Resumo
Este ensaio foi elaborado dentro de uma perspectiva ativa de produção do conhecimento, a partir de uma metodologia adaptada da Aprendizagem Baseada em Problemas. O objetivo foi analisar coletiva e interdisciplinarmente a noção classificatória em torno do gênero. Foram consultadas 103 bibliografias, discutidas por 24 estudantes em Saúde Coletiva e elaborada uma síntese sobre as investigações e as experiências individuais e coletivas das discentes e do docente sobre a temática. Esta experiência pedagógica permitiu compreender a potência da linguagem na função de manter ou subverter estruturas hegemônicas. Concluiu-se que as construções e as fixações de identidades com base em práticas altamente reguladas com relação ao sexo e ao gênero reduzem as multiplicidades possíveis de ser e estar no mundo.
Palavras-chave
aprendizagem baseada em problemas; educação superior; saúde; relações de gênero
Resumen
Este ensayo fue elaborado dentro de una perspectiva activa de producción de conocimiento a partir de la metodología adaptada de Aprendizaje Basado en Problemas (ABP). El objetivo fue analizar colectiva e interdisciplinariamente la noción clasificatoria en torno al sexo/género. Se consultaron 103 bibliografías, discutidas por 24 estudiantes en Salud Colectiva. Se elaboró un análisis sobre las investigaciones y experiencias de los estudiantes y el docente sobre el tema. Esta experiencia pedagógica nos permitió comprender el poder del lenguaje en mantener o subvertir las estructuras hegemónicas. Concluimos que las construcciones y fijaciones de identidades basadas en prácticas altamente reguladas relacionadas con el sexo/género reducen las posibles multiplicidades de ser y estar en el mundo.
Palabras clave
aprendizaje basado en problemas; educación superior; salud; relaciones de género
Abstract
This essay was developed based on an active perspective of knowledge production adapted from the problem-based learning (PBL) methodology. It sought to collectively and interdisciplinarily analyze the categories of sex and gender. A total of 103 references were consulted, discussed by 24 students in Collective Health. A theoretical synthesis was elaborated about the individual and collective investigations and experiences of the students and professor regarding the topic. This pedagogical experience allowed us to understand the power of language has in maintaining or subverting hegemonic structures. In conclusion, the constructions and fixations of identities based on highly regulated sex/gender practices reduce the possible multiplicities of being in the world.
Keywords
problem-based learning; higher education; health; gender relations
Introdução
O presente ensaio foi elaborado dentro de uma perspectiva ativa de produção do conhecimento, a partir de uma metodologia adaptada da “Aprendizagem baseada em problemas ou projetos” (ABP), em inglês “Problem-based learning” (PBL). Este método foi inicialmente proposto e utilizado no curso de medicina na Universidade McMaster (Canadá) em 1969, quando docentes desta escola compreenderam ser preciso romper com os currículos tradicionais da medicina (Neville & Norman, 2007Neville, A. J., & Norman G. R. (2007). PBL in the undergraduate MD program at McMaster University: three iterations in three decades. Academic Medicine, 82(4), 370-374.). Exercer rupturas nos processos de produção de conhecimento são importantes momentos de deslocamento nas estruturas de poder, sobretudo no contexto deste trabalho que considera a temática das relações de gênero. Existe atualmente uma necessidade concreta de ampliar e romper com a pedagogia e os conceitos sobre sexo e gênero encontrados hegemonicamente na educação, na literatura acadêmica nas diversas áreas da saúde e também no imaginário coletivo (Souza & Dinis, 2010Souza, L. C., & Dinis, N. F. (2010). Discursos sobre homossexualidade e gênero na formação docente em biologia. Pro-Posições, 21(3), 119-134.). Conceitos estes que se esforçam em enquadrar o sexo como uma dimensão da ordem da “natureza” do ser humano e não discutem as experiências – em processos de aprendizagem – das(os) estudantes no contexto dos enquadramentos que estas categorias as(os) expõem.
Apoiada na ABP, foi sugerida uma mudança pedagógica nas atividades de formação do currículo do curso de medicina da Universidade de McMaster, quando docentes propuseram uma aprendizagem autodirigida, baseada na busca crítica e reflexiva de conhecimento (Neville & Norman, 2007Neville, A. J., & Norman G. R. (2007). PBL in the undergraduate MD program at McMaster University: three iterations in three decades. Academic Medicine, 82(4), 370-374.). O motivo para tal foi compreender a multiplicidade de cenários para serem pensados para cada pessoa e para cada conduta na área médica, fazendo com que os problemas-testes englobassem os problemas reais no cotidiano de cuidado e dos atendimentos em saúde (Barrows, 1986Barrows, H. S. (1986). A taxonomy of problem‐based learning methods. Medical education, 20(6), 48-486.; Hmelo-Silver, 2004Hmelo-Silver, C. E. (2004). Problem-based learning: What and how do students learn? Educational psychology review, 16(3), 235-266.; Neville & Norman, 2007Neville, A. J., & Norman G. R. (2007). PBL in the undergraduate MD program at McMaster University: three iterations in three decades. Academic Medicine, 82(4), 370-374.). Além disso, com a inserção constante de inúmeras tecnologias clínicas ao longo dos anos, informações e conhecimentos novos não imaginados ou previstos pelos docentes passaram a ser estampados constantemente durante o posterior exercício da atividade profissional (Barrows, 1986Barrows, H. S. (1986). A taxonomy of problem‐based learning methods. Medical education, 20(6), 48-486.; Hmelo-Silver, 2004Hmelo-Silver, C. E. (2004). Problem-based learning: What and how do students learn? Educational psychology review, 16(3), 235-266.; Neville & Norman, 2007Neville, A. J., & Norman G. R. (2007). PBL in the undergraduate MD program at McMaster University: three iterations in three decades. Academic Medicine, 82(4), 370-374.). Com isso, observou-se haver uma certa exigência de que estudantes e profissionais em saúde sejam sempre ativas(os) na busca pelo conhecimento.
