gomes, F. E. S. (2016). Os sentidos de habitar para pessoas em situação de rua: um olhar fenomenológico (Dissertação de mestrado, Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal).; Tiene, 2004Tiene, I. (2004). Mulher moradora na rua: entre vivências e políticas sociais. Arthur Nogueira, SP: Alínea.).
Rua como transição
Na subtemática a rua como transição, apresentou-se a rua como situacional e momentânea, relacionada às dificuldades financeiras, como desemprego, falta de renda e, consequentemente, de suporte familiar. Por meio da narrativa exposta a seguir, é possível considerar que os participantes não estão satisfeitos e acomodados com sua situação atual e que pretendem utilizar os serviços da assistência social como propulsores para a saída das ruas.
É só uma passagem, é só um serviço que eu quero usar e ir embora e não precisar mais dele... o morador de rua é uma pessoa que passa por uma situação difícil na vida e a única alternativa dele é a rua, então o que ele vai procurar? Tem pessoas que se acostumam, eu, por exemplo, não consigo me acostumar. Eu entro em pânico, não durmo. Pra ti ter uma ideia, quando tô na rua eu não durmo por causa da situação, já fiquei quatro noites acordado sem dormir, fui dormir no quinto dia porque não aguentava mais. (Apolo, 30 anos, o persistente)
Esse aspecto também é debatido por Giorgetti (2012Giorgetti, C. (2012). Moradores de rua: uma questão social? São Paulo, SP: Fapesp.), que realizou um estudo comparativo entre pessoas em situação de rua em São Paulo e em Paris. A autora afirma que não foram encontradas diferenças entre os países, pois “trata-se de indivíduos sem uma habitação e que satisfazem tal necessidade seja procurando uma instituição social, seja se apropriando e transformando o espaço público em moradia” (Giorgetti, 2012Giorgetti, C. (2012). Moradores de rua: uma questão social? São Paulo, SP: Fapesp., p. 4).
A análise da rua como espaço de transição permite pensar que as pessoas que se encontram nessa situação buscam mecanismos para lidar com essa realidade e procuram, nos serviços da rede pública, alternativas diferentes de vida. Inclusive, ao longo dos anos, houve mudanças na nomenclatura que indica esse processo situacional; não se utiliza mais o termo morador de rua, mas pessoa em situação de rua ou, ainda, cidadãos, como proposto recentemente pelo relatório “Cidadãos em situação de rua: dossiê Brasil: grandes cidades”, da Universidade Federal de Juiz de Fora (Oliveira, 2020Oliveira, T. R. (2020, 29 de abril). Estudo inédito desfaz mitos sobre os moradores de rua no Brasil. Instituto Humanitas Unisinos. Recuperado de http://www.ihu.unisinos.br/78-noticias/598471-estudo-inedito-desfaz-mitos-sobre-os-moradores-de-rua-no-brasil
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).
Por fim, as significações em torno da categoria rua assumem inúmeras formas e desdobramentos. Se, por um lado, sempre foi denotada como perigosa, violenta e negativa, neste trabalho ela também assumiu novos contornos. Os relatos dos entrevistados indicaram que a rua pode assumir outras ou, ainda, novas possibilidades. Pode ser refúgio momentâneo ou ser vivenciada com o calor de um lar e nela se criarem laços fraternos e relações sociais, pois diante da impossibilidade de permanecerem em seus lares, a rua acolheu todos, sem distinção. Afinal, a rua acolhe quem dela precisa.