A partir desta experiência – publicada em 1974 com a definição de PBL –, muitos trabalhos fizeram adaptações e foram publicados em todo o mundo sobre conceitos, experiências, resultados e iterações desta abordagem, principalmente com estudantes de medicina (Barrows, 1986Barrows, H. S. (1986). A taxonomy of problem‐based learning methods. Medical education, 20(6), 48-486.; Hmelo-Silver, 2004Hmelo-Silver, C. E. (2004). Problem-based learning: What and how do students learn? Educational psychology review, 16(3), 235-266.; Lopes et al., 2015Lopes, R. M., Pinho, L. A. de, Silva-Filho, M. V., Alves, N. G., & Alves, L. A. (2015). Aprendizagem Baseada em Problemas: uma proposta para a formação de Técnicos em Laboratórios de Saúde Pública. Revista Eletrônica de Comunicação, Informação e Inovação em Saúde, 9(2), 1-10., Lopes et al., 2019Lopes, R. M., Alves, N. G., Pierini, M. F., & Silva-Filho, M. V. (2019). Características gerais da aprendizagem baseada em problemas. fundamentos para a aplicação no ensino médio e na formação de professores. In R. M. Lopes, M. V. Silva Filho, & N. G. Alves (Org.), Aprendizagem Baseada em Problemas: fundamentos para a aplicação no ensino médio e na formação de professores (pp. 47-74). Publiki.; Mamede et al. 2006Mamede, S., Schmidt, H. G., & Norman, G. R. (2006). Innovations in problem-based learning: what can we learn from recent studies? Advances in Health Sciences Education, 11(4), 403-422.; Neville & Norman, 2007Neville, A. J., & Norman G. R. (2007). PBL in the undergraduate MD program at McMaster University: three iterations in three decades. Academic Medicine, 82(4), 370-374.). No entanto, apesar de o método considerar a importância das experiências pessoais e do conhecimento interdisciplinar, poucos estudos foram conduzidos fora da área médica e com abordagens socioculturais que reflitam as condições de saúde da população. Logo, construir um conhecimento sobre as diferenças sociais com base em sexo e gênero – a partir das experiências individuais e coletivas de estudantes de diversas formações dentro de um programa de pós-graduação em Saúde Coletiva – é de grande valia ao processo educacional e formativo em saúde e de grande contribuição ao campo das Ciências Sociais em Saúde.
O objetivo deste ensaio foi analisar a experiência da problematização como método construtivista/dialógico de ensino, na qual os conceitos de sexo e gênero, identificados na literatura indexada pelas estudantes, foram relacionados à visibilidade e à invisibilidade das diferenças sociais nas relações hegemônicas. Esta experiência de ensino-aprendizagem foi desenvolvida em uma disciplina de pós-graduação no campo da Saúde Coletiva.
Métodos
Historicamente, uma grande variedade de métodos pedagógicos é denominada de ABP ou PBL. A similitude entre eles é a utilização de temas, tópicos ou problemas na atividade educacional e a ausência de respostas únicas. O trabalho é estruturado em ciclos de aprendizagem sob a supervisão de uma professora ou um professor, conhecidos como tutoras(turores), que sugerem a distribuição da turma em grupos reduzidos de estudantes. conforme os interesses e as motivações nos temas, denominados grupos tutoriais (Lopes et al., 2019Lopes, R. M., Alves, N. G., Pierini, M. F., & Silva-Filho, M. V. (2019). Características gerais da aprendizagem baseada em problemas. fundamentos para a aplicação no ensino médio e na formação de professores. In R. M. Lopes, M. V. Silva Filho, & N. G. Alves (Org.), Aprendizagem Baseada em Problemas: fundamentos para a aplicação no ensino médio e na formação de professores (pp. 47-74). Publiki.). O método possui alguns objetivos principais que são seguidos em maior ou menor escala, a depender da proposta pedagógica, das habilidades docentes e das responsabilidades discentes. Resumidamente, são eles: 1- geração de hipóteses, investigação e análise; 2- aprendizagem autodirigida; 3- motivação no aprendizado; e 4- estruturação das informações (Barrows, 1986Barrows, H. S. (1986). A taxonomy of problem‐based learning methods. Medical education, 20(6), 48-486.; Hmelo-Silver, 2004Hmelo-Silver, C. E. (2004). Problem-based learning: What and how do students learn? Educational psychology review, 16(3), 235-266.; Lopes e al., 2019; Neville & Norman, 2007Neville, A. J., & Norman G. R. (2007). PBL in the undergraduate MD program at McMaster University: three iterations in three decades. Academic Medicine, 82(4), 370-374.).
A estratégia de ensino-aprendizagem referente a este ensaio ocorreu no ano de 2018. Esta disciplina de Ciências Sociais em Saúde é obrigatória na estrutura curricular de um Programa de Pós-Graduação em Saúde Coletiva. O processo, abarcando os principais objetivos do método da ABP, se desenvolveu em oito momentos principais:
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Distribuição da turma em grupos de três a quatro pessoas, conforme os temas de interesse (grupos tutoriais).
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Os grupos receberam uma questão norteadora “Como se constroem as diferenças sociais com base no sexo e no gênero?” e, em cada um desses grupos, foram discutidos os conhecimentos prévios sobre o tema. Neste momento, cada grupo rascunhou suas ideias e identificou as informações que consideraram importantes e as informações faltantes que seriam necessárias para melhor compreender o tema.
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Individualmente, de maneira autônoma, todas4 4 Considerando que a grande maioria das estudantes de programas de Pós-Graduação em Saúde Coletiva são mulheres, e a grande maioria das autoras que debatem sexo e gênero também são mulheres, neste texto trataremos sujeitos indeterminados e referências indefinidas sempre no feminino, com exceção de quando estivermos nos referenciando exclusivamente ao masculino. as estudantes realizaram a busca, a leitura e a sistematização dos conceitos e das matrizes teóricas encontradas sobre a temática sexo e gênero. Com isso, elaboraram um resumo com as fundamentações teóricas encontradas, suas problematizações e conclusões pessoais. Este texto deveria explicitar os procedimentos de busca, conter entre 1000 e 2000 palavras e seguir as normas ABNT de citação e referências utilizadas.
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Após essa busca autodirigida e o desenvolvimento do texto individual, todos os grupos tutoriais se reuniram conjuntamente em aula, compartilharam e discutiram as novas, as antigas e as diferentes informações/reflexões do processo de aprendizagem, sempre considerando o método e a temática em questão.
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O grupo tutorial, cujo tema de interesse foi “Sexo e gênero”, se responsabilizou pela leitura de todas as 24 investigações individuais sobre essa temática e realizou encontros extraclasse para discutir esses textos, as experiências discentes/tutor e os compartilhamentos/reflexões colocados em sala de aula.
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O grupo tutorial “Sexo e gênero” elaborou um texto coletivo de aproximadamente 6000 palavras e um seminário em que buscaram sintetizar as informações contidas nos textos individuais, nas experiências individuais/coletivas e nas reflexões trazidas pela ABP.
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O texto coletivo foi enviado para todas as discentes e para o tutor, uma semana antes da apresentação do seminário. Tanto o texto coletivo quanto a apresentação do seminário foram novamente discutidos pela turma.
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Após o seminário, o grupo tutorial “Sexo e gênero”, composto pelas autoras deste ensaio, discutiu novamente as reflexões trazidas pelo seminário; identificou as informações consideradas importantes e as informações faltantes para melhor compreender o tema; e redigiu este texto.
Resultados
Para a estruturação final da temática “Sexo e gênero”, o grupo tutorial foi composto por três mulheres, cada uma de uma área de concentração da Saúde Coletiva (Ciências Sociais em Saúde; Epidemiologia; e Política, Planejamento e Gestão em Saúde) e cujas motivações neste ensaio permeiam seus respectivos temas de pesquisa, quais sejam: Estudo Cultural sobre as atividades profissionais relacionadas à saúde sexual; Fatores de risco para feminicídios; e Experiências feministas no território de cuidado da Rua.