Vivências e significados da violência
É inegável que a PSR sofre as mais diversas formas de violência. Dados do censo da população em situação de rua de 2015 da cidade de São Paulo indicaram as principais formas de violência consideradas pelos participantes. Em primeiro lugar, aparece a agressão verbal, seguida de violência patrimonial (roubo e furto) e, depois, de agressão física (Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas, 2015Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas. (2015). Pesquisa censitária da população em situação de rua, caracterização socioeconômica da população adulta em situação de rua e relatório temático de identificação das necessidades desta população na cidade de São Paulo. São Paulo, SP: Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas. Recuperado de https://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/upload/Produtos/Produto%209_SMADS_SP.pdf
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). O mesmo censo realizado em 2019 constatou que 39,8% das pessoas em situação de rua já haviam sofrido violência policial. O estudo também citou outras formas de violência ocorridas na rua, como a violência entre pares, a violência advinda da guarda municipal, a violência de pessoas que passam na rua e a violência familiar (Qualitest, 2019Qualitest. (2019). Pesquisa censitária da população em situação de rua, caracterização socioeconômica da população adulta em situação de rua e relatório temático de identificação das necessidades desta população na cidade de São Paulo. São Paulo, SP: Qualitest. Recuperado de https://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/upload/Produtos/Produto%209_SMADS_SP.pdf
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).
A despeito disso, essa segunda temática, intitulada “vivências e significado da violência”, abordará as vivências de violência das pessoas em situação de rua e o significado que assumem na vida desses cidadãos. A partir disso, foi possível identificar que os participantes sofreram diferentes formas de violações, as quais incluíram violência doméstica, sexual, familiar, psicológica, institucional, física, de gênero, racial e simbólica. O intuito dessa temática não é abordar detalhadamente cada tipo de violência, mas lançar um olhar para o modo citado com maior ênfase na fala dos participantes: a violência simbólica.
Para os participantes, a violência vai muito além da violação física ou da agressão propriamente dita. Os relatos indicam que a violência proferida pela fala é tão letal quanto a que causa dano físico. Esse tipo de ato atinge diretamente a conduta, as atitudes e a moralidade dos sujeitos e, consequentemente, a sua ética. Para Pierre de Bourdieu (1989Bourdieu, P. (1989). O poder simbólico. Rio de Janeiro, RJ: Bertrand Brasil.), trata-se de uma violência “invisível”, a qual é legitimada por meios simbólicos de comunicação e conhecimento, que se constrói por meio da relação de subjugação-submissão, resultados de uma dominação consensual em todos os espaços sociais ou “campos” (L. Silva & Oliveira, 2017Silva, L. F., & Oliveira, L. (2017). O papel da violência simbólica na sociedade por Pierre Bourdieu. Revista FSA, 14(3), 160-174. Recuperado de http://www4.unifsa.com.br/revista/index.php/fsa/article/view/1342
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).
No relato dos participantes a violência simbólica foi classificada como preconceito, falta de educação, agressividade e covardia. Ao serem questionados sobre o que é violência, foi possível compreender que os participantes a entendem como algo que causa tanto dano físico quanto psíquico. Os entrevistados expressaram vivências de violência simbólica, que, por meio da palavra, fere a subjetividade, o campo psíquico e emocional do indivíduo, culminando, assim, em sofrimento e, consequentemente, na perpetuação das práticas e reproduções de violência dentro dos seus contextos e das suas relações sociais. A narrativa a seguir ilustra os contornos desse tipo de violação, que infere dor por meio da humilhação e opressão diante do outro.
Violência? Violência é agredir um ao outro, agredir fisicamente ou agredir em palavras, teus sentimentos, te deixar abalado, te deixar muito triste, te julgar de coisas que tu não fez, pra mim também é uma forma de violência porque é triste mexer com teus sentimentos, te deixar com dor. Isso aí é uma forma de violência pra mim (Fênix, 48 anos, aquele que renasceu).