Do total de 24 estudantes que participaram desta pesquisa, a grande maioria delas era mulheres (75%); 14 do mestrado (58,3%) e dez do doutorado (41,7%) em Saúde Coletiva; das áreas de concentração de “Política, Planejamento e Gestão em Saúde” (45,8%), “Epidemiologia” (37,5%) e “Ciências Sociais em Saúde” (16,7%). A turma foi composta por estudantes graduadas em enfermagem (16,7%), medicina (16,7%), fisioterapia (12,5%), psicologia (12,5%), nutrição (8,3%), odontologia (8,3%), serviço social (8,3%), administração hospitalar (4,2%), comunicação social (4,2%), pedagogia (4,2%) e terapia ocupacional (4,2%).
Os textos individuais disponibilizados pela turma sobre as diferenças sociais com base em sexo e gênero utilizaram o total de 103 referências bibliográficas, sendo, em média, seis referências para elaborar cada texto individual, com utilização mínima de duas e máxima de 17 bibliografias. As discentes incluíram referências desde o ano de 1982 até o ano 2018 (36 anos), das quais metade foi publicada ou reeditada nos últimos dez anos. A grande maioria das referências bibliográficas utilizadas estava no idioma português (84,5%), mas foram utilizadas também referências nos idiomas inglês (12,6%) e espanhol (2,9%).
As principais bases de dados consultadas para a pesquisa foram a Scientific Electronic Library Online - Scielo (26,3%); o buscador Google Acadêmico (21,1%); e a Biblioteca Virtual em Saúde - BVS (15,8%). Também se valeram de outros recursos, tais como: dicionários (10,5%); bibliotecas (5,3%); os Descritores em Ciências da Saúde - DeCS (5,3%); o Google (5,3%); referências utilizadas em disciplinas anteriores (5,3%); e resoluções/políticas nacionais (5,3%). Entre os termos de busca mais frequentemente usados estiveram: gênero (25,9%); sexo (22,2%); diferenças sociais (11,1%); diferença (7,4%); e relações de gênero (7,4%).
Do total de 103 textos referenciados, os mais consultados na busca autodirigida foram:
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“Gênero: uma categoria útil de análise histórica”, da autora Joan Scott, publicado no ano 1989 e, posteriormente, traduzido para o português (Scott, 1989Scott, J. W. (1989). Gênero: uma categoria útil para análise histórica (C. R. Dabat, & M. B. Ávila, Trad, Texto original: Gender: a useful category of historical analyses. Gender and the politics of history). Columbia University Press.). Foi utilizado por nove estudantes – 37,5% da turma.
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“Problemas de gênero: feminismo e subversão da identidade”, da autora Judith Butler, traduzido e publicado em português no ano de 2003 (Butler, 2003Butler, J. (2003). Problemas de gênero: feminismo e subversão da identidad. (R. Aguiar, Trad.). Civilização Brasileira.). Foi utilizado por seis estudantes – 25,0% da turma.
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“Diferença e igualdade nas relações de gênero: Revisando o debate”, da autora Maria de Fátima Araújo, publicado em 2005 (Araújo, 2005). Foi utilizado por cinco estudantes – 20,8% da turma.
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“História da sexualidade I: A vontade de saber”, do autor Michel Foucault, traduzido e publicado em português no ano de 1988 (Foucault, 1988Foucault, M. (1988). História da sexualidade I: A vontade de saber (13 ed.). Graal.). Foi utilizado por quatro estudantes – 16,7% da turma.
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“Política Nacional de Saúde Integral de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais”, publicado pela Secretaria de Gestão Estratégica e Participativa do Ministério da Saúde do Brasil no ano de 2013 (Brasil, 2013). Foi utilizado por três estudantes – 12,5% da turma.
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“‘Gênero’ para um dicionário marxista: a política sexual de uma palavra”, da autora Donna Haraway, traduzido e publicado em português no ano de 2004 (Haraway, 2004Haraway, D. (2004). "Gênero" para um dicionário marxista: a política sexual de uma palavra. Cadernos pagu, 22, 201-246.). Foi utilizado por três estudantes – 12,5% da turma.
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“Inventando o Sexo: Corpo e Gênero dos gregos a Freud”, do autor Thomas Laqueur, traduzido e publicado em português no ano de 2001 (Laqueur, 2001Laqueur, T. (2001). Inventando o sexo. Relume Dumará.). Foi utilizado por três estudantes – 12,5% da turma.
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“Uma ciência da diferença: sexo e gênero na medicina da mulher”, da autora Fabíola Rohden, publicado em 2009 (Rohden, 2009Rohden, F. (2009). Uma ciência da diferença: sexo e gênero na medicina da mulher (2. ed.). Fiocruz.). Foi utilizado por três estudantes – 12,5% da turma.
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“Desigualdade social e o conceito de gênero”, da autora Juliana Anacleto dos Santos, publicado em 2010 (Santos, 2010Santos, J. A. (2010). Desigualdade social e o conceito de gênero. Editora UFJF.). Foi utilizado por três estudantes – 12,5% da turma.
As 94 demais referências bibliográficas consultadas para construir os 24 textos individuais foram utilizadas por duas ou por apenas uma discente. Discutimos esses resultados, considerando as referências usadas, os textos individuais e as experiências trazidas em aula dentro do que julgamos ser mais relevante para o tema. Trechos dos textos originais das estudantes foram incorporados, em itálico, ao longo da discussão para ilustrar os pontos trabalhados.