Violência é ser agredida f isicamente e com palavras, às vezes as palavras dói mais. Eu me sinto vulnerável, entendeu? Se sentir vulnerável, ter que abaixar a cabeça para os outros... violência é covardia. (Íris, 33 anos, aquela que busca justiça)
A partir das situações ilustradas na fala dos sujeitos desta pesquisa, é possível identificar que a violência simbólica causa dor e sofrimento psíquico, deixando marcas na estrutura subjetiva de cada indivíduo. Para Bourdieu (1989Bourdieu, P. (1989). O poder simbólico. Rio de Janeiro, RJ: Bertrand Brasil.), “as relações de comunicações são, de modo inseparável, sempre, relações de poder que dependem, na forma e no conteúdo, do poder material ou simbólicos acumulados pelos agentes (ou pelas instituições) envolvidos nessa relação” (p. 11). A violência simbólica está presente nas estruturas sociais e mentais e é perpetuada pelas práticas discriminatórias. Ela é difícil de perceber e associar, pois não se resume a ferimentos visíveis, mas psíquicos.
Os participantes, além de compreenderem a violência como a desvalorização e o desmerecimento, citaram, ainda, que ela também está relacionada à falta de educação e ao preconceito. As narrativas a seguir ilustram os contornos desse tipo de violência e denunciam também um modo de violência racial velada.
Violência pra mim é preconceito, não física, mas como formação de caráter. É também falta de educação, é falta de conscientização. (Apolo, 30)
É quando uma pessoa te agride ou fala alguma coisa que a gente não gosta ou fala palavrão ou abusa, isso é violência, preconceito também. Uma palavra dói acho que mais que um tapa, já me chamaram de macaca, já me chamaram de um monte de coisa. Na escola falavam do meu cabelo, me chamavam de bombril. (Reia, 19)
Ao analisar as falas apresentadas, é possível afirmar que o preconceito é marcado pelo grau de dignidade e valor moral que a sociedade atribui aos sujeitos (M. L. Silva, 2009Silva, M. L. L. D. (2009). Trabalho e população em situação de rua no Brasil. São Paulo, SP: Cortez.). Mattos e Ferreira (2004Mattos, R. M., & Ferreira, R. F. (2004). Quem vocês pensam que (elas) são? Representações sobre a pessoa em situação de rua. Psicologia & Sociedade, 16(2), 47-58. doi: 10.1590/S0102-71822004000200007
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) buscaram, nesse sentido, compreender a representação social que a sociedade tem das pessoas em situação de rua. Eles identificaram que o preconceito é internalizado por essa categoria num processo de identificação do sujeito com as características que lhe são dirigidas, servindo, assim, de referência para a configuração da sua própria identidade. Fruto de um contexto sócio-histórico, a representação negativa é sentida como atributo individual e pode acabar produzindo sentimentos de fracasso e de incompetência social.
Assim sendo, observa-se que o imaginário construído pelas pessoas em geral sobre a PSR é composto pela ideia de “pessoa com menos valor” e é reforçado por práticas discriminatórias e preconceituosas que ocorrem dentro de um contexto sócio-histórico que sempre visou combater a vadiagem ou a mendicância. A criminalização da pobreza e as formas de violações de direitos, cabe destacar, são reforçadas pela sociedade, mas também pelo Estado (M. A. Silva, 2019Silva, M. A. S. (2019). Os determinantes de uma vivência nas ruas: reflexões necessárias. In 16º Congresso Brasileiro de Assistentes Sociais (pp. 1-10). Brasília, DF: Abepss.).
As narrativas de alguns participantes da pesquisa também evidenciam episódios de violência moral praticados por agentes da segurança pública. Muitas falas denunciam a violência simbólica produzida pela máquina estatal, que, para Mendonça (1996Mendonça, S. R. D. (1996). Estado, violência simbólica e metaforização da cidadania. Tempo, 1, 95-125. Recuperado de https://www.sinprodf.org.br/wp-content/uploads/2012/01/texto-1-estado-e-viol%C3%AAncia-simb%C3%B3lica.pdf
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), é a mais profunda e estrutural modalidade de violência perpetrada pelo Estado. Nas palavras de Dionísio:
Eles (guarda municipal) já têm na cabeça, esse não vale nada, como eles falam esse não tem valor nenhum, vocês são uns lixos, são o resto do mundo. As palavras ofensivas elas machucam mais que um tapa. É melhor tu dar uma facada do que tirar uma palavra ofensiva”. (Dionísio, 43).
Essa relação entre indivíduo e estado dá-se no que Pierre de Bourdieu (1997Bourdieu, P. (1997). Sobre a televisão. Oeiras, PI: Celta Editora.) chamou de “campo”, que, por sua vez, é “um espaço social estruturado, um campo de forças - há dominantes e dominados, há relações constantes, permanentes, de desigualdade, que se exercem no interior desse espaço - que é também um campo de lutas para transformar ou conservar esse campo de forças” (Bourdieu, 1997Bourdieu, P. (1997). Sobre a televisão. Oeiras, PI: Celta Editora., p. 57). É nesse campo de forças que a violência simbólica se apresenta. O Estado, destaca-se, detém o monopólio do uso legítimo da violência física e simbólica. Esta última é cometida com a cumplicidade entre quem sofre e quem pratica, sem que ambos tenham consciência disso, ou seja, ela não é percebida como tal, por isso perpassa as estruturas sociais de forma sutil e, por vezes, despercebida. Ela se torna peça chave na política estatal atual, não sendo possível definir Estado sem perpassar sobre violência simbólica (Rocha, 2016Rocha, A. F. O. D. (2016). Violência simbólica: o controle social na forma da lei. Porto Alegre, RS: EdiPUCRS.). Muitos dos entrevistados relataram que nunca denunciaram o abuso da força estatal e nunca buscaram respaldo judiciário por medo de retaliação. Os relatos indicam que os agressores fazem ameaças de morte e, segundo eles, as denúncias pioram a situação e podem culminar em perseguição policial, acarretando, assim, em maiores riscos e consequências:
Procuro a SAMU, a saúde. Eu não vou atrás dos meus direitos, nunca vou porque é perda de tempo, não vou ganhar nada com isso, capaz de ganhar mais desaforo ainda, se tu ir atrás dos teus direitos eles vão te rebaixar mais do que tu é, se tu tá caído eles vão te derrubar mais ainda. Se eu for atrás da guarda é até capaz de eu ir preso. (Dionísio, 43)
A situação da abordagem truculenta de agentes de segurança pública relatada por esse participante pode ser evidenciada em outros estudos, os quais indicam que, devido ao medo de represália, as pessoas em situação de rua que sofrem agressão não denunciam as situações de violação aos órgãos responsáveis e acabam se calando. As queixas de espancamento e violação de direitos são inúmeras e constantes contra essa população (Kunz, Heckert, & Carvalho, 2014Kunz, G. D., Heckert, A. L, & Carvalho, S. V. (2014). Modos de vida da população em situação de rua: inventando táticas nas ruas de Vitória/ES. Fractal: Revista de Psicologia, 26(3), 919-942. doi: 10.1590/1984-0292/1192
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; R. Gomes, 2006Gomes, R. D. C. M. (2006). Gente-Caracol: a cidade contemporânea e o habitar as ruas (Dissertação de mestrado, Instituto de Psicologia, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre).).
Ainda convém pontuar que a violência simbólica é permeada por ambivalências. De um lado, aparecem as práticas estatais de agentes de segurança pública, que violam e agridem o cidadão em situação de rua, por outro, aqueles que zelam pela proteção e que deveriam estar a serviço de todos. Essa ambivalência pode ser observada em outras estruturas sociais e na própria dinâmica da rua, aqui compreendida tanto como espaço de proteção quanto de risco.
Como visto, a violência simbólica perpetua-se por práticas discriminatórias do estado e da sociedade sob um conjunto da população. É facilmente instalada e difícil de se combater, pois determina regras de comportamentos e retira o sujeito do seu campo de indivíduo legitimado e de direitos. Portanto, podemos verificar que as experiências de violência acabam culminando em alguma forma de sofrimento, cujos efeitos apontam para os sentimentos de vulnerabilidade, insegurança e falta de reconhecimento que as diferentes formas de opressão acarretam.