Discussão dos resultados
O campo educacional em Saúde Coletiva é um campo de conhecimento interdisciplinar, de composição heterogênea tanto institucional quanto profissionalmente, abrangendo disciplinas básicas como as Ciências Sociais em Saúde; a Política, planejamento e gestão em saúde; e a Epidemiologia (Loyola, 2012Loyola, M. A. (2012). O lugar das ciências sociais na saúde coletiva. Saúde e sociedade, 21(1), 9-14.; Luz, 2009Luz, M. T. (2009). Complexidade do campo da Saúde Coletiva: multidisciplinaridade, interdisciplinaridade, e transdisciplinaridade de saberes e práticas - análise sócio-histórica de uma trajetória paradigmática. Saúde e sociedade, 18(2), 304-311.; Nunes, 1994Nunes, E. D. (1994). Saúde coletiva: história de uma ideia e de um conceito. Saúde e Sociedade, 3(2), 5-21., 1996, 2005; Osmo & Schraiber, 2015Osmo, A., & Schraiber, L.B. (2015). O campo da Saúde Coletiva no Brasil: definições e debates em sua constituição. Saúde e sociedade, 24(Suppl. 1), 205-218.; Paim & Almeida Filho, 1998Paim, J. S., & Almeida-Filho, N. (1998). Saúde coletiva: uma “nova saúde pública” ou campo aberto a novos paradigmas? Revista de Saúde Pública, 32(4), 299-316.). A pedagogia em Saúde Coletiva iniciou sua prática discursiva nos anos 1970, com os primeiros cursos de pós-graduação stricto sensu (mestrado e doutorado), foi se estruturando a partir de 1980 e se ampliando progressivamente até a atualidade (Nunes, 1994Nunes, E. D. (1994). Saúde coletiva: história de uma ideia e de um conceito. Saúde e Sociedade, 3(2), 5-21., 1996Nunes, E. D. (1996). Saúde Coletiva: revisitando a sua história e os cursos de pós-graduação. Ciência & Saúde Coletiva, 1(1), 55-69., 2005Nunes, E. D. (2005). Pós-graduação em saúde coletiva no Brasil: histórico e perspectivas. PHYSIS: Revista Saúde Coletiva, 15(1), 13-38.; Osmo & Schraiber, 2015Osmo, A., & Schraiber, L.B. (2015). O campo da Saúde Coletiva no Brasil: definições e debates em sua constituição. Saúde e sociedade, 24(Suppl. 1), 205-218.). Para conceituar a Saúde Coletiva, evidenciam-se principalmente o posicionamento central na saúde; os aspectos sociais da saúde; a discussão do conceito como “campo vivo”, sempre em construção; a discussão num tom interrogativo sobre o caráter coletivo do campo; e as mudanças em conceitos da saúde ao longo dos anos no Brasil – passando pelo Projeto Preventivista, Saúde Pública, Medicina Social até o atual conceito de Saúde Coletiva (Loyola, 2012Loyola, M. A. (2012). O lugar das ciências sociais na saúde coletiva. Saúde e sociedade, 21(1), 9-14.; Luz, 2009Luz, M. T. (2009). Complexidade do campo da Saúde Coletiva: multidisciplinaridade, interdisciplinaridade, e transdisciplinaridade de saberes e práticas - análise sócio-histórica de uma trajetória paradigmática. Saúde e sociedade, 18(2), 304-311.; Nunes, 1994Nunes, E. D. (1994). Saúde coletiva: história de uma ideia e de um conceito. Saúde e Sociedade, 3(2), 5-21., 1996, 2005; Osmo & Schraiber, 2015Osmo, A., & Schraiber, L.B. (2015). O campo da Saúde Coletiva no Brasil: definições e debates em sua constituição. Saúde e sociedade, 24(Suppl. 1), 205-218.; Paim & Almeida Filho, 1998). O perfil das estudantes neste estudo corroborou as descrições na literatura sobre o campo da Saúde Coletiva, dando ênfase à interdisciplinaridade profissional das estudantes.
No processo educacional sobre Ciências Sociais em Saúde do programa de pós-graduação em Saúde Coletiva, em que as autoras (discentes) e o autor (docente) deste artigo estiveram presentes, o conceito de sexo – em grande parte das discussões e dos textos analisados – esteve relacionado ao sexo genital ou sexo cromossomático, que dizem respeito às diferenças genitais (órgãos sexuais ou reprodutores externos e internos), cromossômicas (XY, XX ou outras combinações) e hormonais (produção em maior ou menor quantidade de progesterona, estrogênio e testosterona) (Heilborn, 1994Heilborn, M. L. (1994). De que gênero estamos falando. Sexualidade, gênero e sociedade, 1(2), 1-6.; Nogueira, 2001Nogueira, C. (2001). Um novo olhar sobre as relações sociais de gênero. Fundação Calouste Gulbenkian.; Olinto, 1998Olinto, M. T. A. (1998). Reflexões sobre o uso do conceito de gênero e/ou sexo na epidemiologia: um exemplo nos modelos hierarquizados de análise. Revista Brasileira de Epidemiologia, 1(2), 161-169.). A partir deste conceito, diz-se que os seres são determinados “naturalmente” como fêmeas/feminino, intersexuais ou machos/masculinos. No entanto, os debates trazidos pelas discentes em sala de aula se basearam em muitos outros estudos. Estudos estes que fazem uma crítica a qualquer definição que traga essa imputação de sexo como algo “natural” e biológico, e sempre lembrando que a biologia é um espaço político. Discutimos e compreendemos o sexo, tanto órgão como prática, não como um lugar biológico preciso e tampouco uma pulsão natural, mas sim, como uma tecnologia que fixa e reduz os corpos às suas respectivas zonas erógenas (Preciado, 2014Preciado, B. (2014). Manifesto contrassexual (M. P. G. Ribeiro, Trad.). n-1 edições.).
Estas noções classificatórias em torno do sexo, como muito bem colocado pela autora Judith Butler, manifestam-se como um poder de produzir – demarcar, fazer, circular, diferenciar – os corpos, a partir de práticas que são altamente reguladas (Butler, 2000Butler, J. (2000). Corpos que pesam: sobre os limites discursivos do “sexo”. In G. L. Louro, O corpo educado: pedagogias da sexualidad. (pp. 151-172). Belo Horizonte: Autêntica.). E nesse sentido, ao longo da história, através de estratégias discursivas, a masculinidade é descrita em função de sua relação com dispositivos tecnológicos, e a feminilidade é definida em função de sua disponibilidade sexual e reprodutiva (Preciado, 2014Preciado, B. (2014). Manifesto contrassexual (M. P. G. Ribeiro, Trad.). n-1 edições.).
Parte dos textos individuais trouxe um panorama histórico sobre a construção de uma ciência da diferença sexual no campo da saúde. Um dos textos construídos por uma estudante relatou que:
Antes do século XVIII, a justificativa para a categorização dos corpos enquanto diferentes estariam relacionadas às temperaturas e que indicariam os “graus de perfeição” deste corpo (Rohden, 2003Rohden, F. (2003). A construção da diferença sexual na medicina. Cadernos de Saúde Pública, 19(Suppl. 2), S201-S212.; 2009Rohden, F. (2009). Uma ciência da diferença: sexo e gênero na medicina da mulher (2. ed.). Fiocruz.). Ambos órgãos genitais seriam iguais, porém com diferença de graus. Dependendo da quantidade de calor, o órgão genital seria externalizado ou internalizado.
O curioso é que com isso, entenderam em graus, o órgão genital mais externalizado – homens – como algo mais desenvolvido, e o órgão genital mais internalizado – mulheres – como algo pouco desenvolvido, imperfeito (Rohden, 2003Rohden, F. (2003). A construção da diferença sexual na medicina. Cadernos de Saúde Pública, 19(Suppl. 2), S201-S212., 2009).
É importante observarmos, na história, todo o tipo de manipulação com os corpos das mulheres e nos surpreendemos com todo o tipo de justificativas para o controle e a fixação de identidades, a partir da “Educação” e da “Ciência”. Considerando a perspectiva de sexo/gênero, a “Ciência” em saúde contribui e contribuiu enormemente para as regulações utilitárias e abusivas sobre os corpos das mulheres. Historicamente, alguns cientistas argumentavam que a natureza fez uma diferenciação “inata” entre os dois sexos e que, por isso, era preciso que a sociedade respeitasse essa diferença e promovesse/mantivesse um comportamento relacionado com esses “fatos” (Rohden, 2003Rohden, F. (2003). A construção da diferença sexual na medicina. Cadernos de Saúde Pública, 19(Suppl. 2), S201-S212.). Isso foi construído, tendo em conta que o masculino estaria relacionado a inteligência, habilidade, força; e o feminino, ao sensível, ao sedentário, ao melancólico (Rohden, 2003Rohden, F. (2003). A construção da diferença sexual na medicina. Cadernos de Saúde Pública, 19(Suppl. 2), S201-S212.).
Um dos apontamentos relevantes, durante as discussões suscitadas pelo seminário, se refere à necessidade de demarcar que muitas das críticas quanto a estruturas, hierarquias e fixações acerca do sexo/gênero, do mesmo modo devem ser observadas nas questões de raça e etnicidades, já que a apropriação dos respectivos corpos em nome da “Ciência” opera por distintos dispositivos, ainda mais opressores e violentos, merecendo mais estudos e aprofundamentos.
Em suma, “gênero” é uma esfera social posta sobre um corpo sexuado (Scott, 1989Scott, J. W. (1989). Gênero: uma categoria útil para análise histórica (C. R. Dabat, & M. B. Ávila, Trad, Texto original: Gender: a useful category of historical analyses. Gender and the politics of history). Columbia University Press.) e deve ser lido junto a perspectivas que considerem raça, classe e os variados territórios geográficos e existenciais.
Durante as discussões no campo da Saúde Coletiva, temas de grande relevância para a área, como a depressão, estiveram presentes durante a discussão de sexo/gênero:
A depressão, por exemplo, ocorre com frequência duas vezes maior nas mulheres que nos homens, o que está associado não somente à depreciação social das características femininas, mas também ao atravessamento dos estereótipos de gênero no diagnóstico: mesmo quando apresentam sintomas idênticos, a probabilidade do médico diagnosticar a depressão em mulheres é significativamente maior do que nos homens (OMS, 2002).
(Ferraz & Kraiczyk, 2010Ferraz D., & Kraiczyk J. (2010) Gênero e políticas públicas de saúde – construindo respostas para o enfrentamento das desigualdades no âmbito do SUS. Revista de Psicologia da UNESP. 9(1),70-82., p. 72)
Trabalhamos ao longo da disciplina, principalmente, com os conceitos de gênero trazidos por três autoras: Joan Scott, Judith Butler e Paul Beatriz Preciado. As autoras Joan Scott (1989Scott, J. W. (1989). Gênero: uma categoria útil para análise histórica (C. R. Dabat, & M. B. Ávila, Trad, Texto original: Gender: a useful category of historical analyses. Gender and the politics of history). Columbia University Press., 2010)Scott, J. W. (2010). Gender: still a useful category of analysis? Diogenes, 57(1), 7-14. e Mara Viveros Vigoya (2016)Vigoya, M. V. (2016). Sex/Gender. In L. Dish, & M. Hawkesworth, The Oxford Handbook of Feminist Theor. (pp. 852-873). Oxford University Press. argumentam o gênero como uma classificação de relações sociais construídas histórico-culturalmente a partir das definições de sexo. Para compreender como essa categoria foi construída historicamente, foi necessário entender quatro elementos associados a essa construção, a saber: 1- os símbolos culturais que remetem a representações simbólicas, como as figuras religiosas de Eva e Maria para representar as mulheres; 2- os conceitos normativos encontrados na religião, na política, na ciência e na educação, que colocam em evidência interpretações do sentido dos símbolos, por exemplo do feminino e do masculino; 3- a noção do político e referência às instituições e às organizações; e 4- a identidade subjetiva (Scott, 1989Scott, J. W. (1989). Gênero: uma categoria útil para análise histórica (C. R. Dabat, & M. B. Ávila, Trad, Texto original: Gender: a useful category of historical analyses. Gender and the politics of history). Columbia University Press.). Logo, o conceito de gênero é entendido aqui como uma decodificação das representações simbólicas, normativas, políticas e subjetivas atribuídas ao feminino e ao masculino, compreendendo as relações complexas entre as diversas formas de interação humana (Scott, 1989Scott, J. W. (1989). Gênero: uma categoria útil para análise histórica (C. R. Dabat, & M. B. Ávila, Trad, Texto original: Gender: a useful category of historical analyses. Gender and the politics of history). Columbia University Press.).
Judith Butler (1993Butler, J. (1993). Gender as performance: An interview with Judith Butler. Entrevista realizada por Peter Osborne e Lynne Segal. Radical philosophy, 67(67), 32-39., 2000Butler, J. (2000). Corpos que pesam: sobre os limites discursivos do “sexo”. In G. L. Louro, O corpo educado: pedagogias da sexualidad. (pp. 151-172). Belo Horizonte: Autêntica., 2003)Butler, J. (2003). Problemas de gênero: feminismo e subversão da identidad. (R. Aguiar, Trad.). Civilização Brasileira. traz o conceito de gênero como um artifício flutuante; uma “categoria múltipla e relacional que abarca códigos linguísticos institucionalizados e representações políticas e culturais” (Santos, 2013Santos, H. M. (2013). A importância de discutir gênero na psicologia. In D. S. V. Andrade & H. M. Santos (Orgs.), Gênero na psicologia: articulações e discussões (pp. 19-33). Salvador: CRP-03, p. 24). A autora não encontra correspondência imediata entre sexo e gênero, visto que é possível haver gênero feminino sobre um sexo masculino (e vice-versa), referenciando-se somente pelos elementos sexuais biológicos. Gênero, então, é uma interpretação múltipla do sexo (Butler, 1993Butler, J. (1993). Gender as performance: An interview with Judith Butler. Entrevista realizada por Peter Osborne e Lynne Segal. Radical philosophy, 67(67), 32-39.). Butler reconhece que esta ruptura foi importante para o movimento feminista fugir do determinismo biológico a respeito do “papel natural” da mulher e do homem (Butler, 1993Butler, J. (1993). Gender as performance: An interview with Judith Butler. Entrevista realizada por Peter Osborne e Lynne Segal. Radical philosophy, 67(67), 32-39.). Como discutido com relação ao sexo, a marca do gênero também qualifica os corpos como humanos e, com isso, aquelas imagens corporais, que não se encaixam em nenhum gênero, ficariam fora do humano (Butler, 2003Butler, J. (2003). Problemas de gênero: feminismo e subversão da identidad. (R. Aguiar, Trad.). Civilização Brasileira.).