Diante disso, cabe reforçar o papel dos movimentos sociais e das equipes que atuam nas políticas públicas de proteção às pessoas em situação de rua. Mesmo diante da necessidade de ampliação das políticas e intervenções, especialmente no que se refere à violência nas ruas, reconhecer o importante papel desses agentes é essencial. Desde a instituição e a implementação dos serviços de atendimento à PSR até a fiscalização e denúncia dos diversos tipos de violações sofridas por quem vive na rua, os movimentos sociais vêm ocupando um lugar central no Brasil (Martinelli, Nunes, & Machado, 2020Martinelli, T., Nunes, R. S., & Machado, V. F. (2020). O asseguramento dos direitos sociais a partir da política de assistência social para populações em situação de rua. Textos & Contextos, 19(1), e37186. doi: 10.15448/1677-9509.2020.1.37189
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). Portanto, consolidar esses coletivos e ampliar a participação social, além de fortalecer os serviços e as equipes que atuam no atendimento às pessoas em situação de rua, representam importantes estratégias de combate à violência e às violações de direitos na rua.
Considerações finais
Por meio das narrativas dos participantes, foi possível identificar histórias de vida marcadas por inúmeras violações de direitos e violências em diferentes contextos, ocorridas anteriormente à chegada às ruas. Os principais resultados demonstraram que a rua assume diferentes sentidos, pois, ao mesmo tempo em que se configura como um local de vulnerabilidade e insegurança, ela representa um espaço de sobrevivência e de possibilidades. A rua acolhe todos que nela chegam, seja por opção própria, por falta dela ou, ainda, para evitar situações de sofrimento e violência.
Com relação às vivências na rua, a violência apareceu como um elemento central. Os participantes da pesquisa relataram diferentes tipos de violência e práticas que retiram a dignidade do sujeito e perpetuam o lugar de exclusão, desmerecimento, discriminação e indiferença. Trata-se de práticas que caracterizam uma violência simbólica que fere o campo psíquico, simbólico e social, e ameaça a autonomia, a justiça e o livre exercício dos direitos desses cidadãos. Essa violência, salienta-se, não é percebida e identificada como tal nem por quem a exerce nem por quem sofre.
Finalmente, recomenda-se que novas pesquisas sejam realizadas nesse âmbito, na tentativa de compreender essas trajetórias e o que permeia esses “campos”, assim como as relações de dominação e poder que se estabelecem na estrutura social. O estado precisa atentar-se para o desenvolvimento de atividades e projetos que sejam condizentes com a realidade desses indivíduos, bem como para a qualificação dos profissionais de segurança pública que atuam junto a essa população, visto que, por vezes, reforçam a violência simbólica. Ainda, os dados apresentados evidenciam a necessidade de políticas públicas afirmativas que considerem as vivências da PSR, em direção à eliminação e à superação das desigualdades sociais.
Referências
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1
Para preservar a identidade dos participantes, os nomes aqui apresentados são fictícios e remetem a deuses(as) da mitologia. Os nomes foram escolhidos com base nas características pessoais dos participantes e a dominação que o acompanha foi atribuída com a finalidade de evidenciar elementos da sua história de vida, identificada pela pesquisadora.
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2
Este estudo tem aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Feevale, pois integra uma pesquisa maior, intitulada “População adulta em situação de rua de Novo Hamburgo/RS: vivências, demandas e possibilidades de intervenção”, vinculada à Universidade Feevale e aprovada em novembro de 2018, sob parecer nº 3.038.366. Destaca-se, ainda, que os participantes da pesquisa receberam o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) antes de iniciar a coleta dos dados.
Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
04 Dez 2023 -
Data do Fascículo
2023
Histórico
-
Recebido
19 Fev 2022 -
Aceito
04 Mar 2022