O poder ocupa um lugar privilegiado no conceito de gênero e sexo, pois as diferenças entre os sexos/os gêneros constroem continuamente diferenças sociais de acesso aos recursos produtivos, simbólicos e culturais hegemônicos (Connell & Pearse, 2015Connell, R., & Pearse, R. (2015). A questão do gênero. In R. Connell, & R. Pearse, Gênero: uma perspectiva global. Compreendendo o gênero da esfera pessoal à política no mundo contemporâneo. (M. Moschkovich, Trad. e Rev. Técnica, pp. 29-50). nVersos.; Scott, 1989Scott, J. W. (1989). Gênero: uma categoria útil para análise histórica (C. R. Dabat, & M. B. Ávila, Trad, Texto original: Gender: a useful category of historical analyses. Gender and the politics of history). Columbia University Press., 2010Scott, J. W. (2010). Gender: still a useful category of analysis? Diogenes, 57(1), 7-14.). O que significa dizer que a classificação de gênero e de sexo legitima as relações de poder, mostrando um tipo de valorização social e política. Para manter essas relações de poder estabelecidas entre os sexos/os gêneros, há uma necessidade constante de que os discursos pareçam seguros, fixos e fora de qualquer construção social, ou seja, necessitam parecer como que fazendo parte de uma ordem natural ou divina (Scott, 1989Scott, J. W. (1989). Gênero: uma categoria útil para análise histórica (C. R. Dabat, & M. B. Ávila, Trad, Texto original: Gender: a useful category of historical analyses. Gender and the politics of history). Columbia University Press.). A construção de um discurso da natureza normatiza as formas de ser e de estar no mundo e reduz as multiplicidades possíveis com relação ao sexo e ao gênero.
Os poderes normativos de doutrinas religiosas, educativas e científicas produzem, outorgam e interpretam o sentido dos símbolos, fixam os discursos e, por isso, limitam e controlam todas as suas possibilidades (Connell & Pearse, 2015Connell, R., & Pearse, R. (2015). A questão do gênero. In R. Connell, & R. Pearse, Gênero: uma perspectiva global. Compreendendo o gênero da esfera pessoal à política no mundo contemporâneo. (M. Moschkovich, Trad. e Rev. Técnica, pp. 29-50). nVersos.; Foucault, 1999Foucault, M. (1999). A ordem do discurso. (Aula inaugural no Collège de France, pronunciada em 2 de dezembro de 1970, L. F.de A. Sampaio, Trad.). Loyola.; Quijano, 2005Quijano, A. (2005). A colonialidade do saber: eurocentrismo e ciências sociais. Perspectivas latino-americanas. CLACSO, Consejo Latinoamericano de Ciencias Sociales.; Scott, 1989Scott, J. W. (1989). Gênero: uma categoria útil para análise histórica (C. R. Dabat, & M. B. Ávila, Trad, Texto original: Gender: a useful category of historical analyses. Gender and the politics of history). Columbia University Press.). Discursos religiosos fazem um paralelo com os discursos da natureza e seguem com expressões que ressaltam o caráter natural das mulheres como trabalhadoras dedicadas às suas respectivas famílias e o sexo como parte da natureza essencial, biológica e determinante da vida pessoal e pública das pessoas (Connell & Pearse, 2015Connell, R., & Pearse, R. (2015). A questão do gênero. In R. Connell, & R. Pearse, Gênero: uma perspectiva global. Compreendendo o gênero da esfera pessoal à política no mundo contemporâneo. (M. Moschkovich, Trad. e Rev. Técnica, pp. 29-50). nVersos.). Há um grande esforço social, pelas mãos de legisladores e instituições religiosas, para conduzir o comportamento sobre o que é considerado adequado para as pessoas (Connell & Pearse, 2015Connell, R., & Pearse, R. (2015). A questão do gênero. In R. Connell, & R. Pearse, Gênero: uma perspectiva global. Compreendendo o gênero da esfera pessoal à política no mundo contemporâneo. (M. Moschkovich, Trad. e Rev. Técnica, pp. 29-50). nVersos.).
Existe parte da sociedade que aceita a pluralidade sexual contemporânea, entretanto muitos grupos tendem a lidar com a questão com agressividade e intolerância, muitas vezes se utilizando das instituições sociais tradicionais como a família por exemplo para justificar o extremismo
(Louro, 2008Louro, G.L. (2008) Gênero e Sexualidade: pedagogias contemporâneas. Pro-posições, 19(2), 56.).
Bourdieu citado em Carvalho (2011)Carvalho, M. P. (2011). O conceito de gênero: uma leitura com base nos trabalhos do GT Sociologia da Educação da ANPEd (1999-2009). Revista Brasileira de Educação, 16(46), 99-117., ao analisar a onipresença da dominação masculina, vê que ela se instala de maneira objetivada no mundo social, funcionando como um princípio universal de visão de mundo e ordenador da sociedade. Trata-se de um sistema simbólico, sexuado, baseado em dualidades opostas que naturalizam esta dominação como consequência e não como causa (Bourdieu citado em Carvalho, 2011Carvalho, M. P. (2011). O conceito de gênero: uma leitura com base nos trabalhos do GT Sociologia da Educação da ANPEd (1999-2009). Revista Brasileira de Educação, 16(46), 99-117.). Essa sua dimensão simbólica, hegemônica, dificulta pensar e agir fora dela, pois estão inscritas nos “habitus” (sistemas de disposições adquiridas que internalizam as estruturas sociais) e nos corpos (Bourdieu citado em Carvalho, 2011Carvalho, M. P. (2011). O conceito de gênero: uma leitura com base nos trabalhos do GT Sociologia da Educação da ANPEd (1999-2009). Revista Brasileira de Educação, 16(46), 99-117.). Identificamos aí uma violência simbólica na sociedade, exercida entre todos os gêneros.
O termo “gênero”, no seu uso mais recente, como estratégia de referir-se à organização social na relação entre os sexos, parece ter sido utilizado primeiro entre feministas americanas que insistiam no caráter fundamentalmente social das distinções baseadas no sexo e defendiam que a pesquisa sobre as mulheres transformaria os paradigmas no seio de cada disciplina (Scott, 1989Scott, J. W. (1989). Gênero: uma categoria útil para análise histórica (C. R. Dabat, & M. B. Ávila, Trad, Texto original: Gender: a useful category of historical analyses. Gender and the politics of history). Columbia University Press.). A partir daí, o interesse no termo funcionou como uma forma de reivindicar os direitos das mulheres, trabalhar em prol da mudança social e fortalecer o trabalho intelectual e teórico das disciplinas científicas (Alonso, 1999Alonso, I. A. (1999). El significado del género en las Ciencias Sociales. Política Y Sociedad, 32, 9-21.).
A Sociologia contemporânea efetuou importantes rupturas, entre elas a desconstrução das dicotomias estruturalistas, dando lugar, nas Ciências Sociais, a abordagens não totalizantes e a um longo processo de transição paradigmática. No entanto, a maioria das teorizações sobre gênero não foge muito dos quadros tradicionais das Ciências Sociais, trazendo um caráter limitado na medida em que inclui generalizações redutoras ou simples demais que não contribuem muito na elaboração de análises que levem a mudanças (Scott, 1989Scott, J. W. (1989). Gênero: uma categoria útil para análise histórica (C. R. Dabat, & M. B. Ávila, Trad, Texto original: Gender: a useful category of historical analyses. Gender and the politics of history). Columbia University Press.). Scott (1989)Scott, J. W. (1989). Gênero: uma categoria útil para análise histórica (C. R. Dabat, & M. B. Ávila, Trad, Texto original: Gender: a useful category of historical analyses. Gender and the politics of history). Columbia University Press. discute a importância de descrever os fatos históricos e ir além da rejeição ao caráter fixo e permanente das oposições binárias, revertendo e deslocando suas construções hierárquicas, para analisar as diferenças sociais entre os sexos/os gêneros. Nesse sentido, suas contribuições giram em torno das condicionalidades e das relações de poder que configuram as categorias que escolhemos para realizar as nossas análises. Desnudar os mecanismos e os jogos de força que constituem essas análises e categorias ganha lugar de destaque para as mudanças das estruturas hegemônicas.
Desconstruções e rupturas talvez sejam as palavras-chave que melhor se encaixem na realidade com que nos deparamos. Desviar de um sistema prescritivo e normativo, que segue impondo regras e normas de ser, estar e agir, e deixar emergir um cenário onde as mais variadas formas de relacionar-se assumam uma posição de franca expressão enunciativa das verdades conectadas ao subjetivo, ou seja, o contemporâneo abrindo-se à aceitação de uma mescla de signos que sejam validados socialmente, equiparando sujeitos em um contexto igualitário.
Preciado (2014)Preciado, B. (2014). Manifesto contrassexual (M. P. G. Ribeiro, Trad.). n-1 edições. contribuiu significativamente nesse sentido, quando desconstrói as teorias discursivas explanadas até agora e coloca o gênero não simplesmente como performativo e nem como um efeito das práticas culturais linguístico-discursivas. Tanto o sexo quanto o gênero são, antes de tudo, formas de incorporação prostética que se fazem passar por naturais, mas que estão sujeitos a processos de transformação e de mudanças constantes (Preciado, 2014Preciado, B. (2014). Manifesto contrassexual (M. P. G. Ribeiro, Trad.). n-1 edições.). Ao mesmo tempo que o gênero e o sexo são puramente construídos, são também inteiramente orgânicos e deles se resultam sofisticadas tecnologias que fabricam corpos sexuais (Preciado, 2014Preciado, B. (2014). Manifesto contrassexual (M. P. G. Ribeiro, Trad.). n-1 edições.). Preciado (2014)Preciado, B. (2014). Manifesto contrassexual (M. P. G. Ribeiro, Trad.). n-1 edições. critica tanto o feminismo essencialista, que se retraiu em posições conservadoras sobre a maternidade e a reprodução, quanto o chamado feminismo construtivista, que caiu na armadilha de pensar a tecnologia como aquilo que modifica uma natureza dada, ao invés de pensar a tecnologia como a própria produção de uma natureza. A autora ou o autor propõe que os corpos não se reconheçam como gêneros diferentes e, sim, como corpos falantes, passíveis de todas as práticas – que ela(ele) denominou como Manifesto contrassexual (Preciado, 2014Preciado, B. (2014). Manifesto contrassexual (M. P. G. Ribeiro, Trad.). n-1 edições.). Dentro deste Manifesto, a autora(autor) apresenta um trabalho de desconstrução contrassexual para romper com toda uma série de binômios oposicionistas: homem/mulher, homossexualidade/heterossexualidade, masculino/feminino, primitivo/moderno.
Ficou nítido que estes binômios oposicionistas essencializam características e reforçam os estigmas dos grupos, que os impedem de acessar as tecnologias discursivas e corporais que poderiam produzir. Dentro disto, os binômios mulher/homem e feminino/masculino trabalham para manter as diferenças sociais. E o discurso da “natureza” e de um destino biológico legitima as façanhas materiais e ideológicas de apropriações a que os corpos das mulheres são impostos e a elas se submetem (Guillaumin, 2005Guillaumin, C. (2005) Prática de poder e ideia de natureza: a apropriação das mulheres. In O. Curiel, &J. Falquet, J. (Ed.), El patriarcado al desnudo: tres feministas materialistas: Colette Guillaumin - Paola Tabet - Nicole Claude Mathieu (pp. 19-56). Brecha Lésbica.). Neste contexto, em muitos casos, poderemos refletir sobre mulheres economicamente dependentes dos seus maridos, que, na realidade, fazem todos os serviços domésticos e de cuidados não pagos5 5 Ser não pago por um trabalho significa que faz parte de seu caráter não ter nenhuma relação com uma quantidade qualquer, monetária ou de sustento (Guillaumin, 2005). para eles, mas, ainda assim, são consideradas como não trabalhadoras, sem emprego e até como suas propriedades (Connell & Pearse, 2015Connell, R., & Pearse, R. (2015). A questão do gênero. In R. Connell, & R. Pearse, Gênero: uma perspectiva global. Compreendendo o gênero da esfera pessoal à política no mundo contemporâneo. (M. Moschkovich, Trad. e Rev. Técnica, pp. 29-50). nVersos.). Não ocorrem estranhamentos, questionamentos e nenhum mal-estar diante do fato de as mulheres garantirem materialmente a manutenção de seu “possuidor” e de suas demais propriedades, na ordem da apropriação tanto privada (casamento) quanto coletiva (família, escolas, vida religiosa) (Guillaumin, 2005Guillaumin, C. (2005) Prática de poder e ideia de natureza: a apropriação das mulheres. In O. Curiel, &J. Falquet, J. (Ed.), El patriarcado al desnudo: tres feministas materialistas: Colette Guillaumin - Paola Tabet - Nicole Claude Mathieu (pp. 19-56). Brecha Lésbica.). As construções sociais dos homens e das mulheres autorizam a sujeição das mulheres, inclusive como força de trabalho sexual e como corpos disponíveis para a procriação doméstica. As mulheres são assediadas a realizar desde serviços físicos de casa a um ritmo ininterrupto até o exercício eventual de atividades que quebram suas aspirações, sua integridade e sua vida (Guillaumin, 2005Guillaumin, C. (2005) Prática de poder e ideia de natureza: a apropriação das mulheres. In O. Curiel, &J. Falquet, J. (Ed.), El patriarcado al desnudo: tres feministas materialistas: Colette Guillaumin - Paola Tabet - Nicole Claude Mathieu (pp. 19-56). Brecha Lésbica.; Preciado, 2014Preciado, B. (2014). Manifesto contrassexual (M. P. G. Ribeiro, Trad.). n-1 edições.). Uma estudante pontuou a respeito:
Os empregos femininos, além dos salários menores, vínculos trabalhistas mais precários, movimentos repetitivos e outras características de desgaste psicológico e emocional, muitas vezes sujeitos a assédio psicológico ou sexual. Os distúrbios psiquiátricos menores estão associados com a dupla jornada das mulheres pobres e também com longas jornadas de trabalho.
Recorrendo ao importante fundamento do movimento feminista de que “o pessoal é político”, foi discutida parte da história e da política das mulheres, especialmente no Brasil. Estes fatos históricos revelam a condição de opressão a que as mulheres estão submetidas e, ao mesmo tempo, a compreensão da importância da luta contra as injustiças sociais. Tais questões foram abordadas também em marcadores legais e institucionais pelas estudantes durante as aulas. Relataram elas que:
No Brasil, somente há cerca de 140 anos foi possível para as mulheres cursar o ensino superior, o que só ocorreu em 1879.
Antes de 1932 não era possível votar.
Em 1945 a “igualdade entre homens e mulheres” precisou ser reconhecida em um documento formal (Carta das Nações Unidas).
Em 1951, a organização internacional do trabalho aprovou a igualdade de remuneração entre trabalho masculino e feminino para a mesma função.
Somente em 1962 foi criado o Estatuto da Mulher casada, o qual garantiu, entre outras coisas, que a mulher não precisaria mais de autorização do marido para trabalhar ou receber herança, e em caso de separação ela poderia requerer a guarda dos filhos.
Em 1988 foi promulgada a Constituição da República Federativa do Brasil, garantindo igualdade em direitos e obrigações entre homens e mulheres perante a lei.
Do ponto de vista político eleitoral, em 1996, o congresso nacional incluiu o sistema de cotas na Legislação Eleitoral, obrigando os partidos a inscreverem no mínimo 20% de mulheres nas chapas proporcionais, dada a baixa representação no cenário político.
Apenas em 2006, diante dos alarmantes dados de violência de gênero, foi sancionada a Lei Maria da Penha que criou mecanismos para coibição e prevenção da violência contra a mulher.
Atualmente, ainda são gritantes as diferenças sociais produzidas com base no sexo e no gênero das pessoas. Embora as imagens das mulheres sejam comumente utilizadas na internet, elas têm poucas chances de serem produtoras de conteúdo na rede. Na política, não chegam a 25% da representação parlamentar em todo mundo; e nos negócios os homens são 95,6% das mais poderosas lideranças de negócios do mundo (Connell & Pearse, 2015Connell, R., & Pearse, R. (2015). A questão do gênero. In R. Connell, & R. Pearse, Gênero: uma perspectiva global. Compreendendo o gênero da esfera pessoal à política no mundo contemporâneo. (M. Moschkovich, Trad. e Rev. Técnica, pp. 29-50). nVersos.). A ciência e a tecnologia também são, em sua maioria, controladas por homens; e a maioria dos templos religiosos é dirigido exclusivamente por homens (Connell & Pearse, 2015Connell, R., & Pearse, R. (2015). A questão do gênero. In R. Connell, & R. Pearse, Gênero: uma perspectiva global. Compreendendo o gênero da esfera pessoal à política no mundo contemporâneo. (M. Moschkovich, Trad. e Rev. Técnica, pp. 29-50). nVersos.). Tratando-se de diferenças sociais, com olhar particular para a população de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais, Transgêneros, Queer, assexuais e outros grupos (LGBTQIA+), nos surpreendeu a falta de referências na literatura, com dados específicos sobre as diferenças sociais nesta população. Inferimos, a partir do que foi abordado até aqui, que todos os modos de viver que, de alguma maneira, não se encaixam nos modos patriarcais da sociedade e nos preceitos religiosos tendem a não ter reconhecimento de seu lugar na sociedade, ficando assim marginalizados. Essas representações mantêm historicamente o padrão de desigualdades entre os gêneros.
Houve relatos de que a experiência das discentes na construção do conhecimento com a metodologia de ABP foi desafiante, porque essas atividades demandam o uso de recursos e estratégias não completamente dominado por todas, tais como a busca em bases de dados, a leitura de documentos que contrapõem ideias e argumentos, assim como não foi fácil se deparar com textos das ciências humanas com estruturas argumentativas complexas, diferentes dos trabalhados nas áreas da saúde que tem um estilo relativamente mais conciso. As estudantes concordaram na utilidade de fazer uma primeira aproximação ao tema, posteriormente poder debater e clarificar ideias e conceitos com colegas e o docente e, por último, participar de um seminário e de um texto final que reúna a construção do grupo.
Como experiência de aprendizagem na área das ciências médicas, a turma entendeu como a participação individual e coletiva é fundamental para o grupo e relatou sentir gratificação com a construção coletiva do conhecimento. A sugestão de escrita do artigo, a partir do texto coletivo, foi, inclusive, uma demanda da turma. As estudantes ressaltaram a aula e a universidade como uma instituição com potência para descontruir normas rígidas de comportamento que limitam as potencialidades dos indivíduos e os condicionam a existências pré-desenhadas que castram sua subjetividade e capacidade.
Conclusão
No processo de aprendizagem, a partir do método desenvolvido, consideramos que o objetivo proposto foi atingido, isso porque observamos a importância do compartilhamento de experiências individuais e coletivas, especialmente quando entrelaçadas com a busca motivada, a estruturação e a síntese teórico-conceitual relacionadas à temática “Sexo e gênero”. Notamos, em primeiro lugar, a inextinguibilidade do tema. Compreendemos, em segundo lugar, os diversos caminhos existentes e possíveis para a busca e a estruturação das informações. Em terceiro lugar, as diferentes construções de significado a partir da maneira como cada discente se relaciona com o tema, o que significa dizer que ficaram nítidas as posições de cada participante na maneira como apresentou a temática “Sexo e gênero” nos textos individuais e nas discussões coletivas. E, por último, a potência da linguagem na função de manter ou subverter estruturas hegemônicas que controlam, limitam e validam as regras de poder estabelecidas nos diferentes grupos e nos diferentes gêneros.
O importante desta abordagem pedagógica foi construir e entender coletiva e interdisciplinarmente a noção classificatória em torno de sexo/gênero e as demarcações dos corpos, com base em práticas altamente reguladas. Concluímos que as diferenças sociais com base no sexo e no gênero são determinadas por construções sociais normatizadas pelas diversas instituições que privilegiam homens cis brancos heterossexuais e o binarismo mulher/homem. Estas construções e fixações de identidades com relação a sexo e gênero reduzem as multiplicidades possíveis de ser e de estar no mundo. Não se enquadrar nas normas regulatórias binárias de gênero significa enfrentar um estigma e discriminação na sociedade, e ser mulher significa carregar uma série de estereótipos associada à apropriação dos nossos corpos.
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Normalização, preparação e revisão textual: Vera Lúcia Fator Gouvêa Bonilha - verah.bonilha@gmail.com
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Apoio: Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – Brasil (CAPES) – Código de Financiamento 001 (88882.434628/2019-01)
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Considerando que a grande maioria das estudantes de programas de Pós-Graduação em Saúde Coletiva são mulheres, e a grande maioria das autoras que debatem sexo e gênero também são mulheres, neste texto trataremos sujeitos indeterminados e referências indefinidas sempre no feminino, com exceção de quando estivermos nos referenciando exclusivamente ao masculino.
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Ser não pago por um trabalho significa que faz parte de seu caráter não ter nenhuma relação com uma quantidade qualquer, monetária ou de sustento (Guillaumin, 2005Guillaumin, C. (2005) Prática de poder e ideia de natureza: a apropriação das mulheres. In O. Curiel, &J. Falquet, J. (Ed.), El patriarcado al desnudo: tres feministas materialistas: Colette Guillaumin - Paola Tabet - Nicole Claude Mathieu (pp. 19-56). Brecha Lésbica.).
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Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
14 Abr 2023 -
Data do Fascículo
2023
Histórico
-
Recebido
15 Fev 2022 -
Revisado
15 Fev 2022 -
Aceito
15 Abr 2022